Em torno da Corrupção
Não há dúvida de que dona Corrupção está na moda, como a mídia sobejamente o demonstra. A edição dominical de O Globo tem como cabeçalho “Números oficiais – Corrupção desviou R$ 67 bi de cofres públicos em 8 anos – De cada R$ 100 roubados, governo federal só recupera R$ 2,34”.
Por outro lado, a Veja desta semana traz como matéria de capa: “Dez Motivos para se indignar com a corrupção – Com os 85 bilhões de reais surrupiados pelos corruptos brasileiros no último ano seria possível ( e alinha a seguir dez alternativas para o desperdício, entre as quais erradicar a miséria, construir 241 km de metrô ou 36 mil km de rodovais).A prática evidencia que nos jornais as chamadas matérias de capa do domingo são reportagens adrede reservadas para tais edições. Elaboradas de antemão – já circulam no sábado – provêm de assuntos escolhidos a dedo, que estão fora dos critérios habituais. Embora os diários não sejam padarias, durante a semana as manchetes vêm quentes como as fornadas de pão. Já no dia do Senhor, os padrões semelham ser outros. Se as matérias têm interesse, elas pertencem no entanto aos assuntos que podem ficar nas gavetas por algum tempo.
Exame perfunctório das duas reportagens indica a disparidade de medidas. Enquanto O Globo fala de sessenta e sete bi em oito anos, Veja aponta para 85 bi em 2010 e 720 bi nos últimos dez anos.
Os totais, encolhidos ou não, assustam de qualquer maneira. Por maior que seja a desfaçatez dos corruptos, os presumíveis métodos utilizados por tais gatunos, engravatados ou não, visarão em princípio escapar dos controles dos órgãos públicos, por mais aleatórios, burocráticos e ineficientes que sejam. Daí talvez a primeira razão pela discrepância nos totais, contrapondo o conservadorismo do jornalão O Globo ao sensacionalismo do semanário Veja.
Ao ler esses totais, as reações de revolta do leitor podem diferir. Em tudo isso, existem dois aspectos que compreensivelmente tendem a provocar maior realce na atenção: o peso gravoso sobre as costas do contribuinte, em insolente desproporção com o percentual realmente empregado para o bem público (o pressuposto do impostômetro, que beira os 40%); e a perda pelos ralos da corrupção que nós deparamos na falta de saneamento básico, nas rodovias em petição de miséria, no drama da saúde pública, nos terminais dos principais aeroportos, verdadeiras vergonhas nacionais, e um vastíssimo, amazônico et cetera.
É claro que há outras facetas mais. Pelo caráter confrangedor, não é das coisas que nos agradem muito reportar. Talvez a ênfase dos últimos tempos seja consequência dos governos que nos cercam. Reação da sociedade civil com os padrões prevalentes que estão mais para Terceiro e Quarto Mundo, do que os supostos rarefeitos patamares dos países desenvolvidos. Por falar nisso e seja dito sem orgulho, também nos emergentes Brics a corrupção campeia em mais de uma inicial.
Todos concordam – ou fingem concordar – em que o exemplo tem de vir de cima. Mas as reações mudam se nos ativermos somente ao discurso, sem dar tento à práxis.
Agora, as coisas pioram muito se não se encontra a postura ética nem mesmo no discurso. Aí, é que elas realmente ficam pretas...
As preocupações do estamento judiciário paulista
Dentre as notícias interessantes – no sentido chinês – desta semana, o caderno Cotidiano da Folha de S. Paulo nos informa do seguinte:
Tribunal de Justiça (de São Paulo) quer tratamento especial para juiz suspeito de infração.O Presidente do TJ-SP, Desembargador José Roberto Bedran disse, a propósito, que isso evitará que incidentes ‘cheguem aos jornais’.
As declarações de Sua Excelência ocorreram durante sessão em que juiz suspeito de dirigir embriagado recebeu promoção.”
Com efeito, o presidente Bedran pediu oficialmente à Secretaria Estadual de Segurança Pública a criação da figura de um “delegado especial” para cuidar das ocorrências que envolvam juízes e desembargadores.
O objetivo seria o de evitar que incidentes com juízes “cheguem ao conhecimento dos jornais, e possam até ser explorados”.
A proposta em tela foi apresentada na sessão do TJ nesta última semana, durante a discussão sobre a promoção a desembargador do juiz Francisco Orlando de Souza,detido sob suspeita de dirigir embriagado e sem habilitação, no dia nove do corrente.
Após a briga de trânsito, o juiz foi levado à delegacia e liberado no mesmo dia. Ele nega que estivesse bêbado.
Assinale-se que em São Paulo, um magistrado não pode ser detido e a ocorrência tem de ser comunicada ao TJ. O tratamento especial, com delegado exclusivo, não está, contudo, previsto em lei.
Na sessão do TJ, houve versões discrepantes, mas todas, ao que parece, no que tange a elogios de magistrados ao colega, assim como suspeitas sobre a atitude do delegado. Ao cabo o juiz Francisco Orlando de Souza foi promovido a Desembargador, inda que por antiguidade.
( Fontes: O Globo, Veja, Folha de S. Paulo )
2 comentários:
Há tempos que me causa estranheza a frequência com que a "D. Veja" tem trazido à tona farto material sobre a tal da corrupção.Porque será que nos tempos iniciais do governo Collor de Mello, no governo do Dr. José Sarney e no governo do renomado intelectual Fernando Henrique Cardoso a mesma revista não agia com o sensasionalismo que agora emprega? Será que a corrupção era "mais leve" ou era muito bem escamoteada. Infelizmente acredito que a corrupção é um mal que vem permeando todos os governos citados acima, com a mesma intensidade da atual só que a imprensa trabalhava pró-governo e não contra o governo como tem feito desde oos tempos do presidente Lula.
Infelizmente um erro não justifica outro. Não é só a imprensa que está farta com a corrupção. Basta sair a rua e contemplar, de preferência nos domingos, as marchas convocadas pela internet, sem qualquer influência partidária - e como haveria, com esses partidos - cheias de jovens com o nariz do palhaço que tão bem simboliza a relativa impotência da sociedade civil.Não é nada contra o presidente Lula. Ele não é vítima desse processo. Basta olhar a malta à sua volta, basta ver o estado deplorável de toda a nossa infraestrutura, o estado da saúde, o escândalo da segurança, e um vastíssimo, avassalador et cetera. Por mais que respeite a tese da minha comentarista, é preciso evitar as teorias conspiratórias que podem ser convenientes, mas na verdade só servem para mal disfarçar a hidra da corrupção.
Postar um comentário