Recordam-se da MP 458, chamada pelos ambientalistas e também pelo líder do PT no Senado, Aloizio Mercadante, de MP da Grilagem ? Pois após três semanas de matreira procrastinação, e depois de deixar ‘vazar’ para a imprensa de que estava considerando vetar pelo menos três artigos dessa MP, o Senhor Luiz Ignacio Lula da Silva enfim se digna comunicar que a sancionará com um único veto, i.e., o inciso 2º do artigo 7º da MP, que permite a transferência de terras da União para pessoas jurídicas.
As demais reivindicações do PT (Senadores Mercadante e Marina Silva), do desgastado Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, e dos ambientalistas não foram atendidas. Os trechos da famigerada MP que o Presidente da República reputou inegocíaveis são parte do referido artigo 2º , que permite a regularização de terras ocupadas por prepostos, assim como o artigo 13º, que dispensa vistoria prévia para regularização.
Se as negaças iniciais do Senhor Lula se referiam a esses três artigos, salta aos olhos que a MP 458 é um monstrengo jurídico, e que já o fato de tê-la avalizado em sua versão primitiva se afigura bastante sintomático da debilidade política do Ministro Minc e o seu excessivo apego ao cargo.
Antes de ocuparmo-nos de outras jóias relativas à tramitação e aprovação da MP, semelha relevante indicar os traços marcantes da MP da Grilagem, que a aliança do Governo e dos ruralistas chamam pomposamente de ‘regularização fundiária da Amazônia’: A MP 458 pretende regularizar 67,4 milhões de hectares – área equivalente às da Alemanha e da Itália juntas. A legislação a ser sancionada prevê a doação das terras às pessoas físicas que possuam até cem hectares. Haverá cobrança ‘simbólica’ para propriedades de até quatrocentos hectares. Entre quatrocentos e mil e quinhentos hectares a venda será feita pelo valor venal da terra.
Já foi assinalado que esta Medida Provisória, conduzida pela Senadora Kátia Abreu (DEM – Tocantins) à aprovação, é esperta inclusive na escolha das medidas (hectares ao invés de metros quadrados). Adotando este falso redutor – o hectare corresponde a dez mil metros quadrados – fica menos dolorosa a transação para a opinião pública.
Quanto às demais ‘jóias’ deste triunfo da frente ruralista – que é uma derrota escandalosa para o Brasil – parece-me oportuno ressaltar as seguintes:
(1) nesta coalizão de muitos anônimos que é o Ministério Lula, , o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, articulou na Câmara o acordo que produziu o estatuto da MP da Grilagem. Como Mangabeira Unger já fora chamado no passado a coordenar assuntos da Amazônia, semelha evidente que este governo não confia no Ministério do Meio Ambiente para esta tarefa, que a outrem semelharia a escolha natural;
(2) não obstante a pressão dos ambientalistas e da ex-Ministra Marina Silva, para que Lula vetasse outras passagens da MP 458, consta que o Presidente esteve inclinado a sancionar na íntegra o texto da legislação consoante aprovado pelo Congresso ;
(3) o Presidente Lula só não seguiu a sua inclinação, porque, do ponto de vista político, uma sanção integral traria desgaste para a imagem do governo no exterior.
Todo o processo relativo à MP 458, não deixa dúvidas quanto à real posição política do Presidente Luiz Ignacio Lula da Silva. É necessário que os ambientalistas se atenham a realidades. Ao contrário das posições históricas do PT – do mártir Chico Mendes, de Marina Silva, etc. - e não obstante a cortina de fumaça que o fez assinar o manifesto de Christiane Torloni e Victor Fasano, o senhor Lula não adotará medidas pelo valor intrinseco do meio ambiente. No embate entre ambientalistas, de um lado, e ruralistas e desmatadores de outro, a visão imediatista do Presidente o fará sempre pender para a triste aliança dos corifeus do atraso e da devastação.
Lula só não se dispõe a entregar tudo a Blairo Maggi, Kátia Abreu, Ronaldo Caiado et caterva porque se assim fizesse, a sua imagem sofreria desgaste no exterior. Aprova a MP da grilagem na sua quase integralidade, mas como deseja continuar a ser “o cara” acha importante enfeitar a sua ‘regularização fundiária’ com o modesto tapume de vilazinha Potiomkin da modificação de parte do artigo 7º .
Por fim, tenha-se presente que Sua Excelência vai sancionar a MP 458, sem embargo de ferir em nove pontos a Constituição Federal. Tal conclusão consta da nota técnica encaminhada ao Presidente por representação de Procuradores do Ministério Público Federal. Essa advertência, se ignorada por Lula, pode e deve conduzir à contestação junto ao Supremo Tribunal Federal das ilegalidades e inconstitucionalidades da Medida Provisória.
Se este caminho for seguido, de alguma coisa terá servido todo esse teatro relacionado com a MP 458. Se tal espúria legislação for afinal derrubada, ela o será por motivos nacionais. O Brasil, é bom que se lembre, sendo um país soberano, age conforme os seus interesses. E nesses interesses está a abrogação da Medida Provisória manifestamente inconstitucional.
( da Folha de São de Paulo, 25.VI.2009)
quinta-feira, 25 de junho de 2009
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