A exploração predatória por empresários e clubes europeus do talento futebolístico de nossa gente é prática que se estende de longa data e que tem motivado algumas dessultórias tentativas de pôr cobro ao que constitui permanente escândalo e, por que não dizê-lo, uma vergonha para o Brasil.
Estaremos tratando com o mesmo país que se jacta de ser a oitava economia mundial, que é um dos líderes do chamado ‘G-20’, que desde muito postula um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, e cujo presidente acaba de ser distinguido como ‘o cara’ pelo carismático Barack Obama ?
Seria como se continuasse a reeditar, já nos albores do século XXI, e no terceiro milênio da era cristã, um antigo tráfico, ora vestido com outros trajes, mas que guarda com o nefando comércio que formalmente terminaria no século XIX algumas turbadoras semelhanças ?
Atualmente se nos depara um intercâmbio de pessoas que, ao invés de decrescer e de restringir-se, outra coisa não faz senão aumentar e não só nos fluxos antes conhecidos, mas alargar-se despejadamente para novos celeiros, em ativismo que se não fere os condicionamentos legais – e há sobejas dúvidas nesta área – decerto arranha o aspecto ético da questão.
Há muito os clubes nacionais são literalmente saqueados pelas incursões em seus plantéis de jogadores por empresários a mando de empresas esportivas européias. É sabido que os clubes brasileiros são frágeis criaturas, se cotejadas com os seus congêneres da União Européia. Sabemos igualmente que, a despeito de tentativas, como a Lei Pelé, para o fortalecimento destas sociedades no Brasil, contam-se nos dedos de u’a mão os times que dispõem de alguma solidez financeira e consequente capacidade de manter equipes estruturadas e com bons jogadores.
Estranha deveras que esporte tão popular e tão entranhado no ethos de nossa terra, venha a sofrer as contingências a que tristemente os torcedores se submetem, qual seja a sua transformação em verdadeiras plataformas, em que craques e bons jogadores pouco demoram, arrancados de e/ou vendidos por (os dois lados se complementam) diretorias impotentes para os gramados de além-mar ? E para mais sublinhar a humilhante sujeição, tais transferências se fazem durante suposta ‘janela’ do Campeonato brasileiro ? Antiga prática do torcedor, v.g. a memorização da equipe de sua preferência, hoje se afigura verdadeira tarefa de Sísifo, a tal ponto mudam – e seguramente não para melhor – os times brasileiros !
É velho costume nosso atribuirmos males como este a artimanhas estrangeiras. Não se diga que esse comércio desbragado não se realize sem a conivência dos clubes europeus e dos empresários. No entanto, forçoso será reconhecer que os clubes brasileiros, a C.B.D., as federações estaduais, o Congresso Nacional e a própria sociedade civil tem a sua parte nesta versão hodierna do tráfico que representa uma vergonha para o nosso país, e grave falha na proteção da juventude nossa concidadã.
A ganância dos traficantes pode constituir a semente de sua própria perdição. Lemos na revista Veja desta semana reportagem de capa sobre ‘o milionário negócio de descobrir, treinar e vender para a Europa “craques-bebês” brasileiros’. Esta nova faceta do tráfico de jogadores de futebol acentua a ignomínia e o absurdo dessa prática. Aí o principal perdedor é a criança ou jovem, individuada com supostos dotes esportivos que justifiquem o ‘investimento’de transplantá-lo a país estrangeiro, fundados na aposta – e na lei das probabilidades – de que a inversão será lucrativa tanto para os familiares, quanto para o clube que vai bancar o negócio. Neste assunto, obviamente, quem tem mais a perder é o alegado beneficiário, a que se arranca de seu meio, sua cidade e seu país, no encalço de uma excelência que, ironicamente, o próprio transplante para ultramar pode inviabilizar.
Quando as coisas chegam a tais funduras, parafraseando a famosa frase de Clemenceau, creio que o futebol e os negócios relativos aos jogadores constituem tema demasiado importante para ser entregue a diretorias de clubes e a paredros de federações e confederações. É tempo de a sociedade civil avocar este assunto e exigir do Congresso Nacional e do Governo atitude séria, conforme à imagem do país que desejam fazer acreditar no exterior. Basta de tráfico de jogador de futebol !
sexta-feira, 15 de maio de 2009
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