Que me perdoe o leitor, porém volto a ocupar-me da relação do Governo Lula com o tema do meio ambiente. Sei que já tratei da questão em duas matérias inseridas em ‘Colchas’: na de 26 de março, acerca do decreto sobre cavernas; e na de 9 de abril, ‘entre perplexidade e descrença’.
Todo o problema talvez se concentre nessas duas palavras – perplexidade e descrença. Depois do inverno atravessado durante os oito anos de FHC, a sociedade civil queria acreditar na boa disposição do Governo Lula para com a causa ecológica. E a designação da Senadora Marina Silva como titular da Pasta representou uma chancela relevante de tal determinação.
Sabemos hoje como terminou esta fase. Ambientalistas e a larga faixa de simpatizantes dessa nova atitude com a mãe natureza - resultado de conscientização nascida no século vinte em função dos desastrosos efeitos do fator humano no equilíbrio ecológico – assistem, consternados e exasperados, à exposição da inarredável discrepância entre um discurso supostamente verde e uma práxis que é a negativa em termos concretos das alegadas boas intenções.
Como antes referido, Marina Silva, a militante petista acreana, a defensora da causa de Chico Mendes, preferiu afinal renunciar à Pasta, após uma série de malogros, para que a sua continuada presença à frente do Ministério não mais pudesse ser instrumentalizada como cortina de fumaça para decisões do Governo Lula objetivamente favoráveis aos desmatadores e demais agressores do meio ambiente.
A sua substituição pelo midiático Carlos Minc, criatura do peemedebista Sérgio Cabral, e de peso político que não pode ser comparado ao de Marina Silva, se representou mais um gesto de alegado endosso da causa ecológica, tem evidenciado na prática o quanto o discurso ambientalista do Governo Lula é vazio, sempre que exista uma contraposição relevante entre Ibama e o ministério, de um lado, e os desmatadores e demais agressores do meio ambiente, do outro.
Se atentarmos para essa atitude, que se poderia chamar de prestidigitação, a referência colhida na coluna de Miriam Leitão em O Globo (17 de abril corrente) constitui exemplo deveras interessante. Dentre as conversas do Presidente Lula no Fórum Econômico Mundial, recentemente organizado pelo Banco Mundial no Rio de Janeiro, ela assinala um diálogo inesperado de Lula com o presidente do Fórum, o alemão Klaus Schwab, em que pediu informações sobre projetos de economia verde. Schwab disse que há vários projetos dando certo e ficou de mandar mais informação.
No entanto, a experiência pretérita será um aguilhão para que o público conscientizado não se anime em excesso com esta implícita e louvável intenção do Primeiro Mandatário.
Ora, o ceticismo não surge do nada, mas de um incômodo contraponto entre róseas promessas e a dura realidade. A própria Miriam Leitão se encarrega de trazer à baila esses fatos e posturas que não se coadunam com o discurso ecológico: (a) o governo acaba de conseguir na Câmara a aprovação de Medida Provisória que reduz as exigências de licenciamento ambiental para as rodovias do PAC, entre as quais as críticas BR-163 e BR-319; (b) o governo igualmente liberou pacote de ajuda ao setor agrícola sem qualquer exigência ambiental, mesmo para aqueles segmentos implicados em desmatamento.
Contudo, não é só nessas iniciativas pontuais que o Governo Lula assume posições preocupantes, que vão ao arrepio da filosofia de uma economia verde. Dessarte, ao invés de empenho de economia de baixo carbono, o Governo Lula está na contramão da atual tendência, ao promover ampliação sem precedentes de usinas termoelétricas a carvão e a óleo combustível. Este é um desenvolvimento inquietante e que, no entanto, passa quase em surdina nos temas veiculados para a opinião pública pela grande imprensa.
Se elevamos loas aos biocombustíveis e à sua contribuição para fatores menos poluentes, este é um tema que deve integrar um discurso geral e consequente, e não constituir apenas argumento a ser utilizado em contexto bilateral.
A opção por termoelétricas a carvão e a óleo combustível é um recurso que contraria a postura histórica brasileira, voltada para um futuro mais risonho e com menos carbono. Ao contrário da China, que é pobre de recursos para sustentar as suas ambições de crescimento – e cuja poluição generalizada é um remédio desastroso em inúmeros aspectos – o Brasil não deve optar pelas chamadas opções apressadas, com o seu ranço inimitável de passado poluidor, e sim investir em energias limpas, para que não fiquemos relegados a uma tóxica e lamentável retaguarda.
A par da corrupção e dos desmandos do Poder Legislativo, a Questão Ecológica não tem recebido a atenção nem o debate que, com urgência, faz por merecer.
Cada vez que o Governo Lula cede a Blairo Maggi e a esta enorme hidra cujas cabeças no Pará, no Mato Grosso, no Mato Grosso do Sul, em Santa Catarina e alhures, avança a pavimentação da estrada real para o inferno ecológico. Naquela esperteza burra de que o paradigma é Esaú, ele vende por um prêmio risível pelo dúbio apoio desta hidra, em troca de uma desgraça certa que atingirá mais do que essa construção constitucionalmente temporária, e sim a uma vasta coletividade que não merece um porvir de miséria e desertificação.
De que lhe servirá então o opróbio dos pósteros, se os responsáveis e os seus cúmplices já estarão dormindo sono tão profundo quanto o de Totonho Rodrigues ?
domingo, 19 de abril de 2009
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