sábado, 24 de abril de 2021

O Juiz Moro e a Verdade (II)

   Vossa Excelência perdeu,  disse  o Ministro Gilmar Mendes ao colega Luis Roberto Barroso, no bate-boca constrangedor na sessão do Supremo, que, ao reunir votos suficientes para confirmar a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro numa das condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na prática representa o sepultamento da  Operação Lava - Jato.

    Se a conclusão do ministro Gilmar Mendes está certa (o juiz Barroso perdeu), para que se tenha ideia  de quem realmente perdeu, é oportuno transcrever trecho do dito editorial: Quem venceu não foram Gilmar e os seis ministros que votaram com ele. (...) Quem venceu foram, além obviamente de Lula todos os demais 174 condenados em  virtude das 179 ações penais deflagradas pela força-tarefa da Lava - Jato no Paraná, assim como os réus daquelas ainda não julgadas.

      Dessarte, "todo o edifício jurídico  de provas e denúncias elaboradas pela Lava-Jato, as dezenas de delações e acordos de leniência  assinados, as confissões, os R$ 14,8 bilhões em multas, os R$ 4,3 bilhões devolvidos aos cofres públicos, as penas de prisão cumpridas - tudo agora estará sujeito a revisão, mediante a conclusão, referendada no plenário do STF, de que  a relação de Moro com os procuradores era espúria.

       "Mesmo que depois se venha a dizer que a suspeição  valia apenas para  Lula, ela se tornará  um argumento poderoso na mão da legião de advogados de defesa, especializados nas duas manobras que garantem a impunidade no Brasil: a anulação de provas e a protelação de processos até a prescrição dos crimes.  É a mesma legião que, sob o argumento de defender o Estado de Direito, se transformou em um lobby articulado em favor das chicanas judiciais que fazem do Brasil terreno fértil para corrupção.

         "As condenações de Lula, proferidas depois  de investigação e denúncia que produziram provas eloquentes - entre elas, a confissão do próprio empreiteiro que lhe deu de presente a obra do triplex no Guarujá - foram confirmadas em duas instâncias e no STJ  por dez juízes diferentes. Soçobraram por uma dessas tecnicalidades em que os advogados são especialistas: quase cinco anos depois da denúncia, o Ministro Edson Fachin decidiu que Lula não poderia ter sido julgado em Curitiba. Era uma tentativa de evitar o exame da parcialidade de Moro na Segunda Turma do Supremo, que poderia fazer desmoronar todo o resto da Lava-Jato.

           " A manobra de Fachin não funcionou. Depois de ter segurado por dois anos seu voto sobre a parcialidade, em poucas horas Gilmar levou-o à turma e, numa votação expressa, Moro foi declarado suspeito. No plenário, formou-se quinta-feira maioria para confirmar a decisão. Só não foi confirmada porque, em meio ao bate-boca, o presidente do STF, Luiz Fux, decidiu dar a sessão por encerrada, enquanto o ministro Marco Aurélio encetava pedir vista."

              A conclusão desse editorial, que acredito ser um dos mais oportunos e relevantes para os estudiosos de Direito,  em que honro incluir-me, pelo meu curso terminado há muito no  velho e histórico prédio da Praça da República, no Rio de Janeiro, está no parágrafo  terminal deste muito relevante editorial-chefe.  Nesse sentido, creio que se deve dar aos eventuais leitores a oportunidade de uma conclusão, que se encaixa no arrazoado em tela: "Pode   até haver motivos jurídicos  para justificar  a decisão tomada  pelo plenário. Mas no mundo real, longe do universo estéril das discussões acadêmicas, o efeito está claro: como seu principal símbolo, a Lava-Jato acabou.  A operação  que pela primeira vez levou para  trás das grades empresários e políticos do mais alto escalão virou história. 

" Com ela, o país desperdiçou uma oportunidade de amadurecimento institucional, uma possibilidade de substituir a impunidade e o capitalismo de compadrio seculares por um ambiente de negócios mais justo, mais maduro e mais eficiente."

  " Quem perdeu não foi só Barroso, como afirmou Gilmar. Quem perdeu foi o Brasil."


(Fonte: O Globo.)

Nenhum comentário: