A cisão na sociedade grega, e a crescente insatisfação com os métodos de repressão policial eclodiram mais uma vez, desta feita ao ensejo do assassínio no sábado, a seis do corrente, por policiais, em bairro central de Atenas, de um jovem de quinze anos, Alexandros Grigoropoulos.
As manifestações de protesto dos estudantes são um fenômeno comum em Atenas. Em geral, as passeatas dos universitários ou se destinam à praça Sintagma (Constituição), onde se acha o edifício do Parlamento, ou vão mais além, subindo a avenida da Rainha Sofia, para terminarem diante do edifício-bunker da Embaixada dos Estados Unidos. O fato de os protestos da juventude helênica visarem aos Estados Unidos (e, incidentalmente, ao Reino Unido) se deve às memórias do chamado regime dos coronéis gregos (1967-1974), e ao suposto apoio que esta ditadura militar teve de Washington.
De hábito, grande parte dessas manifestações são pacíficas. Impressiona, outrossim, a organização de tais movimentos. A despeito dos excessos da repressão – com a utilização profusa do gás lacrimogêneo, comumente utilizado de forma ilegal pelos policiais – os estudantes se mantêm ordenados, as fileiras ligadas pelos braços dobrados, o que semelha reminiscente da falange macedônica, se bem que desarmada. A formação é mantida, tanto no avanço, quanto na retirada, o que espelha seja a unidade do movimento universitário, seja a sua força potencial.
O governo da Nova Democracia, chefiado por Costas Karamanlis, tem maioria de apenas uma cadeira em um Parlamento singular de 300 membros. Na oposição estão os sociais democratas de Georgos Papandreou, os comunistas de Aleka Papariga e a coalizão da esquerda radical (Syriza), com Alekos Alavanos. Não obstante a exígua maioria, a Nova Democracia, que já está no segundo mandato, procura implementar sua agenda neoliberal como se dispusesse de amplo respaldo. Há diversos anos, intenta forçar a aprovação de reforma universitária, que, na prática, busca quebrar o monopólio da universidade pública na concessão de diplomas na Grécia. A maior parte dos corpos discente e docente na Grécia se opõe a tal empresa, por nela ver desrespeito ao princípio constitucional do ensino universitário aberto a todos, na base do conhecimento e da gratuidade.
Como sói acontecer, a polícia reagiu a ataque isolado de uma ala mais radical do movimento estudantil com violência desnecessária. Não obstante tentativas de atribuir ao infortúnio a morte do jovem Grigoropoulos, testemunhas oculares confirmaram que o estudante foi intencionalmente atingido por disparo de pistola de um policial. Dada a crescente e generalizada insatisfação nos meios estudantis e em largos segmentos da população, nada terá de surpreendente a eclosão de protestos e depredações não só em Atenas e Salônica, senão em Patras e nas ilhas de Creta e Corfu.
A evolução da crise até o presente não tem igualmente surpreendido. O Ministro do Interior, Procópio Pavlopoulos, apresentou ao Primeiro Ministro Karamanlis o seu pedido de exoneração. Pavlopoulos comanda cerca de 45 mil policiais, que, no momento, enfrentam considerável desafio, em resposta ao assassinato do jovem de quinze anos. A reação nas diversas cidades chegou a tal ponto que teria deixado de ser contabilizado pelos bombeiros o número de incidentes (manifestações, lojas avariadas ou destruídas, detenções, prisões,populares e policiais feridos, etc.).
O Presidente da República Helênica, o respeitado Karolos Papoulias, fez um apelo pela manutenção da ordem. Papoulias, que é um antigo militante socialista, dispõe, no regime constitucional grego, do poder que detinham os presidentes na antiga quarta república francesa, isto é, muito pouco além da representação do Estado e das funções cerimoniais.
Por sua vez, ainda de acordo com o esperado, Costas Karamanlis recusou o pedido de demissão de Pavlopoulos. Não se pode, no entanto, afirmar que não será afastado ulteriormente.
Por outro lado, o líder da oposição, Papandreou, ritualmente pediu a demissão de Karamanlis, no que foi acompanhado pelos aliados comunistas e esquerdistas.
No que tange à reação de Karamanlis, tudo dependerá da evolução da crise. Se a exemplo de episódios anteriores, lograr manter sem defecções a sua maioria de 151 contra 149, não é provável que o líder da Nova Democracia se resolva a enfrentar eleições antecipadas.
Sem embargo, a política é e será sempre a arte do possível. Se a situação continuar a deteriorar-se, possíveis desafetos dentro das próprias fileiras governamentais se disporão ao jogo arriscado de contrariar o poder oficial. Nesta hipótese, se a sua base parlamentar fragmentar-se não restará a Karamanlis outra saída senão enfrentar o corredor polonês da eleição antecipada.
Dentro do quadro mutável da crise, tal perspectiva, por ora, não é a mais provável. Não pode, porém, ser descartada.
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
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