OS JORNAIS – XVI
O GLOBO - 21.09.2008
A ameaça do ‘Aedes’. O jornal O Globo dedicou duas páginas inteiras ao exame da ameaça que a dengue representa para o Rio de Janeiro. Embora a dengue haja sido considerada extinta em 1958 no Brasil, ela voltou no início dos anos setenta, possivelmente procedente da Venezuela, e por causas que aprofundarei mais adiante espalhou-se pelo Brasil. Conquanto o mosquito ‘Aedes Aegypti’ esteja presente em todo o país – e portanto o estudo desta doença interesse a todos os estados – a dengue é analisada por O Globo no contexto do estado do Rio e do município do Rio de Janeiro. Num ano em que o município do Rio enfrentou a mais grave epidemia de dengue de sua história – que provocou a morte de pelo menos 98 pessoas – especialistas alertam: o controle do mosquito Aedes Aegypti tem sido ineficaz. Segundo eles, não só as estratégias de ação são inadequadas, como são escassos os recursos destinados pelo Município, pelo Estado e pela União (meu o grifo) ao combate à doença. Verifica-se que a prefeitura planeja despender R$15,6 milhões, menos que o estado (R$45,6 milhões). Nesses termos, a prefeitura vai gastar mais com massa asfáltica (R$20,6 milhões) e muito menos do que com a chamada Cidade da Música (R$ 222,8 milhões autorizados em 2008, em um total de R$503 milhões). Há muitos pormenores de interesse, porém dada a extensão do tema semelha oportuno assinalar as estatísticas no Estado do Rio e no Município do Rio de Janeiro nos anos das duas principais epidemias (2002 e 2008). Na Cidade do Rio de Janeiro, em 2008 até agora foram registrados 128.647 casos, dos quais há 98 óbitos confirmados; já em 2002 houve 138.027 casos e sessenta e quatro óbitos confirmados. Por sua vez, no Estado do Rio de Janeiro o total de casos até agora é de 243.041, e o número de óbitos 313 (172 confirmados), sendo que 36% das mortes foram de crianças entre zero e quinze anos. Já em 2002, os casos foram 288.245, e 91 óbitos confirmados.
Comentário do cidadão. Depois da tragédia que representou a epidemia de 2008, muito mais letal do que a de 2002 (como os números acima comprovam), somente no Brasil há de surpreender que para o próximo verão tanto o Município (o principal agente responsável), quanto o Estado e a União não tenham acordado ao combate deste flagelo os meios indispensáveis para medidas sérias em defesa da população. Se cotejarmos a retórica (e as medidas emergenciais, deslanchadas já sob o látego da epidemia, no verão de 2008) de Estado e União (a prefeitura do Sr. Cesar Maia a princípio até negou a existência de epidemia, chegando ao requinte de informar os meios de comunicação sempre por funcionários de terceiro ou quarto escalão), em qualquer outro país civilizado haveria o pressuposto de que para o próximo verão (a época de maior incidência do vetor da enfermidade) existiria um esforço concentrado que correspondesse de certa forma às declarações e promessas do verão passado. Diante dos números – e dos pronunciamentos de especialistas – só se pode perguntar onde é que estão Suas Excelências o Ministro Temporão (da Saúde) e o Governador Ségio Cabral ? Não creio valha a pena perguntar onde está o Sr. Maia (que, a despeito de sua inação e de falta de cooperação quando eclodiu a epidemia, foi tratado com grande leniência pelos meios de comunicação). Do Sr. Maia o Rio de Janeiro estará livre a partir de janeiro do ano próximo.
Estamos em época eleitoral, e chovem as promessas. Se esse gênero de discurso resolvesse os problemas nacionais, estaduais e municipais, não trepidaria em afirmar que o Brasil seria a verdadeira terra prometida. Com efeito, o cidadão brasileiro não é apenas muito tolerante com os seus governantes. Não cobra de seus eleitos as promessas não cumpridas, como se se tratasse de expedientes válidos para alcançar as benesses do poder, bem depressa esquecidos no que implicam de eventual empenho e coerência. Em outros tempos, dir-se-ía que falta vergonha a tais senhores, por faltarem com a palavra empenhada. Em tempos ainda mais antigos, a pitonisa de Delfos (porta-voz de Apolo) vaticinava os piores castigos àqueles que descumprissem seus juramentos...
Entretanto, o cidadão brasileiro em geral – há obviamente exceções – tem um outro problema: ele sofre de uma espécie de memória teflon. Os piores desmandos, as mais graves omissões – com as trágicas conseqüências acarretadas, v.g., pela omissão ou pelas ações marcadamente ineficazes (como no caso do Rio de Janeiro) não permanecem por um tempo mais longo em sua memória. Por isso, os políticos contam com esse esquecimento para igualmente esquecerem as suas promessas e porque não dizer a própria hombridade e consciência ética de fazer o que é melhor e mais urgente para os seus eleitores.
Como cidadão, eu sentiria real satisfação se os homens públicos nacionais - e em especial aqueles sobrecarregados pelas honrarias dos altos cargos - se recordassem deste perene compromisso com o sofrido e paciente povo brasileiro, e, por uma vez, desmentissem a famigerada consciência teflon, atuando como no caso em tela de comprovada gravidade (e que tem golpeado notadamente as crianças e os destituídos) como políticos com P maiúsculo.
segunda-feira, 22 de setembro de 2008
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