A Eleição Americana de 2008 - A Campanha
das Primárias no Partido Democrata
A campanha presidencial estadunidense, iniciada em 2007, se assinalou, no que concerne ao Partido Democrata, pelo favoritismo inicial da pré-candidata Hillary Rodham Clinton. Até Iowa, foi havida como a candidata natural dos Democratas tanto pelos republicanos. Assim, Karl Rove, ao despedir-se da Casa Branca de Bush, no seu estilo corrosivo a definiu como candidata inevitável porém com falhas irremediáveis; e tambemo pela maioria dos democratas, conforme refletido pelo apoio então dado pelos chamados superdelegados, como pela própria pré-candidata que não hesitava em empregar fórmulas que presumiam como já definida a sua designação pela Convenção. Entretanto, para a surpresa de muitos, a campanha das primárias se iniciaria em Iowa com a vitória de Barack Obama. A eleição no estado de Iowa foi feita sob a forma de ‘caucus’, um procedimento algo complexo e tipicamente americano em que se computa a vontade majoritária das diversas assembléias populares. Obama soube privilegiar essa fórmula, investindo bastante na preparação da campanha naquele pequeno estado, cuja importância residia na circunstância de ser a primeira primária da estação. Já Hillary, talvez pela hubris de se considerar a candidata virtual, negligenciou em atenção especial ao caucus. Da noite para o dia, caíu do pedestal de grande favorita, entrando a sua candidatura em grave crise. Na disputa pela primária em New Hampshire, apresentada como provável perdedora, Hillary evidenciou espírito de luta e sensibilidade, diante da impiedosa carga da mídia, que aparentemente se deleitava com o seu prematuro tropeço. Assim uma lágrima terá influenciado o eleitor ( e a eleitora) daquele estado, provocando reviravolta na corrida, com a sua já imprevista vitória.
Não creio haja aqui espaço para descrição pormenorizada da campanha primária democrata de 2008. Parecem-me relevantes, no entanto, as seguintes considerações: As primárias democratas de 2008 constituíram o embate mais prolongado e acirrado da história partidária, sem nada comparável em muitos e muitos anos. A ‘candidata natural’ Hillary viu a sua posição contestada pelo também senador Barack H. Obama (Illinois). Características dos dois pré-candidatos. A pré-candidatura de Obama teve a impulsioná-la a oratória, a mensagem de mudança (‘change’), o trânsito junto a juventude, a oposição desde o início à guerra de Bush junior contra o Iraque, e o amplo apoio recebido da comunidade afro-americana. Durante as primárias, após o desaparecimento de todos os demais contendores (com o populista John Edwards por último), houve diversos debates televisados entre Obama e Hillary. Em nenhum deles, nenhum dos dois candidatos pôde alcançar vitória decisiva sobre o outro, mas alguns traços ficaram marcados. A habilidade de Obama em apresentar ‘change’ como mensagem genérica, sem especificações; essa postura foi igualmente empregada quanto a outras questões por Obama, que evitou tratar de aspectos controversos (e potencialmente divisivos). Obama soube valer-se de sua oposição de princípio à guerra no Iraque, colocando a sua contendora em dificuldade na tentativa de explicar o seu voto no Senado favorável à intervenção militar no Iraque. Dentre os aspectos positivos da pré-candidata, Hillary mostrou maior conhecimento de temas econômicos e em termos de plano de saúde, marcou sua diferença com a posição não tão abrangente do Senador por Illinois.
A campanha das primárias. Uma contenda massacrante, estendida pelo desejo de vários estados de antecipar as respectivas eleições, prolongou-se por seis meses, de princípios de janeiro a começos de junho. Por uma série de circunstâncias (apoio maciço da mídia que terá visto em B. Obama um novo John Kennedy, a formação de maioria pró-Obama em delegados simples a partir da chamada Super-Terça – quando se realizaram simultaneamente diversas primárias -, o irresistível ‘repensamento’ em favor do candidato afro-americano de inúmeros dos chamados superdelegados que antes apoiavam Hillary, a crescente pressão sobre Hillary para que desistisse de sua pré-candidatura em função da atmosfera de ‘já ganhou’ incentivada pela mídia às vezes por causa de vitórias de Obama e em outros casos paradoxalmente a despeito de sucessos de Hillary, e last but not least a tenaz resistência da Senadora por New York a uma renúncia antes do final da temporada das primárias) a competição entre os dois pré-candidatos só se encerraria na primeira década de junho, terminadas as primárias, com a declarada ‘suspensão’ de sua campanha em um marcante discurso por Hillary Clinton.
Durante essa memorável campanha primária, a senadora Clinton obveve dezoito milhões de votos (contra um total correspondente de Obama). Hillary venceu nos estados mais populosos: New York, California, Pennsilvania, Texas, Ohio, Virginia, Florida, entre outros. Mostrou ela apoio majoritário junto aos latinos, ao eleitorado operário, às mulheres, aos mais idosos, e também da classe média baixa. Obama, por sua vez, mostrou força junto aos jovens, aos intelectuais, e na comunidade afro-americana. Teve ele o apoio preponderante da mídia, e também da própria direção democrata, refletida na controversa decisão sobre as primárias nos estados da Flórida e Michigan. Os diretórios estaduais as tinham antecipado, ao arrepio das disposições do direção partidária. Hillary venceu na Flórida e no Michigan, mas os delegados respectivos acabaram com apenas meio-voto para a próxima Convenção.
Os opositores de Hillary na imprensa, além dos adversários herdados da Administração Clinton, incluíram algumas mulheres (como a veterana Elizabeth Drew e a colunista Maureen Dowd, esta com um tom assaz viperino), representantes do establishment como o Senador Ted Kennedy e o clan Kennedy, o candidato derrotado em 2004 John Kerry, e o ex-presidente Jimmy Carter, entre outros. Se é natural que as opiniões se dividam, já não é tão natural o tom emocional e a aberta parcialidade em muitos desses juízos acerca da pré-candidata pelo estado de New York. No próximo artigo me ocuparei dos pontos fortes e débeis do candidato Barack Obama, e das perspectivas de uma real composição entre as duas principais forças do Partido Democrata com vistas às eleições presidenciais de novembro vindouro.
sexta-feira, 20 de junho de 2008
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Um comentário:
Interessante embate para novembro:
um republicano moderado e altamente respeitado até fora de seu partido (partido, aliás, que deseja apagar o mais depressa possível os estragos feitos por George W.) e o primeiro candidato negro com chances reais de vencer uma eleição. Obama demonstrará habilidade e faro político se souber deixar de lado o pesado legado dos Clinton (isto é, se conseguir deixar Hillary fora de sua chapa).
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