quinta-feira, 26 de junho de 2008

II - Eleição Americana. Perspectivas de B. Obama

No marcante discurso de Hillary Clinton, a que me referi no artigo anterior, em que suspendeu a campanha e martelou junto a seus partidários a necessidade de apoiar a candidatura de Barack Obama à presidência através de refrão com traços shakespearianos, se reflete tanto a dificuldade, quanto a necessidade de autêntica união do partido se os democratas realmente desejam voltar à Casa Branca. Costurar este apoio constituirá a premissa indispensável para que Obama logre vencer o republicano John McCain.
Os escolhos para que uma real composição de forças entre os dois grandes nomes do Partido Democrata não são imaginários. Temos idéia do difícil caminho pela frente na lacônica declaração de apoio a Obama pelo ex-Presidente Clinton, declaração de uma única linha e veiculada por assessor. Se tal frieza clintoniana decorre da aparente falta de vontade política de Obama e seu grupo em chegar a acordo com a corrente de Hillary Clinton, não é de prever-se que a chapa democrata terá a necessária pujança para vencer o G.O.P.
Malgrado Obama, com a ajuda da mídia e do ‘establishment’, haja vencido o duro embate das primárias democratas, se computarmos os estados mais populosos (California, New York, Pennsilvania) e aqueles que costumam pender para o ganhador nas eleições presidenciais (Kentucky, Virginia, Ohio) os resultados não se afiguram tão animadores para ele. Para que vença em novembro não lhe bastará o endosso cerimonial da Convenção de Denver. Deverá afastar a húbris do pré-candidato e os rancores de seus partidários ‘incondicionais’ e trazer para o aprisco os diversos segmentos que se identificaram com a pregação da pré-candidata Clinton (mulheres, operários e trabalhadores de baixa escolaridade, latinos, etc.). Se Obama não manifestar disposição de recompor-se e de reunir-se com o grupo de Clinton, a sua liderança no Partido Democrata terá a duração que teve a de outros candidatos designados como Humphrey (1968), McGovern (1972), Mondale (1984), Dukakis (1988) e Kerry (2004).
E assim como foi difícil para Hillary obter da multidão de seus partidários presentes no discurso de despedida da candidatura à Presidente os seus aplausos para o pré-candidato Barack H. Obama, será igualmente árduo porém politicamente necessário que o candidato afro-americano forme com a mulher Hillary a chapa democrata, unindo as duas forças majoritárias no partido e com equipolente apoio popular.
Obama pode parecer um novo John Kennedy, mas tem mais flancos vulneráveis ao preconceito do que o carismático presidente da Nova Fronteira. A recente declaração de assessor de John McCain, desautorizada é certo pelo candidato, é um sinal premonitório desses temores que muita vez o eleitor resolve no segredo da urna. Outro indício da ressurgência de esqueletos supostamente jogados na lata de lixo da história se acha nas reuniões sulinas dos senhores encapuzados da Ku-Klux Klan.
Que Obama não se faça ilusões. Se se propõe realmente recolocar os democratas na Casa Branca e reconfirmá-lo na maioria das duas Câmaras legislativas, não será através da escolha de medalhões para a Vice-Presidência – podendo ofertar-lhe um nome ilustre, mas não os votos que soube granjear Hillary – que ele se tornará o próximo Presidente dos Estados Unidos da América.

domingo, 22 de junho de 2008

Machado de Assis ou Guimarães Rosa ?

O Suplemento Mais! da Folha de São Paulo deste domingo, 22 de junho, dedica a sua matéria de capa a uma ‘enquête’ feita pelo jornal “com 30 dos principais críticos e escritores brasileiros” no ano do centenário da morte de Machado de Assis e do centenário do nascimento de Guimarães Rosa. Segundo a dita pesquisa, Machado teria derrotado a Guimarães Rosa por um placar de onze votos a dois.
Se se pode compreender, ao ensejo da coincidência de datas, o interesse jornalístico em promover essa suposta eleição do maior escritor brasileiro, caberia perguntar se (I) este gênero de procedimento pode pretender alguma credibilidade e (II) como corolário do anterior, se tal espécie de juízo pode ter alguma validade objetiva.
(I) Tanto Machado de Assis quanto Guimarães Rosa integraram a Academia Brasileira de Letras, o primeiro como proponente de sua criação, a partir do modelo francês, e o segundo, cerca de seis décadas depois, por ambição de lograr o galardão de participar do colegiado. O fato de terem sido membros da Academia – Guimarães Rosa postergou por um ano a sua posse, fundamentadamente temeroso do efeito sobre o seu coração – acrescenta por acaso um iota ao respectivo conceito como escritores ? É forçoso responder pela negativa, e por uma série de razões que semelha penoso explicitar.
Se pertencer a um colégio de ditos ‘imortais’ não semelha apropriado ou pertinente para reforçar uma eventual candidatura , o que dizer de um grupo de notáveis escolhidos subjetivamente pela editoria da Folha? Convém frisar que não se contesta este ou aquele nome, mas sim o critério de selecionar por inevitável arbítrio um número determinado e constituí-lo como responsável pela escolha. Esse processo não difere de outros, ritualmente empregados pela mídia, e a seleção dos eventuais premiados estará sempre sujeita a restrições, seja pelo número de eleitores, seja pelo universo da escolha.
( II) Se a literatura não é a competição que parece para alguns, será conseqüência inelutável não atribuir validade objetiva a tais classificações ad hoc. Não se discute a respeito do valor de Machado de Assis e Guimarães Rosa, entre muitos outros. Na própria ironia, eles sorririam dessa tentativa de estabelecer quem é o primeiro e quem é o segundo. Pois além de atentarem para os caprichos da musa, eles não ignoram que se acham sob a jurisdição do deus Cronos. Se há limites na determinação da qualidade literária respectiva, não os haverá na paixão e nas preferências dos anos, das estações e dos séculos. Tudo o mais será nonada.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

A Eleição Americana de 2008 - os Democratas

A Eleição Americana de 2008 - A Campanha
das Primárias no Partido Democrata

A campanha presidencial estadunidense, iniciada em 2007, se assinalou, no que concerne ao Partido Democrata, pelo favoritismo inicial da pré-candidata Hillary Rodham Clinton. Até Iowa, foi havida como a candidata natural dos Democratas tanto pelos republicanos. Assim, Karl Rove, ao despedir-se da Casa Branca de Bush, no seu estilo corrosivo a definiu como candidata inevitável porém com falhas irremediáveis; e tambemo pela maioria dos democratas, conforme refletido pelo apoio então dado pelos chamados superdelegados, como pela própria pré-candidata que não hesitava em empregar fórmulas que presumiam como já definida a sua designação pela Convenção. Entretanto, para a surpresa de muitos, a campanha das primárias se iniciaria em Iowa com a vitória de Barack Obama. A eleição no estado de Iowa foi feita sob a forma de ‘caucus’, um procedimento algo complexo e tipicamente americano em que se computa a vontade majoritária das diversas assembléias populares. Obama soube privilegiar essa fórmula, investindo bastante na preparação da campanha naquele pequeno estado, cuja importância residia na circunstância de ser a primeira primária da estação. Já Hillary, talvez pela hubris de se considerar a candidata virtual, negligenciou em atenção especial ao caucus. Da noite para o dia, caíu do pedestal de grande favorita, entrando a sua candidatura em grave crise. Na disputa pela primária em New Hampshire, apresentada como provável perdedora, Hillary evidenciou espírito de luta e sensibilidade, diante da impiedosa carga da mídia, que aparentemente se deleitava com o seu prematuro tropeço. Assim uma lágrima terá influenciado o eleitor ( e a eleitora) daquele estado, provocando reviravolta na corrida, com a sua já imprevista vitória.
Não creio haja aqui espaço para descrição pormenorizada da campanha primária democrata de 2008. Parecem-me relevantes, no entanto, as seguintes considerações: As primárias democratas de 2008 constituíram o embate mais prolongado e acirrado da história partidária, sem nada comparável em muitos e muitos anos. A ‘candidata natural’ Hillary viu a sua posição contestada pelo também senador Barack H. Obama (Illinois). Características dos dois pré-candidatos. A pré-candidatura de Obama teve a impulsioná-la a oratória, a mensagem de mudança (‘change’), o trânsito junto a juventude, a oposição desde o início à guerra de Bush junior contra o Iraque, e o amplo apoio recebido da comunidade afro-americana. Durante as primárias, após o desaparecimento de todos os demais contendores (com o populista John Edwards por último), houve diversos debates televisados entre Obama e Hillary. Em nenhum deles, nenhum dos dois candidatos pôde alcançar vitória decisiva sobre o outro, mas alguns traços ficaram marcados. A habilidade de Obama em apresentar ‘change’ como mensagem genérica, sem especificações; essa postura foi igualmente empregada quanto a outras questões por Obama, que evitou tratar de aspectos controversos (e potencialmente divisivos). Obama soube valer-se de sua oposição de princípio à guerra no Iraque, colocando a sua contendora em dificuldade na tentativa de explicar o seu voto no Senado favorável à intervenção militar no Iraque. Dentre os aspectos positivos da pré-candidata, Hillary mostrou maior conhecimento de temas econômicos e em termos de plano de saúde, marcou sua diferença com a posição não tão abrangente do Senador por Illinois.
A campanha das primárias. Uma contenda massacrante, estendida pelo desejo de vários estados de antecipar as respectivas eleições, prolongou-se por seis meses, de princípios de janeiro a começos de junho. Por uma série de circunstâncias (apoio maciço da mídia que terá visto em B. Obama um novo John Kennedy, a formação de maioria pró-Obama em delegados simples a partir da chamada Super-Terça – quando se realizaram simultaneamente diversas primárias -, o irresistível ‘repensamento’ em favor do candidato afro-americano de inúmeros dos chamados superdelegados que antes apoiavam Hillary, a crescente pressão sobre Hillary para que desistisse de sua pré-candidatura em função da atmosfera de ‘já ganhou’ incentivada pela mídia às vezes por causa de vitórias de Obama e em outros casos paradoxalmente a despeito de sucessos de Hillary, e last but not least a tenaz resistência da Senadora por New York a uma renúncia antes do final da temporada das primárias) a competição entre os dois pré-candidatos só se encerraria na primeira década de junho, terminadas as primárias, com a declarada ‘suspensão’ de sua campanha em um marcante discurso por Hillary Clinton.
Durante essa memorável campanha primária, a senadora Clinton obveve dezoito milhões de votos (contra um total correspondente de Obama). Hillary venceu nos estados mais populosos: New York, California, Pennsilvania, Texas, Ohio, Virginia, Florida, entre outros. Mostrou ela apoio majoritário junto aos latinos, ao eleitorado operário, às mulheres, aos mais idosos, e também da classe média baixa. Obama, por sua vez, mostrou força junto aos jovens, aos intelectuais, e na comunidade afro-americana. Teve ele o apoio preponderante da mídia, e também da própria direção democrata, refletida na controversa decisão sobre as primárias nos estados da Flórida e Michigan. Os diretórios estaduais as tinham antecipado, ao arrepio das disposições do direção partidária. Hillary venceu na Flórida e no Michigan, mas os delegados respectivos acabaram com apenas meio-voto para a próxima Convenção.
Os opositores de Hillary na imprensa, além dos adversários herdados da Administração Clinton, incluíram algumas mulheres (como a veterana Elizabeth Drew e a colunista Maureen Dowd, esta com um tom assaz viperino), representantes do establishment como o Senador Ted Kennedy e o clan Kennedy, o candidato derrotado em 2004 John Kerry, e o ex-presidente Jimmy Carter, entre outros. Se é natural que as opiniões se dividam, já não é tão natural o tom emocional e a aberta parcialidade em muitos desses juízos acerca da pré-candidata pelo estado de New York. No próximo artigo me ocuparei dos pontos fortes e débeis do candidato Barack Obama, e das perspectivas de uma real composição entre as duas principais forças do Partido Democrata com vistas às eleições presidenciais de novembro vindouro.

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Sarkozy e a demissão do âncora Poivre d’Arvor

A demissão de Patrick Poivre d’Arvor, âncora do principal canal de televisão da França (a TF1) tem uma importância bastante maior de o que teria uma movimentação análoga em outro país. Há 21 anos aparecendo para os franceses no telejornal das 20 horas, Poivre d’Arvor se tornara uma figura emblemática e conhecida do público. O âncora na França tem uma posição mais afirmativa, não sendo, como em muitos outros países, um mero locutor televisivo. Durante a sua permanência na TF1 atravessara oito anos (dos catorze) de Mitterrand, os doze anos de Chirac, e cerca de um ano de Nicolas Sarkozy. Poivre d’Arvor, posto que respeitoso, não tinha postura subserviente diante do pouvoir, expressando mesmo diante dos Presidentes e dos Primeiro-Ministros as opiniões e as dúvidas da grande audiência que representava. Caíu agora, ao que tudo indica, por solicitação expressa de Sarkozy ao dono da TF1, Martin Bouygues. A ingerência do Chefe de Estado na remoção do âncora – algo até hoje inaudito na França – a princípio foi vista com ceticismo pelo próprio PPDA, porque ele não poderia imaginar, segundo teria dito, que o Presidente metesse o seu nariz nesse tipo de coisa. Mutatis mutandis, seria como se um presidente americano solicitasse o afastamento de Walter Cronkite. Como é característica francesa, o affaire não se limita a uma diferença de opiniões. Conforme se veicula, quem assumirá a cadeira de Poivre d’Arvor em setembro (durante os meses do verão boreal na França as férias têm precedência) será a jornalista Laurence Ferrari, que, de acordo com os boatos, já teria se relacionado no passado recente com Nicolas Sarkozy. Tudo isso decerto não há de contribuir para a melhoria das relações da mídia francesa com o atual ocupante do Palácio do Elysée. Ainda a propósito do âncora da TF1, cabe aqui uma nota pessoal. Durante os anos difíceis da minha gestão em Argel, era com prazer que minha esposa e eu acompanhávamos o telejornal das oito, sob a coordenação de Poivre d’Arvor. Profissional discreto, mas não omisso, ele apresentava o noticiário do interesse francês, e não raro entrevistava no curso da transmissão personalidades politicas, do governo e da oposição, incluindo o Primeiro Ministro. Por outro lado, as entrevistas compreendiam igualmente expoentes da cultura e dos negócios, entre outros, ensejando para os telespectadores quadro bastante amplo da sociedade francesa. No onze de setembro de 2001 nos encontrávamos em Paris. Ao ligarmos a televisão do hotel às vinte horas nos coube a surpresa de tomarmos conhecimento do atentado terrorista daquela data, em transmissão sob a direção do sempre objetivo e proficiente Patrick Poivre d’Arvor. Certamente ele fará falta.

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sábado, 14 de junho de 2008

Os Cachorros de Atenas

Mauro M. de Azeredo

Além das ruinas famosas de Atenas, além de suas largas avenidas e dos edifícios e monumentos, sem esquecer as amplas, generosas vistas que do Pireu descortinam ou prometem miríades de ilhas a embelezar as águas do mar Egeu, sem omitir todo o legado de arte, ciência, filosofia e política que de tais paragens é devedor o Ocidente, ouso pedir a sua atenção para diverso aspecto, a que me permito encarecer um momento de benevolência.
Ao caminhar pelas ruas desta cidade, em meio ao tráfego desordenado e a pedestres afobados, bem cedo me daria conta de outra característica que diverge do cenário habitual das metrópoles.
Pelas calçadas, nas aléias das praças, nas faixas pedonais das ruas, nas soleiras de lojas, entre as loquazes mesinhas dos cafés, eu os deparo, a princípio com alguma surpresa e quiçá traços de inquietude. Com o tempo, essa inconsueta presença se vai aos poucos integrando na paisagem, não como elemento estranho, mas feição própria do cenário citadino.
Em geral, não andam em bandos. Se não forem disturbados, não terão decerto conduta anti-social. Ao contrário de outras terras, são respeitosos das convenções locais. Já os vi, a postura talvez temerosa, aguardarem o sinal verde para atravessarem a movimentada rua.
Também diferem de seus congêneres estrangeiros pela relativa corpulência, pela boa apresentação, pela habilidade com que associam desenvoltura e discrição, e pela preferência em circunscrever a respectiva área de atuação.
Assim, se se poderá encontrá-los em cerimônias cívicas, parques públicos, na agorá e em outros terrenos históricos decerto palmilhados por seus distantes antepassados, tampouco estarão ausentes de bairros residenciais, hotéis de cinco estrelas e de estabelecimentos comerciais e bancários. Quanto a restaurantes, sobretudo aqueles turísticos, ali não aparecem tanto, quiçá por não se sentirem tão à vontade.
Permita o ilustre passageiro, cujo olhar paira displicente sobre os logradouros atenienses, que eu lhes apresente essas criaturas, que não têm o dom da fala, mas que sabem comunicar-se seja com transeuntes, seja com moradores ou profissionais. Sem dominar o grego – que, sem dúvida, não é língua fácil – e sem recorrer à mendicância, eles sabem garantir passadio e eventual abrigo na vizinhança.
Senão, vejamos. Em minhas andanças pelas ladeiras de Kolonaki, a Ipanema comercial dessas bandas, já me acostumei a contemplar vitrinas e lojas na companhia respeitosa de nédios vira-latas. Se as cores da pelugem hão de variar entre o pardo escuro e o negro, a maioria não nega a descendência policial, menos pelas maneiras, do que pelo porte.
Neles a coleira não é marca de submissão. Revela apenas que se trata de indivíduo vacinado, por obra e graça do poder municipal. A alimentação ficará a cargo dos moradores do quarteirão, concedida mais em troca de eventuais afinidades do que por serviços ocasionais de segurança.
Por vezes, preferem afastar-se para um banho de sol, que lhes apraz em especial durante as agruras do inverno mediterrâneo. Contudo, muita vez não desdenham tentativa de diálogo com um humano apressado. Levantam a cabeça, o ar inquisitivo, até mesmo em sentido contrário ao seu movimento corporal. Deixam no ar a indagação se, por acaso, a pessoa não desejaria deter-se um instante, quem sabe para trocar impressões.
Outro, que me pareceu mais carente, seguiu-me por longo trecho da calçada, àquela hora já esvaziada pelos draconianos horários comerciais aqui vigentes. Fê-lo, sou forçado a convir, com uma certa fineza, diria mesmo timidez. Não sei se para não importunar-me, ou para não forçar a companhia, guardando a cadência dos passos, alternava a respectiva posição, quer alguns metros à frente ou atrás. O desejo de uma relação menos episódica, ele o traía apenas pelos olhos compridos e modos deferentes.
Para que, por fim, se possa formar noção de quão integrado se acha este contingente da demografia ateniense – se não adotarmos acepção demasiado rígida desse termo – julgo oportuno mencionar-lhes a participação nas comemorações cívicas. A par de acompanharem, com passo estugado, os batalhões das diversas forças bélicas, os cães de Atenas não temem acercar-se do poder estatal e de seus magnos representantes.
Decerto imbuído desse espírito, um deles se aproximou, o ar entre difidente e resoluto, do posto reservado à mais alta expressão do Estado. Se não se atreveu a pisar-lhe o espaço atapetado, resolveu conferir com as alertas narinas o seu esquinado contorno, retirando-se em seguida, sob o olhar curioso dos dignitários presentes, sem nada mais acrescentar à cuidadosa investigação, que, por vezes, a espécie associa a comportamentos complementares.

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