sábado, 11 de outubro de 2008

Prêmio Nobel de Literatura - a Omissão do Brasil

O Prêmio Nobel de Literatura – A continuada Omissão do Brasil

Jean-Marie Gustave le Clézio é o 14º.francês a ser agraciado com o Nobel de Literatura. Em meio à polêmica aberta pelo Secretário e porta-voz da Academia Sueca, Horace Engdahl, com declarações bastante discutíveis sobre a atual literatura estadunidense (que se acharia muito isolada, não haveria suficientes traduções e nem participariam do diálogo de literaturas, constituindo assim, uma ignorância que os limita), a escolha de Le Clézio - que é pouco conhecido no Brasil (apenas três livros aqui editados) - semelha recair em um grande nome. Os livros de Le Clézio trazem aquele traço característico gaulês que é o interesse pelo estrangeiro e pelo agreste, como se vê nos temas versados (desertos, contrastes culturais). Entretanto, o propósito deste artigo não se reporta à seleção de Le Clézio, mas ao invés deseja discutir a exclusão do Brasil do prêmio Nobel em geral e daquele de literatura em particular.
A leitura dos prêmios Nobel de literatura, a princípio, nos indica ser um elenco dispar, em que ilustres desconhecidos e escritores datados aparecem junto de grandes nomes como Sartre (que rejeitou o prêmio), Camus, Thomas Mann, Gunther Grass (apesar de seu ‘esquecimento’ de juventude), Gabriel Garcia Marquez e outros mais.
Qual a razão da omissão de escritores brasileiros, levada em conta a circunstância de que a América Latina está representada, senão pletoricamente, pelo menos conta com os nomes da chilena Gabriela Mistral (1945), do guatemalteco Miguel Angel Asturias (1967), do chileno Pablo Neruda (1971), do colombiano Gabriel Garcia Marquez (1982) e do mexicano Octavio Paz (1990) ?
Com efeito, se o Prêmio Nobel, iniciado em 1901 com Sully Prudhomme, jamais incluíu um brasileiro, cabe perguntar se tal omissão é uma deliberada indicação de juízo negativo da qualidade de nossos escritores (e poetas), ou se é produto de outros fatores. Em verdade, o Prêmio Nobel, que deixou de distinguir escritores notáveis –de que, talvez,a maior omissão seja Marcel Proust - apresenta em sua lista uma série de sombras (sem memória, como as do Hades), e outros nomes digamos intermediários, que não tem o peso literário daqueles preteridos.
Na crônica do Nobel, comentou-se no passado que a não-premiação de Jorge Amado resultara de singular implicância de membro influente da comissão sueca. Decerto, à qualidade dos livros de Amado na sua primeira fase não correspondeu na produção ulterior idêntico nível literário. Não obstante, pelo conjunto de obra, e pela sua difusão mundial, Jorge Amado não terá preenchido os mesmos requisitos ou quiçá mais, do que, v.g., Anatole France (1921) e Miguel Angel Asturias (1967) ? E o que dizer da omissão do grande poeta Carlos Drummond de Andrade, diante das premiações de poetas de língua hispânica como Gabriela Mistral e Pablo Neruda ?
Este esquecimento do Brasil como presença literária – não entrarei aqui nas também gritantes omissões de Cesar Lattes e Dom Hélder Câmara, em outros campos do Nobel – semelha acaso corresponder a um juízo preconceituoso de nossa terra como sem personalidade (o recentemente falecido escritor palestino Edward Said nos considerou um país nondescript ) ? Ou será a conseqüência de uma relativa ausência de nossos escritores na literatura mundial, o que aparentemente não se sustenta pela atenção além fronteiras dispensada a grandes nomes como Machado de Assis, Manuel Bandeira, João Guimarães Rosa e o próprio Carlos Drummond.
Forçoso será reconhecer que à proficiência tristemente demonstrada pelo regime militar para barrar a candidatura de D. Helder Câmara ao Prêmio Nobel da Paz não houve antes ou depois equipolente disposição no sentido de divulgar nomes pátrios junto às ditas instâncias competentes.
Por outro lado, a própria lista do Nobel já representa um melancólico reflexo da postura neo-colonialista e européia do órgão decisório, privilegiando obscuros escritores escandinavos, e muitos e muitos europeus. Em tempos recentes, a comissão tem demonstrado, através de módica distribuição a nomes de países ditos exóticos, uma certa preocupação com vistas a resguardar-se de críticas contra o seu viés pró-Velho Continente.
Como última questão, dada a presente falta de expoentes em nossa literatura, as perspectivas de premiação não se afiguram das mais brilhantes, embora, como consolo, parece oportuno assinalar que a comissão já premiou muitas mediocridades na sua secular história. Por que então não se poderia especular de que venha a Europa curvar-se perante o Brasil mesmo que o seja por autor de grandeza não comparável àqueles que nas palavras de Carlos de Laet entre outras distinções já tiveram a da Morte ?

3 comentários:

Mauro disse...

Na grande Copa dos Prêmios Nobel o Brasil leva de 10 a zero. Que injusto! Juiz ladrão! Era nossa vez de levar o Oscar do revezamento de países exóticos! Por aqui, ninguém reclama da falta de reconhecimento em química, física, medicina, economia (esta sim, merecedora de pelo menos um Nobel de química). Há pouquíssimo a reconhecer, mas isto não nos envergonha. Já em Literatura e Paz, áreas "soft" onde mais vale a torcida do que os fatos, a omissão do País só pode ser um cálculo para nos humilhar... O fato de nunca termos tido um escritor de inserção E qualidade realmente mundiais (ou de nossos heróis e problemas não importarem muito ao mundo) não vem ao caso. Mas por que damos tanta importância a algo fora de nosso controle? Há algo mais profundo do que apenas as proverbiais uvas azedas - há uma mentalidade de que DEVERIA estar sob nosso controle, de que é nosso DIREITO receber o prêmio (esqueceram de pôr na Constituição) - mais ainda se não o "merecemos". Tentar impor a nacionalidade ao invés do reconhecimento do mérito do indivíduo; a inaceitável vergonha de nosso time não ser capaz de ter um nome nessa seleção; o desdém pelo “esquecimento” como incompetente ou como parte de um complô anti-Brasil. Quem sabe quando alguém consiguir explicar em prosa ou verso aos brasileiros como foi que chegamos a este ponto - então teremos um candidato ao Nobel.

Mauro disse...

...conseguir...

Mauro M. de Azeredo disse...

Os comentários de Mauro em muitos aspectos não contradizem a minha postagem, mas a complementam. Cabe, no entanto, sublinhar que a ênfase está no Prêmio de Literatura, porque o comentário se origina da distinção concedida ao escritor francês Le Clézio. Há mais dois pontos que cabe referir:(a)o comentário, a despeito de centrar-se na literatura, menciona igualmente dois prêmios em outros campos a que brasileiros fariam talvez jus, como no caso de Cesar Lattes (física) e no de D.Helder (Paz); b) quando reportei a mudança de atitude do comitê sueco, com premiações a outras regiões, o fiz como exemplo de tokenism do comitê, e obviamente não era minha intenção mendigar dádivas para o Brasil. Com efeito, a concessão do prêmio não é um processo tão mecânimo quanto se desejaria fazer crer, e sendo complexo pressupõe uma atitude menos conformista. Afinal, se mantivermos uma espécie de cargo cult mentality, pode-se prever que nada há de mudar...