Provoca surpresa e consternação a noticia do jornal O Globo de que o governo federal se propõe contratar por R$ 15 milhões agência de relações públicas para promover a imagem do Brasil no exterior.
Existem considerações tanto de ordem conceitual quanto de natureza administrativa que desaconselham fortemente tal iniciativa.
De início, é extremamente discutível que ‘a promoção de imagem’ seja algo que deva ser seriamente considerado. Não devemos esquecer que imagem, seja efeito ótico ou tropo linguístico, corresponde à suposta projeção de uma realidade determinada. Assim, em termos objetivos, para que um país (ou organização, etc.) projete uma boa imagem será imprescindível que a sua realidade interna seja consentânea com que o público externo tende a atribuir em termos de satisfatórias condições internas a países (ou empresas, etc.).
Para limitarmo-nos a países, a sua imagem será a projeção através da mídia e das populações de determinadas informações que pela sua qualidade objetiva tenderão a formar um conceito agregado favorável, neutro ou desfavorável a respeito desses países.
Só a falta de conhecimento pode induzir alguém a acreditar na viabilidade de ‘criação de imagem’. A adulteração ou criação de imagens que não correspondem à realidade – o que não é novidade em termos de governos ditatoriais ou autoritários (vide, a propósito, as chamadas ‘Vilas de Potemkin’, da segunda metade do século XVIII) – nada tem a ver com uma política séria de divulgação de um país determinado.
De resto, os Estados soberanos já dispõem de mecanismos administrativos para atender não à suposta formação de imagem, mas para divulgar dados e fatos acerca da respectiva realidade nacional. Nesse sentido, uma das funções básicas da diplomacia reside na faculdade de representação do país e na defesa de seus interesses.
Verifica-se, portanto, que o Brasil, desde os albores da independência e mesmo antes, possui ministério encarregado das relações exteriores. Pela coerência da política imperial e depois republicana, a diplomacia brasileira tem sido respeitada, dentro e fora das fronteiras, pela qualidade da formação de seus diplomatas e por muitos de seus ministros de estado, com o Barão do Rio Branco à frente.
Através dos tempos, o Itamaraty tem assumido, por encargo presidencial, atribuições que foram no passado de outras pastas. Tenho presente, por exemplo, a assunção, no início dos anos sessenta do século passado, pelo Ministério das Relações Exteriores dos então escritórios comerciais. Várias outras funções, dentro de uma visão lata da representação dos interesses nacionais, tem sido formal ou informalmente assumidas. As características da Casa de Rio Branco – e a sua proficiência - tem sido a causa principal para o incremento de seus encargos.
Se a história ensina que a política externa deve estar a cargo de profissionais, e não é suscetível de conviver com visões dicotômicas, tampouco é o caso de desviar recursos para a contratação de agências de promoção de imagem no exterior. Outros países como os estados ditos fracassados e as democracias adjetivadas estão delas mais necessitados.
sábado, 12 de julho de 2008
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Um comentário:
A promoção de um país no exterior é hoje uma parte indispensável de sua política externa. A chamada diplomacia pública engloba, entre outros aspectos, estratégias de divulgação nas áreas de turismo, promoção comercial, atração de investimentos, difusão cultural, e outros aspectos. Concordo com o articulista que essas estratégias, avulsas ou coordenadas em um esforço centralizado de difusão da “imagem“ (por falta de melhor termo) não devem ser confundidas com esforços de “marketing”, no sentido pejorativo da palavra, destinados a ocultar ou distorcer realidades através da propagação urbi et orbi de uma "imagem" rósea, irreal. A projeção de qualquer país no exterior tem de estar embasada em fatos, e refletir os esforços de sociedades que progridem através de valores democráticos, de forma inclusiva e participativa.
Seria contudo ingênuo pensar que a imagem de um país depende unica ou majoritariamente da percepção ou interesse espontâneos do público, informado pelos meios de comunicação. Ora, a mídia de qualquer país pode distorcer consideravelmente a percepção de um país – e quanto mais distante e culturalmente afastado, maior a distorção. Ainda pior, a mídia pode simplesmente ignorar o que se passa em determinada nação, relegando-a à indiferença ou ao imobilismo em termos de percepção internacional. Vivendo nos EUA no final da década de 90, pude observar como uma sociedade razoavelmente sofisticada e informada pode perpetuar dentro de si imagens distorcidas de outros países. No caso do Brasil, apenas as notícias ruins e os estereótipos de “país tropical” venciam, naquela época, as barreiras das redações de jornal.
A sociedade mundial de hoje está inundada pela informação. O desafio não é mais fazer-se disponível para o leitor, o formador de opinião, o potencial turista ou investidor. O desafio está em atrair e manter seu interesse. Para tanto, os órgãos de governo encarregados das estratégias de divulgação têm de contar com os instrumentos necessários (pessoal qualificado e capacitado, recursos financeiros e tecnológicos).
No caso do Brasil, o Itamaraty pareceria a escolha mais lógica e sensata para coordenar tal esforço, que decerto envolveria várias agências de governo. O projeto de unificar estratégias já existentes sob o chapéu de uma “imagem do Brasil” requereria, contudo, a criação de uma estrutura à parte no Ministério, com orçamento, pessoal e capacidade de decisão para coordenar e harmonizar tudo que hoje é feito por órgãos como Embratur, Apex, BNDES, ABC, DPR e muitos outros.
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