Doris (7)
“ Seu Almir...”
Entretido na leitura do jornal, não notara a presença da jovem.
“ Oi, Doris...”
À sua frente, a face risonha da empregada. Por um átimo, quase sem querer, mergulhou fundo nos largos, amendoados olhos castanhos, que se abriam como janelas, de par em par.
“ Eu queria agradecer ao senhor...”
“ Ora, você não tem nada que agradecer...”
Sem se aperceber, ficou por mais uns instantes a fitá-la.
“ O senhor quer mais alguma coisa de mim ?”
Foi então que se deu conta de que a moça não baixara o olhar. Sobre a mesa, como que esquecida, depusera mão de dedos finos, que se desenhavam no alvo pano da toalha.
“ Almir, você já está aí ?”
A voz de Sonia vinha do corredor.
De pronto, a sua postura se alterou.
“ Doris, vai lá na cozinha buscar o café preto pra dona Sonia.”
Ao dar essa instrução, tocou muito de leve no dorso de sua mão ainda estendida. Entrementes, as vistas se postavam para saudar o ingresso iminente da esposa.
*
Passam os dias. No fim da tarde de sábado, na expectativa da ansiada folga, a jovem ouve calada o que a patroa entende por descanso semanal.
“ Não acho certo que você saia cedo, e nós tenhamos que preparar o café. Afinal, você mora conosco... Que lhe custa então de deixar o café pronto e preparar também um prato único para o almoço, tipo pastelão ?”
Doris preferiu não responder. Limitou-se a balbuciar um ‘dá licença?’ e se meter no quartinho. Nos sábados, seu Almir ia pro clube, e só voltava na hora da janta. Não havia modo de recorrer à sua ajuda, com a outra ali presente.
Uma lágrima correu-lhe pelo rosto. Tudo de caso pensado. Deixara pra falar na última hora, pra que ela não pudesse pedir a ajuda do marido.
Sozinha, acabou no entanto por se decidir. Tinha os direitos dela, e se deixasse a patroa montar, estaria bem arranjada... Na manhã seguinte, sairia cedinho de casa, iria pra praia, lá daria um jeito... Não tinha um tostão sequer, pois o fim do mês demorava a chegar.
Não tinha medo, porém. Levaria debaixo da roupa o maiô de duas peças. Sabia que tava fora de moda... Mas que fazer ? Esse era o seu problema menor.
A única coisa que pegaria do apartamento seria a chave dos fundos. Como é que poderia se virar sem ela ? Não havia maneira... mas entendia muito bem porque a patroa nunca falara de dar pra ela uma duplicada das chaves... Tudo o que pudesse atrapalhar a folga semanal prometida, a outra não deixaria de armar.
A raiva que sentia lhe dava forças pra enfrentar a parada. Até pensou em procurar a morena do elevador... mas nem sabia em que andar trabalhava... Pro futuro trataria de se defender, de se relacionar com gente da sua idade...
De noite, serviu o ajantarado sem dizer palavra. Com semblante sisudo, ia e vinha, atendendo ao que dela se esperava. Almir estranhou e, com o olhar, indagou da mulher o que estava acontecendo. Em resposta, Sonia, com rápido aceno, o tranquiliza. Doris só pode estar emburrada pelas tarefas do domingo.
*
domingo, 28 de fevereiro de 2010
Colcha de Retalhos XXXIX
Reforma da Saúde. Perspectivas
Realizou-se na quinta-feira, 25 de fevereiro, a reunião convocada pelo Presidente Obama, de que participaram o Vice-Presidente Joe Biden, a Speaker Nancy Pelosi, o líder da maioria democrata no Senado,Harry Reid (Nevada), o líder da minoria republicana, Senador Mitch McConnell (Kentucky), o Senador John McCain (R/Ariz.), o Representante John Boehner, líder da minoria republicana na Câmara, assim como Senadores e Deputados democratas e republicanos, com maior presença no debate sobre a Reforma do Plano Geral de Saúde.
Esse encontro se pautou por diálogo em termos cordiais entre as duas bancadas. Em alguns pontos houve convergência de opiniões, mas como exercício de bipartidarismo a reunião de Blair House se manteve conforme o esperado, sem desenvolvimentos imprevistos.
Desejada pelo Presidente como eventual instrumento de construção de acordo bipartidário, o debate decerto não produziu resultados espetaculares, os quais de resto não se afiguravam como prováveis.
Doravante, o único caminho ainda aberto para que uma reforma da saúde seja levada à assinatura presidencial reside na chamada reconciliação fiscal. Tanto o lider da maioria no Senado, Harry Reid, quanto a Speaker Pelosi, na Câmara, estudam meios e modos de implementá-la.
Segundo observou Reid, a despeito dos protestos republicanos, o recurso da reconciliação fiscal já foi usado pelos dois partidos 21 vezes desde l981. A vantagem que oferece é a sua aprovação no Senado pela maioria de 51 votos. Como a designação indica, o instrumento só se aplica a normas com implicações fiscais. Desse modo, as demais disposições seriam aprovadas em projetos de lei separados.
Como sempre, os meios de comunicação especulam sobre as dificuldades políticas para a sua aprovação por Câmara e Senado. Diante da falta de opções, caberá à capacidade de liderança do Presidente Obama, e de seus epígonos no Senado, Harry Reid, e na Câmara, Nancy Pelosi, para que o principal projeto da agenda democrata se transforme em lei.
A Estranha guerra do Coronel Kaddafi
A guerra santa (jihad) proclamada nesta semana pelo Coronel Muammar al-Kaddafi, líder da Líbia, contra a Confederação Helvética há de surpreender pelo motivo invocado. Com efeito, em plebiscito o povo suiço se manifestara de forma maciça pela proibição da construção de minaretes.
Na solene declaração do Coronel Kaddafi “aqueles que destroem as mesquitas de Alá merecem ser atacados pela jihad, e se a Suiça fizesse fronteira com a Líbia nós lutaríamos contra ela.”
Nesse sentido, o líder da chamada Jamahiriya encareceu a todos os muçulmanos que boicotassem os produtos suiços e que barrassem aviões e navios suiços dos aeroportos e portos de seus respectívos países.
Como se sabe, desde incidente em Genebra, com Hannibal Kaddafi, filho de Kaddafi, na Suiça – que foi detido por dois dias por ter dado uma surra em empregados hoteleiros, motivada pela cobrança de contas – e malgrado o abjeto pedido de desculpas do então Presidente helvético, Hans Rudolf Merz – as relações entre os dois países ficaram em suspenso.
As ‘negociações’ entre Berna e Tripoli foram afinal interrompidas, porque a Líbia deteve a dois suiços, acusados de violação de residência. Um deles, asilado na embaixada por dezenove meses, pode enfim deixar o paraíso verde, mas o outro permanece trancafiado em cárcere líbico.
Como a jihad decretada pelo coronel evoluirá é uma pergunta de difícil resposta. Quanto a eventuais repercussões na esfera islâmica, posto que menos provável a sua difusão, os tempos que correm não favorecem prognósticos seguros.
( Fonte: International Herald Tribune)
Realizou-se na quinta-feira, 25 de fevereiro, a reunião convocada pelo Presidente Obama, de que participaram o Vice-Presidente Joe Biden, a Speaker Nancy Pelosi, o líder da maioria democrata no Senado,Harry Reid (Nevada), o líder da minoria republicana, Senador Mitch McConnell (Kentucky), o Senador John McCain (R/Ariz.), o Representante John Boehner, líder da minoria republicana na Câmara, assim como Senadores e Deputados democratas e republicanos, com maior presença no debate sobre a Reforma do Plano Geral de Saúde.
Esse encontro se pautou por diálogo em termos cordiais entre as duas bancadas. Em alguns pontos houve convergência de opiniões, mas como exercício de bipartidarismo a reunião de Blair House se manteve conforme o esperado, sem desenvolvimentos imprevistos.
Desejada pelo Presidente como eventual instrumento de construção de acordo bipartidário, o debate decerto não produziu resultados espetaculares, os quais de resto não se afiguravam como prováveis.
Doravante, o único caminho ainda aberto para que uma reforma da saúde seja levada à assinatura presidencial reside na chamada reconciliação fiscal. Tanto o lider da maioria no Senado, Harry Reid, quanto a Speaker Pelosi, na Câmara, estudam meios e modos de implementá-la.
Segundo observou Reid, a despeito dos protestos republicanos, o recurso da reconciliação fiscal já foi usado pelos dois partidos 21 vezes desde l981. A vantagem que oferece é a sua aprovação no Senado pela maioria de 51 votos. Como a designação indica, o instrumento só se aplica a normas com implicações fiscais. Desse modo, as demais disposições seriam aprovadas em projetos de lei separados.
Como sempre, os meios de comunicação especulam sobre as dificuldades políticas para a sua aprovação por Câmara e Senado. Diante da falta de opções, caberá à capacidade de liderança do Presidente Obama, e de seus epígonos no Senado, Harry Reid, e na Câmara, Nancy Pelosi, para que o principal projeto da agenda democrata se transforme em lei.
A Estranha guerra do Coronel Kaddafi
A guerra santa (jihad) proclamada nesta semana pelo Coronel Muammar al-Kaddafi, líder da Líbia, contra a Confederação Helvética há de surpreender pelo motivo invocado. Com efeito, em plebiscito o povo suiço se manifestara de forma maciça pela proibição da construção de minaretes.
Na solene declaração do Coronel Kaddafi “aqueles que destroem as mesquitas de Alá merecem ser atacados pela jihad, e se a Suiça fizesse fronteira com a Líbia nós lutaríamos contra ela.”
Nesse sentido, o líder da chamada Jamahiriya encareceu a todos os muçulmanos que boicotassem os produtos suiços e que barrassem aviões e navios suiços dos aeroportos e portos de seus respectívos países.
Como se sabe, desde incidente em Genebra, com Hannibal Kaddafi, filho de Kaddafi, na Suiça – que foi detido por dois dias por ter dado uma surra em empregados hoteleiros, motivada pela cobrança de contas – e malgrado o abjeto pedido de desculpas do então Presidente helvético, Hans Rudolf Merz – as relações entre os dois países ficaram em suspenso.
As ‘negociações’ entre Berna e Tripoli foram afinal interrompidas, porque a Líbia deteve a dois suiços, acusados de violação de residência. Um deles, asilado na embaixada por dezenove meses, pode enfim deixar o paraíso verde, mas o outro permanece trancafiado em cárcere líbico.
Como a jihad decretada pelo coronel evoluirá é uma pergunta de difícil resposta. Quanto a eventuais repercussões na esfera islâmica, posto que menos provável a sua difusão, os tempos que correm não favorecem prognósticos seguros.
( Fonte: International Herald Tribune)
sábado, 27 de fevereiro de 2010
Secos e Molhados
Ameaça Inflacionária ?
Medida pelo IGP-M para este fevereiro, a inflação surpreende por retornar a níveis a que desde muito o brasileiro se desacostumara.
Com efeito, o IGP-M deste mês ascende a 1,18%. Dessarte, é a primeira vez desde o aceso da crise financeira internacional, em outubro de 2008, que a inflação supera o rendimento dos principais tipos de investimento.
Para os conservadores DI – que investem em títulos públicos pós-fixados e acompanham a taxa básica de juros Selic – atualmente em 8,75% ao ano – a perda, com o desconto da inflação, está orçada em 0,67% do poder de aquisição do dinheiro empregado.
Já para a caderneta de poupança, a perda de poder aquisitivo será ainda maior: corresponde a 0,69% a diminuição relativa ao poder de compra.
Não é necessário ser especialista em economia e finanças para prever o que acontecerá na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (COPOM). Dada a pressão inflacionária, afigura-se muito provável que a taxa Selic venha a ser aumentada, já na sua próxima reunião, prevista para 16 e 17 de março.
Conquanto não seja possível estimar o percentual do aumento, pode-se sem dúvida garantir que o viés a ser indicado pelos conselheiros estará apontando para o incremento, dadas as características eleitorais do ano de 2010.
As próprias declarações do Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, deixam claro que as taxas podem subir no curto prazo. Segundo ele, a conduta do BC não sofrerá mudanças em função das eleições, e, por conseguinte, o Banco poderá tomar “decisões antipáticas ou impopulares”, vale dizer, alçar a taxa de juros.
O Desafio da Crise Grega
Jacques Attali, antigo auxiliar direto do Presidente François Mitterrand e primeiro Presidente do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimentol, mostra em artigo publicado pelo Herald Tribune que a crise financeira da Grécia pode acelerar uma reforma mais do que necessária na organização da União Europeia.
Os problemas ora enfrentados pela zona do euro – cuja criação data dos anos noventa – não constituem surpresa para as autoridades financeiras europeias. Desde o início, consoante frisa Attali, tornou-se claro que a nova moeda não se sustentaria sem um ministério europeu de finanças, que procedesse à coordenação de políticas tributárias e fiscais para toda a zona do Euro.
Se a queda do Muro deu prioridade à agenda comunitária de ampliação, ao invés da de aprofundamento da união europeia, a situação criada – e a crise grega e dos demais ‘piigs’- enfatiza o despautério de união com banco central e moeda única, mas despojada de ministério de finanças para coordenar as políticas tributárias e fiscais em uma série de estados soberanos.
O desafio criado pela situação falimentar da economia grega – e a possibilidade de reação em cadeia que mimetize, no caso de uma falência nacional declarada, o que aconteceu na economia internacional com a crise financeira decorrente das hipotecas subprime e a falência do Banco Lehman Brothers.
Se a moeda única era a única opção para a Europa dispor de um único mercado, ora torna- se igualmente indispensável a coordenação das políticas tributárias e fiscais, caso se deseje que o Euro possa sobreviver como moeda forte.
Desse modo, como todos os estados partícipes têm muito a perder, já se inicia uma coordenação de facto dessas políticas. E é bastante provável que dessa coordenação se evolua para a institucionalização – um Ministério Europeu das Finanças para complementar o Banco Central Europeu.
Nas palavras de Attali: “ Da Grécia nasceu a Europa. E a crise grega será, enfim, a parteira da plena realização do projeto Europeu.”
É um juízo otimista, posto que realista, das perspectivas existentes. Não foge a nenhum observador, contudo, a possibilidade de involução marcada pelo pessimismo. Se as crises soem manifestar-se a partir dos pontos mais débeis, está no interesse dos participantes a criação de condições tendentes ao fortalecimento da zona do Euro, para que o descalabro não vá atingir a todos indiscriminadamente.
( Fontes: O Globo e International Herald Tribune )
Medida pelo IGP-M para este fevereiro, a inflação surpreende por retornar a níveis a que desde muito o brasileiro se desacostumara.
Com efeito, o IGP-M deste mês ascende a 1,18%. Dessarte, é a primeira vez desde o aceso da crise financeira internacional, em outubro de 2008, que a inflação supera o rendimento dos principais tipos de investimento.
Para os conservadores DI – que investem em títulos públicos pós-fixados e acompanham a taxa básica de juros Selic – atualmente em 8,75% ao ano – a perda, com o desconto da inflação, está orçada em 0,67% do poder de aquisição do dinheiro empregado.
Já para a caderneta de poupança, a perda de poder aquisitivo será ainda maior: corresponde a 0,69% a diminuição relativa ao poder de compra.
Não é necessário ser especialista em economia e finanças para prever o que acontecerá na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (COPOM). Dada a pressão inflacionária, afigura-se muito provável que a taxa Selic venha a ser aumentada, já na sua próxima reunião, prevista para 16 e 17 de março.
Conquanto não seja possível estimar o percentual do aumento, pode-se sem dúvida garantir que o viés a ser indicado pelos conselheiros estará apontando para o incremento, dadas as características eleitorais do ano de 2010.
As próprias declarações do Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, deixam claro que as taxas podem subir no curto prazo. Segundo ele, a conduta do BC não sofrerá mudanças em função das eleições, e, por conseguinte, o Banco poderá tomar “decisões antipáticas ou impopulares”, vale dizer, alçar a taxa de juros.
O Desafio da Crise Grega
Jacques Attali, antigo auxiliar direto do Presidente François Mitterrand e primeiro Presidente do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimentol, mostra em artigo publicado pelo Herald Tribune que a crise financeira da Grécia pode acelerar uma reforma mais do que necessária na organização da União Europeia.
Os problemas ora enfrentados pela zona do euro – cuja criação data dos anos noventa – não constituem surpresa para as autoridades financeiras europeias. Desde o início, consoante frisa Attali, tornou-se claro que a nova moeda não se sustentaria sem um ministério europeu de finanças, que procedesse à coordenação de políticas tributárias e fiscais para toda a zona do Euro.
Se a queda do Muro deu prioridade à agenda comunitária de ampliação, ao invés da de aprofundamento da união europeia, a situação criada – e a crise grega e dos demais ‘piigs’- enfatiza o despautério de união com banco central e moeda única, mas despojada de ministério de finanças para coordenar as políticas tributárias e fiscais em uma série de estados soberanos.
O desafio criado pela situação falimentar da economia grega – e a possibilidade de reação em cadeia que mimetize, no caso de uma falência nacional declarada, o que aconteceu na economia internacional com a crise financeira decorrente das hipotecas subprime e a falência do Banco Lehman Brothers.
Se a moeda única era a única opção para a Europa dispor de um único mercado, ora torna- se igualmente indispensável a coordenação das políticas tributárias e fiscais, caso se deseje que o Euro possa sobreviver como moeda forte.
Desse modo, como todos os estados partícipes têm muito a perder, já se inicia uma coordenação de facto dessas políticas. E é bastante provável que dessa coordenação se evolua para a institucionalização – um Ministério Europeu das Finanças para complementar o Banco Central Europeu.
Nas palavras de Attali: “ Da Grécia nasceu a Europa. E a crise grega será, enfim, a parteira da plena realização do projeto Europeu.”
É um juízo otimista, posto que realista, das perspectivas existentes. Não foge a nenhum observador, contudo, a possibilidade de involução marcada pelo pessimismo. Se as crises soem manifestar-se a partir dos pontos mais débeis, está no interesse dos participantes a criação de condições tendentes ao fortalecimento da zona do Euro, para que o descalabro não vá atingir a todos indiscriminadamente.
( Fontes: O Globo e International Herald Tribune )
CIDADE NUA ( II )
Doris (6)
Sonia acabou dando a notícia para a moça na tarde seguinte. Não buscou ocultar que a coisa lhe estava atravessada. Doris deu de ombros aos maus humores da patroa. Em vez de preocupar-se com o que fosse sobrar pra ela, preferiu pensar no mais importante. Seu Almir não faltara com a palavra. E, por isso, ela já não se sentia tão sozinha naquela casa.
Seria o caso de agradecer ao patrão ? Podia ser bastante jovem e impulsiva, mas sentia que nesse terreno devia andar com cuidado. Havia muitas formas de manifestar gratidão. Em especial, carecia de ser cautelosa... De todas maneiras, não queria afrontar a outra.
Melhor esperar a ocasião certa, quando dissesse a Almir o seu muito obrigada. Tivesse calma, e a hora viria, sem que a dona estivesse por perto para entornar o caldo.
*
“ Você já passou a roupa de cama ?”
“ Sim, senhora.”
“ Então, tire esse avental, que vamos dar uma saída.”
Doris foi ao banheiro, penteou o cabelo, e procurou se ajeitar.
A patroa voltou logo. Levava uma bolsa.
Ao entrarem no elevador, toparam com senhora, acompanhada por jovem morena.
“ Oi, Sonia, há quanto tempo...”
“ É mesmo, Amélia... tudo bem com você?”
“ Tudo bem...”
Enquanto isso, as duas empregadas se espiavam. Essa, deve regular comigo, pensou Doris.
Chegadas ao térreo, as donas se despediram.
Caminhando na rua, ela tinha uma sensação meio esquerda. Parecia que as pessoas na calçada reparassem nela. Por isso, abaixava o olhar, encabulada. E assim, qual bicho do mato se comportava, inda que uma voz lhe repetisse: bobagem, Doris, fica na tua que ninguém está ligando pra ti...
Não vão muito longe, antes que Sonia a pegue pelo braço.
“ É aqui.Vamos entrar.”
Vê loja pequena, mal iluminada, cercada de armários até o teto. Com passo de conhecida, uma vendedora amatronada delas se acerca.
“ Boa tarde, dona Sonia. Uniforme pra moça ?”
“ Sim. Duas mudas. Azul marinho e cinza grafite.”
O corpo delgado e esguio de Doris tende a encurtar a visita. A atendente começa a fazer o embrulho.
“ Dona Sonia, eu também preciso de dois pares de sapato...”
“ Pra quê dois ? Um basta,” retruca, irritada.
“ De que cor ?”, pergunta impassível a caixeira.
“ Azul marinho”, murmura a empregada.
“ Melhor, preto”, disse a patroa.
Ao cabo, ela ainda consegue levar toucado e avental branco com bordado inglês. Os pedidos extra de Doris incomodam a Sonia, menos pelo acréscimo de preço, do que por descabidos ares de vaidade.
*
Sonia acabou dando a notícia para a moça na tarde seguinte. Não buscou ocultar que a coisa lhe estava atravessada. Doris deu de ombros aos maus humores da patroa. Em vez de preocupar-se com o que fosse sobrar pra ela, preferiu pensar no mais importante. Seu Almir não faltara com a palavra. E, por isso, ela já não se sentia tão sozinha naquela casa.
Seria o caso de agradecer ao patrão ? Podia ser bastante jovem e impulsiva, mas sentia que nesse terreno devia andar com cuidado. Havia muitas formas de manifestar gratidão. Em especial, carecia de ser cautelosa... De todas maneiras, não queria afrontar a outra.
Melhor esperar a ocasião certa, quando dissesse a Almir o seu muito obrigada. Tivesse calma, e a hora viria, sem que a dona estivesse por perto para entornar o caldo.
*
“ Você já passou a roupa de cama ?”
“ Sim, senhora.”
“ Então, tire esse avental, que vamos dar uma saída.”
Doris foi ao banheiro, penteou o cabelo, e procurou se ajeitar.
A patroa voltou logo. Levava uma bolsa.
Ao entrarem no elevador, toparam com senhora, acompanhada por jovem morena.
“ Oi, Sonia, há quanto tempo...”
“ É mesmo, Amélia... tudo bem com você?”
“ Tudo bem...”
Enquanto isso, as duas empregadas se espiavam. Essa, deve regular comigo, pensou Doris.
Chegadas ao térreo, as donas se despediram.
Caminhando na rua, ela tinha uma sensação meio esquerda. Parecia que as pessoas na calçada reparassem nela. Por isso, abaixava o olhar, encabulada. E assim, qual bicho do mato se comportava, inda que uma voz lhe repetisse: bobagem, Doris, fica na tua que ninguém está ligando pra ti...
Não vão muito longe, antes que Sonia a pegue pelo braço.
“ É aqui.Vamos entrar.”
Vê loja pequena, mal iluminada, cercada de armários até o teto. Com passo de conhecida, uma vendedora amatronada delas se acerca.
“ Boa tarde, dona Sonia. Uniforme pra moça ?”
“ Sim. Duas mudas. Azul marinho e cinza grafite.”
O corpo delgado e esguio de Doris tende a encurtar a visita. A atendente começa a fazer o embrulho.
“ Dona Sonia, eu também preciso de dois pares de sapato...”
“ Pra quê dois ? Um basta,” retruca, irritada.
“ De que cor ?”, pergunta impassível a caixeira.
“ Azul marinho”, murmura a empregada.
“ Melhor, preto”, disse a patroa.
Ao cabo, ela ainda consegue levar toucado e avental branco com bordado inglês. Os pedidos extra de Doris incomodam a Sonia, menos pelo acréscimo de preço, do que por descabidos ares de vaidade.
*
sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010
CIDADE NUA ( II )
Doris (5)
Almir era pessoa de boa paz. Em geral, dava-se bem com todos. Assim, no trabalho e no edifício, sempre se lembravam dele quando surgiam problemas. Plácido, jeitoso, encontrava com naturalidade tom e palavra certa para destrinchar as questões mais enroladas.
Tampouco os conhecidos ignoravam que a sua bonomia tinha limites. O proverbial bom gênio não significava que, em ocasiões isoladas, não reagisse com vivacidade.
Com efeito, tais episódios, pela sua extrema raridade, podiam surpreender os incautos. Quem o praticasse, guardaria a impressão de que o destempero funcionava como espécie de compensação para a postura costumeira, tranquila, paciente e bem-humorada.
Por isso, Almir sabia contornar os frequentes maus bofes da mulher, fosse pelo silêncio, ou pela omissão. No entanto, naquele lar sem crianças, Sonia não confundia mansuetude com fraqueza. Muitos carnavais já haviam transcorrido para que se fizesse ilusões a respeito do marido.
Pela natureza do assunto, decidiu esperar para quando os dois estivessem na cama. Amiúde, se davam boa noite, e cada um virava para o seu lado. Por vezes, contudo, ele se valia desta hora para convencer a esposa da conveniência de determinadas decisões. Seria talvez a sonolência da consorte que lhe aplainava o caminho na maioria das vezes. Certeza, não tinha, porém a coisa funcionava. E com isso evitava atritos e desgastes desnecessários.
“ Sonia, gostaria de pedir um minutinho ainda da tua atenção...”
“ Será que não dá pra tratar disso amanhã ?...”
“ É coisa simples, a gente resolve num pulo.”
“ O que que é ?”
“ Como está a situação da Doris ?”
“ O quê ?!”
Agitada, a mulher se alçara nos cotovelos. Almir continuou deitado.
“ Temos de regularizar a posição dela...”
“ Ora, faça-me o favor... Você virou acaso inspetor sindical ?”
“ Sonia, temos de ajeitar algumas coisas simples... Sinceramente, espero que você esteja exagerando...”
“ Almir, não se faça de santinho... Sabe quanto gastamos com a mulher que a trouxe aqui ?”
Com a mão, ele fez sinal para que baixasse a voz.
“ Você não me consultou pra nada, e portanto não estou interessado em saber. Quando falo de regularizar a situação da menina, é lógico que não me refiro à carteira assinada, INSS, etc. Isso fica pra depois.”
“ Então, pode me informar o que Sua Excelência tá querendo ?”
“ Pra quê esse sarcasmo, Sonia ? O que ‘cê precisa acertar com ela é o salário, a folga semanal e arranjar um uniforme pra a coitada, né ?”
Entrementes, a mulher se levantara e andava à sua frente, como fera enjaulada.
“ Tou vendo que virou porta-voz da Doris... Não acha isso ridículo ? Isto é papel de dona de casa...”
“ Sonia, não banque a desentendida pra cima de mim. Só tou entrando nisso, porque você se tem recusado a tratar do assunto com ela.”
“ Como ! A coisa é ainda pior que eu imaginava. Você virou advogado dela...”
Lépido, Almir pulou da cama e se pôs à frente de Sonia. Incontinente, colocou as mãos nos seus ombros.
“ Meu bem, não vamos perder tempo com rodeios. Nem quero que toda vizinhança saiba que estamos brigando. Me diga, por favor, quais são as suas ideias com relação ao emprego da Doris.”
Ele, sem altear o tom, a olhava firme nos olhos. Ela, por sua vez, baixando a vista, não tentou desvencilhar-se.
“ Não falei isso antes com Você porque pensei que não era o caso. Tenciono que a Doris trabalhe aqui como uma doméstica ao par. Com casa, comida, roupa lavada e inclusive uniforme.”
“ Ao par ? Que que é isso ?”
“ É um arranjo entre patroa e empregada, que é usado na Europa, e que, creio eu, continua a ser praticado em certas regiões do Brasil.”
“ Minha querida, realmente não acreditando no que tou ouvindo. Ao par ?! Olha, isso pode até ser praticado em certas regiões do Brasil, como você diz, só que tem outro nome e é ilegal ...”
Pela reação desconcertada da esposa, Almir intuíu que Sonia realmente estava convencida de que o sistema era factível e até usual.
“ Você acha que não se pode ter uma empregada nessas condições?”
“ Não tenho a menor dúvida, meu bem. Além disso, insistir nisso é correr um risco enorme de denúncia e complicações com sindicatos, justiça trabalhista...”
“ O que é que se faz, então ?”
“ Amanhã, ‘cê chama a Doris e estipula que ela vai ganhar um salário por mês, com direito a uma folga semanal. E não se esquece de dar duas mudas de uniforme pra ela...”
“ E tudo que se gastou com a Genoveva, isso não conta ?”
“ Não, meu bem, não conta mesmo. E não vale a pena esquentar com isso... E, agora, que tal se a gente fosse dormir ?...”
*
Almir era pessoa de boa paz. Em geral, dava-se bem com todos. Assim, no trabalho e no edifício, sempre se lembravam dele quando surgiam problemas. Plácido, jeitoso, encontrava com naturalidade tom e palavra certa para destrinchar as questões mais enroladas.
Tampouco os conhecidos ignoravam que a sua bonomia tinha limites. O proverbial bom gênio não significava que, em ocasiões isoladas, não reagisse com vivacidade.
Com efeito, tais episódios, pela sua extrema raridade, podiam surpreender os incautos. Quem o praticasse, guardaria a impressão de que o destempero funcionava como espécie de compensação para a postura costumeira, tranquila, paciente e bem-humorada.
Por isso, Almir sabia contornar os frequentes maus bofes da mulher, fosse pelo silêncio, ou pela omissão. No entanto, naquele lar sem crianças, Sonia não confundia mansuetude com fraqueza. Muitos carnavais já haviam transcorrido para que se fizesse ilusões a respeito do marido.
Pela natureza do assunto, decidiu esperar para quando os dois estivessem na cama. Amiúde, se davam boa noite, e cada um virava para o seu lado. Por vezes, contudo, ele se valia desta hora para convencer a esposa da conveniência de determinadas decisões. Seria talvez a sonolência da consorte que lhe aplainava o caminho na maioria das vezes. Certeza, não tinha, porém a coisa funcionava. E com isso evitava atritos e desgastes desnecessários.
“ Sonia, gostaria de pedir um minutinho ainda da tua atenção...”
“ Será que não dá pra tratar disso amanhã ?...”
“ É coisa simples, a gente resolve num pulo.”
“ O que que é ?”
“ Como está a situação da Doris ?”
“ O quê ?!”
Agitada, a mulher se alçara nos cotovelos. Almir continuou deitado.
“ Temos de regularizar a posição dela...”
“ Ora, faça-me o favor... Você virou acaso inspetor sindical ?”
“ Sonia, temos de ajeitar algumas coisas simples... Sinceramente, espero que você esteja exagerando...”
“ Almir, não se faça de santinho... Sabe quanto gastamos com a mulher que a trouxe aqui ?”
Com a mão, ele fez sinal para que baixasse a voz.
“ Você não me consultou pra nada, e portanto não estou interessado em saber. Quando falo de regularizar a situação da menina, é lógico que não me refiro à carteira assinada, INSS, etc. Isso fica pra depois.”
“ Então, pode me informar o que Sua Excelência tá querendo ?”
“ Pra quê esse sarcasmo, Sonia ? O que ‘cê precisa acertar com ela é o salário, a folga semanal e arranjar um uniforme pra a coitada, né ?”
Entrementes, a mulher se levantara e andava à sua frente, como fera enjaulada.
“ Tou vendo que virou porta-voz da Doris... Não acha isso ridículo ? Isto é papel de dona de casa...”
“ Sonia, não banque a desentendida pra cima de mim. Só tou entrando nisso, porque você se tem recusado a tratar do assunto com ela.”
“ Como ! A coisa é ainda pior que eu imaginava. Você virou advogado dela...”
Lépido, Almir pulou da cama e se pôs à frente de Sonia. Incontinente, colocou as mãos nos seus ombros.
“ Meu bem, não vamos perder tempo com rodeios. Nem quero que toda vizinhança saiba que estamos brigando. Me diga, por favor, quais são as suas ideias com relação ao emprego da Doris.”
Ele, sem altear o tom, a olhava firme nos olhos. Ela, por sua vez, baixando a vista, não tentou desvencilhar-se.
“ Não falei isso antes com Você porque pensei que não era o caso. Tenciono que a Doris trabalhe aqui como uma doméstica ao par. Com casa, comida, roupa lavada e inclusive uniforme.”
“ Ao par ? Que que é isso ?”
“ É um arranjo entre patroa e empregada, que é usado na Europa, e que, creio eu, continua a ser praticado em certas regiões do Brasil.”
“ Minha querida, realmente não acreditando no que tou ouvindo. Ao par ?! Olha, isso pode até ser praticado em certas regiões do Brasil, como você diz, só que tem outro nome e é ilegal ...”
Pela reação desconcertada da esposa, Almir intuíu que Sonia realmente estava convencida de que o sistema era factível e até usual.
“ Você acha que não se pode ter uma empregada nessas condições?”
“ Não tenho a menor dúvida, meu bem. Além disso, insistir nisso é correr um risco enorme de denúncia e complicações com sindicatos, justiça trabalhista...”
“ O que é que se faz, então ?”
“ Amanhã, ‘cê chama a Doris e estipula que ela vai ganhar um salário por mês, com direito a uma folga semanal. E não se esquece de dar duas mudas de uniforme pra ela...”
“ E tudo que se gastou com a Genoveva, isso não conta ?”
“ Não, meu bem, não conta mesmo. E não vale a pena esquentar com isso... E, agora, que tal se a gente fosse dormir ?...”
*
Por que Orlando Zapata escolheu a Morte
O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava no lugar errado na hora errada. A homenagem a Fidel Castro faz parte de um ritual de sua geração, por aquilo que o comandante terá significado em hora difícil para a América Latina.
Neste preito havia uma contradição, que o perigo maior da ditadura militar obrigava a relevar. Nem por isso a antinomia deixava de existir. Pois na verdade, se os admiradores do líder da revolução cubana vivessem naquela ilha e buscassem aí realizar os fins a que se propunham nos respectivos países, acabariam em masmorras não diferentes das dos regimes castrenses então imperantes na maior parte do subcontinente.
A seleção natural darwineana não se confina ao reino animal. O tempo, esta ilusão da realidade humana, é o carrasco daqueles que ousam ignorá-lo. Para os que não atentam para a sua impiedosa realidade, está reservado destino cruel, o da morte em vida. Em outras palavras, a crescente e inexorável irrelevância.
Para os que têm a felicidade de viver longe do jugo de um declinante personagem, posto que ainda demasiado atuante, pode parecer apenas espetáculo similar ao das efígies de cera de Madame Tussaud.
Aos distintos visitantes que para lá se abalam para os litúrgicos cumprimentos, a autocracia dispensa especiais atenções. A imagem de Lula, os olhos apertados em reminiscente emoção, diante do símbolo ainda preservado, se afigura mais veraz e eloquente do que muitos discursos.
Diante de tais encenações, surge a figura incômoda de Orlando Zapata.Sua morte antecipada, não foi ele quem a decretou. Vítima da liberdade e da luta contra os tiranos, ele é mais do que um símbolo na própria indômita tenacidade. Para os eternos otimistas da progressão humana, Zapata é um mônito para a triste permanência dos déspotas e ditadores, erva daninha que os séculos ainda não lograram exterminar.
As Parcas quiçá lhes ensombreçam o olhar, não obstante os esforços da medicina. Acaso a eventual presença à sua volta de cultores de passadas ilusões, há de servir-lhes de algum lenitivo ? Pelo sofrimento que os esgares mal dissimulam, semelha pouco provável.
Neste preito havia uma contradição, que o perigo maior da ditadura militar obrigava a relevar. Nem por isso a antinomia deixava de existir. Pois na verdade, se os admiradores do líder da revolução cubana vivessem naquela ilha e buscassem aí realizar os fins a que se propunham nos respectivos países, acabariam em masmorras não diferentes das dos regimes castrenses então imperantes na maior parte do subcontinente.
A seleção natural darwineana não se confina ao reino animal. O tempo, esta ilusão da realidade humana, é o carrasco daqueles que ousam ignorá-lo. Para os que não atentam para a sua impiedosa realidade, está reservado destino cruel, o da morte em vida. Em outras palavras, a crescente e inexorável irrelevância.
Para os que têm a felicidade de viver longe do jugo de um declinante personagem, posto que ainda demasiado atuante, pode parecer apenas espetáculo similar ao das efígies de cera de Madame Tussaud.
Aos distintos visitantes que para lá se abalam para os litúrgicos cumprimentos, a autocracia dispensa especiais atenções. A imagem de Lula, os olhos apertados em reminiscente emoção, diante do símbolo ainda preservado, se afigura mais veraz e eloquente do que muitos discursos.
Diante de tais encenações, surge a figura incômoda de Orlando Zapata.Sua morte antecipada, não foi ele quem a decretou. Vítima da liberdade e da luta contra os tiranos, ele é mais do que um símbolo na própria indômita tenacidade. Para os eternos otimistas da progressão humana, Zapata é um mônito para a triste permanência dos déspotas e ditadores, erva daninha que os séculos ainda não lograram exterminar.
As Parcas quiçá lhes ensombreçam o olhar, não obstante os esforços da medicina. Acaso a eventual presença à sua volta de cultores de passadas ilusões, há de servir-lhes de algum lenitivo ? Pelo sofrimento que os esgares mal dissimulam, semelha pouco provável.
quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010
CIDADE NUA (II)
Doris (4)
Gostava de servir o café da manhã pra seu Almir. Ao contrário da cara fechada da outra, ele sempre dava bom dia pra ela. Quando a patroa não estava, parecia ainda mais simpático, muita vez ensaiando um sorriso.
“ Como é que você vai, Doris ?”
“ Vamo indo, seu doutor...”
Um dia mais para o fim da segunda semana, lá estava ele de novo sozinho... Então, resolveu arriscar.
“ Será que o senhor me dava uma mãozinha ?”
“ Como assim, Doris ?”
“ Já tá chegando o segundo domingo, e dona Sonia não diz nada da minha folga, do salário... Nem uniforme eu tenho, tou com a mesma roupa desque cheguei...”
À medida que escutava as queixas da empregada, o risinho foi desaparecendo. Por um momento, ficou quieto, a testa franzida.
“ A patroa é a minha mulher... Para tratar disso tudo, será melhor falar com ela.”
A princípio, a menina o encarou. Tinha as vistas marejadas de lágrimas.
“ Se ela nunca me responde, com’é que vou falar com ela ?”
Fungando, deu meia volta e saíu apressada da copa.
Surpreso com a reação, Almir hesita. A situação e sobretudo a atitude da moça mexiam com ele. Por isso, num relance, a alcança na área.
Doris chorava. Enternecido, quase sem dar-se conta, lhe envolve os ombros com o braço, e a retém. Na agradável estreiteza do contato, sente retesados os músculos.
Aos poucos, o pranto vai cessando. Sem resistir ao abraço, olhos úmidos o procuram, agradecidos.
Por um tempo, ele ainda a prende. Turbado, não atina de imediato com o motivo.
“Deixa comigo, Doris. Vou me ocupar do teu caso.”
*
Gostava de servir o café da manhã pra seu Almir. Ao contrário da cara fechada da outra, ele sempre dava bom dia pra ela. Quando a patroa não estava, parecia ainda mais simpático, muita vez ensaiando um sorriso.
“ Como é que você vai, Doris ?”
“ Vamo indo, seu doutor...”
Um dia mais para o fim da segunda semana, lá estava ele de novo sozinho... Então, resolveu arriscar.
“ Será que o senhor me dava uma mãozinha ?”
“ Como assim, Doris ?”
“ Já tá chegando o segundo domingo, e dona Sonia não diz nada da minha folga, do salário... Nem uniforme eu tenho, tou com a mesma roupa desque cheguei...”
À medida que escutava as queixas da empregada, o risinho foi desaparecendo. Por um momento, ficou quieto, a testa franzida.
“ A patroa é a minha mulher... Para tratar disso tudo, será melhor falar com ela.”
A princípio, a menina o encarou. Tinha as vistas marejadas de lágrimas.
“ Se ela nunca me responde, com’é que vou falar com ela ?”
Fungando, deu meia volta e saíu apressada da copa.
Surpreso com a reação, Almir hesita. A situação e sobretudo a atitude da moça mexiam com ele. Por isso, num relance, a alcança na área.
Doris chorava. Enternecido, quase sem dar-se conta, lhe envolve os ombros com o braço, e a retém. Na agradável estreiteza do contato, sente retesados os músculos.
Aos poucos, o pranto vai cessando. Sem resistir ao abraço, olhos úmidos o procuram, agradecidos.
Por um tempo, ele ainda a prende. Turbado, não atina de imediato com o motivo.
“Deixa comigo, Doris. Vou me ocupar do teu caso.”
*
Chávez: a Denúncia que Faltava
Na espécie dos ditadores, existem alguns que, embora almejando o poder incontrastado, desejam aparecer com os trajes dos genuínos democratas. Desde muito, a história nos ensina que devemos desconfiar das chamadas democracias adjetivadas, como, v.g., as defuntas democracias populares da Europa oriental.
O caudilho Hugo Chávez Frias se encontra nesta grei. Se para uns tantos o coronel Chávez seria autêntico democrata – valendo-se de aparências e desdenhando a realidade -, constituía motivo de preocupação e certo confrangimento o silêncio da Organização dos Estados Americanos.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), entidade vinculada à OEA, ora divulga relatório de mais de trezentas páginas em que acusa o governo do presidente Hugo Chávez de adotar práticas de países totalitários (limitações à liberdade de expressão e da mídia, criminalização de protestos contra o governo, ainda que pacíficos, manipulação do sistema judiciário e constrangimentos ao funcionamento de qualquer dissidência civil).
A despeito de o que precede, a CIDH ainda rotula a Venezuela, como se democracia fosse 'pela realização de eleições livres e por esforços nas áreas econômicas, social e cultural’.
Apesar dessa identificação do regime chavista com a democracia, é tamanha a série de exceções arroladas à prática democrática, que há de causar estranhável assombro ao observador a manutenção do rótulo democrático.
Se ‘democracia’ não é concessão de última hora para salvar as aparências, vejamos o que segue.
A democracia bolivariana começa por negar a entrada à comissão. Por isso, os sete comissários – entre os quais o brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro – tiveram de recorrer, em segunda mão, a diversas fontes de informação, v.g., Alto Comissariado dos Direitos Humanos das Nações Unidas, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e ONGs de defesa de direitos humanos internacionais e regionais[1].
Em função de suas pesquisas, a comissão se deparou com o uso frequente de expedientes que sufocam a oposição e os direitos humanos básicos da classe política, organizações civis e mesmo cidadãos comuns.
Apesar das amiudadas eleições, há muitos obstáculos para a oposição, que não tem iguais possibilidades de ser eleita (e quando eleita, os cargos conquistados podem ser esvaziados de suas atribuições, por atos discricionários do caudilho).
Outrossim, na democracia chavista há “retaliação, intimidação, desqualificação, exclusão, discriminação no trabalho e até mesmo ataques legais e privação de liberdade” contra cidadãos e organizações contrárias ao governo. O acosso totalitário é uma das caracteristícas do regime chavista, utilizado à mancheias contra os seus eventuais opositores.
Consoante o comissário brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, o principal problema venezuelano é a falta de independência do Judiciário, a par de leis que permitem interpretações demasiado subjetivas.
“ Há dez anos a Venezuela não faz concurso público para juiz e dos 1900 em atividade, 900 são provisórios. A (consequência é) falta de independência e parcialidade dos tribunais em favor do governo.”
Diante da falta de independência dos demais poderes – o legislativo é atualmente um braço do Executivo – e outras características de tiranias (ataques contra jornalistas e defensores de direitos humanos; repressão de protestos; violência no sistema penitenciário e altos níveis de impunidade), a interminável relação de traços totalitários nos leva a perguntar qual o real significado de continuar a chamar-se a Venezuela de democracia.
Será apenas vazia concessão da burocrática OEA à suposta democracia venezuelana, cujos sinais vitais já se afiguram demasiado débeis ?
( Fonte: O Globo )
[1] No ano passado, comissário da ONG Human Rights Watch fora sumariamente expulso pelos esbirros do regime chavista, posto no primeiro avião disponível (destinado a São Paulo).
O caudilho Hugo Chávez Frias se encontra nesta grei. Se para uns tantos o coronel Chávez seria autêntico democrata – valendo-se de aparências e desdenhando a realidade -, constituía motivo de preocupação e certo confrangimento o silêncio da Organização dos Estados Americanos.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), entidade vinculada à OEA, ora divulga relatório de mais de trezentas páginas em que acusa o governo do presidente Hugo Chávez de adotar práticas de países totalitários (limitações à liberdade de expressão e da mídia, criminalização de protestos contra o governo, ainda que pacíficos, manipulação do sistema judiciário e constrangimentos ao funcionamento de qualquer dissidência civil).
A despeito de o que precede, a CIDH ainda rotula a Venezuela, como se democracia fosse 'pela realização de eleições livres e por esforços nas áreas econômicas, social e cultural’.
Apesar dessa identificação do regime chavista com a democracia, é tamanha a série de exceções arroladas à prática democrática, que há de causar estranhável assombro ao observador a manutenção do rótulo democrático.
Se ‘democracia’ não é concessão de última hora para salvar as aparências, vejamos o que segue.
A democracia bolivariana começa por negar a entrada à comissão. Por isso, os sete comissários – entre os quais o brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro – tiveram de recorrer, em segunda mão, a diversas fontes de informação, v.g., Alto Comissariado dos Direitos Humanos das Nações Unidas, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e ONGs de defesa de direitos humanos internacionais e regionais[1].
Em função de suas pesquisas, a comissão se deparou com o uso frequente de expedientes que sufocam a oposição e os direitos humanos básicos da classe política, organizações civis e mesmo cidadãos comuns.
Apesar das amiudadas eleições, há muitos obstáculos para a oposição, que não tem iguais possibilidades de ser eleita (e quando eleita, os cargos conquistados podem ser esvaziados de suas atribuições, por atos discricionários do caudilho).
Outrossim, na democracia chavista há “retaliação, intimidação, desqualificação, exclusão, discriminação no trabalho e até mesmo ataques legais e privação de liberdade” contra cidadãos e organizações contrárias ao governo. O acosso totalitário é uma das caracteristícas do regime chavista, utilizado à mancheias contra os seus eventuais opositores.
Consoante o comissário brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, o principal problema venezuelano é a falta de independência do Judiciário, a par de leis que permitem interpretações demasiado subjetivas.
“ Há dez anos a Venezuela não faz concurso público para juiz e dos 1900 em atividade, 900 são provisórios. A (consequência é) falta de independência e parcialidade dos tribunais em favor do governo.”
Diante da falta de independência dos demais poderes – o legislativo é atualmente um braço do Executivo – e outras características de tiranias (ataques contra jornalistas e defensores de direitos humanos; repressão de protestos; violência no sistema penitenciário e altos níveis de impunidade), a interminável relação de traços totalitários nos leva a perguntar qual o real significado de continuar a chamar-se a Venezuela de democracia.
Será apenas vazia concessão da burocrática OEA à suposta democracia venezuelana, cujos sinais vitais já se afiguram demasiado débeis ?
( Fonte: O Globo )
[1] No ano passado, comissário da ONG Human Rights Watch fora sumariamente expulso pelos esbirros do regime chavista, posto no primeiro avião disponível (destinado a São Paulo).
quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010
CIDADE NUA ( II )
Doris (3)
Embora não tivesse jeito para ensinar, Sonia logo se capacitou que não havia outra saída. Pelos modos e pelas perguntas, viu que teria muito trabalho pela frente.
Tampouco tardou em perceber que não era burra. Além disso, esguia de corpo, a tez clara, aloirada, faria boa impressão se não fosse pela roupa surrada e os longos cabelos malcuidados.
Tais impressões não seriam de molde a tranquilizá-la. Pagara muito bem a Genoveva, para correr o risco de perder num piscar de olhos a empregada sabe-se lá pra quê.
À medida que avançava nas explicações, principiou a dar-se conta das reações e reflexos da moça que pareciam cada vez mais lentos.
“ Que leseira é essa, menina ? Mal comecei a ensinar e você já tá cansada ?”
“ Não é nada disso, patroa...”
Diante do espanto de Sonia, murmurando “ Dá licença”, ela se arriou em cadeira da copa.
“ O que é que está acontecendo ?”
“ Patroa, tou fraca... pudera, não comi nada o dia todo...”
Só me falta que ela desmaie no primeiro dia do emprego, pensou.
“Tou vendo o teu problema...”
Procurou arrastar Doris para perto do fogão, de modo que pudesse acompanhar o que pretendia fazer. Não demorou muito em verificar que a outra não estava em condições de aprender coisa alguma.
Com as sobras do almoço, preparou um pratarraz para a empregada, que o devorou num instante e até pediu mais.
*
Nos primeiros dias, a prioridade de Sonia foi treinar Doris para a rotina diária. Levantar às sete, servir o café da manhã, fazer as camas, limpar o apartamento, preparar o almoço para meio-dia e trinta, lavar os pratos, com o cesto cheio por a roupa na máquina e extendê-la, no dia seguinte passá-la a ferro, servir a janta às sete da noite, e, por fim, uma vez tudo limpo e a mesa posta para o café, cair na cama.
A patroa logo iria observar que ela aprendia depressa. Tanto com os horários, quanto com as coisas mais simples, tipo café da manhã, por a roupa na máquina, etc. acostumou-se rápido.
Para o trabalho de cozinheira, no entanto, estava muito crua. Era arriscado deixá-la sozinha no fogão. Na prática, Sonia tinha de cuidar dos pratos, se não quisesse que a refeição ficasse intragável.
Assim, em chegando ao fim da primeira semana, a sua experiência lhe dizia que a menina se virava bem como arrumadeira. Já na cozinha...
Por seu lado, Doris notou umas duas ou três coisas. A patroa não era de muito papo. Nisso, igual a Genoveva. Se não lhe desse na telha,não respondia às perguntas...
É verdade também que não tinha mãos a medir durante todo o dia, a ponto de jogar-se na cama, bem cedo ainda. Dormia como uma pedra, de tão cansada.
Engraçado, a dona nunca pedia a ela pra comprar lá o que fosse na rua. Nem na feira, a outra queria a sua companhia.
Dia após dia, e ela sempre metida em casa. Até tentara forçar a barra. Se não seria melhor se... Não. As desculpas podiam variar, mas o resultado era sempre o mesmo. Não saía do apartamento.
Havia outro detalhe que a arreliava. Fazia já semana que Genoveva a trouxera. E desde então, por mais caladona que fosse, dona Sonia nunca encontrara tempo para tratar do emprego.
*
Embora não tivesse jeito para ensinar, Sonia logo se capacitou que não havia outra saída. Pelos modos e pelas perguntas, viu que teria muito trabalho pela frente.
Tampouco tardou em perceber que não era burra. Além disso, esguia de corpo, a tez clara, aloirada, faria boa impressão se não fosse pela roupa surrada e os longos cabelos malcuidados.
Tais impressões não seriam de molde a tranquilizá-la. Pagara muito bem a Genoveva, para correr o risco de perder num piscar de olhos a empregada sabe-se lá pra quê.
À medida que avançava nas explicações, principiou a dar-se conta das reações e reflexos da moça que pareciam cada vez mais lentos.
“ Que leseira é essa, menina ? Mal comecei a ensinar e você já tá cansada ?”
“ Não é nada disso, patroa...”
Diante do espanto de Sonia, murmurando “ Dá licença”, ela se arriou em cadeira da copa.
“ O que é que está acontecendo ?”
“ Patroa, tou fraca... pudera, não comi nada o dia todo...”
Só me falta que ela desmaie no primeiro dia do emprego, pensou.
“Tou vendo o teu problema...”
Procurou arrastar Doris para perto do fogão, de modo que pudesse acompanhar o que pretendia fazer. Não demorou muito em verificar que a outra não estava em condições de aprender coisa alguma.
Com as sobras do almoço, preparou um pratarraz para a empregada, que o devorou num instante e até pediu mais.
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Nos primeiros dias, a prioridade de Sonia foi treinar Doris para a rotina diária. Levantar às sete, servir o café da manhã, fazer as camas, limpar o apartamento, preparar o almoço para meio-dia e trinta, lavar os pratos, com o cesto cheio por a roupa na máquina e extendê-la, no dia seguinte passá-la a ferro, servir a janta às sete da noite, e, por fim, uma vez tudo limpo e a mesa posta para o café, cair na cama.
A patroa logo iria observar que ela aprendia depressa. Tanto com os horários, quanto com as coisas mais simples, tipo café da manhã, por a roupa na máquina, etc. acostumou-se rápido.
Para o trabalho de cozinheira, no entanto, estava muito crua. Era arriscado deixá-la sozinha no fogão. Na prática, Sonia tinha de cuidar dos pratos, se não quisesse que a refeição ficasse intragável.
Assim, em chegando ao fim da primeira semana, a sua experiência lhe dizia que a menina se virava bem como arrumadeira. Já na cozinha...
Por seu lado, Doris notou umas duas ou três coisas. A patroa não era de muito papo. Nisso, igual a Genoveva. Se não lhe desse na telha,não respondia às perguntas...
É verdade também que não tinha mãos a medir durante todo o dia, a ponto de jogar-se na cama, bem cedo ainda. Dormia como uma pedra, de tão cansada.
Engraçado, a dona nunca pedia a ela pra comprar lá o que fosse na rua. Nem na feira, a outra queria a sua companhia.
Dia após dia, e ela sempre metida em casa. Até tentara forçar a barra. Se não seria melhor se... Não. As desculpas podiam variar, mas o resultado era sempre o mesmo. Não saía do apartamento.
Havia outro detalhe que a arreliava. Fazia já semana que Genoveva a trouxera. E desde então, por mais caladona que fosse, dona Sonia nunca encontrara tempo para tratar do emprego.
*
O Escândalo do Distrito Federal
Depois da prisão do governador José Roberto Arruda, por sentença do Superior Tribunal de Justiça, o Vice-Governador Paulo Octavio, que exercia a governança interina, resolveu renunciar ao mandato e abandonar a nave do DEM. Politicamente isolado, suspeito – mas sem as notórias provas de vídeo – de participação no escândalo do terceiro mensalão – depois dos do PT e do PSDB - Paulo Octavio renunciou por falta de mínimas condições políticas para permanecer no cargo. Toda a dócil maioria de quem Chico Caruso apropriadamente alcunhou de Tolo Arruda, em súbito assomo de respeito ao decoro, não mais o reconhecia como herdeiro do ‘chefe’, ora em prisão preventiva na Polícia Federal.
Em doze dias, assume um terceiro governador. Este novo interino era o novel presidente da Câmara Legislativa do D.F., Wilson Lima (PR) que entrara no lugar do deputado das meias, Leonardo Prudente (DEM), igualmente flagrado pelas câmeras de Durval Barbosa (delator premiado).
Em entrevista ao Correio Braziliense, quando já calçava os coturnos da governança, fiado nos primeiros acenos de renúncia de Paulo Octavio, Wilson Lima fornece indicação ao eventual de o que se pode esperar deste fiel partidário do governador afastado – e do nume tutelar Joaquim Roriz. O seu currículo é retrato de comovente ascensão, da pobreza do picoleiro ao atual proprietário de império empresarial que reúne construtoras, hotéis e shopping centers na capital federal. Acedera em suceder a Prudente a instâncias de Arruda. Deputado em terceiro mandato, aspira a ser designado ministro do Tribunal de Contas local.
O Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, bem resumiu o significado da renúncia de Paulo Octavio:
“A rigor, não muda nada. O pedido de intervenção federal se fundamenta na falência generalizada das instituições no D.F., que será julgado em março pelo Supremo Tribunal Federal.”
A propósito o colunista Merval Pereira, nos reporta que “todas as indicações são de que o Supremo Tribunal Federal não está com ânimo de decretar a intervenção no Distrito Federal”.
Não é necessário ser nenhum Marco Túlio Cicero para clamar “Até quando abusarás de nossa paciência ?” . O famoso Quousque tandem do Cônsul Cícero se referia ao conspirador Catilina, mas o que nos impede de transpô-lo, cerca de vinte e dois séculos depois, à deplorável situação que vige no Distrito Federal, diante da ‘falência generalizada de suas instituições’, assim definida pela autoridade competente ?
É de esperar-se que o S.T.F. não se renda ao espírito timorato dos que se arreceiam das graves, mas necessárias intervenções. A visão deprimente da atual situação no D.F. – que quadro mais apropriado do que a polícia montada investindo contra os estudantes que se manifestavam pelo respeito da lei – já fornece a justificativa de intervenção para valer nessas cavalariças de Áugeas.
Sob a sombra do poder federal devem ser construídas instituições dignas deste nome. E não esse arremedo de governo, que nada fica a dever, na ética e no nível intelectual, a esquecidos grotões dos ainda sobreviventes do coronelato interiorano.
(Fonte: O Globo )
Em doze dias, assume um terceiro governador. Este novo interino era o novel presidente da Câmara Legislativa do D.F., Wilson Lima (PR) que entrara no lugar do deputado das meias, Leonardo Prudente (DEM), igualmente flagrado pelas câmeras de Durval Barbosa (delator premiado).
Em entrevista ao Correio Braziliense, quando já calçava os coturnos da governança, fiado nos primeiros acenos de renúncia de Paulo Octavio, Wilson Lima fornece indicação ao eventual de o que se pode esperar deste fiel partidário do governador afastado – e do nume tutelar Joaquim Roriz. O seu currículo é retrato de comovente ascensão, da pobreza do picoleiro ao atual proprietário de império empresarial que reúne construtoras, hotéis e shopping centers na capital federal. Acedera em suceder a Prudente a instâncias de Arruda. Deputado em terceiro mandato, aspira a ser designado ministro do Tribunal de Contas local.
O Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, bem resumiu o significado da renúncia de Paulo Octavio:
“A rigor, não muda nada. O pedido de intervenção federal se fundamenta na falência generalizada das instituições no D.F., que será julgado em março pelo Supremo Tribunal Federal.”
A propósito o colunista Merval Pereira, nos reporta que “todas as indicações são de que o Supremo Tribunal Federal não está com ânimo de decretar a intervenção no Distrito Federal”.
Não é necessário ser nenhum Marco Túlio Cicero para clamar “Até quando abusarás de nossa paciência ?” . O famoso Quousque tandem do Cônsul Cícero se referia ao conspirador Catilina, mas o que nos impede de transpô-lo, cerca de vinte e dois séculos depois, à deplorável situação que vige no Distrito Federal, diante da ‘falência generalizada de suas instituições’, assim definida pela autoridade competente ?
É de esperar-se que o S.T.F. não se renda ao espírito timorato dos que se arreceiam das graves, mas necessárias intervenções. A visão deprimente da atual situação no D.F. – que quadro mais apropriado do que a polícia montada investindo contra os estudantes que se manifestavam pelo respeito da lei – já fornece a justificativa de intervenção para valer nessas cavalariças de Áugeas.
Sob a sombra do poder federal devem ser construídas instituições dignas deste nome. E não esse arremedo de governo, que nada fica a dever, na ética e no nível intelectual, a esquecidos grotões dos ainda sobreviventes do coronelato interiorano.
(Fonte: O Globo )
terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
CIDADE NUA ( II )
Doris (2)
Não estranhou o quartinho. Era apertado, mas tinha janela de basculante pra área, cama-patente junto da parede, estante com três tábuas no fundo e um caixotinho, que podia servir de mesinha.
Do lado da área, viu o banheiro e tanque. Pra quem já dormira em barracos cheios de rachas, buracos, o chão de terra, bichos entrando e até ratos nada a reclamar...
Sentada no colchão, pensava na roupa de cama que a dona daria para ela.
Esquisito que não tivesse falado com ela, pra dizer das condições e tal. A Genoveva, que não era de muita conversa, cortara logo o papo, quando perguntou o que devia fazer.
“Não esquenta menina. A seu tempo, a patroa vai te dar as instruções.”
Só isto e mais nada ela disse.
Então, achou melhor esperar.
*
Passam as horas. Bate o cansaço. Recosta, então, a cabeça na trouxa e se espicha no catre. Tenciona descansar só um pouquinho, enquanto a dona não vem...
Mas a correria dos últimos dias, a incerteza da mudança, a longa viagem só com uma xícara de café preto a empurram para sono pesado, que de tão profundo a patroa custa a despertá-la, quando, pela tardinha, afinal aparece.
“ Ó menina, acorda!”
Devagar, ela se senta na borda da cama. Por instantes, confusa, não atina aonde está.
“Hmm, vejo que por fim acordou... Isso é lá hora de dormir ?”
“ Ué, tava cansada, a senhora não veio falar comigo...”
“ Calma, menina, que na minha casa cuido eu do compasso da música.”
Doris a encarou com a expressão vazia de quem não compreendeu.
Então Sonia a pegou pelo braço. Na cozinha, mostrou o lugar das panelas,dos pratos, talheres. Depois, em tom monocórdio, continuou com os mantimentos, temperos, como guardar os alimentos, a manteiga, o queijo, os refrigerantes e bebidas na geladeira...
“ Você está me seguindo, Doris ?”
“ Como, patroa ?”
“ Você tá me entendendo ou não ?”
“ Mais ou menos, patroa.”
“ O que é isso ! Tou te falando em português, ora essa!”
“ É que é muita coisa nova, patroa...”
“ Tou vendo que não entende patavina de cozinha, não é ?”
“ Tou aqui, patroa, pronta pra aprender.”
Sonia suspirou fundo. Depois, a fitou nos olhos.
“ Doris, me diz, o quê que você sabe cozinhar ?”
“ Um pouco, lá eu sei, patroa.”
“ Um pouco ou muito pouco ?”
“ Muito pouco.”
*
Não estranhou o quartinho. Era apertado, mas tinha janela de basculante pra área, cama-patente junto da parede, estante com três tábuas no fundo e um caixotinho, que podia servir de mesinha.
Do lado da área, viu o banheiro e tanque. Pra quem já dormira em barracos cheios de rachas, buracos, o chão de terra, bichos entrando e até ratos nada a reclamar...
Sentada no colchão, pensava na roupa de cama que a dona daria para ela.
Esquisito que não tivesse falado com ela, pra dizer das condições e tal. A Genoveva, que não era de muita conversa, cortara logo o papo, quando perguntou o que devia fazer.
“Não esquenta menina. A seu tempo, a patroa vai te dar as instruções.”
Só isto e mais nada ela disse.
Então, achou melhor esperar.
*
Passam as horas. Bate o cansaço. Recosta, então, a cabeça na trouxa e se espicha no catre. Tenciona descansar só um pouquinho, enquanto a dona não vem...
Mas a correria dos últimos dias, a incerteza da mudança, a longa viagem só com uma xícara de café preto a empurram para sono pesado, que de tão profundo a patroa custa a despertá-la, quando, pela tardinha, afinal aparece.
“ Ó menina, acorda!”
Devagar, ela se senta na borda da cama. Por instantes, confusa, não atina aonde está.
“Hmm, vejo que por fim acordou... Isso é lá hora de dormir ?”
“ Ué, tava cansada, a senhora não veio falar comigo...”
“ Calma, menina, que na minha casa cuido eu do compasso da música.”
Doris a encarou com a expressão vazia de quem não compreendeu.
Então Sonia a pegou pelo braço. Na cozinha, mostrou o lugar das panelas,dos pratos, talheres. Depois, em tom monocórdio, continuou com os mantimentos, temperos, como guardar os alimentos, a manteiga, o queijo, os refrigerantes e bebidas na geladeira...
“ Você está me seguindo, Doris ?”
“ Como, patroa ?”
“ Você tá me entendendo ou não ?”
“ Mais ou menos, patroa.”
“ O que é isso ! Tou te falando em português, ora essa!”
“ É que é muita coisa nova, patroa...”
“ Tou vendo que não entende patavina de cozinha, não é ?”
“ Tou aqui, patroa, pronta pra aprender.”
Sonia suspirou fundo. Depois, a fitou nos olhos.
“ Doris, me diz, o quê que você sabe cozinhar ?”
“ Um pouco, lá eu sei, patroa.”
“ Um pouco ou muito pouco ?”
“ Muito pouco.”
*
Reforma da Saúde: Proposta de Obama
O Presidente Barack Obama apresentou ontem, 22 de fevereiro, por primeira vez, proposta de Projeto de Reforma do Plano Geral de Saúde estadunidense. Depois do tropeço no estado de Massachusetts, em que o Partido Democrata perdeu o sexagésimo voto no Senado, modificaram-se bastante as perspectivas de aprovação da Reforma Sanitária no Congresso Americano.
Atualmente existem dois projetos de lei, aprovados separadamente pela Camara de Representantes e pelo Senado. Antes da inesperada vitória do desconhecido Ron Brown, tratava-se de proceder à Conferência de Conciliação, em que os dois projetos seriam transformados em um, com condições de aprovação pelas duas Câmaras. Agora o horizonte do importante projeto legislativo se ensombreceu, com a real possibilidade de que os republicanos logrem enterrá-lo no Senado, através do recurso a filibuster.
O Presidente Obama resolveu ora fazer o que provavelmente deveria ter realizado antes, vale dizer assumir papel mais dinâmico e presidencial na condução do projeto, que é a principal iniciativa de sua Administração no plano interno.
Apresentou ele em audiência pública projeto que consolida as versões de Senado e Câmara. Como a sua atuação anterior já indicara, Obama pende mais para o projeto do Senado. Segundo os cálculos, a cobertura seria extendida para mais 31 milhões de americanos – que hoje estão a descoberto – o que implicaria em um dispêndio de USS$ 950 bilhões em dez anos, o que é mais do que os US$ 871 bilhões do Senado, mas menos do que os US$ 1.05 trilhão da Câmara. A Administração estima que o plano reduzirá o déficit federal em 100 bilhões de dólares nos próximos dez anos, e cerca de um trilhão na segunda década, através do corte de despesas e do maior controle sobre desperdício e fraude.
Consoante o projeto do Senado, o projeto presidencial não inclui a chamada opção pública (adotada pelo plano da Câmara). De conformidade com o Senado, o projeto de Obama prevê câmaras estaduais de seguro. No entanto, há diferenças relevantes quanto ao projeto do Senado. Elimina-se o privilégio concedido a Nebrasca – arrancado por seu Senador – de que a União pague àquele estado o custo com a expansão do Medicaid. Doravante, de 2014 até 2017, a União absorverá o custo adicional em todos os Estados.
O projeto consolidado também ab-roga regras impopulares, que hoje discriminam contra pacientes com problemas clínicos pré-existentes. E cancela outrossim a determinação do Medicare de que os segurados devem arcar com os custos dos remédios de prescrição médica entre US$2,700 e US$ 6,100, durante cada ano.
Na próxima quinta-feira, haverá uma audiência pública, convocada pelo Presidente, em que Republicanos e Democratas discutirão a matéria, em encontro coberto pelas redes nacionais de televisão. O Presidente conta com a possibilidade de que essa conferência possa desobstruir o caminho para a eventual aprovação do projeto de reforma. Embora a atitude das bancadas republicanas no Senado e na Câmara indiquem a baixa probabilidade de tal dramática mudança, a Casa Branca conta com o chamado efeito bipartidário. Nesse contexto, as últimas pesquisas de opinião creditaram ao Presidente real esforço no sentido de alcançar-se eventual acordo bipartidário, sendo reconhecida pela maioria do eleitorado a postura negativista do partido Republicano, que tem inviabilizado qualquer possibilidade de entendimento nacional no Congresso.
Com a acentuada mudança no Senado, em que os democratas não mais dispõem da super-maioria dos sessenta votos, e as diferenças existentes entre as bancadas democratas em Câmara e Senado – nenhuma delas até o presente avalizou a proposta do Presidente -, as perspectivas de êxito da iniciativa de Barack Obama não são brilhantes. Não obstante, a passagem da reforma sanitária não possa ser excluída, até mesmo pelo procedimento radical da chamada reconciliação fiscal – aprovação por maioria simples no Senado e na Câmara de um projeto redimensionado da aludida reforma – como admitido pela própria Casa Branca.
Obama extende aos republicanos o ramo de oliveira de uma discussão franca de um projeto de interesse nacional. Se o G.O.P. persistir na linha de confrontação – quanto pior, melhor – o fará incorrendo no risco de ser carimbado pela opinião pública como favorecendo interesses de facção, em detrimento de um genuino entendimento nacional.
( Fonte: International Herald Tribune )
Atualmente existem dois projetos de lei, aprovados separadamente pela Camara de Representantes e pelo Senado. Antes da inesperada vitória do desconhecido Ron Brown, tratava-se de proceder à Conferência de Conciliação, em que os dois projetos seriam transformados em um, com condições de aprovação pelas duas Câmaras. Agora o horizonte do importante projeto legislativo se ensombreceu, com a real possibilidade de que os republicanos logrem enterrá-lo no Senado, através do recurso a filibuster.
O Presidente Obama resolveu ora fazer o que provavelmente deveria ter realizado antes, vale dizer assumir papel mais dinâmico e presidencial na condução do projeto, que é a principal iniciativa de sua Administração no plano interno.
Apresentou ele em audiência pública projeto que consolida as versões de Senado e Câmara. Como a sua atuação anterior já indicara, Obama pende mais para o projeto do Senado. Segundo os cálculos, a cobertura seria extendida para mais 31 milhões de americanos – que hoje estão a descoberto – o que implicaria em um dispêndio de USS$ 950 bilhões em dez anos, o que é mais do que os US$ 871 bilhões do Senado, mas menos do que os US$ 1.05 trilhão da Câmara. A Administração estima que o plano reduzirá o déficit federal em 100 bilhões de dólares nos próximos dez anos, e cerca de um trilhão na segunda década, através do corte de despesas e do maior controle sobre desperdício e fraude.
Consoante o projeto do Senado, o projeto presidencial não inclui a chamada opção pública (adotada pelo plano da Câmara). De conformidade com o Senado, o projeto de Obama prevê câmaras estaduais de seguro. No entanto, há diferenças relevantes quanto ao projeto do Senado. Elimina-se o privilégio concedido a Nebrasca – arrancado por seu Senador – de que a União pague àquele estado o custo com a expansão do Medicaid. Doravante, de 2014 até 2017, a União absorverá o custo adicional em todos os Estados.
O projeto consolidado também ab-roga regras impopulares, que hoje discriminam contra pacientes com problemas clínicos pré-existentes. E cancela outrossim a determinação do Medicare de que os segurados devem arcar com os custos dos remédios de prescrição médica entre US$2,700 e US$ 6,100, durante cada ano.
Na próxima quinta-feira, haverá uma audiência pública, convocada pelo Presidente, em que Republicanos e Democratas discutirão a matéria, em encontro coberto pelas redes nacionais de televisão. O Presidente conta com a possibilidade de que essa conferência possa desobstruir o caminho para a eventual aprovação do projeto de reforma. Embora a atitude das bancadas republicanas no Senado e na Câmara indiquem a baixa probabilidade de tal dramática mudança, a Casa Branca conta com o chamado efeito bipartidário. Nesse contexto, as últimas pesquisas de opinião creditaram ao Presidente real esforço no sentido de alcançar-se eventual acordo bipartidário, sendo reconhecida pela maioria do eleitorado a postura negativista do partido Republicano, que tem inviabilizado qualquer possibilidade de entendimento nacional no Congresso.
Com a acentuada mudança no Senado, em que os democratas não mais dispõem da super-maioria dos sessenta votos, e as diferenças existentes entre as bancadas democratas em Câmara e Senado – nenhuma delas até o presente avalizou a proposta do Presidente -, as perspectivas de êxito da iniciativa de Barack Obama não são brilhantes. Não obstante, a passagem da reforma sanitária não possa ser excluída, até mesmo pelo procedimento radical da chamada reconciliação fiscal – aprovação por maioria simples no Senado e na Câmara de um projeto redimensionado da aludida reforma – como admitido pela própria Casa Branca.
Obama extende aos republicanos o ramo de oliveira de uma discussão franca de um projeto de interesse nacional. Se o G.O.P. persistir na linha de confrontação – quanto pior, melhor – o fará incorrendo no risco de ser carimbado pela opinião pública como favorecendo interesses de facção, em detrimento de um genuino entendimento nacional.
( Fonte: International Herald Tribune )
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010
O Embuste do Novo Metrô
Depois da inauguração da estação General Osório, em Ipanema, feita com a fanfarra das grandes ocasiões – com direito à presença do Presidente Lula – e a simultânea ‘inauguração’ da linha 1A , com ligação da Pavuna a Botafogo, cercou o metrô carioca atmosfera de otimismo.
Afinal, a gente da baixada teria um acesso mais pronto ao centro e à zona sul. No entanto, bem cedo se verificou que a realidade era bem diferente.
O metrô, ao invés de ficar mais confortável e rápido, tornou-se verdadeiro transporte de terceiro mundo, com ar condicionado deficiente, transporte lento, carros superlotados e geral e completo desconforto.
O atropelo no embarque, os longos intervalos entre as composições, o excessivo calor dentro dos vagões atopetados de gente, só poderiam provocar cenas lamentáveis de mal-estar e desmaios, nos carros lotados.
Não se fale de respeito pelo idoso, por pessoas com deficiências, pelas mulheres grávidas que num verdadeiro vale-tudo uma turba de impetuosos jovens cuidava de ocupar os lugares, em acintoso desrespeito a qualquer regra seja de mínima educação ou sequer de atenção às disposições dos assentos.
A concessionária, a par de não haver providenciado vagões condizentes para o serviço, tampouco se dá ao trabalho de assegurar a existência de condições de respeito ao usuário, através de um corpo de fiscais dignos desse nome. O que temos atualmente é a enorme deterioração do atendimento à população, que é decorrente da falta do poder estatal (Governo do Estado) de assegurar condições mínimas nas linhas e nos equipamentos, para que o transporte de massa não seja assemelhado a vagões de carga animal.
Com efeito, o Governador Sergio Cabral, com estranha liberalidade estendeu a concessão à Metrô Rio para mais vinte anos. Sem embargo, a concessionária não construiu a nova Estação da Cruz Vermelha, nem realizou a conexão entre as linhas um e dois na Estação da Carioca, preferindo fazê-lo na da Central do Brasil.
A par do trabalho do Deputado Alessandro Molon, o Ministério Público entrou na questão. Em função da citada superlotação, a mais de problemas de sinalização e riscos de acidente, o promotor Carlos Andresano Moreira, da 3ª Promotoria de Justiça e Defesa do Consumidor, apresentou ação civil pública, com pedido de liminar, para que o antigo sistema seja restabelecido até que haja condições adequadas de operação.
Para o Ministério Público, a conexão direta entre Pavuna e Botafogo só poderá funcionar com a conclusão das obras da estação Cidade Nova, a implementação de sistema automático de sinalização, a chegada dos 114 trens encomendados pela concessionária Metrô Rio – com entrega prevista para 2011 – e o restabelecimento do intervalo de quatro minutos entre os trens.
( Fonte: O Globo)
Afinal, a gente da baixada teria um acesso mais pronto ao centro e à zona sul. No entanto, bem cedo se verificou que a realidade era bem diferente.
O metrô, ao invés de ficar mais confortável e rápido, tornou-se verdadeiro transporte de terceiro mundo, com ar condicionado deficiente, transporte lento, carros superlotados e geral e completo desconforto.
O atropelo no embarque, os longos intervalos entre as composições, o excessivo calor dentro dos vagões atopetados de gente, só poderiam provocar cenas lamentáveis de mal-estar e desmaios, nos carros lotados.
Não se fale de respeito pelo idoso, por pessoas com deficiências, pelas mulheres grávidas que num verdadeiro vale-tudo uma turba de impetuosos jovens cuidava de ocupar os lugares, em acintoso desrespeito a qualquer regra seja de mínima educação ou sequer de atenção às disposições dos assentos.
A concessionária, a par de não haver providenciado vagões condizentes para o serviço, tampouco se dá ao trabalho de assegurar a existência de condições de respeito ao usuário, através de um corpo de fiscais dignos desse nome. O que temos atualmente é a enorme deterioração do atendimento à população, que é decorrente da falta do poder estatal (Governo do Estado) de assegurar condições mínimas nas linhas e nos equipamentos, para que o transporte de massa não seja assemelhado a vagões de carga animal.
Com efeito, o Governador Sergio Cabral, com estranha liberalidade estendeu a concessão à Metrô Rio para mais vinte anos. Sem embargo, a concessionária não construiu a nova Estação da Cruz Vermelha, nem realizou a conexão entre as linhas um e dois na Estação da Carioca, preferindo fazê-lo na da Central do Brasil.
A par do trabalho do Deputado Alessandro Molon, o Ministério Público entrou na questão. Em função da citada superlotação, a mais de problemas de sinalização e riscos de acidente, o promotor Carlos Andresano Moreira, da 3ª Promotoria de Justiça e Defesa do Consumidor, apresentou ação civil pública, com pedido de liminar, para que o antigo sistema seja restabelecido até que haja condições adequadas de operação.
Para o Ministério Público, a conexão direta entre Pavuna e Botafogo só poderá funcionar com a conclusão das obras da estação Cidade Nova, a implementação de sistema automático de sinalização, a chegada dos 114 trens encomendados pela concessionária Metrô Rio – com entrega prevista para 2011 – e o restabelecimento do intervalo de quatro minutos entre os trens.
( Fonte: O Globo)
CIDADE NUA (II)
Doris ( 1 )
Sonia parecia nervosa. Não parava quieta. Por duas vezes, falou pelo interfone com o porteiro.
“Pode-se saber o que está acontecendo ?”, perguntou Almir.
“Nada de importante !”, respondeu, com o jeito ríspido habitual.
Lentamente, passam os minutos.
De novo, ela se levanta do poltrona e vai para a cozinha. Em seguida, ele ouve a mulher abrir a porta de serviço para, instantes depois, fechá-la com força. Não demora muito e está no interfone outra vez. Tenta entender o que diz, mas não consegue.
Volta de lá com o semblante carregado de costume. Almir hesita, mas afinal resolve insistir.
“Você podia me dizer quem ‘cê tá esperando ?”
Por um átimo, ela o encarou. Temeu que gritasse, como era seu vezo, quando algo a incomodava. Para seu alívio, no entanto, a cena não ocorreu.
Sentada na poltrona, baixou a fronte, enquanto de leve a massageava com dedos da mão direita.
“ Me deixa em paz !”
Dito como se fora ordem, ele prefere não contrariar.
Folheia o jornal. As páginas não trazem nada de interesse. Com um bocejo, espia o relógio. Ainda não é hora de sair para o turno da tarde.
*
Acordou com o barulho da chamada.
Olha em torno, mas não encontra a mulher. Ao dar-se conta da hora, tratou de pegar logo o casaco.
Sai meio afobado para o trabalho. Da porta da frente, dá um tchau para Sonia. Embora não tenha resposta, fica com a impressão de haver escutado a sua voz.
*
“ Dona Sonia ? Aquelas duas pessoas chegaram... Podem subir?”
“ Tá bem.”
Ansiosa, teve ganas de fumar um cigarro. Já ia pegar da carteira, quando mudou de ideia. Melhor resolver o assunto primeiro. Depois, teria todo o tempo.
*
“ Você é a Genoveva ?”
Mulata atarracada, com ares de cinquentona, pensou. A seu lado, jovem magricela, mais alta. Sobraçava uma trouxa.
“ Sim... e a senhora, dona Sonia ?”
“ Exatamente.”
Por um instante as duas se entreolharam.
“ Que acha da menina esperar no quartinho, enquanto a gente acerta?”
Genoveva assentiu, e com leve meneio fez a acompanhante obedecer.
“ Aceita um cafezinho ?”
As duas foram para a copa. Havia um sorriso nos lábios da patroa, mas a outra continuou séria.
Em silêncio, deixou a dona servir.
“ Açúcar ou adoçante ?”
“ Açúcar, duas colheres.”
Sem dizer palavra, devagar, elas tomaram.
“Sabe de uma coisa, Genoveva... Não quis falar no telefone, mas achei um pouco caro.”
“ Não seja por isso dona Sonia... A gente dá o dito por não dito, e é isso aí.”
“ Então pra você não tem discussão ? É pegar ou largar.”
Sobreveio uma pausa. Sonia parecia inquieta.
Ao contrário da mulata, que permanecia impassível.
“ Como é que ficamos ?”
Por segunda vez, a mulher a encarou.
“ Pelo visto, dona, não ficamos.”
“ ‘Pera um minuto !”, disse Sonia, alçando a voz. “ Será que afinal não dá pra conversar ?!”
A face de Genoveva se contraíu, à maneira de quem busca controlar a irritação.
“ Tou vendo, dona, que a gente tá perdendo tempo... Vejo também que a senhora não tá querendo pagar o combinado...”
“ Calma aí... não vamo brigar por bobagem...”
As vistas apertadas da outra a esquadrinharam, por um momento.
“ A senhora paga ou não paga o combinado ? Será que não dá pra entender que eu não tou aqui pra regatear preço ?”
Sonia respirou fundo. Não gostava de ser contrariada. A mulata, porém, não estava a fim de ceder, e ela temia entornar o caldo, se insistisse demasiado.
“Tá bem! tá bem ! Você ganhou: vou buscar os cobres.”
Foi irritada, mas voltaria com um sorrisinho.
Recebendo o envelope, Genoveva contou o dinheiro, nota por nota.
Conferida a paga, estendeu-lhe a mão.
“Negócio fechado.”
E sem sequer um olhar para a moça saíu pela porta afora.
*
Sonia parecia nervosa. Não parava quieta. Por duas vezes, falou pelo interfone com o porteiro.
“Pode-se saber o que está acontecendo ?”, perguntou Almir.
“Nada de importante !”, respondeu, com o jeito ríspido habitual.
Lentamente, passam os minutos.
De novo, ela se levanta do poltrona e vai para a cozinha. Em seguida, ele ouve a mulher abrir a porta de serviço para, instantes depois, fechá-la com força. Não demora muito e está no interfone outra vez. Tenta entender o que diz, mas não consegue.
Volta de lá com o semblante carregado de costume. Almir hesita, mas afinal resolve insistir.
“Você podia me dizer quem ‘cê tá esperando ?”
Por um átimo, ela o encarou. Temeu que gritasse, como era seu vezo, quando algo a incomodava. Para seu alívio, no entanto, a cena não ocorreu.
Sentada na poltrona, baixou a fronte, enquanto de leve a massageava com dedos da mão direita.
“ Me deixa em paz !”
Dito como se fora ordem, ele prefere não contrariar.
Folheia o jornal. As páginas não trazem nada de interesse. Com um bocejo, espia o relógio. Ainda não é hora de sair para o turno da tarde.
*
Acordou com o barulho da chamada.
Olha em torno, mas não encontra a mulher. Ao dar-se conta da hora, tratou de pegar logo o casaco.
Sai meio afobado para o trabalho. Da porta da frente, dá um tchau para Sonia. Embora não tenha resposta, fica com a impressão de haver escutado a sua voz.
*
“ Dona Sonia ? Aquelas duas pessoas chegaram... Podem subir?”
“ Tá bem.”
Ansiosa, teve ganas de fumar um cigarro. Já ia pegar da carteira, quando mudou de ideia. Melhor resolver o assunto primeiro. Depois, teria todo o tempo.
*
“ Você é a Genoveva ?”
Mulata atarracada, com ares de cinquentona, pensou. A seu lado, jovem magricela, mais alta. Sobraçava uma trouxa.
“ Sim... e a senhora, dona Sonia ?”
“ Exatamente.”
Por um instante as duas se entreolharam.
“ Que acha da menina esperar no quartinho, enquanto a gente acerta?”
Genoveva assentiu, e com leve meneio fez a acompanhante obedecer.
“ Aceita um cafezinho ?”
As duas foram para a copa. Havia um sorriso nos lábios da patroa, mas a outra continuou séria.
Em silêncio, deixou a dona servir.
“ Açúcar ou adoçante ?”
“ Açúcar, duas colheres.”
Sem dizer palavra, devagar, elas tomaram.
“Sabe de uma coisa, Genoveva... Não quis falar no telefone, mas achei um pouco caro.”
“ Não seja por isso dona Sonia... A gente dá o dito por não dito, e é isso aí.”
“ Então pra você não tem discussão ? É pegar ou largar.”
Sobreveio uma pausa. Sonia parecia inquieta.
Ao contrário da mulata, que permanecia impassível.
“ Como é que ficamos ?”
Por segunda vez, a mulher a encarou.
“ Pelo visto, dona, não ficamos.”
“ ‘Pera um minuto !”, disse Sonia, alçando a voz. “ Será que afinal não dá pra conversar ?!”
A face de Genoveva se contraíu, à maneira de quem busca controlar a irritação.
“ Tou vendo, dona, que a gente tá perdendo tempo... Vejo também que a senhora não tá querendo pagar o combinado...”
“ Calma aí... não vamo brigar por bobagem...”
As vistas apertadas da outra a esquadrinharam, por um momento.
“ A senhora paga ou não paga o combinado ? Será que não dá pra entender que eu não tou aqui pra regatear preço ?”
Sonia respirou fundo. Não gostava de ser contrariada. A mulata, porém, não estava a fim de ceder, e ela temia entornar o caldo, se insistisse demasiado.
“Tá bem! tá bem ! Você ganhou: vou buscar os cobres.”
Foi irritada, mas voltaria com um sorrisinho.
Recebendo o envelope, Genoveva contou o dinheiro, nota por nota.
Conferida a paga, estendeu-lhe a mão.
“Negócio fechado.”
E sem sequer um olhar para a moça saíu pela porta afora.
*
domingo, 21 de fevereiro de 2010
Colcha de Retalhos XXXVIII
A luta de Yulia V. Timoshenko
Candidata à Presidente da Ucrânia nas eleições de sete de fevereiro corrente, Yulia V. Timoshenko, terá sido derrotada por Viktor F. Yanukovich, líder do partido das Regiões, por uma diferença de apenas 3,5 pontos percentuais.
Como se sabe, em função da chamada revolução laranja, Yanukovich fora forçado em 2004 a renunciar à presidência, sob suspeita de fraude eleitoral generalizada.
Desta feita, apesar de instada a fazê-lo, a candidata nacionalista Yulia Timoshenko se recusou a conceder a vitória ao rival Yanukovich (considerado pró-russo). Os observadores internacionais presentes aos comícios julgaram-nos livres, e genuino seu resultado. Nesse sentido, diversos líderes – entre os quais Obama – já cumprimentaram Yanukovich.
Timoshenko entrou com ação junto à Corte Administrativa Superior, em que apela contra o resultado, alegando fraude eleitoral em larga escala. A Corte fez saber que decidirá sobre a apelação a 25 de fevereiro, justamente na data prevista para a posse de Yanukovich (que será, portanto, adiada).
Solicitada por Yanukovich a renunciar ao cargo de Primeiro Ministro, Yulia Timoshenko igualmente se negou. Entrementes, se inicia luta política entre as duas coalizões. Assim, o partido de Yanukovich procura novas alianças, para reunir os votos necessários (226 sufrágios em um parlamento de 450 membros) a um voto de desconfiança no gabinete da Sra. Timoshenko.
Por sua vez, a nacionalista – que passou a mostrar penteado com trança camponesa como sinal de sua opção patriótica, após a revolução laranja – Yulia se empenha em combate tanto judicial, quanto parlamentar, em que, ao contestar o triunfo do adversário, busca enfraquecer a aliança contrária e se preparar para um eventual novo turno eleitoral.
O gosto japonês por espécies ameaçadas
Segundo se veicula, o Japão não pretende participar de nenhum acordo internacional que vise a banir o comércio do atum azul (bluefin tuna) do Atlântico. É notório que a pesca industrial de explotação desta espécie causará a sua breve extinção.
Nesse contexto, se inserem os esforços das Nações Unidas para tentar preservar o que resta dos anteriores profusos cardumes do prelibado peixe.
O negociador japonês, Masanori Miyahara, se recusa a participar do entendimento: “É uma pena, mas é uma questão de princípio.”
Segundo o senhor Miyahara, essa espécie de atum seria da competência da Comissão Internacional para a Conservação do Atum Atlântico, e não da Convenção das Nações Unidas do Comércio em Espécies ameaçadas da Fauna e da Flora Selvagens (Cites).
Obviamente, com isso a importação para as mesas dos consumidores japoneses prosseguirá, até presumivelmente a extinção de mais esta espécie marinha.
Essa postura que ignora os deletérios efeitos dessa pesca industrial nada tem de original, no que concerne aos japoneses. A atitude do senhor Miyahara é apenas mais outra decorrência das preferências dos consumidores do Império do Sol Nascente.
Conquanto a situação das baleias tenha sido melhorada, pelo embargo internacional à caça predatória deste mamífero marinho, os japoneses ainda se escudam em uma quota científica para suposta pesquisa de trezentas baleias por ano.
O empenho nipônico na matéria – que acoberta o especial gosto da população pelo consumo dessa carne – pode ser sentido nos embates entre os mastodônticos navios de caça do Japão e as corajosas, mas pequenas, embarcações do Greenpeace, na sua altruista batalha em prol das longínquas parentes da tão malfalada Moby Dick.
O Calvário da Grécia
O ingresso da República Helênica no privilegiado clube do euro foi conseguido menos pela robustez econômica da economia grega, do que pela sua proverbial habilidade mercantil e financeira. Ao abandonar a histórica moeda dracma, a Grécia perseguia uma ilusão consumista, que, após alguns anos de uma existência que antes chamaríamos de viver à tripa forra, vem agora bater à porta dos responsáveis de turno pela administração grega, no caso os socialistas.
Com a explosão do déficit helênico muito além dos três por cento supostamente aplicados pela União Europeia, e a notória situação extrema de Atenas no grupo dos chamados Piigs – acrônimo dos paises mais endividados da U.E. (Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha) – um diretório europeu, liderado por Alemanha e França, deram prazo para que o governo grego lograsse aquilo que jamais antes fora conseguido.
Em outras palavras, sanear a economia, reduzindo a dívida a totais aceitáveis em termos comunitários.
Não tendo outra opção, o gabinete Papandreou se propõe apertar o cinto, o que significa reduzir o deficit de 12,7% para 3% em 2012, consoante a exigência da U.E. Assinale-se que atualmente as reservas gregas são de sete bilhões de euros, e a divida de... 300 bilhões.
No regime de desperdício que caracteriza a U.E. – basta ver o número de comissários sob a presidência do português José Manuel Barroso – e os gordos subsídios antes fornecidos por Bruxelas, cuja obtenção era bastante facilitada pela falta de controle de parte da autoridade comunitária, basta um exemplo entre muitos, a esse respeito.
Agora, Bruxelas exige devolução de 375 mil euros de associação de produtores de azeite da Ilha de Creta. Conforme noticiado, a associação mentiu tanto sobre o número de oliveiras plantadas, que se faria necessária uma linha de 144 km de Creta à ilha de Santorini para fornecer o espaço indispensável ao suposto plantio.
É evidente a responsabilidade dos cidadãos e da autoridade helênica. Mas muitos de tais abusos e farsescos contos do vigário só são críveis defronte da espantosa incompetência, negligência e eventual cumplicidade daqueles que deveriam zelar pelos fundos comunitários e sua apropriada aplicação.
(Fontes: International Herald Tribune e O Globo)
Candidata à Presidente da Ucrânia nas eleições de sete de fevereiro corrente, Yulia V. Timoshenko, terá sido derrotada por Viktor F. Yanukovich, líder do partido das Regiões, por uma diferença de apenas 3,5 pontos percentuais.
Como se sabe, em função da chamada revolução laranja, Yanukovich fora forçado em 2004 a renunciar à presidência, sob suspeita de fraude eleitoral generalizada.
Desta feita, apesar de instada a fazê-lo, a candidata nacionalista Yulia Timoshenko se recusou a conceder a vitória ao rival Yanukovich (considerado pró-russo). Os observadores internacionais presentes aos comícios julgaram-nos livres, e genuino seu resultado. Nesse sentido, diversos líderes – entre os quais Obama – já cumprimentaram Yanukovich.
Timoshenko entrou com ação junto à Corte Administrativa Superior, em que apela contra o resultado, alegando fraude eleitoral em larga escala. A Corte fez saber que decidirá sobre a apelação a 25 de fevereiro, justamente na data prevista para a posse de Yanukovich (que será, portanto, adiada).
Solicitada por Yanukovich a renunciar ao cargo de Primeiro Ministro, Yulia Timoshenko igualmente se negou. Entrementes, se inicia luta política entre as duas coalizões. Assim, o partido de Yanukovich procura novas alianças, para reunir os votos necessários (226 sufrágios em um parlamento de 450 membros) a um voto de desconfiança no gabinete da Sra. Timoshenko.
Por sua vez, a nacionalista – que passou a mostrar penteado com trança camponesa como sinal de sua opção patriótica, após a revolução laranja – Yulia se empenha em combate tanto judicial, quanto parlamentar, em que, ao contestar o triunfo do adversário, busca enfraquecer a aliança contrária e se preparar para um eventual novo turno eleitoral.
O gosto japonês por espécies ameaçadas
Segundo se veicula, o Japão não pretende participar de nenhum acordo internacional que vise a banir o comércio do atum azul (bluefin tuna) do Atlântico. É notório que a pesca industrial de explotação desta espécie causará a sua breve extinção.
Nesse contexto, se inserem os esforços das Nações Unidas para tentar preservar o que resta dos anteriores profusos cardumes do prelibado peixe.
O negociador japonês, Masanori Miyahara, se recusa a participar do entendimento: “É uma pena, mas é uma questão de princípio.”
Segundo o senhor Miyahara, essa espécie de atum seria da competência da Comissão Internacional para a Conservação do Atum Atlântico, e não da Convenção das Nações Unidas do Comércio em Espécies ameaçadas da Fauna e da Flora Selvagens (Cites).
Obviamente, com isso a importação para as mesas dos consumidores japoneses prosseguirá, até presumivelmente a extinção de mais esta espécie marinha.
Essa postura que ignora os deletérios efeitos dessa pesca industrial nada tem de original, no que concerne aos japoneses. A atitude do senhor Miyahara é apenas mais outra decorrência das preferências dos consumidores do Império do Sol Nascente.
Conquanto a situação das baleias tenha sido melhorada, pelo embargo internacional à caça predatória deste mamífero marinho, os japoneses ainda se escudam em uma quota científica para suposta pesquisa de trezentas baleias por ano.
O empenho nipônico na matéria – que acoberta o especial gosto da população pelo consumo dessa carne – pode ser sentido nos embates entre os mastodônticos navios de caça do Japão e as corajosas, mas pequenas, embarcações do Greenpeace, na sua altruista batalha em prol das longínquas parentes da tão malfalada Moby Dick.
O Calvário da Grécia
O ingresso da República Helênica no privilegiado clube do euro foi conseguido menos pela robustez econômica da economia grega, do que pela sua proverbial habilidade mercantil e financeira. Ao abandonar a histórica moeda dracma, a Grécia perseguia uma ilusão consumista, que, após alguns anos de uma existência que antes chamaríamos de viver à tripa forra, vem agora bater à porta dos responsáveis de turno pela administração grega, no caso os socialistas.
Com a explosão do déficit helênico muito além dos três por cento supostamente aplicados pela União Europeia, e a notória situação extrema de Atenas no grupo dos chamados Piigs – acrônimo dos paises mais endividados da U.E. (Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha) – um diretório europeu, liderado por Alemanha e França, deram prazo para que o governo grego lograsse aquilo que jamais antes fora conseguido.
Em outras palavras, sanear a economia, reduzindo a dívida a totais aceitáveis em termos comunitários.
Não tendo outra opção, o gabinete Papandreou se propõe apertar o cinto, o que significa reduzir o deficit de 12,7% para 3% em 2012, consoante a exigência da U.E. Assinale-se que atualmente as reservas gregas são de sete bilhões de euros, e a divida de... 300 bilhões.
No regime de desperdício que caracteriza a U.E. – basta ver o número de comissários sob a presidência do português José Manuel Barroso – e os gordos subsídios antes fornecidos por Bruxelas, cuja obtenção era bastante facilitada pela falta de controle de parte da autoridade comunitária, basta um exemplo entre muitos, a esse respeito.
Agora, Bruxelas exige devolução de 375 mil euros de associação de produtores de azeite da Ilha de Creta. Conforme noticiado, a associação mentiu tanto sobre o número de oliveiras plantadas, que se faria necessária uma linha de 144 km de Creta à ilha de Santorini para fornecer o espaço indispensável ao suposto plantio.
É evidente a responsabilidade dos cidadãos e da autoridade helênica. Mas muitos de tais abusos e farsescos contos do vigário só são críveis defronte da espantosa incompetência, negligência e eventual cumplicidade daqueles que deveriam zelar pelos fundos comunitários e sua apropriada aplicação.
(Fontes: International Herald Tribune e O Globo)
sábado, 20 de fevereiro de 2010
Recaídas
Estranho Silêncio
Segundo informa a Folha de S.Paulo, há mais de três meses o Supremo Tribunal Federal aguarda resposta do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva a perguntas sobre o conhecimento dele dos fatos apontados na ação penal do mensalão, bem como sua relação com os réus do processo.
O Presidente Lula foi indicado como testemunha de defesa por dois dos acusados no processo, os ex-deputados federais Roberto Jefferson e José Janene.
Ante a demora de Lula em responder ao questionamento da Procuradoria Geral da República, o Ministro do STF Joaquim Barbosa, relator do processo, reenviou as questões ao Presidente a cinco de fevereiro corrente.
Conquanto não haja prazo determinado para atender aos quesitos repassados pelo Ministro Barbosa, o eventual atraso não pode ser excessivo a ponto de atrapalhar o andamento do processo.
Se não apresentar seu testemunho por escrito, Lula será passível de ser arguido por crime de desobediência à ordem legal, consoante informa a assessoria do Ministro.
As eventuais respostas de Luiz Inácio Lula da Silva serão o primeiro depoimento formal do Presidente sobre o caso.
As reações de Lula ao escândalo do mensalão – a mais séria crise enfrentada por seu governo – variam de observações que referem a prática generalizada do ‘caixa dois’ à negativa de sua existência, formulada em novembro de 2009: “foi uma tentativa de golpe no governo. Foi a maior armação já feita contra o governo.”
Vê-se pelo teor das respostas o obvio desconforto presidencial com o mensalão. Por outro lado, o emprego da chamada ‘tese conspiratória’, é utilizado com grande desenvoltura pelo PT, a despeito das ações penais que correm na Justiça.
De qualquer forma, Sua Excelência, como Primeiro Magistrado da Nação, terá que submeter-se ao dever legal de responder aos 33 quesitos redigidos pelo Ministério Público.
Síntomas Preocupantes
O Partido dos Trabalhadores pôs as manguinhas de fora, apresentando programa de governo para a pré-candidata Dilma Rousseff bastante mais à esquerda do que o proposto por sua Executiva.Dentre os pontos polêmicos, estão a taxação das grandes fortunas, o fim da criminalização de movimentos como o MST, apoio à criação de Comissão de Verdade para examinar os crimes da ditadura, e redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais.
Diante do fato consumado, a pré-candidata em seu discurso de hoje, adotaria tom moderado, em defesa da estabilidade. A esse propósito, a par das passadas posições da indicada pelo Presidente Lula – acrescida da indicação de Marco Aurélio Garcia para a coordenação da campanha – caberia a pergunta acerca do grau de controle da pré-candidata sobre o seu partido, à vista das discrepâncias entre plataforma partidária e o seu compromisso de manutenção da linha lulista.
Existem outras indicações de que o Partido dos Trabalhadores tem ulteriores dúvidas sobre a estratégia traçada pelo Presidente Lula. Assim, o congresso petista derrotou a emenda que previa a inclusão do PMDB como aliado preferencial.
Todos esses assomos de independentismo não mandam decerto boas mensagens para o Presidente, nem sobretudo para as perspectivas da futura governança. Abandonar o pragmatismo de Lula em termos de política economico-financeira pode ser tentação eleitoreira irresistível aos aloprados do petismo, mas não é nada bom para o posicionamento de correntes influentes da opinião pública que se reconciliaram com o governo petista justamente pela sua responsabilidade nas finanças.
A frase do colunista Merval Pereira – “Dilma sem Lula simplesmente não existe” – se mostra a força do apoio prestado à candidata de algibeira, sinaliza também a sua eventual fraqueza, se ungida à presidência, em ater-se à linha do então já ex-presidente.
É sabida a sovada máxima – ganhar com a esquerda, e governar com a direita. Entretanto, além dos problemas de conceituação, às vezes é difícil, uma vez destapada a garrafa, fazer com que os gênios a ela voltem.
( Fontes: Folha de S. Paulo e O Globo )
Segundo informa a Folha de S.Paulo, há mais de três meses o Supremo Tribunal Federal aguarda resposta do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva a perguntas sobre o conhecimento dele dos fatos apontados na ação penal do mensalão, bem como sua relação com os réus do processo.
O Presidente Lula foi indicado como testemunha de defesa por dois dos acusados no processo, os ex-deputados federais Roberto Jefferson e José Janene.
Ante a demora de Lula em responder ao questionamento da Procuradoria Geral da República, o Ministro do STF Joaquim Barbosa, relator do processo, reenviou as questões ao Presidente a cinco de fevereiro corrente.
Conquanto não haja prazo determinado para atender aos quesitos repassados pelo Ministro Barbosa, o eventual atraso não pode ser excessivo a ponto de atrapalhar o andamento do processo.
Se não apresentar seu testemunho por escrito, Lula será passível de ser arguido por crime de desobediência à ordem legal, consoante informa a assessoria do Ministro.
As eventuais respostas de Luiz Inácio Lula da Silva serão o primeiro depoimento formal do Presidente sobre o caso.
As reações de Lula ao escândalo do mensalão – a mais séria crise enfrentada por seu governo – variam de observações que referem a prática generalizada do ‘caixa dois’ à negativa de sua existência, formulada em novembro de 2009: “foi uma tentativa de golpe no governo. Foi a maior armação já feita contra o governo.”
Vê-se pelo teor das respostas o obvio desconforto presidencial com o mensalão. Por outro lado, o emprego da chamada ‘tese conspiratória’, é utilizado com grande desenvoltura pelo PT, a despeito das ações penais que correm na Justiça.
De qualquer forma, Sua Excelência, como Primeiro Magistrado da Nação, terá que submeter-se ao dever legal de responder aos 33 quesitos redigidos pelo Ministério Público.
Síntomas Preocupantes
O Partido dos Trabalhadores pôs as manguinhas de fora, apresentando programa de governo para a pré-candidata Dilma Rousseff bastante mais à esquerda do que o proposto por sua Executiva.Dentre os pontos polêmicos, estão a taxação das grandes fortunas, o fim da criminalização de movimentos como o MST, apoio à criação de Comissão de Verdade para examinar os crimes da ditadura, e redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais.
Diante do fato consumado, a pré-candidata em seu discurso de hoje, adotaria tom moderado, em defesa da estabilidade. A esse propósito, a par das passadas posições da indicada pelo Presidente Lula – acrescida da indicação de Marco Aurélio Garcia para a coordenação da campanha – caberia a pergunta acerca do grau de controle da pré-candidata sobre o seu partido, à vista das discrepâncias entre plataforma partidária e o seu compromisso de manutenção da linha lulista.
Existem outras indicações de que o Partido dos Trabalhadores tem ulteriores dúvidas sobre a estratégia traçada pelo Presidente Lula. Assim, o congresso petista derrotou a emenda que previa a inclusão do PMDB como aliado preferencial.
Todos esses assomos de independentismo não mandam decerto boas mensagens para o Presidente, nem sobretudo para as perspectivas da futura governança. Abandonar o pragmatismo de Lula em termos de política economico-financeira pode ser tentação eleitoreira irresistível aos aloprados do petismo, mas não é nada bom para o posicionamento de correntes influentes da opinião pública que se reconciliaram com o governo petista justamente pela sua responsabilidade nas finanças.
A frase do colunista Merval Pereira – “Dilma sem Lula simplesmente não existe” – se mostra a força do apoio prestado à candidata de algibeira, sinaliza também a sua eventual fraqueza, se ungida à presidência, em ater-se à linha do então já ex-presidente.
É sabida a sovada máxima – ganhar com a esquerda, e governar com a direita. Entretanto, além dos problemas de conceituação, às vezes é difícil, uma vez destapada a garrafa, fazer com que os gênios a ela voltem.
( Fontes: Folha de S. Paulo e O Globo )
sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010
Obama recebe o Dalai Lama
A audiência do Presidente Barack Obama ao Dalai Lama, líder espiritual do Tibet é acontecimento cuja importância reside precipuamente na sua realização.
A despeito dos protestos da liderança chinesa, e das suas ameaças genéricas, não é crível que o presidente Hu Jin Tao tivesse ilusões sobre a possibilidade de eventual recuo do homólogo americano. Tampouco a imagem de Obama, depois de seus percalços chineses (pouca divulgação de seu discurso na tevê chinesa, descortesia em Copenhague), sequer admitiria a eventualidade de cancelamento da visita do Dalai Lama.
Acresce notar a ritualidade dos protestos chineses a tudo que se relacione com atividades diplomáticas do líder tibetano. E no que respeita a Washington, nenhum antecessor de Obama deixou de encontrar-se com a carismática encarnação da nacionalidade tibetana.
Apesar de a audiência realizar-se na Casa Branca, residência oficial do Presidente, Obama fez alguma demonstração de boa vontade à República Popular da China, ao recebê-lo a sós, sem a presença da imprensa. Se teve a cortesia de distribuir a foto de ambos durante o encontro de uma hora, acompanhada de comunicado em que se defende a identidade do Tibete, não houve cobertura das redes televisivas da reunião.
A China por sua vez também cooperou na liturgia relacionada com a audiência. O Embaixador americano foi convocado mas por um vice-ministro das Relações Exteriores, Cui Tiankai, e a sua nota de protesto, se desconstruída sob luzes diplomáticas, foi até moderada. Exprime “forte insatisfação e resoluta oposição ao encontro”.
Dessarte, a despeito das aparências, inexiste muita diferença no comentário do Embaixador Jon Huntsman de que ‘agora é tempo para andar para a frente (move forward) e cooperar’, e nas ‘exigências’ chinesas de que “os Estados Unidos levem em séria consideração da posição da RPC, e adotem de imediato medidas para apagar os impactos adversos e deixem de colaborar (conniving) e apoiar as forças separatistas anti-chinesas.”
O Dalai Lama é o símbolo vivo da identidade tibetana. Já há vários anos deixou de preconizar a restauração da independência do Tibete – que, como se sabe, fora invadido e incorporado manu militari pela China comunista. Com essa atitude, o líder tibetano demonstrou grande realismo político. Continuou, no entanto, a batalhar pela preservação da autonomia do Tibete, assim como pela defesa de sua identidade cultural, ameaçada pelas hordas de imigração da etnia han, que é a predominante na RPC.
Malgrado todas as suas tentativas de negociação com Beijing, a liderança chinesa expressa visceral rejeição quanto à figura do Dalai Lama, que ela se pauta em rotular de separatista e de inimigo da China.
Diante da personalidade carismática do líder tibetano, que, a despeito de toda a repressão, continua a ser para a população autóctone a genuina expressão da nacionalidade tibetana, as reações da burocracia estatal chinesa se caracterizam pelo automatismo e pela coleta de série de malogros na luta inglória em tentar barrar os contatos internacionais do Dalai Lama.
Por conseguinte, a insatisfação da hierarquia da RPC nesse episódio carece de ser conduzida ao seu real significado, que é bastante limitado, e tende a esgotar-se, para efeitos práticos, no ritual acima descrito.
( Fonte: CNN )
A despeito dos protestos da liderança chinesa, e das suas ameaças genéricas, não é crível que o presidente Hu Jin Tao tivesse ilusões sobre a possibilidade de eventual recuo do homólogo americano. Tampouco a imagem de Obama, depois de seus percalços chineses (pouca divulgação de seu discurso na tevê chinesa, descortesia em Copenhague), sequer admitiria a eventualidade de cancelamento da visita do Dalai Lama.
Acresce notar a ritualidade dos protestos chineses a tudo que se relacione com atividades diplomáticas do líder tibetano. E no que respeita a Washington, nenhum antecessor de Obama deixou de encontrar-se com a carismática encarnação da nacionalidade tibetana.
Apesar de a audiência realizar-se na Casa Branca, residência oficial do Presidente, Obama fez alguma demonstração de boa vontade à República Popular da China, ao recebê-lo a sós, sem a presença da imprensa. Se teve a cortesia de distribuir a foto de ambos durante o encontro de uma hora, acompanhada de comunicado em que se defende a identidade do Tibete, não houve cobertura das redes televisivas da reunião.
A China por sua vez também cooperou na liturgia relacionada com a audiência. O Embaixador americano foi convocado mas por um vice-ministro das Relações Exteriores, Cui Tiankai, e a sua nota de protesto, se desconstruída sob luzes diplomáticas, foi até moderada. Exprime “forte insatisfação e resoluta oposição ao encontro”.
Dessarte, a despeito das aparências, inexiste muita diferença no comentário do Embaixador Jon Huntsman de que ‘agora é tempo para andar para a frente (move forward) e cooperar’, e nas ‘exigências’ chinesas de que “os Estados Unidos levem em séria consideração da posição da RPC, e adotem de imediato medidas para apagar os impactos adversos e deixem de colaborar (conniving) e apoiar as forças separatistas anti-chinesas.”
O Dalai Lama é o símbolo vivo da identidade tibetana. Já há vários anos deixou de preconizar a restauração da independência do Tibete – que, como se sabe, fora invadido e incorporado manu militari pela China comunista. Com essa atitude, o líder tibetano demonstrou grande realismo político. Continuou, no entanto, a batalhar pela preservação da autonomia do Tibete, assim como pela defesa de sua identidade cultural, ameaçada pelas hordas de imigração da etnia han, que é a predominante na RPC.
Malgrado todas as suas tentativas de negociação com Beijing, a liderança chinesa expressa visceral rejeição quanto à figura do Dalai Lama, que ela se pauta em rotular de separatista e de inimigo da China.
Diante da personalidade carismática do líder tibetano, que, a despeito de toda a repressão, continua a ser para a população autóctone a genuina expressão da nacionalidade tibetana, as reações da burocracia estatal chinesa se caracterizam pelo automatismo e pela coleta de série de malogros na luta inglória em tentar barrar os contatos internacionais do Dalai Lama.
Por conseguinte, a insatisfação da hierarquia da RPC nesse episódio carece de ser conduzida ao seu real significado, que é bastante limitado, e tende a esgotar-se, para efeitos práticos, no ritual acima descrito.
( Fonte: CNN )
quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010
Resenha Macroeconômica
O balanço dos dois mandatos do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, feito com antecipação de um ano – dada a presunção de que em ano de eleição poucas modificações tendem a ocorrer – apresenta um quadro constrastante, em que aspectos positivos são contrabalançados por negativos.
Do lado do haver, registram-se a baixa na inflação de 9,3% em 2003 para 4,31% em 2009 e a previsão de 4,78% em 2010; o relativo equilíbrio no superavit primário (receitas menos despesas, descontados os juros da dívida), de 3,3% (do PIB) em 2003 a 2,1% em 2009 ( o mais fraco desempenho provocado pela crise) e previsão de 3,3% em 2010.
Também nesse capítulo, se assinala a redução entre a dívida pública e o PIB. A projeção para 2010 é de 40,5% do PIB. Igualmente, carece de ser mencionada a capacidade de minimizar os efeitos da crise financeira internacional.
Do lado do dever, o Governo Lula manteve tendências negativas anteriores e enfatizou outras, igualmente prejudiciais. No campo inercial, ressalta o incremento continuado da carga tributária total (de 32,54% em 2003 para 35,02% em 2009 – com um pico de 35,16% em 2008). Já o spread (diferença entre o custo de captação dos bancos e os juros cobrados dos clientes) oscilou entre 30,01% (2003) e 24,33 % (2009). O spread bancário não acompanhou em termos relativos a baixa na taxa Selic, que caíu para 8,75%.
Ainda no lado negativo, houve pronunciado aumento nos gastos correntes (despesas com funcionários estatais), que passou para 16,3% do PIB, enquanto os investimentos do setor público se acham em torno de um pífio 1%. Desenvolvimentos paralelos a tais opções estão no excesso de burocracia e regulamentação, e na ausência de um política afirmativa em termos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico.
Com a apreciação do real em relação ao dólar estadunidense, as exportações tenderão a diminuir, com particular desafio aos produtos industriais encarecidos pela alta do real, e as importações devem ser infladas pelo barateamento do dólar, com a consequente pressão sobre a balança de gastos correntes.
Em suma, se a Administração Lula fez o seu dever de casa na política monetária e na gestão da dívida – a melhora em nossas contas internacionais se refletiu na posição segura do Brasil diante desta crise financeira internacional, ao contrário dos dissabores do passado – a política assistencialista do lulismo (Bolsa Família e inchação da burocracia estatal) aumentou de forma excessiva os gastos correntes (que, ao invés de outros dispêndios, são permanentes e inflexíveis), em detrimento dos investimentos em infraestrutura, mantidos dentro do inominável padrão de 1% do PIB.
A continuada ascensão da carga tributária total (35,02%), que não se traduz em válida contrapartida para o brasileiro em termos de investimentos básicos (saúde, educação, segurança) já constitui reflexo de políticas de desperdício (inchação das despesas públicas estatais, falta de uma política de investimentos, alto nível de corrupção).
Por outro lado, a política lulista de privilegiar o presente, com propósitos eleitoreiros de manutenção e ampliação de influência partidária, implica outrossim em renúncia de futuro com melhores condições de vida em geral para a própria população.
O brasileiro comum já sente esta culpável omissão no estado lastimável de nossas rodovias e ferrovias, na falta de obras de saneamento, no criminoso desleixo nas obras de prevenção e combate às enchentes, no desequilíbrio nas educações primária e secundária, e na geral omissão de investimentos em alta e média tecnologia. Basta um exame perfunctório de o que a China, a despeito de seu sobrepeso demográfico, está empreendendo nos domínios da energia limpa e na pesquisa de novas fontes energéticas, para que nos capacitemos do relativo atraso de nosso país, pela consistente opção do atual governo pela mediocridade imediatista de suas políticas de estampo clientelista.
Não nos esqueçamos, por conseguinte, que os nossos governantes – no Executivo e no Legislativo – são o reflexo da vontade do eleitor. A conscientização política, a pressão do Povo carece de exercer-se não só no dia do pleito, mas na elaboração da lista de candidatos. Na construção de um Brasil melhor, mais honesto, é fundamental que não se permita às atuais lideranças no Congresso que venham a desfigurar a iniciativa popular da eliminação dos fichas-sujas de Câmara e Senado. E que a sua aprovação seja de efeito imediato, e não empurrada para as calendas, como pretendem os atuais líderes corporativistas.
O dinheiro dos nossos impostos merece melhor sorte do que ser entornado em odres velhos e corrompidos. Por um Brasil mais justo!
( Fonte de dados econométricos: O Globo )
Do lado do haver, registram-se a baixa na inflação de 9,3% em 2003 para 4,31% em 2009 e a previsão de 4,78% em 2010; o relativo equilíbrio no superavit primário (receitas menos despesas, descontados os juros da dívida), de 3,3% (do PIB) em 2003 a 2,1% em 2009 ( o mais fraco desempenho provocado pela crise) e previsão de 3,3% em 2010.
Também nesse capítulo, se assinala a redução entre a dívida pública e o PIB. A projeção para 2010 é de 40,5% do PIB. Igualmente, carece de ser mencionada a capacidade de minimizar os efeitos da crise financeira internacional.
Do lado do dever, o Governo Lula manteve tendências negativas anteriores e enfatizou outras, igualmente prejudiciais. No campo inercial, ressalta o incremento continuado da carga tributária total (de 32,54% em 2003 para 35,02% em 2009 – com um pico de 35,16% em 2008). Já o spread (diferença entre o custo de captação dos bancos e os juros cobrados dos clientes) oscilou entre 30,01% (2003) e 24,33 % (2009). O spread bancário não acompanhou em termos relativos a baixa na taxa Selic, que caíu para 8,75%.
Ainda no lado negativo, houve pronunciado aumento nos gastos correntes (despesas com funcionários estatais), que passou para 16,3% do PIB, enquanto os investimentos do setor público se acham em torno de um pífio 1%. Desenvolvimentos paralelos a tais opções estão no excesso de burocracia e regulamentação, e na ausência de um política afirmativa em termos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico.
Com a apreciação do real em relação ao dólar estadunidense, as exportações tenderão a diminuir, com particular desafio aos produtos industriais encarecidos pela alta do real, e as importações devem ser infladas pelo barateamento do dólar, com a consequente pressão sobre a balança de gastos correntes.
Em suma, se a Administração Lula fez o seu dever de casa na política monetária e na gestão da dívida – a melhora em nossas contas internacionais se refletiu na posição segura do Brasil diante desta crise financeira internacional, ao contrário dos dissabores do passado – a política assistencialista do lulismo (Bolsa Família e inchação da burocracia estatal) aumentou de forma excessiva os gastos correntes (que, ao invés de outros dispêndios, são permanentes e inflexíveis), em detrimento dos investimentos em infraestrutura, mantidos dentro do inominável padrão de 1% do PIB.
A continuada ascensão da carga tributária total (35,02%), que não se traduz em válida contrapartida para o brasileiro em termos de investimentos básicos (saúde, educação, segurança) já constitui reflexo de políticas de desperdício (inchação das despesas públicas estatais, falta de uma política de investimentos, alto nível de corrupção).
Por outro lado, a política lulista de privilegiar o presente, com propósitos eleitoreiros de manutenção e ampliação de influência partidária, implica outrossim em renúncia de futuro com melhores condições de vida em geral para a própria população.
O brasileiro comum já sente esta culpável omissão no estado lastimável de nossas rodovias e ferrovias, na falta de obras de saneamento, no criminoso desleixo nas obras de prevenção e combate às enchentes, no desequilíbrio nas educações primária e secundária, e na geral omissão de investimentos em alta e média tecnologia. Basta um exame perfunctório de o que a China, a despeito de seu sobrepeso demográfico, está empreendendo nos domínios da energia limpa e na pesquisa de novas fontes energéticas, para que nos capacitemos do relativo atraso de nosso país, pela consistente opção do atual governo pela mediocridade imediatista de suas políticas de estampo clientelista.
Não nos esqueçamos, por conseguinte, que os nossos governantes – no Executivo e no Legislativo – são o reflexo da vontade do eleitor. A conscientização política, a pressão do Povo carece de exercer-se não só no dia do pleito, mas na elaboração da lista de candidatos. Na construção de um Brasil melhor, mais honesto, é fundamental que não se permita às atuais lideranças no Congresso que venham a desfigurar a iniciativa popular da eliminação dos fichas-sujas de Câmara e Senado. E que a sua aprovação seja de efeito imediato, e não empurrada para as calendas, como pretendem os atuais líderes corporativistas.
O dinheiro dos nossos impostos merece melhor sorte do que ser entornado em odres velhos e corrompidos. Por um Brasil mais justo!
( Fonte de dados econométricos: O Globo )
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010
O Escândalo da Censura
Se pouco tempo depois da promulgação da Constituição Cidadã, a cinco de outubro de 1988, se veiculasse a possibilidade de que a Justiça se investisse do triste papel de fautora de censura junto aos meios de comunicação, o que mostrariam constituintes e o Ministro da Justiça, Fernando Lyra, senão largos sorrisos de descrença ? Como poderiam aqueles que afinal acreditavam livre o Brasil da peçonha da censura emprestar crédito a semelhante absurdo ? A par da tortura, a Carta a quem se negou a Ulysses Guimarães a honra de um prefácio, está associada igualmente ao ditame de Censura, nunca mais!
Os que participaram, direta ou indiretamente, de sua redação e aprovação, e os que a saudaram como o fanal da democracia e de sua nova era, não trepidariam em assinalar-lhe entre os galardões, o inciso IX do artigo 5º , e o artigo 220, parágrafo 2º . Pois quem ousaria negar a cláusula pétrea de que “é livre a expressão de atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença” , a que se jungem as determinações : “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição” , “vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.”
Tais disposições, se cremos estivessem gravadas no mármore ático das leis imorredouras, hoje são ignoradas ou desvirtuadas não só por juízes de perdidos grotões, mas até por desembargadores e ministros que ousam aguar a planta daninha da chamada censura judicial.
De uns tempos para cá, qual hidra ela está em toda parte, grassando livremente por força de iníquas sentenças. Para combater a criação imortal da Constituição de 1988, carecemos de opinião pública forte, de Congresso que lhe esteja à altura, de juizes e magistrados que não só conheçam, mas respeitem a Carta Magna, de Poder Executivo que execre a praga da censura e de seus parasitas burocráticos.
Acaso precisamos de bons advogados ? O hábil e erudito causídico será sempre útil instrumento, desde que respeite os princípios constitucionais, e despreze todo o sofisma que torne possível o mostrengo inconstitucional.
A censura judicial, esta criação maldita de longa erosão de sagrado princípio da Carta de 1988, acobertada e insuflada pelos desvios e escaninhos de um poder que não se atreve a reivindicar-lhe a autoria, acaba de completar, não uma efeméride – que é reservada a feitos e conquistas memoráveis – mas lôbrego marco.
Mais de duzentos dias decorreram da censura imposta em segunda instância, pelo Desembargador Dácio Vieira, do TJ-DF, que impediu ao jornal Estado de São Paulo publicar notícias relativas à investigação da Polícia Federal sobre a atuação do empresário Fernando Sarney, filho do senador e Presidente do Senado Federal, José Sarney.
Se escândalos existem neste país, é oportuno que este seja assinalado, para retirá-lo do poço do olvido a que parece adrede consignado. É uma vergonha não só para aqueles que contribuíram para a manutenção de tal avantesma dos tempos plúmbeos da ditadura, mas e talvez sobretudo para a falta de uma reação digna do nome dos meios de comunicação. Dir-se-ía a contemplar-lhes o silêncio, seja em palavras, seja em editoriais e comentários, que preferem negar-lhe sequer o perigo, mas a própria existência. Serão os eternos personagens da história que se recusam a intervir, por julgar que a questão não lhes diz respeito. E o que farão, quando sozinhos, os esbirros virão por eles e não por outros ?
Talvez até os próprios advogados do Estado possam ser inculpados, por não saberem, quiçá, rasgar os véus do engano que ajudam a dissimular os traços hediondos da criatura que acusam.
No entanto, o itinerário desta causa se nos apresenta comprido e nada gratificante. Chegou mesmo pelo caminho da liminar às portas do Supremo. E para surpresa de muitos – entre os que me incluo – a Suprema Corte perderia a ocasião de livrar do emaranhado de liames o cristalino princípio. Houve ministros, no entanto, que o tiveram bem presente. Lamentavelmente, estavam em minoria na Corte Constitucional.
Nós que abominamos a censura em todas as suas formas, quer burocráticas, quer judiciais, fazemos votos para que surja desta ínclita minoria o núcleo restaurador da cláusula pétrea do incisivo IX do artigo 5º. Se mais uma vez os advogados do Estado batem à porta do TJ-DF, queremos esperar por agradável e prazerosa surpresa, em que o mérito da sentença liminar do desembargador Dácio Vieira seja julgado, derrubado e por fim reproclamada a vigência do princípio constitucional.
Será porventura acalentar loucas, infundadas esperanças ?
Os que participaram, direta ou indiretamente, de sua redação e aprovação, e os que a saudaram como o fanal da democracia e de sua nova era, não trepidariam em assinalar-lhe entre os galardões, o inciso IX do artigo 5º , e o artigo 220, parágrafo 2º . Pois quem ousaria negar a cláusula pétrea de que “é livre a expressão de atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença” , a que se jungem as determinações : “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição” , “vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.”
Tais disposições, se cremos estivessem gravadas no mármore ático das leis imorredouras, hoje são ignoradas ou desvirtuadas não só por juízes de perdidos grotões, mas até por desembargadores e ministros que ousam aguar a planta daninha da chamada censura judicial.
De uns tempos para cá, qual hidra ela está em toda parte, grassando livremente por força de iníquas sentenças. Para combater a criação imortal da Constituição de 1988, carecemos de opinião pública forte, de Congresso que lhe esteja à altura, de juizes e magistrados que não só conheçam, mas respeitem a Carta Magna, de Poder Executivo que execre a praga da censura e de seus parasitas burocráticos.
Acaso precisamos de bons advogados ? O hábil e erudito causídico será sempre útil instrumento, desde que respeite os princípios constitucionais, e despreze todo o sofisma que torne possível o mostrengo inconstitucional.
A censura judicial, esta criação maldita de longa erosão de sagrado princípio da Carta de 1988, acobertada e insuflada pelos desvios e escaninhos de um poder que não se atreve a reivindicar-lhe a autoria, acaba de completar, não uma efeméride – que é reservada a feitos e conquistas memoráveis – mas lôbrego marco.
Mais de duzentos dias decorreram da censura imposta em segunda instância, pelo Desembargador Dácio Vieira, do TJ-DF, que impediu ao jornal Estado de São Paulo publicar notícias relativas à investigação da Polícia Federal sobre a atuação do empresário Fernando Sarney, filho do senador e Presidente do Senado Federal, José Sarney.
Se escândalos existem neste país, é oportuno que este seja assinalado, para retirá-lo do poço do olvido a que parece adrede consignado. É uma vergonha não só para aqueles que contribuíram para a manutenção de tal avantesma dos tempos plúmbeos da ditadura, mas e talvez sobretudo para a falta de uma reação digna do nome dos meios de comunicação. Dir-se-ía a contemplar-lhes o silêncio, seja em palavras, seja em editoriais e comentários, que preferem negar-lhe sequer o perigo, mas a própria existência. Serão os eternos personagens da história que se recusam a intervir, por julgar que a questão não lhes diz respeito. E o que farão, quando sozinhos, os esbirros virão por eles e não por outros ?
Talvez até os próprios advogados do Estado possam ser inculpados, por não saberem, quiçá, rasgar os véus do engano que ajudam a dissimular os traços hediondos da criatura que acusam.
No entanto, o itinerário desta causa se nos apresenta comprido e nada gratificante. Chegou mesmo pelo caminho da liminar às portas do Supremo. E para surpresa de muitos – entre os que me incluo – a Suprema Corte perderia a ocasião de livrar do emaranhado de liames o cristalino princípio. Houve ministros, no entanto, que o tiveram bem presente. Lamentavelmente, estavam em minoria na Corte Constitucional.
Nós que abominamos a censura em todas as suas formas, quer burocráticas, quer judiciais, fazemos votos para que surja desta ínclita minoria o núcleo restaurador da cláusula pétrea do incisivo IX do artigo 5º. Se mais uma vez os advogados do Estado batem à porta do TJ-DF, queremos esperar por agradável e prazerosa surpresa, em que o mérito da sentença liminar do desembargador Dácio Vieira seja julgado, derrubado e por fim reproclamada a vigência do princípio constitucional.
Será porventura acalentar loucas, infundadas esperanças ?
terça-feira, 16 de fevereiro de 2010
O Desafio Iraniano
A Secretária de Estado, Hillary Clinton, em encontro tipo town hall[1] com estudantes da Universidade Carnegie Mellon, em Doha, ocupou-se do crescente poder exercido no Irã pelos Guardas Islâmicos Revolucionários.
Com efeito, o Exército iraniano vem extendendo consideravelmente a respectiva influência, valendo-se de sua aliança com o estamento clerical e as forças de segurança. Os Guardas Revolucionários, além de dominarem o programa nuclear, se apossaram de largas faixas na área econômico-industrial e política.
Conforme a visão prospectiva da Secretária Hillary, os órgãos do governo iraniano – o Lider Supremo, o Presidente, o Parlamento – estão sendo suplantados pelos Guardas Revolucionários. Ao marginalizar as lideranças clerical e política, o Irã se estaria movendo para uma ditadura militar.
Em linguagem franca, que recorda a pregação da candidata das primárias democratas, ora falando pela Administração Obama, Hillary assegura aos aliados no Golfo a proteção americana contra a ameaça iraniana.
Ressalta a franqueza da linguagem da Secretária de Estado, atendidos os estreitos laços do emirado de Qatar com Teerã. Instada pelo público estudantil do ‘town hall’, declarou que os Estados Unidos não planejam ação militar contra o Irã. Sem embargo, ressurge o discurso de linha dura da antiga candidata presidencial, com a previsão de medidas mais severas contra os Guardas Islâmicos. Dessarte, se pretende introduzir medidas que atuem como uma cunha entre o Iraniano médio e a privilegiada e corrupta classe dominante.
Nesse sentido, o Departamento do Tesouro estadunidense congelou os haveres de quatro companhias controladas pelos Guardas Revolucionários, bem como as sob a jurisdição do General Rostam Qasemi, i.e., um conglomerado de empresas de construção e engenharia.
Com vistas a tornar mais eficazes as sanções, se encara a possibilidade de individuar atividades econômicas específicas sob a gerência dos militares. Igualmente com o propósito de viabilizar a aprovação das sanções do Conselho de Segurança, há a intenção de solicitar ao rei Abdullah da Arábia Saudita que reponha a Beijing o fornecimento de petróleo de procedência iraniana, porventura ameaçado pela eventual adesão da RPC as sanções contra Teerã propostas por Washington.
*
Já no campo interno iraniano, reina certo desânimo na oposição reformista. Tal se deve ao relativo malogro das manifestações do dia onze de fevereiro, que não mantiveram a progressão registrada em dias anteriores, como o de Ashura e o dos Estudantes Mártires.
O êxito do governo se deveu à onda de prisões, à política de intimidação, e a disposições de efetivo controle da multidão. Dentro do movimento oposicionista, se ressente a falta de uma liderança mais afirmativa, dado o caráter moderado tanto de Mir Hussein Moussavi e do clérigo Mehdi Karroubi. Nesse particular, os dois candidatos às eleições fraudulentas de doze de junho não motivam larga faixa estudantil, que tem manifestado a sua preferência ao eliminar a palavra Allah da bandeira iraniana, e ao propugnar a independência da tutela clerical instituída pelo Imã Ruhollah Khomeini.
O tropeço de onze de fevereiro do movimento revolucionário – depois da série de sucessos marcados por grande adesão popular – pode ser apenas uma pausa no avanço da contestação ao regime dos ayatollahs. Há obvia necessidade de uma reestruturação da resistência, dadas as falhas na organização das manifestações de protesto.
Por outro lado, na dinâmica revolucionária, a liderança verde de Moussavi e a de Karroubi não parece satisfazer às necessidades da aglutinação das forças contrárias ao regime. A pergunta que se impõe é se, no contexto da lógica de tais movimentos, surgirá nova liderança carismática, ou um dos atuais chefes evoluirá na radicalização, atendendo às exigências do momento.
( Fonte: International Herald Tribune )
[1] Encontro em que o orador interage com o público, que tem a faculdade de colocar perguntas. O formato lembra o de uma assembleia, daí a designação town hall.
Com efeito, o Exército iraniano vem extendendo consideravelmente a respectiva influência, valendo-se de sua aliança com o estamento clerical e as forças de segurança. Os Guardas Revolucionários, além de dominarem o programa nuclear, se apossaram de largas faixas na área econômico-industrial e política.
Conforme a visão prospectiva da Secretária Hillary, os órgãos do governo iraniano – o Lider Supremo, o Presidente, o Parlamento – estão sendo suplantados pelos Guardas Revolucionários. Ao marginalizar as lideranças clerical e política, o Irã se estaria movendo para uma ditadura militar.
Em linguagem franca, que recorda a pregação da candidata das primárias democratas, ora falando pela Administração Obama, Hillary assegura aos aliados no Golfo a proteção americana contra a ameaça iraniana.
Ressalta a franqueza da linguagem da Secretária de Estado, atendidos os estreitos laços do emirado de Qatar com Teerã. Instada pelo público estudantil do ‘town hall’, declarou que os Estados Unidos não planejam ação militar contra o Irã. Sem embargo, ressurge o discurso de linha dura da antiga candidata presidencial, com a previsão de medidas mais severas contra os Guardas Islâmicos. Dessarte, se pretende introduzir medidas que atuem como uma cunha entre o Iraniano médio e a privilegiada e corrupta classe dominante.
Nesse sentido, o Departamento do Tesouro estadunidense congelou os haveres de quatro companhias controladas pelos Guardas Revolucionários, bem como as sob a jurisdição do General Rostam Qasemi, i.e., um conglomerado de empresas de construção e engenharia.
Com vistas a tornar mais eficazes as sanções, se encara a possibilidade de individuar atividades econômicas específicas sob a gerência dos militares. Igualmente com o propósito de viabilizar a aprovação das sanções do Conselho de Segurança, há a intenção de solicitar ao rei Abdullah da Arábia Saudita que reponha a Beijing o fornecimento de petróleo de procedência iraniana, porventura ameaçado pela eventual adesão da RPC as sanções contra Teerã propostas por Washington.
*
Já no campo interno iraniano, reina certo desânimo na oposição reformista. Tal se deve ao relativo malogro das manifestações do dia onze de fevereiro, que não mantiveram a progressão registrada em dias anteriores, como o de Ashura e o dos Estudantes Mártires.
O êxito do governo se deveu à onda de prisões, à política de intimidação, e a disposições de efetivo controle da multidão. Dentro do movimento oposicionista, se ressente a falta de uma liderança mais afirmativa, dado o caráter moderado tanto de Mir Hussein Moussavi e do clérigo Mehdi Karroubi. Nesse particular, os dois candidatos às eleições fraudulentas de doze de junho não motivam larga faixa estudantil, que tem manifestado a sua preferência ao eliminar a palavra Allah da bandeira iraniana, e ao propugnar a independência da tutela clerical instituída pelo Imã Ruhollah Khomeini.
O tropeço de onze de fevereiro do movimento revolucionário – depois da série de sucessos marcados por grande adesão popular – pode ser apenas uma pausa no avanço da contestação ao regime dos ayatollahs. Há obvia necessidade de uma reestruturação da resistência, dadas as falhas na organização das manifestações de protesto.
Por outro lado, na dinâmica revolucionária, a liderança verde de Moussavi e a de Karroubi não parece satisfazer às necessidades da aglutinação das forças contrárias ao regime. A pergunta que se impõe é se, no contexto da lógica de tais movimentos, surgirá nova liderança carismática, ou um dos atuais chefes evoluirá na radicalização, atendendo às exigências do momento.
( Fonte: International Herald Tribune )
[1] Encontro em que o orador interage com o público, que tem a faculdade de colocar perguntas. O formato lembra o de uma assembleia, daí a designação town hall.
segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010
Das Guerras e de suas Vítimas
Dresden
Para a geração que cresceu com a sombra distante da Segunda Guerra Mundial, a cidade de Dresden, a joia arquitetônica dos reis da Saxônia, teria sido a princípio um lamentável erro da campanha aérea do Reino Unido. O comandante dos bombardeios ingleses, o Marechal-do-Ar Sir Arthur Harris, mais tarde, alcunhado de Bomber Harris, passou a atribuir importância estratégica aos bombardeios noturnos da R.A.F. contra os civis do Reich alemão. Nesse sentido, julgou oportuna a maciça intervenção na cidade barroca do Leste, até então preservada por causa de seu escasso valor estratégico. O próprio Winston Churchill teria questionado o acerto da incursão anglo-americana.
O escritor W.G. Sebald, prematuramente morto por um acidente,procurou em muitos de seus escritos reinfundir um pouco de dignidade no sacrifício de tantos civis alemães ceifados pelo conflito de 1939-1945. São de difícil leitura, pelo seu impiedoso realismo, as suas páginas sobre os quarteirões de Hamburgo arrasados pelos métodos de destruição e incêndio das ondas sucessivas de aviões Lancaster. Bastam as imagens das gordas, hediondas moscas cevadas com a carne e a gordura das vítimas como descrição de encarniçada maldade de que o leitor se capacita com estranhável indignação.
À medida que os tambores das batalhas não mais ressoavam tão fortes, aumentou o repúdio da geral opinião contra o inútil sacrifício de Dresden, considerada um símbolo de matança indiscriminada de civis pelos bombardeios aéreos do final da guerra. Parecia mais do que árdua tarefa a justificação de hecatombe dessa natureza, quando os exércitos aliados investiam a Alemanha e as possibilidades de resistência só poderiam subsistir nos demenciais cálculos do Führer.
Com o desenvolvimento da tecnologia da morte, o ataque de 13 de fevereiro de 1945 foi um exercício de extermínio aéreo de invejável perfeição. Precedida por bombas de destruição material, que abriram buracos no alto dos telhados, arrebentou janelas e portas, e escavou crateras nas ruas, seguiu-se o lançamento de bombas incendiárias que caíam nas recém-dilaceradas estruturas de madeira dos velhos edifícios, que acendiam chamas que se espalhavam pelas correntes de ar de casa para casa, para juntar-se em tempestade de fogo com a força relativa do furacão. Malgrado os cuidados da descrição, ressalta o objetivo precípuo que é o de incinerar o maior número de habitantes, presas fáceis na orquestração infernal da guerra aos civis indefesos. Até os abrigos, rasgados pelos obuses, se transformaram em fornos crematórios.
Dessarte, Dresden passou a ser considerado exemplo da loucura homicida dos bombardeios, se não equiparada a Hiroshima e Nagasaki, igualmente mencionada no capítulo das inúteis e criminosas matanças de civis.
Não mais. De uns tempos para cá, está em curso o contra-ataque dos defensores extremados dos aliados. A reabilitação do Bomber Harris entra nesse contexto. Para que a ocorrência de Dresden seja reinterpretada, é necessário de início redimensionar-lhe as mortes. Antes computadas em centenas de milhares, ora encolhem para 25 mil, e Dresden, de cidade periférica, sem significado estratégico, é dubiamente guindada a objetivo relevante, que teria inclusive encurtado o fim da guerra.
A revista New Yorker publica, a 1º de fevereiro corrente, artigo que se propõe reescrever a história do magnicídio. As vítimas, da centena de milhares, são apresentadas entre 25 e 40 mil, descritos como despedaçadas, queimadas ou asfixiadas. Há frases lapidares: nada houve de excepcional no ataque a Dresden, a cidade era um alvo tão legítimo quanto o de qualquer outra grande cidade alemã. A única contradição no esforço justificatório foi considerar imoral a destruição de Dresden, posto que a concessão seja prontamente minimizada ao expressar que não foi irracional, nem mesmo inusitada. Chega até ao cinismo de reconhecer que bem poderia atender ao padrão do crime de guerra, mas que do prisma aliado o raid se distingue de centenas de outros só pelo fato de que se saíu tão bem.
É de crer-se que as vítimas do desastre de Dresden fazem por merecer apreciações mais equilibradas e mais respeitosas do brutal sacrifício infligido a tantos inocentes.
Ofensiva no Afeganistão.
A imprensa estrangeira não tem poupado atenção a atual ofensiva no Sul do Afeganistão. O ataque aliado na província de Helmand, que é um reduto dos talibãs, estaria procedendo conforme o esperado. A resistência das forças inimigas, bastante forte, estaria conforme às expectativas. Um contingente de tropas americanas, afegãs e inglesas iniciou o ataque no sábado passado, superando as primeiras linhas adversárias. Contudo, ao principiar a dispersão dos pelotões, em busca de núcleos talibãs, os combates se reavivaram, crescendo em frequência e intensidade através de larga extensão de terreno.
Durante a operação, segundo comunicado das forças aliadas, um foguete se desviou em Marja, matando doze civis. O comandante americano, General McChrystal, que se tem pautado em reduzir ao mínimo o número de vítimas civis, lamentou, em mensagem ao Presidente Hamid Karzai “esta trágica perda de vida”.
Como se anuncia, o propósito da manobra é o de restaurar a segurança e a estabilidade em uma larga faixa do Sul do Afeganistão, ora sob o domínio dos insurgentes talibãs.
Não só a retórica, mas a evolução dos choques entre tropas aliadas e os rebeldes evoca reminiscências de conflitos relativamente recentes no Sudeste asiático.
Dada a mudança na postura diante da guerra que não faz muito se verificou na Administração do Presidente Barack Obama, com consequente aumento de efetivos – ainda que matizados com eventuais retiradas em anos seguintes -, tenderá a ser acompanhada de perto, temperada de algum ceticismo, a evolução de mais uma guerra em país que, a despeito do seu estágio civilizatório e das características da própria população, tem no particular retrospecto pouco animador para as potências que houveram por bem invadi-lo.
Para a geração que cresceu com a sombra distante da Segunda Guerra Mundial, a cidade de Dresden, a joia arquitetônica dos reis da Saxônia, teria sido a princípio um lamentável erro da campanha aérea do Reino Unido. O comandante dos bombardeios ingleses, o Marechal-do-Ar Sir Arthur Harris, mais tarde, alcunhado de Bomber Harris, passou a atribuir importância estratégica aos bombardeios noturnos da R.A.F. contra os civis do Reich alemão. Nesse sentido, julgou oportuna a maciça intervenção na cidade barroca do Leste, até então preservada por causa de seu escasso valor estratégico. O próprio Winston Churchill teria questionado o acerto da incursão anglo-americana.
O escritor W.G. Sebald, prematuramente morto por um acidente,procurou em muitos de seus escritos reinfundir um pouco de dignidade no sacrifício de tantos civis alemães ceifados pelo conflito de 1939-1945. São de difícil leitura, pelo seu impiedoso realismo, as suas páginas sobre os quarteirões de Hamburgo arrasados pelos métodos de destruição e incêndio das ondas sucessivas de aviões Lancaster. Bastam as imagens das gordas, hediondas moscas cevadas com a carne e a gordura das vítimas como descrição de encarniçada maldade de que o leitor se capacita com estranhável indignação.
À medida que os tambores das batalhas não mais ressoavam tão fortes, aumentou o repúdio da geral opinião contra o inútil sacrifício de Dresden, considerada um símbolo de matança indiscriminada de civis pelos bombardeios aéreos do final da guerra. Parecia mais do que árdua tarefa a justificação de hecatombe dessa natureza, quando os exércitos aliados investiam a Alemanha e as possibilidades de resistência só poderiam subsistir nos demenciais cálculos do Führer.
Com o desenvolvimento da tecnologia da morte, o ataque de 13 de fevereiro de 1945 foi um exercício de extermínio aéreo de invejável perfeição. Precedida por bombas de destruição material, que abriram buracos no alto dos telhados, arrebentou janelas e portas, e escavou crateras nas ruas, seguiu-se o lançamento de bombas incendiárias que caíam nas recém-dilaceradas estruturas de madeira dos velhos edifícios, que acendiam chamas que se espalhavam pelas correntes de ar de casa para casa, para juntar-se em tempestade de fogo com a força relativa do furacão. Malgrado os cuidados da descrição, ressalta o objetivo precípuo que é o de incinerar o maior número de habitantes, presas fáceis na orquestração infernal da guerra aos civis indefesos. Até os abrigos, rasgados pelos obuses, se transformaram em fornos crematórios.
Dessarte, Dresden passou a ser considerado exemplo da loucura homicida dos bombardeios, se não equiparada a Hiroshima e Nagasaki, igualmente mencionada no capítulo das inúteis e criminosas matanças de civis.
Não mais. De uns tempos para cá, está em curso o contra-ataque dos defensores extremados dos aliados. A reabilitação do Bomber Harris entra nesse contexto. Para que a ocorrência de Dresden seja reinterpretada, é necessário de início redimensionar-lhe as mortes. Antes computadas em centenas de milhares, ora encolhem para 25 mil, e Dresden, de cidade periférica, sem significado estratégico, é dubiamente guindada a objetivo relevante, que teria inclusive encurtado o fim da guerra.
A revista New Yorker publica, a 1º de fevereiro corrente, artigo que se propõe reescrever a história do magnicídio. As vítimas, da centena de milhares, são apresentadas entre 25 e 40 mil, descritos como despedaçadas, queimadas ou asfixiadas. Há frases lapidares: nada houve de excepcional no ataque a Dresden, a cidade era um alvo tão legítimo quanto o de qualquer outra grande cidade alemã. A única contradição no esforço justificatório foi considerar imoral a destruição de Dresden, posto que a concessão seja prontamente minimizada ao expressar que não foi irracional, nem mesmo inusitada. Chega até ao cinismo de reconhecer que bem poderia atender ao padrão do crime de guerra, mas que do prisma aliado o raid se distingue de centenas de outros só pelo fato de que se saíu tão bem.
É de crer-se que as vítimas do desastre de Dresden fazem por merecer apreciações mais equilibradas e mais respeitosas do brutal sacrifício infligido a tantos inocentes.
Ofensiva no Afeganistão.
A imprensa estrangeira não tem poupado atenção a atual ofensiva no Sul do Afeganistão. O ataque aliado na província de Helmand, que é um reduto dos talibãs, estaria procedendo conforme o esperado. A resistência das forças inimigas, bastante forte, estaria conforme às expectativas. Um contingente de tropas americanas, afegãs e inglesas iniciou o ataque no sábado passado, superando as primeiras linhas adversárias. Contudo, ao principiar a dispersão dos pelotões, em busca de núcleos talibãs, os combates se reavivaram, crescendo em frequência e intensidade através de larga extensão de terreno.
Durante a operação, segundo comunicado das forças aliadas, um foguete se desviou em Marja, matando doze civis. O comandante americano, General McChrystal, que se tem pautado em reduzir ao mínimo o número de vítimas civis, lamentou, em mensagem ao Presidente Hamid Karzai “esta trágica perda de vida”.
Como se anuncia, o propósito da manobra é o de restaurar a segurança e a estabilidade em uma larga faixa do Sul do Afeganistão, ora sob o domínio dos insurgentes talibãs.
Não só a retórica, mas a evolução dos choques entre tropas aliadas e os rebeldes evoca reminiscências de conflitos relativamente recentes no Sudeste asiático.
Dada a mudança na postura diante da guerra que não faz muito se verificou na Administração do Presidente Barack Obama, com consequente aumento de efetivos – ainda que matizados com eventuais retiradas em anos seguintes -, tenderá a ser acompanhada de perto, temperada de algum ceticismo, a evolução de mais uma guerra em país que, a despeito do seu estágio civilizatório e das características da própria população, tem no particular retrospecto pouco animador para as potências que houveram por bem invadi-lo.
domingo, 14 de fevereiro de 2010
Colcha de Retalhos XXXVII
5º Aniversário da Morte de Hariri
A 14 de fevereiro de 2005, forte explosão no centro de Beirute vitimou o então Primeiro Ministro Rafik Hariri. Apesar do clamor internacional e da criação de tribunal especial das Nações Unidas, não se logrou até hoje chegar ao mandante do crime, posto que existam suspeitas de envolvimento da Síria, e do próprio Presidente Bashar al-Assad.
Em função dessa probabilidade, a Síria acabou retirando as suas tropas de ocupação do Libano. Não vale dizer que terminaram os problemas naquele país, mas a saída da Síria retirou a capitis diminutio que existia quanto à soberania libanesa.
O enfrentamento entre os cristãos e o Hezbollah – apoiado pelo Irã dos ayatollahs – ora caracteriza a vida política na nação multi-étnica que antes da guerra civil de dezesseis anos era considerada como a Suiça do Levante.
O presente Primeiro Ministro libanês é Saad Hariri, filho de Rafik Hariri. No ensejo, Saad resolveu visitar a Bashar al-Assad, o que causou estranheza. Não obstante, passados cinco anos do brutal assassínio, restam poucas esperanças de que sejam indiciados culpados. Nesse contexto, a visita de Hariri pode ser interpretada como um passo com vistas à distensão, no turvo cenário das relações medio-orientais.
A Crise Financeira Grega
O vagão da República Helênica entrara para a seleta composição que passou a ter o euro como sua moeda já com a boa vontade da autoridade comunitária, e em especial de alemães e franceses que dispõem de maior controle sobre o Banco Central europeu.
Com efeito, as autoridades comunitárias fingiram acreditar que o governo grego havia logrado cumprir com o requisito de manter o deficit orçamentário abaixo dos três por cento do PIB, regra mandatória para poder ingressar no paraíso do euro.
Se a Grécia integra o grupo problema dos chamados piigs (acrônimo para Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha), dentre esses países lhe cabe a distinção às avessas de ser o membro da U.E. com maiores dificuldades.
A Alemanha que sacrificou a sua prezada moeda, o Marco alemão (DM) no altar da missão europeia, hoje principia a ter muitas dúvidas sobre o acerto desta escolha. Eis que o Euro – que pretendia desbancar o dólar estadunidense como principal divisa – tem sofrido bastante em função da debilidade das contas de alguns de seus integrantes. Por outro lado, em meio a tantos países, o poder controlador da autoridade monetária comunitária está cerceado em relação à capacidade de um banco central clássico com respeito a uma moeda nacional.
Malgrado o peso da economia agregada comunitária, a força de sua moeda – o Euro – tende a ser negativamente afetada mais pelos seus membros mais fracos – os piigs – do que pelos mais pujantes.
Será em consequência desse perigo que os integrantes do Euro – com a Alemanha, de Angela Merkel e a França, de Nicolas Sarkozy à frente – cuidaram de costurar com a combalida economia helênica um acordo de emergência que dê ao governo socialista de George Papandreou prazo até o fim do ano para passar sob a forca caudina dos 3%.
Se Papandreou terá condições de implementar tal plano é outra estória. Pelo menos o presidente Trichet, da autoridade monetária da U.E., verá no futuro imediato menos ameaças à atual paridade do euro.
O que se poderia esperar de Dunga ?
A última convocação antes da Copa na verdade não teve surpresas. O treinador, fundado na sua conjuntural popularidade, não resistiu em voltar a ser o Dunga de sempre.
Dadas as suas intrínsecas características, o responsável pela seleção se sente mais à vontade com o conjunto de jogadores que costuma definir como o ‘seu grupo’. Como se assinalam tais selecionados: com uma ou duas exceções, pela falta de qualidades excepcionais – aquelas que, no passado, eram apanágio do jogador brasileiro da seleção.
Esta ausência de autênticos craques representa na verdade a mediocridade que foi o traço marcante de Dunga enquanto jogador. Por isso, a presença de eventuais craques na seleção em realidade constituem exceções que confirma a regra.
Na sua linha geral de reforçar o ‘grupo’, as últimas convocações não podem despertar estranheza. Até um jogador do Cruzeiro de características violentas – teve duas recentes expulsões em jogos da Libertadores – pode ser assimilado pelo ‘grupo’de Dunga. Também a pronta reabilitação de Robinho – bastou um gol de letra, malgrado o fracasso no futebol inglês – se explica, porque Dunga tem muita simpatia por esse jogador.
Já para Ronaldinho Gaúcho, com suas atuações espetaculares no futebol italiano, a barra estará sempre mais alta. Dunga gosta de jogadores aplicados, que cumpram as suas ordens, e que não sejam grandes craques.
Lembram-se da atitude de Parreira e de Zagalo com relação a Romário? Só o chamaram para a seleção de 1994 porque a classificação estava ameaçada. Barraram-lhe o caminho pelo pretexto de uma contusão. Depois, com o colapso de Ronaldo no dia do jogo final com a França, a seleção virou um time de zumbis na decisão com Zidane...
Espero, sinceramente, que daqui a uns meses não tenha de me recordar dessas observações. Será que o scratch do Brasil é assim tão bom que prescinda de craques em capacidade de desestabilizar um resultado ? E não no sentido do puxar de meias de Roberto Carlos, assistindo ao gol de Thierry Henri, que então sequer precisou usar as mãos para eliminar o Brasil nas quartas de final da Copa de 2006 ...
( Fonte: CNN, International Herald Tribune )
A 14 de fevereiro de 2005, forte explosão no centro de Beirute vitimou o então Primeiro Ministro Rafik Hariri. Apesar do clamor internacional e da criação de tribunal especial das Nações Unidas, não se logrou até hoje chegar ao mandante do crime, posto que existam suspeitas de envolvimento da Síria, e do próprio Presidente Bashar al-Assad.
Em função dessa probabilidade, a Síria acabou retirando as suas tropas de ocupação do Libano. Não vale dizer que terminaram os problemas naquele país, mas a saída da Síria retirou a capitis diminutio que existia quanto à soberania libanesa.
O enfrentamento entre os cristãos e o Hezbollah – apoiado pelo Irã dos ayatollahs – ora caracteriza a vida política na nação multi-étnica que antes da guerra civil de dezesseis anos era considerada como a Suiça do Levante.
O presente Primeiro Ministro libanês é Saad Hariri, filho de Rafik Hariri. No ensejo, Saad resolveu visitar a Bashar al-Assad, o que causou estranheza. Não obstante, passados cinco anos do brutal assassínio, restam poucas esperanças de que sejam indiciados culpados. Nesse contexto, a visita de Hariri pode ser interpretada como um passo com vistas à distensão, no turvo cenário das relações medio-orientais.
A Crise Financeira Grega
O vagão da República Helênica entrara para a seleta composição que passou a ter o euro como sua moeda já com a boa vontade da autoridade comunitária, e em especial de alemães e franceses que dispõem de maior controle sobre o Banco Central europeu.
Com efeito, as autoridades comunitárias fingiram acreditar que o governo grego havia logrado cumprir com o requisito de manter o deficit orçamentário abaixo dos três por cento do PIB, regra mandatória para poder ingressar no paraíso do euro.
Se a Grécia integra o grupo problema dos chamados piigs (acrônimo para Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha), dentre esses países lhe cabe a distinção às avessas de ser o membro da U.E. com maiores dificuldades.
A Alemanha que sacrificou a sua prezada moeda, o Marco alemão (DM) no altar da missão europeia, hoje principia a ter muitas dúvidas sobre o acerto desta escolha. Eis que o Euro – que pretendia desbancar o dólar estadunidense como principal divisa – tem sofrido bastante em função da debilidade das contas de alguns de seus integrantes. Por outro lado, em meio a tantos países, o poder controlador da autoridade monetária comunitária está cerceado em relação à capacidade de um banco central clássico com respeito a uma moeda nacional.
Malgrado o peso da economia agregada comunitária, a força de sua moeda – o Euro – tende a ser negativamente afetada mais pelos seus membros mais fracos – os piigs – do que pelos mais pujantes.
Será em consequência desse perigo que os integrantes do Euro – com a Alemanha, de Angela Merkel e a França, de Nicolas Sarkozy à frente – cuidaram de costurar com a combalida economia helênica um acordo de emergência que dê ao governo socialista de George Papandreou prazo até o fim do ano para passar sob a forca caudina dos 3%.
Se Papandreou terá condições de implementar tal plano é outra estória. Pelo menos o presidente Trichet, da autoridade monetária da U.E., verá no futuro imediato menos ameaças à atual paridade do euro.
O que se poderia esperar de Dunga ?
A última convocação antes da Copa na verdade não teve surpresas. O treinador, fundado na sua conjuntural popularidade, não resistiu em voltar a ser o Dunga de sempre.
Dadas as suas intrínsecas características, o responsável pela seleção se sente mais à vontade com o conjunto de jogadores que costuma definir como o ‘seu grupo’. Como se assinalam tais selecionados: com uma ou duas exceções, pela falta de qualidades excepcionais – aquelas que, no passado, eram apanágio do jogador brasileiro da seleção.
Esta ausência de autênticos craques representa na verdade a mediocridade que foi o traço marcante de Dunga enquanto jogador. Por isso, a presença de eventuais craques na seleção em realidade constituem exceções que confirma a regra.
Na sua linha geral de reforçar o ‘grupo’, as últimas convocações não podem despertar estranheza. Até um jogador do Cruzeiro de características violentas – teve duas recentes expulsões em jogos da Libertadores – pode ser assimilado pelo ‘grupo’de Dunga. Também a pronta reabilitação de Robinho – bastou um gol de letra, malgrado o fracasso no futebol inglês – se explica, porque Dunga tem muita simpatia por esse jogador.
Já para Ronaldinho Gaúcho, com suas atuações espetaculares no futebol italiano, a barra estará sempre mais alta. Dunga gosta de jogadores aplicados, que cumpram as suas ordens, e que não sejam grandes craques.
Lembram-se da atitude de Parreira e de Zagalo com relação a Romário? Só o chamaram para a seleção de 1994 porque a classificação estava ameaçada. Barraram-lhe o caminho pelo pretexto de uma contusão. Depois, com o colapso de Ronaldo no dia do jogo final com a França, a seleção virou um time de zumbis na decisão com Zidane...
Espero, sinceramente, que daqui a uns meses não tenha de me recordar dessas observações. Será que o scratch do Brasil é assim tão bom que prescinda de craques em capacidade de desestabilizar um resultado ? E não no sentido do puxar de meias de Roberto Carlos, assistindo ao gol de Thierry Henri, que então sequer precisou usar as mãos para eliminar o Brasil nas quartas de final da Copa de 2006 ...
( Fonte: CNN, International Herald Tribune )
sábado, 13 de fevereiro de 2010
Sinal Amarelo para os Democratas
A sinalização das últimas pesquisas de opinião transmite a insatisfação dos eleitores com ambos os partidos, embora com ligeira vantagem para o Partido Democrata. Continua, entrementes, a fragilização do apoio popular ao Presidente Barack Obama.
A despeito de haver transcorrido o primeiro ano do mandato de Obama, maioria da população continua a atribuir a principal responsabilidade pelos problemas econômicos nacionais, assim como pelo deficit ao ex-Presidente George W. Bush e a Wall Street.
Por outro lado, a maioria da opinião pública culpa seja ao Congresso em geral, seja ao Partido Republicano em particular pela paralísia (gridlock) do Legislativo em 2009. A estratégia do G.O.P. – determinada tanto pelo enfraquecimento do partido, quanto pela preponderância da direita – de não-cooperação absoluta chega a induzir os eleitores a preconizar mudança nas regras de filibuster do Senado.
A opinião vê com preocupação a falta de bipartidarismo no mundo político, e nesse aspecto consideram que os republicanos demonstraram mais falta de espírito bipartidário do que os democratas e, em especial, de Presidente Obama. Nesse contexto,apoiam o esforço de Obama em chegar a acordo com os republicanos.
A desaprovação para os membros do Congresso é ampla – 81% dos consultados julgam que os atuais senadores e deputados não mereceriam ser reeleitos.
Ainda no quadro do Congresso, o facciosismo demonstrado pelos republicanos não é favorecido pela maioria da pesquisa. É pensamento generalizado que os parlamentares devem procurar um consenso para lidar com as sérias questões a serem resolvidas. Nesse sentido, o oposicionismo in extremis do Partido Republicano não é visto como construtivo.
A pesquisa contribui, outrossim, para relativizar a importância na avaliação do movimento popular de direita Tea Party. Malgrado o oba-oba de certos setores da direita e da extrema direita – que tem nos locutores Glenn Back e Rush Limbaugh e na rede Fox os principais suportes nos meios de comunicação – menos de vinte por cento do eleitorado apoia ou sequer conhece esse movimento. Por outro lado, e a fortiori, a maioria dos consultados descarta a necessidade de recurso a um terceiro partido.
Já do nível de aprovação de Barack Obama, o que se pode dizer é que decresceu bastante, estando entre os presidentes de primeiro mandato com menor apoio popular relativo. No momento o seu coeficiente de aprovação está em 46%. Quanto às insatisfações dos eleitores com respeito ao Primeiro Mandatário, julgam que não deveria ter concedido tanto tempo à reforma sanitária e que a sua política de criação de empregos deixa a desejar. Dentre os tópicos aprovados pelo público no que concerne a atuação presidencial, acham-se o término da política de Bush de diminuir os impostos das classes mais ricas, e a proposta de eliminação das restrições para a participação de gays nas forças armadas.
A par disso, diante do óbvio desafio que representam as próximas eleições congressuais intermediárias para a atual maioria do Partido Democrata, a pesquisa fornece a indicação de que o Presidente e seu Partido não deveriam apresentá-las para o eleitorado como se fora um referendo, e sim como uma escolha entre o approach democrata para os problemas nacionais e aquele dos republicanos. A fundamentação de tal estratégia está na circunstância de que as soluções preconizadas pelos democratas têm o apoio da maioria.
Até novembro ainda há muito chão a ser percorrido. Não é muito provável – depois da débacle em Massachusetts – que a Reforma da Saúde possa ser transformada em lei. Não obstante, afigura-se indispensável que o Presidente Obama transmita imagem de liderança mais segura, e que não haja maiores altercações entre os principais líderes do partido.
Se se confirmar um eventual clima conflitivo no Partido Democrata – como manifestações de insatisfação crescente da Speaker Nancy Pelosi com a orientação presidencial - isso transmitiria para a opinião pública visão negativa, que em nada contribuiria para as perspectivas democratas de superar o desafio dos comícios de novembro próximo.
( Fonte: International Herald Tribune )
A despeito de haver transcorrido o primeiro ano do mandato de Obama, maioria da população continua a atribuir a principal responsabilidade pelos problemas econômicos nacionais, assim como pelo deficit ao ex-Presidente George W. Bush e a Wall Street.
Por outro lado, a maioria da opinião pública culpa seja ao Congresso em geral, seja ao Partido Republicano em particular pela paralísia (gridlock) do Legislativo em 2009. A estratégia do G.O.P. – determinada tanto pelo enfraquecimento do partido, quanto pela preponderância da direita – de não-cooperação absoluta chega a induzir os eleitores a preconizar mudança nas regras de filibuster do Senado.
A opinião vê com preocupação a falta de bipartidarismo no mundo político, e nesse aspecto consideram que os republicanos demonstraram mais falta de espírito bipartidário do que os democratas e, em especial, de Presidente Obama. Nesse contexto,apoiam o esforço de Obama em chegar a acordo com os republicanos.
A desaprovação para os membros do Congresso é ampla – 81% dos consultados julgam que os atuais senadores e deputados não mereceriam ser reeleitos.
Ainda no quadro do Congresso, o facciosismo demonstrado pelos republicanos não é favorecido pela maioria da pesquisa. É pensamento generalizado que os parlamentares devem procurar um consenso para lidar com as sérias questões a serem resolvidas. Nesse sentido, o oposicionismo in extremis do Partido Republicano não é visto como construtivo.
A pesquisa contribui, outrossim, para relativizar a importância na avaliação do movimento popular de direita Tea Party. Malgrado o oba-oba de certos setores da direita e da extrema direita – que tem nos locutores Glenn Back e Rush Limbaugh e na rede Fox os principais suportes nos meios de comunicação – menos de vinte por cento do eleitorado apoia ou sequer conhece esse movimento. Por outro lado, e a fortiori, a maioria dos consultados descarta a necessidade de recurso a um terceiro partido.
Já do nível de aprovação de Barack Obama, o que se pode dizer é que decresceu bastante, estando entre os presidentes de primeiro mandato com menor apoio popular relativo. No momento o seu coeficiente de aprovação está em 46%. Quanto às insatisfações dos eleitores com respeito ao Primeiro Mandatário, julgam que não deveria ter concedido tanto tempo à reforma sanitária e que a sua política de criação de empregos deixa a desejar. Dentre os tópicos aprovados pelo público no que concerne a atuação presidencial, acham-se o término da política de Bush de diminuir os impostos das classes mais ricas, e a proposta de eliminação das restrições para a participação de gays nas forças armadas.
A par disso, diante do óbvio desafio que representam as próximas eleições congressuais intermediárias para a atual maioria do Partido Democrata, a pesquisa fornece a indicação de que o Presidente e seu Partido não deveriam apresentá-las para o eleitorado como se fora um referendo, e sim como uma escolha entre o approach democrata para os problemas nacionais e aquele dos republicanos. A fundamentação de tal estratégia está na circunstância de que as soluções preconizadas pelos democratas têm o apoio da maioria.
Até novembro ainda há muito chão a ser percorrido. Não é muito provável – depois da débacle em Massachusetts – que a Reforma da Saúde possa ser transformada em lei. Não obstante, afigura-se indispensável que o Presidente Obama transmita imagem de liderança mais segura, e que não haja maiores altercações entre os principais líderes do partido.
Se se confirmar um eventual clima conflitivo no Partido Democrata – como manifestações de insatisfação crescente da Speaker Nancy Pelosi com a orientação presidencial - isso transmitiria para a opinião pública visão negativa, que em nada contribuiria para as perspectivas democratas de superar o desafio dos comícios de novembro próximo.
( Fonte: International Herald Tribune )
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010
A Prisão do Governador Arruda
A importância da prisão de Arruda, no contexto do combate à corrupção no Brasil, não pode ser minimizada. O governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, se entregou ontem à tardinha, à Polícia Federal, após ter decretada a sua prisão preventiva pelo Superior Tribunal de Justiça, por doze votos a dois, pela acusação de tentar subornar uma testemunha.
O advogado do Governador entrou com recurso ao Supremo Tribunal Federal, com pedido de habeas corpus.
Ao ser inteirado, o Presidente Lula ficou abalado. Segundo um assessor, ele lamentou que “o escândalo tenha chegado a esse ponto”, desfecho este que na sua avaliação não contribui para a “consciência política nacional”.
O escândalo em apreço, descoberto em 27 de novembro último, patenteou o grande envolvimento de toda a cúpula do Governo Arruda com o chamado ‘mensalão do DEM’. A maioria da Câmara Distrital está implicada no escândalo, muitos dos deputados tendo sido filmados recebendo o dinheiro desta nova versão do mensalão.
A aparente blindagem da Câmara Distrital para julgar com isenção o pedido de impeachment do Governador, bem como tentativa documentada deste de tentar subornar testemunha, motivaram a Ação do Ministério Público, agora acolhida pelo STJ.
É a primeira vez na história da República que um Governador em funções é preso preventivamente. O seu substituto imediato, o Vice-Governador Paulo Octavio, também está implicado no escândalo.
O Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, requereu outrossim ao Supremo Tribunal Federal a intervenção federal no DF.
Não é provável que o STF tome conhecimento desse requerimento senão depois do carnaval.
Entrementes, o Ministro Marco Aurélio Mello examina o pedido de habeas corpus do Governador.
O advogado do Governador entrou com recurso ao Supremo Tribunal Federal, com pedido de habeas corpus.
Ao ser inteirado, o Presidente Lula ficou abalado. Segundo um assessor, ele lamentou que “o escândalo tenha chegado a esse ponto”, desfecho este que na sua avaliação não contribui para a “consciência política nacional”.
O escândalo em apreço, descoberto em 27 de novembro último, patenteou o grande envolvimento de toda a cúpula do Governo Arruda com o chamado ‘mensalão do DEM’. A maioria da Câmara Distrital está implicada no escândalo, muitos dos deputados tendo sido filmados recebendo o dinheiro desta nova versão do mensalão.
A aparente blindagem da Câmara Distrital para julgar com isenção o pedido de impeachment do Governador, bem como tentativa documentada deste de tentar subornar testemunha, motivaram a Ação do Ministério Público, agora acolhida pelo STJ.
É a primeira vez na história da República que um Governador em funções é preso preventivamente. O seu substituto imediato, o Vice-Governador Paulo Octavio, também está implicado no escândalo.
O Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, requereu outrossim ao Supremo Tribunal Federal a intervenção federal no DF.
Não é provável que o STF tome conhecimento desse requerimento senão depois do carnaval.
Entrementes, o Ministro Marco Aurélio Mello examina o pedido de habeas corpus do Governador.
A Violenta Repressão no Irã
Poderá ter sido uma vitória de Pirro no Irã para as forças do Ayatollah Ali Khamenei. Em táticas de regime acuado, mas que ainda dispõe de recursos consideráveis, no Dia da Revolução Islâmica, o regime clerical conseguiu evitar que surgissem nas ruas as multidões de jornadas anteriores, como no de Ashura e no dos Mártires Estudantes.
Como referi no blog precedente – O Estado Policial dos Ayatollahs, de dez do corrente - além da intimidação generalizada, a situação procedera a uma série de prisões, em aparência indiscriminadas, posto que dirigidas para desmantelar a capacidade de organização do movimento oposicionista.
Assim, nos parcos relatos de testemunhas disponíveis– os poucos repórteres estrangeiros autorizados foram confinados na praça Azadi (da Liberdade), onde trascorria a manifestação governamental - o número de policiais e da milícia basij era enorme. Com essa articulação repressiva – que chegou ao quase linchamento da esposa de Mir Houssein Moussavi, Zahra Rahnavard, de 65 anos. Atacada pelos beleguins basij, sofreu bastonadas na cabeça e nas costas, e teve de ser retirada às pressas por simpatizantes do movimento verde.
Também os líderes Moussavi e Mehdi Karroubi foram impedidos de chegar ao centro da cidade. O carro de Karroubi foi atacado e teve as vidraças quebradas. A passagem deste para outro carro não logrou evitar a continuada repressão. Karroubi sofreu queimaduras no rosto pelo gás lacrimogêneo. Por outro lado, a viatura do ex-presidente reformista Mohamed Khatami foi igualmente investida.
Com vistas a dificultar os contatos do movimento, houve interferência na internet, com a consequente lentidão. Dessarte, à preparação da véspera, com os costumeiros gritos oposicionistas dos terraços e telhados dos edifícios, clamando ‘morte ao ditador’ não se seguiu a confrontação nas ruas e praças, impedida pela maciça concentração dos destacamentos governistas.
Em mais uma indicação da considerável radicalização de parte da aliança de Khamenei com o Exército e a Polícia, os dois enforcamentos realizados às vésperas do Dia da Revolução, foram motivados pela acusação de ‘mohareb’ (inimigo de Deus), considerada a mais condenável ofensa na religião xiita e, por isso, passível de pena capital. Como disse um defensor dos infelizes justiciados, o regime se deve sentir muito acuado para recorrer a uma acusação tão grave do credo xiita. Não é preciso muito estudo de Freud para determinar a indireta confissão de temor e fraqueza que implica o recurso à penalidade tão extrema.
Conforme se depreende, a luta contra a ditadura clerical no Irã muito há de exigir da oposição reformista para o eventual sucesso do movimento. Apesar da ampla intimidação da resistência e do acirramento das táticas repressivas, as perspectivas indicam um longo combate com a vitória final da maioria do povo iraniano. Por mais violenta que seja a repressão, a história nos ensina que as tiranias não se eternizam, acabando por desmoronar como o castelo de cartas que são, pois, por mais que se empenhem na sua triste faina, jamais conseguirão dominar a revolta generalizada da população.
Os fuzis admitem muitos empregos, menos sentar-se sobre eles. Além disso, não se deve esquecer que são homens aqueles que os manejam. Eis as duas principais fraquezas que respondem pelo destino final de todas as ditaduras.
( Fontes : O Globo e CNN )
Como referi no blog precedente – O Estado Policial dos Ayatollahs, de dez do corrente - além da intimidação generalizada, a situação procedera a uma série de prisões, em aparência indiscriminadas, posto que dirigidas para desmantelar a capacidade de organização do movimento oposicionista.
Assim, nos parcos relatos de testemunhas disponíveis– os poucos repórteres estrangeiros autorizados foram confinados na praça Azadi (da Liberdade), onde trascorria a manifestação governamental - o número de policiais e da milícia basij era enorme. Com essa articulação repressiva – que chegou ao quase linchamento da esposa de Mir Houssein Moussavi, Zahra Rahnavard, de 65 anos. Atacada pelos beleguins basij, sofreu bastonadas na cabeça e nas costas, e teve de ser retirada às pressas por simpatizantes do movimento verde.
Também os líderes Moussavi e Mehdi Karroubi foram impedidos de chegar ao centro da cidade. O carro de Karroubi foi atacado e teve as vidraças quebradas. A passagem deste para outro carro não logrou evitar a continuada repressão. Karroubi sofreu queimaduras no rosto pelo gás lacrimogêneo. Por outro lado, a viatura do ex-presidente reformista Mohamed Khatami foi igualmente investida.
Com vistas a dificultar os contatos do movimento, houve interferência na internet, com a consequente lentidão. Dessarte, à preparação da véspera, com os costumeiros gritos oposicionistas dos terraços e telhados dos edifícios, clamando ‘morte ao ditador’ não se seguiu a confrontação nas ruas e praças, impedida pela maciça concentração dos destacamentos governistas.
Em mais uma indicação da considerável radicalização de parte da aliança de Khamenei com o Exército e a Polícia, os dois enforcamentos realizados às vésperas do Dia da Revolução, foram motivados pela acusação de ‘mohareb’ (inimigo de Deus), considerada a mais condenável ofensa na religião xiita e, por isso, passível de pena capital. Como disse um defensor dos infelizes justiciados, o regime se deve sentir muito acuado para recorrer a uma acusação tão grave do credo xiita. Não é preciso muito estudo de Freud para determinar a indireta confissão de temor e fraqueza que implica o recurso à penalidade tão extrema.
Conforme se depreende, a luta contra a ditadura clerical no Irã muito há de exigir da oposição reformista para o eventual sucesso do movimento. Apesar da ampla intimidação da resistência e do acirramento das táticas repressivas, as perspectivas indicam um longo combate com a vitória final da maioria do povo iraniano. Por mais violenta que seja a repressão, a história nos ensina que as tiranias não se eternizam, acabando por desmoronar como o castelo de cartas que são, pois, por mais que se empenhem na sua triste faina, jamais conseguirão dominar a revolta generalizada da população.
Os fuzis admitem muitos empregos, menos sentar-se sobre eles. Além disso, não se deve esquecer que são homens aqueles que os manejam. Eis as duas principais fraquezas que respondem pelo destino final de todas as ditaduras.
( Fontes : O Globo e CNN )
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