Foi-se o tempo do dever de casa bem feito nas contas públicas. Há mais de ano o que se assiste são tentativas de compor fachadas que mascarem a real situação. O superavit primário – diferença entre receitas e despesas, antes dos gastos com os juros da dívida – despencou para R$ 1,430 bilhão. Na verdade, o Governo Central (Governo Federal, Banco Central e INSS) teve um déficit de R$1,431 bilhão, compensado pelos superavits dos governos regionais (R$ 1,469 bilhão) e Empresas estatais (R$1,392 bilhão).
Outro aspecto caracterizado como positivo, foi o desempenho da Dívida Pública líquida. Não obstante haver aumentado o endividamento entre abril e maio – de R$ 1,370 trilhão para 1,371 trilhão, a relação dívida/PIB caíu de 41,8% para 41,4%.
O bom comportamento da dívida pública líquida se deve, no entanto, mais a fatores estranhos à economia para pagar juros, notadamente a reavaliação do PIB do primeiro trimestre, além da apreciação do real – que reduz a despesa com a parcela da dívida externa.
Dentre os fatores negativos, está a inchação da dívida bruta, que passa de 59,9% do PIB em março para 60,1% em maio. Assinale-se que tem contribuído para esse incremento o iterado recurso da Administração Lula às chamadas capitalizações dos bancos estatais (BNDES), o que aumenta o endividamento público. As ditas capitalizações têm sido preferidas pelo governo, por não serem incluídas na dívida líquida e por conseguinte mascararem a real situação da dívida.
Outra oportunidade perdida no sentido da regularização da situação fiscal é decorrente das políticas clientelísticas e assistencialistas da presente Administração. Na verdade, fundando-se no incremento do PIB, com o consequente aumento da arrecadação, o governo Lula optou por despesas oportunistas como a elevação dos gastos correntes e dos quadros de pessoal funcional, ao invés de proceder a reformas para lidar com o déficit do INSS, e de empregar os maiores recursos disponíveis em investimentos. Tampouco se pensou em reduzir a carga tributária, nem a dívida pública.
Ora, a inchação do funcionalismo – e a criação de ‘carreiras’ para categorias subalternas – assim como os gastos correntes têm um preço que vai além dos dispêndios pontuais. Essas despesas não são flexíveis, não podendo sofrer reajustes para baixo. Se a curva do crescimento econômico tiver inflexão para menos, serão os investimentos na infraestrutura e no âmbito social que terão de ser reduzidos, dada a inflexibilidade dos gastos correntes e de pessoal.
Dessarte, dada a natureza conjuntural dos instrumentos utilizados pela atual Administração na política de redução da dívida – ela só se baseia no crescimento vegetativo da economia e não em medidas fiscais – a tendência progressiva dessa trajetória é, na verdade, ilusória, pelo simples fato de que não é sustentável a médio e longo prazos.
Tenho por vezes utilizado a símile dos chamados comunicados da OKW (do Comando Supremo da Wehrmacht), quando se iniciou a fase derradeira da 2ª. Guerra Mundial, com o contínuo recuo das forças nazistas diante dos aliados. A linguagem dos comunicados passou a ser instrumento para mascarar a realidade, que era a da retirada e crescente inferioridade estratégica da Alemanha de então no quadro do conflito. Como todo o exercício de dissimulação, tem fôlego curto e nenhum efeito sobre a efetiva realidade.
Não creio que seja modelo a ser imitado.
( Fonte: O Globo )
Rodapé da Copa
Afinal ganhamos, neste feriadão virtual da Copa do Mundo, dois dias sem nenhuma partida. Nada contra os jogos – que às vezes abusam da mediocridade como o 0x0 de Paraguai e Japão, no tempo regulamentar e na prorrogação – mas um certo descanso no falatório inconsequente dos locutores é mais do que merecido. Achei, a respeito, oportuna a crítica de Artur Xexéo quanto ao exagero das estatística pelos locutores. O antigo privilégio compulsivo de Galvão Bueno parece que se alastrou, a ponto de nos virem com estatísticas como a de Casagrande – ‘quando a Holanda não é eliminada ela geralmente chega à final’. Como assinala Xexéo, também outros países tendem a ser finalistas quando não forem eliminados...
Aliás a menção de Casagrande me recorda um dos mistérios não respondidos da presente Copa. Reporto-me à barração de Falcão da equipe global que foi à Africa do Sul. Nada contra Casa Grande e Júnior, mas dá pra desconfiar dos motivos da ausência do craque Falcão. Por que será que o aparentemente deferente Galvão Bueno fez perguntas sobre o jogo do Brasil a Falcão, que assistia do telão o jogo, e não aos seus coleguinhas distinguidos pela viagem e os uniformes globais ?
Quanto às oito equipes que sobreviveram na Copa, há poucas surpresas. Gana tem apresentado um bom futebol – decerto o mais objetivo entre os africanos – e por isso merece a representação do Continente. Quanto às demais seleções, todas podem ser imaginadas na final do dia onze de julho, com a única exceção do Paraguai. A sua eventual vitória sobre a Espanha seria uma zebra equipolente àquela do triunfo da Suiça sobre a Fúria.
No que concerne ao Brasil, em especial, às partidas com a Holanda são sempre difíceis. Nisso estamos de acordo com o Dunga.
quarta-feira, 30 de junho de 2010
terça-feira, 29 de junho de 2010
Lições da Lei da Ficha Limpa
Talvez a mais importante legislação aprovada por esta legislatura seja a chamada Lei da Ficha Limpa. Tão logo sancionada e promulgada, a antiga P.L.P. 518/09 começa a produzir efeitos moralizadores e profiláticos.
A tal propósito, parece apropriado analisar-lhe o processo de criação, os seus primeiros resultados e as ilações que desde já podem ser dela elaboradas.
Dentre os institutos consagrados pela Constituição de 5 de outubro de 1988, a Constituição Cidadã, quiçá o da iniciativa popular de leis represente um dos mais benéficos.
Nesse particular, o projeto de lei preparado pelo Movimento contra a Corrupção Eleitoral nos ensina tópicos que não devem ser esquecidos: tais projetos, se consubstanciam aspirações de largos segmentos da opinião pública, se são adequadamente redigidos, e se são apresentados no momento político apropriado, tais projetos, repito, reunirão condições bastante fortes de serem aprovados pelo Congresso.
Com efeito, a própria tramitação da PLP 518 veio demonstrar a eficácia do atendimento de tais requisitos. A reticência – que disfarçava a má-vontade – do Presidente da Câmara na audiência concedida à comissão do MCCE, já assinalava dois traços que acompanhariam toda a progressão desse projeto da sociedade:(i) a surda oposição de grande número de congressistas e (ii) o desafio colocado pela iniciativa, diante da proximidade das eleições legislativas.
Essa oposição se traduziria nos intentos do colégio de líderes da Câmara de engavetar o projeto. Incrementada a pressão, se transigiu em permitir-lhe a tramitação, enquanto se buscou desvirtuar a PLP 518. Nas modificações introduzidas pelo substitutivo, no entanto, a mais importante elevou para os condenados em segunda instância a exclusão do processo eleitoral, o que atendia ao reparo feito pelo Deputado Michel Temer, quando da solene entrega do projeto. Por outro lado, essas emendas não lograriam deturpar o escopo precípuo da legislação.
A principal lição a ser colhida da aprovação da Lei da Ficha Limpa é que o conduto dos projetos de lei de iniciativa popular, se utilizado em conformidade com os requisitos políticos acima discriminados, deve continuar a ser empregado para os temas de maior consenso de opinião pública e que dificilmente terão condições de se transformarem em lei, se deixados à exclusiva iniciativa de deputados e senadores.
A Lei da Ficha Limpa demonstra que pode ser aprovado pelas Câmaras um projeto, mesmo contra a vontade das bancadas, desde que a opinião pública torne inequívoco o respectivo respaldo, assim como o desgaste na eventual recusa seja potencialmente demasiado, a ponto de levar Suas Excelências a votarem com patética unanimidade o que jamais sufragariam se consultado o respectivo interesse.
Corolário da assertiva acima, outra falácia que a promulgação da Lei da Ficha Limpa dissipou foi a tentativa de desmerecer da força da opinião pública, que se buscara escarnecer na expressão opinião publicada. Na sua especiosa restrição é uma corrente auxiliar de os que dizem lixar-se para a dita opinião pública.
Com a sábia aprovação pelo Tribunal Superior Eleitoral da imediata vigência da lei, assim como a correta interpretação de sua abrangência, os objetivos da Lei principiam a ser preenchidos, escoimando das listas eleitorais aqueles candidatos com a ficha suja. É importante evitar que firulas jurídicas – consubstanciadas em eventuais liminares – venham a dar sobrevida legislativa para a triste fauna que há de constranger as convenções partidárias, para lograr obter o ambicionado ingresso aos comícios de três de outubro.
Para tanto, o instituto legal carecerá sempre da ajuda dos veículos de opinião, a fim de alertar a sociedade e os juízes competentes, das tentativas de concorrer às eleições por aqueles elementos que intentam eludir a proibição que sobre eles recai. Mal sabem eles que a Lei da Ficha Limpa é a nova face de um antigo flagelo para os inimigos do Estado – o Ostracismo da democracia ateniense.
A tal propósito, parece apropriado analisar-lhe o processo de criação, os seus primeiros resultados e as ilações que desde já podem ser dela elaboradas.
Dentre os institutos consagrados pela Constituição de 5 de outubro de 1988, a Constituição Cidadã, quiçá o da iniciativa popular de leis represente um dos mais benéficos.
Nesse particular, o projeto de lei preparado pelo Movimento contra a Corrupção Eleitoral nos ensina tópicos que não devem ser esquecidos: tais projetos, se consubstanciam aspirações de largos segmentos da opinião pública, se são adequadamente redigidos, e se são apresentados no momento político apropriado, tais projetos, repito, reunirão condições bastante fortes de serem aprovados pelo Congresso.
Com efeito, a própria tramitação da PLP 518 veio demonstrar a eficácia do atendimento de tais requisitos. A reticência – que disfarçava a má-vontade – do Presidente da Câmara na audiência concedida à comissão do MCCE, já assinalava dois traços que acompanhariam toda a progressão desse projeto da sociedade:(i) a surda oposição de grande número de congressistas e (ii) o desafio colocado pela iniciativa, diante da proximidade das eleições legislativas.
Essa oposição se traduziria nos intentos do colégio de líderes da Câmara de engavetar o projeto. Incrementada a pressão, se transigiu em permitir-lhe a tramitação, enquanto se buscou desvirtuar a PLP 518. Nas modificações introduzidas pelo substitutivo, no entanto, a mais importante elevou para os condenados em segunda instância a exclusão do processo eleitoral, o que atendia ao reparo feito pelo Deputado Michel Temer, quando da solene entrega do projeto. Por outro lado, essas emendas não lograriam deturpar o escopo precípuo da legislação.
A principal lição a ser colhida da aprovação da Lei da Ficha Limpa é que o conduto dos projetos de lei de iniciativa popular, se utilizado em conformidade com os requisitos políticos acima discriminados, deve continuar a ser empregado para os temas de maior consenso de opinião pública e que dificilmente terão condições de se transformarem em lei, se deixados à exclusiva iniciativa de deputados e senadores.
A Lei da Ficha Limpa demonstra que pode ser aprovado pelas Câmaras um projeto, mesmo contra a vontade das bancadas, desde que a opinião pública torne inequívoco o respectivo respaldo, assim como o desgaste na eventual recusa seja potencialmente demasiado, a ponto de levar Suas Excelências a votarem com patética unanimidade o que jamais sufragariam se consultado o respectivo interesse.
Corolário da assertiva acima, outra falácia que a promulgação da Lei da Ficha Limpa dissipou foi a tentativa de desmerecer da força da opinião pública, que se buscara escarnecer na expressão opinião publicada. Na sua especiosa restrição é uma corrente auxiliar de os que dizem lixar-se para a dita opinião pública.
Com a sábia aprovação pelo Tribunal Superior Eleitoral da imediata vigência da lei, assim como a correta interpretação de sua abrangência, os objetivos da Lei principiam a ser preenchidos, escoimando das listas eleitorais aqueles candidatos com a ficha suja. É importante evitar que firulas jurídicas – consubstanciadas em eventuais liminares – venham a dar sobrevida legislativa para a triste fauna que há de constranger as convenções partidárias, para lograr obter o ambicionado ingresso aos comícios de três de outubro.
Para tanto, o instituto legal carecerá sempre da ajuda dos veículos de opinião, a fim de alertar a sociedade e os juízes competentes, das tentativas de concorrer às eleições por aqueles elementos que intentam eludir a proibição que sobre eles recai. Mal sabem eles que a Lei da Ficha Limpa é a nova face de um antigo flagelo para os inimigos do Estado – o Ostracismo da democracia ateniense.
segunda-feira, 28 de junho de 2010
O Escândalo das Arbitragens
As duas oitavas de final de ontem vieram corroborar, uma vez mais nesta Copa do Mundo, inquietante característica deste torneio. A má qualidade das arbitragens tem sido uma constante na Copa da África do Sul. Esse peculiar traço, no entanto, é muitas vezes acompanhado por consequência ainda mais grave: os grosseiros erros dos juízes não constituem apenas lamentáveis ocorrências, condenáveis pelos intrínsecos defeitos. Na verdade, através de suas decisões equivocadas, os árbitros aparecem como agentes determinantes dos respectivos resultados.
As duas partidas de ontem evidenciam esta falha gritante do certamen da FIFA. No jogo Alemanha x Inglaterra, o juiz uruguaio Jorge Larrionda não validou o gol do inglês Lampard, que, sob os olhos do goleiro alemão, cruzara a meta em 36 cm. Por sua vez, em Argentina x Alemanha, o primeiro gol argentino, de Tevez, foi em flagrante impedimento, não marcado pelo italiano Roberto Rosetti.
Mas o mal que os senhores árbitros – e os inúteis bandeirinhas – cometeram não foram atos apenas censuráveis, porém sem ulteriores consequências. Com efeito, Larrionda impediu que a Inglaterra empatasse em 2x2 o embate com a Alemanha, e, por seu lado, validando o ilegal gol argentino, Rosetti deu senhora ajuda à esquadra de Maradona. Até aquele momento era o México e não a Argentina que mais ameaçava o arco adversário. Além disso, dando injusta vantagem para os portenhos, Sua Senhoria Rosetti deu marcada contribuição para desestruturar emocionalmente o time mexicano, como qualquer assistente da partida pôde amplamente verificar.
O próprio semblante do juiz italiano Roberto Rosetti nos minutos seguintes ao gol em flagrante impedimento poderia ser arrolado, se a matéria fosse revista em corte desportiva, como prova indicial do descomunal erro do bandeirinha Stefano Ayroldi, por ele avalizado. Acossado pelos jogadores mexicanos que reclamavam da injustiça, no seu rosto não se lia a certeza de decisão inconteste, mas a ânsia de quem se apressara em confirmar a falha do companheiro de equipe arbitral, e que agora não tinha a coragem de rever o açodado gesto.
O jornal O Globo relacionou seis clamorosos erros arbitrais nesse Mundial, todos eles com influência direta no resultado final da partida. Por ora, o Brasil está entre os ‘beneficiados’ por esta característica melancólica (o braço de Luis Fabiano utilizado impunemente no segundo gol contra a Costa do Marfim, não visto pelo francês Stéphane Lannoy).
São os juízes os principais responsáveis por tais situações ? A resposta é não. A FIFA de Sepp Blattner tem mantido, por intermédio de sua Comissão arbitral, postura que pode ser interpretada, ou como a encarnação da ineficiência do personagem Mr. Magoo, ou a negativa de valer-se da tecnologia para contrabalançar o poder discricionário dos juízes.
Qualquer pessoa com mínima noção da progressão do conhecimento tem elementos para prever qual será o lado vencedor nesta contenda. A asserção do monge Roger Bacon de que conhecimento é poder, tem aqui o seu corolário de que também o é a negação do conhecimento.
É óbvia que tal posição retrógrada e epimeteica da Fifa será descartada mais dia, menos dia. Já se sabe que através de um chip se pode determinar se a bola cruzou ou não a linha de gol e de fundo. A International Board – composta de quatro membros da Fifa e de quatro britânicos[1] - pode mudar a regra por maioria de seis votos e é de todo interesse que assim proceda.
Dado o caráter falível do julgamento de árbitros e bandeirinhas – como esse Mundial semelha desejar realçar ao extremo – é mais do que oportuno abandonar anacrônicas resistências contra a tecnologia e dela valer-se para que ganhe o esporte e sobretudo a lisura de seus resultados.
Que Dunga venha a campo favorecer a posição tradicional, não surpreende. Mas o senhor Joseph Blattner não poderia continuar a omitir-se diante de crassos e evitáveis erros de arbitragem. Não se trata apenas de obstaculizar a atuação do quarto árbitro, a quem até se proibiu de valer-se de um aparelho de televisão.
É preciso escancarar a porta para valorizar o acerto e não o erro, a realidade e não o que passa na cabeça de um juiz e/ou bandeirinha. A sua presença continua a ser necessária, mas, no próprio interesse deles, carece de ser apoiada pelos modernos recursos da tecnologia. Há 44 anos atrás, a discussão ainda era cabível se o gol dos ingleses (contra os alemães) em Wembley existira ou não. Hoje em dia, tornar possível a coonestação de decisões erradas, só pode ser atribuído à eventual aliança da burrice retrógrada com interesses inconfessáveis de preservação de poder.
Está escrito em letras garrafais nas paredes dos estádios que a tola onipotência dos juízes (e ineptos bandeirinhas) tem os dias contados. Senhor Blattner, mostre, por uma vez , ideia de grandeza e abra portas e janelas para a justiça tecnológica nos campos do velho esporte bretão.
(Fonte: O Globo )
[1] Representantes das Associações pioneiras do esporte – Inglaterra, Escócia, Irlanda e País de Gales.
As duas partidas de ontem evidenciam esta falha gritante do certamen da FIFA. No jogo Alemanha x Inglaterra, o juiz uruguaio Jorge Larrionda não validou o gol do inglês Lampard, que, sob os olhos do goleiro alemão, cruzara a meta em 36 cm. Por sua vez, em Argentina x Alemanha, o primeiro gol argentino, de Tevez, foi em flagrante impedimento, não marcado pelo italiano Roberto Rosetti.
Mas o mal que os senhores árbitros – e os inúteis bandeirinhas – cometeram não foram atos apenas censuráveis, porém sem ulteriores consequências. Com efeito, Larrionda impediu que a Inglaterra empatasse em 2x2 o embate com a Alemanha, e, por seu lado, validando o ilegal gol argentino, Rosetti deu senhora ajuda à esquadra de Maradona. Até aquele momento era o México e não a Argentina que mais ameaçava o arco adversário. Além disso, dando injusta vantagem para os portenhos, Sua Senhoria Rosetti deu marcada contribuição para desestruturar emocionalmente o time mexicano, como qualquer assistente da partida pôde amplamente verificar.
O próprio semblante do juiz italiano Roberto Rosetti nos minutos seguintes ao gol em flagrante impedimento poderia ser arrolado, se a matéria fosse revista em corte desportiva, como prova indicial do descomunal erro do bandeirinha Stefano Ayroldi, por ele avalizado. Acossado pelos jogadores mexicanos que reclamavam da injustiça, no seu rosto não se lia a certeza de decisão inconteste, mas a ânsia de quem se apressara em confirmar a falha do companheiro de equipe arbitral, e que agora não tinha a coragem de rever o açodado gesto.
O jornal O Globo relacionou seis clamorosos erros arbitrais nesse Mundial, todos eles com influência direta no resultado final da partida. Por ora, o Brasil está entre os ‘beneficiados’ por esta característica melancólica (o braço de Luis Fabiano utilizado impunemente no segundo gol contra a Costa do Marfim, não visto pelo francês Stéphane Lannoy).
São os juízes os principais responsáveis por tais situações ? A resposta é não. A FIFA de Sepp Blattner tem mantido, por intermédio de sua Comissão arbitral, postura que pode ser interpretada, ou como a encarnação da ineficiência do personagem Mr. Magoo, ou a negativa de valer-se da tecnologia para contrabalançar o poder discricionário dos juízes.
Qualquer pessoa com mínima noção da progressão do conhecimento tem elementos para prever qual será o lado vencedor nesta contenda. A asserção do monge Roger Bacon de que conhecimento é poder, tem aqui o seu corolário de que também o é a negação do conhecimento.
É óbvia que tal posição retrógrada e epimeteica da Fifa será descartada mais dia, menos dia. Já se sabe que através de um chip se pode determinar se a bola cruzou ou não a linha de gol e de fundo. A International Board – composta de quatro membros da Fifa e de quatro britânicos[1] - pode mudar a regra por maioria de seis votos e é de todo interesse que assim proceda.
Dado o caráter falível do julgamento de árbitros e bandeirinhas – como esse Mundial semelha desejar realçar ao extremo – é mais do que oportuno abandonar anacrônicas resistências contra a tecnologia e dela valer-se para que ganhe o esporte e sobretudo a lisura de seus resultados.
Que Dunga venha a campo favorecer a posição tradicional, não surpreende. Mas o senhor Joseph Blattner não poderia continuar a omitir-se diante de crassos e evitáveis erros de arbitragem. Não se trata apenas de obstaculizar a atuação do quarto árbitro, a quem até se proibiu de valer-se de um aparelho de televisão.
É preciso escancarar a porta para valorizar o acerto e não o erro, a realidade e não o que passa na cabeça de um juiz e/ou bandeirinha. A sua presença continua a ser necessária, mas, no próprio interesse deles, carece de ser apoiada pelos modernos recursos da tecnologia. Há 44 anos atrás, a discussão ainda era cabível se o gol dos ingleses (contra os alemães) em Wembley existira ou não. Hoje em dia, tornar possível a coonestação de decisões erradas, só pode ser atribuído à eventual aliança da burrice retrógrada com interesses inconfessáveis de preservação de poder.
Está escrito em letras garrafais nas paredes dos estádios que a tola onipotência dos juízes (e ineptos bandeirinhas) tem os dias contados. Senhor Blattner, mostre, por uma vez , ideia de grandeza e abra portas e janelas para a justiça tecnológica nos campos do velho esporte bretão.
(Fonte: O Globo )
[1] Representantes das Associações pioneiras do esporte – Inglaterra, Escócia, Irlanda e País de Gales.
domingo, 27 de junho de 2010
Colcha de Retalhos XLVIII
A Valorização do Renminbi
Verifica-se agora que a declaração das autoridades chinesas, na semana passada, quanto a uma apreciação do renminbi, na verdade foi uma cortina de fumaça, com a intenção de diminuir a pressão sobre a China durante a reunião do G-20.
A decorrente variação do renminbi não atende ao que os Estados Unidos e outros países vem reclamando, no sentido de maior flexibilização da moeda chinesa. Trata-se, como assinala Paul Krugman, de um eufemismo dos americanos, pois o que se deseja é uma apreciação substancial do renminbi.
Ao invés, observou-se apenas uma oscilação de 0,5% no valor da moeda chinesa, o que não satisfaz às colocações das autoridades financeiras estadunidenses.
Como se sabe, o renminbi depreciado afeta negativamente o intercâmbio. Por seu baixo nível artificial torna mais baratos os produtos chineses, contribuindo, portanto, para inchar os saldos favoráveis na balança comercial. O efeito compensador dessa compressão do valor do yuan chinês é o de tornar para o comprador chinês mais caro o artigo estrangeiro, o que trabalha para reduzir as importações, e, por conseguinte, incrementar ainda mais o saldo da balança comercial.
Como logra o Banco Central Chinês manipular as operações de câmbio de modo a controlar a tendência normal do renminbi, que seria a de valorizar-se. Como assinala Paul Krugman, a política cambial da RPC não é nem complexa, nem sem precedente, salvo obviamente os montantes envolvidos. Como refere, é um clássico exemplo de um governo manter artificialmente baixo o valor de sua moeda, através de vendas de lotes maciços de renminbi, conjugado com a compra de divisas estrangeiras.
A política cambial intervencionista da China se vê facilitada, outrossim, pelas restrições existentes naquele mercado financeiro à movimentação de fundos tanto para dentro quanto para fora do país. Tais controles permitem que a intervenção estatal possa dominar o mercado cambial.
Se preciso fosse, o acúmulo de reservas pelo Banco Central chinês é a prova da realização de tal prática. Atualmente, a China detém um equivalente superior a mais de dois trilhões de dólares, distribuídos em dólares, euros e outras divisas estrangeiras.
Até o presente, as pressões americanas tem sido sobretudo verbais, mas o descontentamento com essa distorção do comércio exterior vem provocando uma irritação crescente também no Congresso americano. Por isso, as pressões tendem a exacerbar-se e podem evoluir para outras medidas, o que tem sido evitado até o momento.
Todavia a paciência das autoridades financeiras diminui e a sobrevida do renminbi nos níveis artificialmente baixos do presente pode não ser tão longa.
A Copa do Mundo entra nas oitavas de final
Os dezesseis países que compõem o turno das oitavas de final da Copa já mostram aspectos relevantes: a presença de cinco países sul-americanos (Brasil, Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai), dois norte-americanos (Estados Unidos e México), dois asiáticos (Coreia do Sul e Japão), apenas um africano (Gana) e seis europeus (Alemanha, Inglaterra, Holanda, Espanha, Portugal e Eslováquia).
Vê-se, portanto, que a presença do futebol latino-americano se iguala à europeia. Por sua vez, a África comparece com apenas um representante, tendo inclusive o anfitrião – a África do Sul – sido eliminado na primeira fase, o que é um desenvolvimento inédito.
Talvez as ausências dentre esse grupo que entra na fase de partidas eliminatórias mereçam ainda mais atenção. A atual campeã, a Itália, e a vice-campeã, a França, já foram eliminadas do torneio. Dentre os países havidos como favoritos, quer as seleções que ostentam títulos mundiais (Brasil, Alemanha, Argentina e Uruguai), quer a Espanha e a Holanda, a sua maior distribuição para a chave inferior tende a torná-la teoricamente mais difícil (Argentina, Alemanha, Inglaterra e Espanha), em comparação com a superior (Uruguai, Holanda e Brasil).
De resto, no sábado 26, com a eliminação da Coreia do Sul pelo Uruguai (2x1) e dos Estados Unidos por Gana (também por 2x1, mas necessitando prorrogação) já se entrou nas oitavas de final. O continente africano continua presente, e o Uruguai também. Nesse particular, cabe mencionar a recuperação tanto da Celeste, quanto da equipe portenha. Depois de medíocre campanha nas eliminatórias – a Argentina só se classificou na última partida contra o Uruguai, e este necessitou de disputar a vaga suplementar – ambas as seleções melhoraram muito o seu jogo.
Quanto a prognósticos, não é tarefa aconselhável dadas as características do futebol. O Brasil de Dunga segue em frente, com as dificuldades naturais causadas pelas decisões soberanas do técnico de, em privilégio de um mítico grupo, enfraquecer o potencial técnico da seleção. A suspensão de Kaká e a sua substituição pelo esforçado volante Júlio Batista mostrou as limitações de tal peculiar orientação do técnico Dunga. Enquanto as demais equipes cuidaram de levar os melhores para a África do Sul, o nosso técnico se mostrou bastante restritivo neste enfoque. Esperemos, no entanto, que, mesmo com o plantel existente, a meta do Hexa possa ainda ser alcançada.
( Fonte: International Herald Tribune )
Verifica-se agora que a declaração das autoridades chinesas, na semana passada, quanto a uma apreciação do renminbi, na verdade foi uma cortina de fumaça, com a intenção de diminuir a pressão sobre a China durante a reunião do G-20.
A decorrente variação do renminbi não atende ao que os Estados Unidos e outros países vem reclamando, no sentido de maior flexibilização da moeda chinesa. Trata-se, como assinala Paul Krugman, de um eufemismo dos americanos, pois o que se deseja é uma apreciação substancial do renminbi.
Ao invés, observou-se apenas uma oscilação de 0,5% no valor da moeda chinesa, o que não satisfaz às colocações das autoridades financeiras estadunidenses.
Como se sabe, o renminbi depreciado afeta negativamente o intercâmbio. Por seu baixo nível artificial torna mais baratos os produtos chineses, contribuindo, portanto, para inchar os saldos favoráveis na balança comercial. O efeito compensador dessa compressão do valor do yuan chinês é o de tornar para o comprador chinês mais caro o artigo estrangeiro, o que trabalha para reduzir as importações, e, por conseguinte, incrementar ainda mais o saldo da balança comercial.
Como logra o Banco Central Chinês manipular as operações de câmbio de modo a controlar a tendência normal do renminbi, que seria a de valorizar-se. Como assinala Paul Krugman, a política cambial da RPC não é nem complexa, nem sem precedente, salvo obviamente os montantes envolvidos. Como refere, é um clássico exemplo de um governo manter artificialmente baixo o valor de sua moeda, através de vendas de lotes maciços de renminbi, conjugado com a compra de divisas estrangeiras.
A política cambial intervencionista da China se vê facilitada, outrossim, pelas restrições existentes naquele mercado financeiro à movimentação de fundos tanto para dentro quanto para fora do país. Tais controles permitem que a intervenção estatal possa dominar o mercado cambial.
Se preciso fosse, o acúmulo de reservas pelo Banco Central chinês é a prova da realização de tal prática. Atualmente, a China detém um equivalente superior a mais de dois trilhões de dólares, distribuídos em dólares, euros e outras divisas estrangeiras.
Até o presente, as pressões americanas tem sido sobretudo verbais, mas o descontentamento com essa distorção do comércio exterior vem provocando uma irritação crescente também no Congresso americano. Por isso, as pressões tendem a exacerbar-se e podem evoluir para outras medidas, o que tem sido evitado até o momento.
Todavia a paciência das autoridades financeiras diminui e a sobrevida do renminbi nos níveis artificialmente baixos do presente pode não ser tão longa.
A Copa do Mundo entra nas oitavas de final
Os dezesseis países que compõem o turno das oitavas de final da Copa já mostram aspectos relevantes: a presença de cinco países sul-americanos (Brasil, Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai), dois norte-americanos (Estados Unidos e México), dois asiáticos (Coreia do Sul e Japão), apenas um africano (Gana) e seis europeus (Alemanha, Inglaterra, Holanda, Espanha, Portugal e Eslováquia).
Vê-se, portanto, que a presença do futebol latino-americano se iguala à europeia. Por sua vez, a África comparece com apenas um representante, tendo inclusive o anfitrião – a África do Sul – sido eliminado na primeira fase, o que é um desenvolvimento inédito.
Talvez as ausências dentre esse grupo que entra na fase de partidas eliminatórias mereçam ainda mais atenção. A atual campeã, a Itália, e a vice-campeã, a França, já foram eliminadas do torneio. Dentre os países havidos como favoritos, quer as seleções que ostentam títulos mundiais (Brasil, Alemanha, Argentina e Uruguai), quer a Espanha e a Holanda, a sua maior distribuição para a chave inferior tende a torná-la teoricamente mais difícil (Argentina, Alemanha, Inglaterra e Espanha), em comparação com a superior (Uruguai, Holanda e Brasil).
De resto, no sábado 26, com a eliminação da Coreia do Sul pelo Uruguai (2x1) e dos Estados Unidos por Gana (também por 2x1, mas necessitando prorrogação) já se entrou nas oitavas de final. O continente africano continua presente, e o Uruguai também. Nesse particular, cabe mencionar a recuperação tanto da Celeste, quanto da equipe portenha. Depois de medíocre campanha nas eliminatórias – a Argentina só se classificou na última partida contra o Uruguai, e este necessitou de disputar a vaga suplementar – ambas as seleções melhoraram muito o seu jogo.
Quanto a prognósticos, não é tarefa aconselhável dadas as características do futebol. O Brasil de Dunga segue em frente, com as dificuldades naturais causadas pelas decisões soberanas do técnico de, em privilégio de um mítico grupo, enfraquecer o potencial técnico da seleção. A suspensão de Kaká e a sua substituição pelo esforçado volante Júlio Batista mostrou as limitações de tal peculiar orientação do técnico Dunga. Enquanto as demais equipes cuidaram de levar os melhores para a África do Sul, o nosso técnico se mostrou bastante restritivo neste enfoque. Esperemos, no entanto, que, mesmo com o plantel existente, a meta do Hexa possa ainda ser alcançada.
( Fonte: International Herald Tribune )
sábado, 26 de junho de 2010
Agressões contra o Meio Ambiente
O Japão e a Conferência da CIB
Terminou a reunião anual da Comissão Internacional da Baleia (CIB), realizada em Agadir, no Marrocos. Depois de tanto alarido e atitudes midiáticas, a conferência se conclui sob a habitual égide da transigência, que continua a permitir o cínico abate – sob o pretexto de uma suposta pesquisa científica - de trezentas baleias por ano pelos navios usina do Japão. No final desta seção, o blog transcreverá trechos do depoimento de Junichi Sato, diretor do programa da Greenpeace naquele país.
Se o chamado ‘pacotão’ (proposta da Presidência chilena que permitiria a retomada da caça comercial, de modo restrito, pelo Japão. por dez anos) não foi aprovado, o que é um resultado positivo, outra resolução vai na contramão do ambientalismo. As baleias-jubarte – que mal saíram da lista de espécie ameaçada de extinção – voltarão a ser caçadas (autorizado o abate de 27 delas no próximo triênio).
Tal decisão - que decorre de proposta dinamarquesa - foi aprovada, com a oposição dos países latinos, graças ao apoio concedido à Dinamarca pelo resto da União Européia e a tríade dos países caçadores.
Essa permissão foi concedida aos povos indígenas da Groenlândia, que é território sob administração da Dinamarca. Pelo visto, esse pequeno país escandinavo se associa aos baleeiros da Noruega, Islândia e Japão, eis que grande parte da carne de baleia caçada pelos aborígenes das costas da minguante Groenlândia vão parar nas mesas dos atuais sucessores de Babette nos restaurantes de ... Copenhague.
Apesar de todas as concessões oportunistas – inclusive a permanência da falsa caça científica patrocinada pelo Império do Sol Nascente – continuará de pé a moratória de 1986 à caça comercial.
Depoimento de Junichi Sato ( excertos )
“Embora Greenpeace não tenha apoiado a proposta ( da CIB), nós tínhamos esperado que ela mudaria para tornar-se um acordo para o fim da pesca da baleia, e não uma receita para continuá-la. Isso é especialmente desapontador para mim, porque o meu engajamento profissional para acabar com a caça às baleias em meu país, o Japão – o que levou à exposição de escândalo de apropriação indébita pela indústria baleeira – implicou em significativo sacrifício pessoal.
A investigação conduzida por mim e um colega, Toru Suzuki, levou à nossa prisão (...). As sedes do escritório de Greenpeace e de membros do plantel foram invadidas. 75 policiais participaram da operação para algemar dois pacíficos ativistas. Ficamos presos sem acusação formal por 23 dias; interrogados por até dez horas por dia, enquanto amarrados nas cadeiras e sem a presença de advogado. Estamos agora sob fiança, aguardando o veredito e a sentença, o que é esperado para os primeiros dias de setembro.
Se eu me aventuro a arriscar o meu futuro para terminar com a fraudulenta caça japonesa, se os denunciadores (whistle-blowers) se dispõem a pôr em risco suas vidas para tornar pública a corrupção, como é possível que a CIB tenha falhado mais uma vez ao não enfrentar o risco político de pressionar o governo japonês para pôr um fim na farsa da pesca científica da baleia ? (...) A Islândia e a Noruega simplesmente ignoram a moratória. Esses dois países, mais o Japão, mataram mais de trinta mil baleias desde 1986. Sempre me opus à caça pelo meu país, e esta é a razão pela qual decidi ingressar em Greenpeace. Se a caça à baleia é um tema político fora do Japão, interiormente mal causa uma marolinha política. Em 2006 Greenpeace decidiu focalizar no Japão a maior parte de sua campanha contra a caça baleeira, com vistas a melhor informar o público nipônico.
Totalmente financiado pelos contribuintes japoneses, o programa de caça à baleia não ensejou nenhuma pesquisa científica séria, que fosse acompanhada por pesquisadores independentes. O Japão tem sido repetidamente informado que a pretensa pesquisa não é necessária nem desejável. Tudo o que causou foi maciça conta para os contribuintes fiscais e toneladas de excesso de carne de baleia que o público japonês não quer comer. Também produziu infindáveis rumores e alegações de corrupção e de má administração.
Há dois anos atrás, seguindo uma dica de três antigos baleeiros transformados em denunciantes (whistle-blowers), eu e meus colegas de Greenpeace no Japão iniciamos uma investigação de interesse público (...). Todos os três baleeiros tinham afirmado que a carne de baleia era rotineiramente apropriada indebitamente, com o pleno conhecimento do governo e das autoridades encarregadas da operação da frota baleeira. Por fim, logramos interceptar uma caixa suspeita dentre uma centena delas, quando era descarregada dos navios. Conquanto o conteúdo constasse como papelão, continha 23,5 kg de carne de baleia de primeira qualidade, e se destinava a um endereço particular.
A cinco de maio de 2008, entregamos a citada caixa às autoridades, com a juntada de provas suplementares do crime. Inicialmente, o promotor distrital de Tóquio começou a investigar. Contudo, ao cabo fomos acusados de invasão de propriedade e de furto da carne de baleia, avaliada (...) em cerca de US$ 550.00. Estamos ameaçados de sofrermos pena de dezoito meses até dez anos na cadeia, por expor a verdade acerca de indústria que está financeiramente, moralmente, e cientificamente falida.
O Conselho sobre Detenções Arbitrárias da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas sentenciou que os nossos direitos humanos foram violados e que a acusação tem motivação política. A Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos expressou a sua preocupação acerca do caso. A Anistia Internacional, a Transparência Internacional, dois Prêmios Nobel da Paz, incontáveis expertos em legislação internacional, políticos e mais de meio milhão de indivíduos levantaram suas vozes contra a promotoria.
Seremos julgados e sentenciados em setembro, mais de dois anos depois de termos denunciado a corrupção. Mas o escândalo não fica por aqui. Só na semana passada, mais alegações surgiram sobre a compra de votos pelo Japão e suborno para manter a frota baleeira em operação. (...)”
A Maracutaia da Flexibilização das Encostas
Ontem a imprensa divulgou o plano da administração do Prefeito Eduardo Paes de modificar o Plano Diretor, para flexibilizar a ocupação de encostas no Rio de Janeiro.
Vestindo a habitual roupagem pseudo-ambientalista, os partidários dessa deformação urbanística desejam desvencilhar-se da atual legislação que impede a abertura de ruas por particulares para criar loteamentos acima de sessenta metros do nível do mar.
O relator na Câmara Municipal da proposição de Eduardo Paes, que é o vereador Roberto Monteiro, do chapa branca PCdoB, se manifesta favorável, a despeito da oposição de Aspásia Camargo, presidente da Comissão.
A emenda ao Plano Diretor suscitou repulsa em meios de especialistas. A esse respeito, a ex-procuradora geral do município, Sonia Rabelo de Castro, e a urbanista Vera Rezende, da Faculdade de Arquitetura da UFF, lançaram abaixo assinado virtual, endereçado à Comissão de Revisão do Plano Diretor, protestando contra o que reputam falta de transparência na tramitação do projeto. Até a noite de ontem, o grupo já havia coletado 140 assinaturas.
Semelha importante ter presente o que assinala a ex-secretária de Urbanismo Andrea Garcia Redondo: “A todo momento surgem novidades, como emendas fantasmas e agora a liberação da ocupação de encostas. Isso é um absurdo. Na hora em que se permite a abertura de ruas, será difícil conter a ocupação.”
( Fontes: CNN, Folha de S. Paulo e O Globo )
Terminou a reunião anual da Comissão Internacional da Baleia (CIB), realizada em Agadir, no Marrocos. Depois de tanto alarido e atitudes midiáticas, a conferência se conclui sob a habitual égide da transigência, que continua a permitir o cínico abate – sob o pretexto de uma suposta pesquisa científica - de trezentas baleias por ano pelos navios usina do Japão. No final desta seção, o blog transcreverá trechos do depoimento de Junichi Sato, diretor do programa da Greenpeace naquele país.
Se o chamado ‘pacotão’ (proposta da Presidência chilena que permitiria a retomada da caça comercial, de modo restrito, pelo Japão. por dez anos) não foi aprovado, o que é um resultado positivo, outra resolução vai na contramão do ambientalismo. As baleias-jubarte – que mal saíram da lista de espécie ameaçada de extinção – voltarão a ser caçadas (autorizado o abate de 27 delas no próximo triênio).
Tal decisão - que decorre de proposta dinamarquesa - foi aprovada, com a oposição dos países latinos, graças ao apoio concedido à Dinamarca pelo resto da União Européia e a tríade dos países caçadores.
Essa permissão foi concedida aos povos indígenas da Groenlândia, que é território sob administração da Dinamarca. Pelo visto, esse pequeno país escandinavo se associa aos baleeiros da Noruega, Islândia e Japão, eis que grande parte da carne de baleia caçada pelos aborígenes das costas da minguante Groenlândia vão parar nas mesas dos atuais sucessores de Babette nos restaurantes de ... Copenhague.
Apesar de todas as concessões oportunistas – inclusive a permanência da falsa caça científica patrocinada pelo Império do Sol Nascente – continuará de pé a moratória de 1986 à caça comercial.
Depoimento de Junichi Sato ( excertos )
“Embora Greenpeace não tenha apoiado a proposta ( da CIB), nós tínhamos esperado que ela mudaria para tornar-se um acordo para o fim da pesca da baleia, e não uma receita para continuá-la. Isso é especialmente desapontador para mim, porque o meu engajamento profissional para acabar com a caça às baleias em meu país, o Japão – o que levou à exposição de escândalo de apropriação indébita pela indústria baleeira – implicou em significativo sacrifício pessoal.
A investigação conduzida por mim e um colega, Toru Suzuki, levou à nossa prisão (...). As sedes do escritório de Greenpeace e de membros do plantel foram invadidas. 75 policiais participaram da operação para algemar dois pacíficos ativistas. Ficamos presos sem acusação formal por 23 dias; interrogados por até dez horas por dia, enquanto amarrados nas cadeiras e sem a presença de advogado. Estamos agora sob fiança, aguardando o veredito e a sentença, o que é esperado para os primeiros dias de setembro.
Se eu me aventuro a arriscar o meu futuro para terminar com a fraudulenta caça japonesa, se os denunciadores (whistle-blowers) se dispõem a pôr em risco suas vidas para tornar pública a corrupção, como é possível que a CIB tenha falhado mais uma vez ao não enfrentar o risco político de pressionar o governo japonês para pôr um fim na farsa da pesca científica da baleia ? (...) A Islândia e a Noruega simplesmente ignoram a moratória. Esses dois países, mais o Japão, mataram mais de trinta mil baleias desde 1986. Sempre me opus à caça pelo meu país, e esta é a razão pela qual decidi ingressar em Greenpeace. Se a caça à baleia é um tema político fora do Japão, interiormente mal causa uma marolinha política. Em 2006 Greenpeace decidiu focalizar no Japão a maior parte de sua campanha contra a caça baleeira, com vistas a melhor informar o público nipônico.
Totalmente financiado pelos contribuintes japoneses, o programa de caça à baleia não ensejou nenhuma pesquisa científica séria, que fosse acompanhada por pesquisadores independentes. O Japão tem sido repetidamente informado que a pretensa pesquisa não é necessária nem desejável. Tudo o que causou foi maciça conta para os contribuintes fiscais e toneladas de excesso de carne de baleia que o público japonês não quer comer. Também produziu infindáveis rumores e alegações de corrupção e de má administração.
Há dois anos atrás, seguindo uma dica de três antigos baleeiros transformados em denunciantes (whistle-blowers), eu e meus colegas de Greenpeace no Japão iniciamos uma investigação de interesse público (...). Todos os três baleeiros tinham afirmado que a carne de baleia era rotineiramente apropriada indebitamente, com o pleno conhecimento do governo e das autoridades encarregadas da operação da frota baleeira. Por fim, logramos interceptar uma caixa suspeita dentre uma centena delas, quando era descarregada dos navios. Conquanto o conteúdo constasse como papelão, continha 23,5 kg de carne de baleia de primeira qualidade, e se destinava a um endereço particular.
A cinco de maio de 2008, entregamos a citada caixa às autoridades, com a juntada de provas suplementares do crime. Inicialmente, o promotor distrital de Tóquio começou a investigar. Contudo, ao cabo fomos acusados de invasão de propriedade e de furto da carne de baleia, avaliada (...) em cerca de US$ 550.00. Estamos ameaçados de sofrermos pena de dezoito meses até dez anos na cadeia, por expor a verdade acerca de indústria que está financeiramente, moralmente, e cientificamente falida.
O Conselho sobre Detenções Arbitrárias da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas sentenciou que os nossos direitos humanos foram violados e que a acusação tem motivação política. A Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos expressou a sua preocupação acerca do caso. A Anistia Internacional, a Transparência Internacional, dois Prêmios Nobel da Paz, incontáveis expertos em legislação internacional, políticos e mais de meio milhão de indivíduos levantaram suas vozes contra a promotoria.
Seremos julgados e sentenciados em setembro, mais de dois anos depois de termos denunciado a corrupção. Mas o escândalo não fica por aqui. Só na semana passada, mais alegações surgiram sobre a compra de votos pelo Japão e suborno para manter a frota baleeira em operação. (...)”
A Maracutaia da Flexibilização das Encostas
Ontem a imprensa divulgou o plano da administração do Prefeito Eduardo Paes de modificar o Plano Diretor, para flexibilizar a ocupação de encostas no Rio de Janeiro.
Vestindo a habitual roupagem pseudo-ambientalista, os partidários dessa deformação urbanística desejam desvencilhar-se da atual legislação que impede a abertura de ruas por particulares para criar loteamentos acima de sessenta metros do nível do mar.
O relator na Câmara Municipal da proposição de Eduardo Paes, que é o vereador Roberto Monteiro, do chapa branca PCdoB, se manifesta favorável, a despeito da oposição de Aspásia Camargo, presidente da Comissão.
A emenda ao Plano Diretor suscitou repulsa em meios de especialistas. A esse respeito, a ex-procuradora geral do município, Sonia Rabelo de Castro, e a urbanista Vera Rezende, da Faculdade de Arquitetura da UFF, lançaram abaixo assinado virtual, endereçado à Comissão de Revisão do Plano Diretor, protestando contra o que reputam falta de transparência na tramitação do projeto. Até a noite de ontem, o grupo já havia coletado 140 assinaturas.
Semelha importante ter presente o que assinala a ex-secretária de Urbanismo Andrea Garcia Redondo: “A todo momento surgem novidades, como emendas fantasmas e agora a liberação da ocupação de encostas. Isso é um absurdo. Na hora em que se permite a abertura de ruas, será difícil conter a ocupação.”
( Fontes: CNN, Folha de S. Paulo e O Globo )
sexta-feira, 25 de junho de 2010
A Subordinação dos Militares ao Poder Civil
Seria difícil imaginar tal episódio no Brasil. Ao contrário de nossos vizinhos sul-americanos, o estamento civil e político – e nisso incluo o Judiciário – brasileiro persiste em atitude demasiado deferente para com a corporação castrense. Na Argentina, os chefes militares da época da guerra suja foram trazidos ao banco dos réus e condenados por sua participação nos desaparecimentos e em outras violações dos direitos humanos. Tampouco se tolerou a permanência de uma justiça militar.
No próprio Chile, a despeito de uma transição mais difícil, o próprio general Augusto Pinochet acabou por ser trazido aos tribunais chilenos, após a histórica prisão domiciliar em terra inglesa, causada por intimação do juiz espanhol Baltasar Garzón.
O cauteloso comportamento dos políticos civis no Brasil para com a hierarquia militar talvez seja um longínquo resquício do golpe do Marechal Deodoro da Fonseca, o que tornou, nas palavras de muitos, a novel república refém de seus supostos criadores e líderes.
Respaldados pelo sufrágio popular, a legitimidade dos próceres republicanos não carece de condestáveis. O Povo é soberano, e como tal os seus representantes eleitos devem proceder. A época dos tratamentos diferenciados e das exceções – como não faz muito a maioria do Supremo Tribunal Federal chancelou a suposta prescritibilidade da tortura, que o direito moderno não mais reconhece – deveria ser coisa do passado. Sem provocações, mas também sem estranhas deferências, o Poder Civil precisa ter consciência de sua intrínseca importância para a vigência de democracia igualitária e sem privilégios de qualquer espécie.
Para tanto, não semelha desimportante ter presente o desfecho da crise provocada pelas declarações atribuídas ao General Stanley A. McChrystal, comandante das tropas aliadas no Afeganistão (Vide blog Indiscrições de um general).
Convocado à Casa Branca, o general McChrystal teve audiência de vinte minutos com o seu Comandante-em-chefe, o Presidente Barack Obama. A despeito do pedido de desculpas do general, o presidente decidiu pela sua imediata subtituição. Assume ora o comando o General David H. Petraeus, que já se assinalara no Iraque, pela estratégia contra-insurgencial.
Sem o querer, a incontinência verbal do general McChrystal ensejou ao presidente estadunidense a ocasião de asseverar a prevalência do poder civil sobre o estamento militar, o que deve estar na base de qualquer democracia. A esse propósito, vem à lembrança a decisão do presidente Harry Truman de exonerar o general Mac Arthur de seu comando no Japão derrotado.
Em entrevista no Pentágono, o Secretário da Defesa Robert M. Gates, enfatizou que não se deveria interpretar a determinação do Presidente Obama em substituir o comandante das tropas no Afeganistão como representando, de alguma forma, uma redução no comprometimento da missão.
Por sua vez, a seu lado, o Almirante Mike Mullen, o atual comandante da Chefia de Estado Maior, após referir-se com pesar à partida de um dileto amigo, sublinhou que o general desrespeitara um valor fundamental do sistema americano, a subordinação (accountability) dos militares perante a liderança civil.
Para quem se expressara em termos,não exatamente respeitosos, quanto à respectiva capacidade de liderar, o Presidente Obama ministrou lição exemplar, mostrando a gregos e troianos que não se intimida com a hierarquia castrense.
( Fonte: International Herald Tribune )
No próprio Chile, a despeito de uma transição mais difícil, o próprio general Augusto Pinochet acabou por ser trazido aos tribunais chilenos, após a histórica prisão domiciliar em terra inglesa, causada por intimação do juiz espanhol Baltasar Garzón.
O cauteloso comportamento dos políticos civis no Brasil para com a hierarquia militar talvez seja um longínquo resquício do golpe do Marechal Deodoro da Fonseca, o que tornou, nas palavras de muitos, a novel república refém de seus supostos criadores e líderes.
Respaldados pelo sufrágio popular, a legitimidade dos próceres republicanos não carece de condestáveis. O Povo é soberano, e como tal os seus representantes eleitos devem proceder. A época dos tratamentos diferenciados e das exceções – como não faz muito a maioria do Supremo Tribunal Federal chancelou a suposta prescritibilidade da tortura, que o direito moderno não mais reconhece – deveria ser coisa do passado. Sem provocações, mas também sem estranhas deferências, o Poder Civil precisa ter consciência de sua intrínseca importância para a vigência de democracia igualitária e sem privilégios de qualquer espécie.
Para tanto, não semelha desimportante ter presente o desfecho da crise provocada pelas declarações atribuídas ao General Stanley A. McChrystal, comandante das tropas aliadas no Afeganistão (Vide blog Indiscrições de um general).
Convocado à Casa Branca, o general McChrystal teve audiência de vinte minutos com o seu Comandante-em-chefe, o Presidente Barack Obama. A despeito do pedido de desculpas do general, o presidente decidiu pela sua imediata subtituição. Assume ora o comando o General David H. Petraeus, que já se assinalara no Iraque, pela estratégia contra-insurgencial.
Sem o querer, a incontinência verbal do general McChrystal ensejou ao presidente estadunidense a ocasião de asseverar a prevalência do poder civil sobre o estamento militar, o que deve estar na base de qualquer democracia. A esse propósito, vem à lembrança a decisão do presidente Harry Truman de exonerar o general Mac Arthur de seu comando no Japão derrotado.
Em entrevista no Pentágono, o Secretário da Defesa Robert M. Gates, enfatizou que não se deveria interpretar a determinação do Presidente Obama em substituir o comandante das tropas no Afeganistão como representando, de alguma forma, uma redução no comprometimento da missão.
Por sua vez, a seu lado, o Almirante Mike Mullen, o atual comandante da Chefia de Estado Maior, após referir-se com pesar à partida de um dileto amigo, sublinhou que o general desrespeitara um valor fundamental do sistema americano, a subordinação (accountability) dos militares perante a liderança civil.
Para quem se expressara em termos,não exatamente respeitosos, quanto à respectiva capacidade de liderar, o Presidente Obama ministrou lição exemplar, mostrando a gregos e troianos que não se intimida com a hierarquia castrense.
( Fonte: International Herald Tribune )
quinta-feira, 24 de junho de 2010
Cidades e Lugarejos Esquecidos
Com a deterioração do clima e o aquecimento global causado pelo homem, os prodígios de ontem já vão ganhando foros de fenômenos recorrentes. Assim, surgem inundações no semiárido com turbadora frequência. No passado, tais inundações terão ocorrido, mas com extrema raridade.
Até no deserto houve casos de pessoas morrerem afogadas pela súbita torrente de um até então adormecido uádi. Contudo, tais ocorrências nesses ‘rios secos’ do Norte do Saara constituem autênticos e raríssimos prodígios.
Como as inundações de Santa Catarina, as ora repetidas tragédias humanas e materiais no Nordeste poderiam ser evitadas. Nunca uma assembleia legislativa estadual deu provas de maior desmemória e improvidência do que a de Santa Catarina ao decretar um inconstitucional[1] código florestal dessa unidade federativa. Será de que de nada valeram os iterados cataclismos para que os políticos da província atendam demagogicamente às estultas reivindicações de restringir as APPs e portanto as ‘matas ciliares' a ridículos cinco metros ? Afinal, se careciam de mementos sobre a necessidade de respeitar o meio ambiente, eles não os tiveram poucos nos desastres naturais que acometeram o estado em tempos recentíssimos.
Hoje o jornal Folha de São Paulo publica oportuna e fundada reportagem, sob a manchete de primeira página ‘17 cidades destruídas já sofreram com as cheias’. Há dois aspectos que semelha importante ressaltar nesta questão.
De uma parte, a faceta administrativa e preventiva que é descurada. Consoante levantamento do diário, 29% das cidades afetadas pelas chuvas em Alagoas e Pernambuco enfrentaram as cheias ao menos uma vez desde 2003.
No particular, dispomos de informação deveras oportuna, fornecida na primeira página da Folha: “para especialista, medidas simples, como regular a vazão dos rios e recompor a vegetação das suas margens, evitariam o problema”.
Por outro lado, a irresponsabilidade dos órgãos federais que deveriam ocupar-se da matéria se vê corroborada pelo desequilíbrio nas despesas de prevenção e nas de reconstrução posterior às inundações: “de 2003 a junho deste ano, foram liberados R$ 5,8 bilhões para ações pós-tragédias e apenas R$ 1,1 bilhão para prevenção.”
A propósito, a Comissão Especial da Câmara, controlada pelos ruralistas e o seu aliado oportunista, o Deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), recebe a inesperada advertência de o que significa mexer irresponsável e demagogicamente com o Código Florestal, tornando inúteis as APPs e incentivando, na contramão do tempo, as vanguardistas hordas do atraso.
Falava acima de um ulterior aspecto dessa tragédia ambiental. Tem-se a impressão, por vezes, que o único órgão que se preocupa com tais fenômenos é a Rede Globo. Pois no noticiário do Jornal Nacional só deparamos com as falas de William Bonner e as intervenções dos repórteres, a começar pelo dedicado veterano Francisco José e tantos outros das sucursais de Pernambuco e das Alagoas. Em meio àquele cenário de destruição e a pobre gente de que a cruel inundação agrava, se possível fôra, a própria miséria, se repetem as tomadas das torrentes avassaladoras que levam consigo, em requinte de quase incompreensível maldade, todas as frágeis estruturas que as comunidades tão interioranas quanto esquecidas ali ,com não pequeno esforço, levantaram.
Não se vêem funcionários federais ou estaduais. Tampouco se ouvem palavras – a presença seria ,decerto, um novo prodígio para aquela gente – dos poderosos de Brasília, para não falar dos de Recife e de Maceió.
É peculiar esse vezo que desgraçadamente parece ser geral, melancolicamente próprio do Brasil hodierno. Não é que até os viajantes candidatos José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) cancelaram suas visitas ao Nordeste, porque ‘o clima não é de festa’ ? Não se ignora que pretendiam ir às festas de São João em Caruaru (PE) e Campina Grande (PB).
Não contesto – longe disso – que o clima não mais seja de festa. Mas, se me permitem, não atino com a razão de fugir de tais locais de infortúnio, como soi fazer o grande comunicador, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nascido em Caruaru, e que veio para o Sul maravilha em um pau de arara.
Será que a gente sofrida do Nordeste só deve merecer as tomadas e as falas do pessoal da Rede Globo ? Será que essa gente não vota, nem, do fundo de sua pobreza, inda paga impostos ? Será que tal gente não merece um pouquinho de atenção dos altos poderes federal e estadual ?
( Fonte: Folha de S. Paulo )
[1] Há recurso perante o Supremo que questiona tal constitucionalidade. No entanto, como será experiência de muitos, a nossa Justiça é lenta ao ponto de parecer-nos acometida de paralisia. Seria preferível que, em questões de tal importância social, o fosse menos.
Até no deserto houve casos de pessoas morrerem afogadas pela súbita torrente de um até então adormecido uádi. Contudo, tais ocorrências nesses ‘rios secos’ do Norte do Saara constituem autênticos e raríssimos prodígios.
Como as inundações de Santa Catarina, as ora repetidas tragédias humanas e materiais no Nordeste poderiam ser evitadas. Nunca uma assembleia legislativa estadual deu provas de maior desmemória e improvidência do que a de Santa Catarina ao decretar um inconstitucional[1] código florestal dessa unidade federativa. Será de que de nada valeram os iterados cataclismos para que os políticos da província atendam demagogicamente às estultas reivindicações de restringir as APPs e portanto as ‘matas ciliares' a ridículos cinco metros ? Afinal, se careciam de mementos sobre a necessidade de respeitar o meio ambiente, eles não os tiveram poucos nos desastres naturais que acometeram o estado em tempos recentíssimos.
Hoje o jornal Folha de São Paulo publica oportuna e fundada reportagem, sob a manchete de primeira página ‘17 cidades destruídas já sofreram com as cheias’. Há dois aspectos que semelha importante ressaltar nesta questão.
De uma parte, a faceta administrativa e preventiva que é descurada. Consoante levantamento do diário, 29% das cidades afetadas pelas chuvas em Alagoas e Pernambuco enfrentaram as cheias ao menos uma vez desde 2003.
No particular, dispomos de informação deveras oportuna, fornecida na primeira página da Folha: “para especialista, medidas simples, como regular a vazão dos rios e recompor a vegetação das suas margens, evitariam o problema”.
Por outro lado, a irresponsabilidade dos órgãos federais que deveriam ocupar-se da matéria se vê corroborada pelo desequilíbrio nas despesas de prevenção e nas de reconstrução posterior às inundações: “de 2003 a junho deste ano, foram liberados R$ 5,8 bilhões para ações pós-tragédias e apenas R$ 1,1 bilhão para prevenção.”
A propósito, a Comissão Especial da Câmara, controlada pelos ruralistas e o seu aliado oportunista, o Deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), recebe a inesperada advertência de o que significa mexer irresponsável e demagogicamente com o Código Florestal, tornando inúteis as APPs e incentivando, na contramão do tempo, as vanguardistas hordas do atraso.
Falava acima de um ulterior aspecto dessa tragédia ambiental. Tem-se a impressão, por vezes, que o único órgão que se preocupa com tais fenômenos é a Rede Globo. Pois no noticiário do Jornal Nacional só deparamos com as falas de William Bonner e as intervenções dos repórteres, a começar pelo dedicado veterano Francisco José e tantos outros das sucursais de Pernambuco e das Alagoas. Em meio àquele cenário de destruição e a pobre gente de que a cruel inundação agrava, se possível fôra, a própria miséria, se repetem as tomadas das torrentes avassaladoras que levam consigo, em requinte de quase incompreensível maldade, todas as frágeis estruturas que as comunidades tão interioranas quanto esquecidas ali ,com não pequeno esforço, levantaram.
Não se vêem funcionários federais ou estaduais. Tampouco se ouvem palavras – a presença seria ,decerto, um novo prodígio para aquela gente – dos poderosos de Brasília, para não falar dos de Recife e de Maceió.
É peculiar esse vezo que desgraçadamente parece ser geral, melancolicamente próprio do Brasil hodierno. Não é que até os viajantes candidatos José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) cancelaram suas visitas ao Nordeste, porque ‘o clima não é de festa’ ? Não se ignora que pretendiam ir às festas de São João em Caruaru (PE) e Campina Grande (PB).
Não contesto – longe disso – que o clima não mais seja de festa. Mas, se me permitem, não atino com a razão de fugir de tais locais de infortúnio, como soi fazer o grande comunicador, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nascido em Caruaru, e que veio para o Sul maravilha em um pau de arara.
Será que a gente sofrida do Nordeste só deve merecer as tomadas e as falas do pessoal da Rede Globo ? Será que essa gente não vota, nem, do fundo de sua pobreza, inda paga impostos ? Será que tal gente não merece um pouquinho de atenção dos altos poderes federal e estadual ?
( Fonte: Folha de S. Paulo )
[1] Há recurso perante o Supremo que questiona tal constitucionalidade. No entanto, como será experiência de muitos, a nossa Justiça é lenta ao ponto de parecer-nos acometida de paralisia. Seria preferível que, em questões de tal importância social, o fosse menos.
quarta-feira, 23 de junho de 2010
Indiscrições de um General
Pelo acesso mais prolongado que teve à roda dos auxiliares diretos do general Stanley McChrystal , comandante das tropas aliadas no Afeganistão, o repórter Michael Hastings, da revista “Rolling Stone” pôde fazer reportagem cheia de indiscrições sobre gente poderosa. No entanto, o que pode ser interessante para o jornalista, não costuma sê-lo necessariamente para as fontes da informação.
Segundo consta, o culpado do ‘furo’ da revista foi o vulcão islandês, o impronunciável Eyjafjallajokull, cuja erupção e profusas cinzas inviabilizaram viagens aéreas em semana de abril, forçando o general e os seus auxiliares a demorado deslocamento de ônibus de Berlim a Paris. Durante essa proximidade acidental, o reporter dispôs de inusitada familiaridade com o círculo de McChrystal.
Não será fora do comum que comandados reclamem do comandante-em-chefe e de seus auxiliares imediatos. O que não estava previsto é que tais críticas hajam sido feitas junto aos atentos e profissionais ouvidos de um jornalista.
Há observações depreciativas acerca da alta hierarquia da Casa Branca, nelas incluídos o Vice-Presidente Joe Biden, o General Jim Jones, Assessor de Segurança Nacional, e Richard Holbrooke, Enviado Especial para o Afeganistão e o Paquistão.
Sem embargo, e a despeito do seu caráter corrosivo, tais comentários não têm a gravidade de epítetos, mesmo ouvidos de segunda mão, e supostamente ditos pelo Comandante das tropas no Afeganistão, o General de quatro estrelas Stanley McChrystal, a respeito de seu Comandante-em-Chefe, o Presidente Barack Obama.
Em uma primeira versão dessas alegadas declarações, McChrystal, que foi nomeado por Obama para comandar os contingentes estadunidense e da OTAN no Afeganistão, qualificara o Presidente como ‘despreparado’, ‘embaraçado e intimidado’.
Os chefes militares do Comandante no Afeganistão criticaram acerbamente tais declarações. Nesta quarta-feira, 23 de junho, o general McChrystal se encontrará com o Presidente Obama e o Vice-Presidente Biden “para explicar ao Pentágono e ao Comandante-em-chefe suas expressões citadas na reportagem”.
Obama, segundo fonte importante, ficou furioso com o artigo, em especial com a sugestão de que ‘ele estava desinteressado e despreparado para discutir a guerra no Afeganistão ao assumir suas altas funções’.
A outra menção à opinião do general-comandante se refere ao que auxiliares de McChrystal repassaram ao reporter, afirmando que o general ficara “bastante desapontado” com uma reunião no Gabinete Oval com Obama, e que ele achara o Presidente “embaraçado e intimidado” durante encontro no Pentágono com o general McChrystal e vários outros generais.
Como se verifica, as fontes do jornalista de ‘Rolling Stone’ são de segunda mão, posto que dada a sua cercania com o general – e as circunstâncias em que foram manifestadas – tenham foros de aparente credibilidade.
Esse gênero de fofoca, que delicia uma certa espécie de jornalismo, não representa decerto a cobertura mais oportuna, sobretudo se se levar em conta a presente situação do conflito que, há pouco, ultrapassou o marco dos mil americanos mortos em combate (desde 2001). Se a guerra do Afeganistão, com todos os seus notórios precedentes históricos, já enfrenta problemas sérios, como o adiamento da tomada de Kandahar, o que reflete discordâncias nos altos círculos sobre o andamento da campanha, as observações atribuídas a McChrystal trazem inoportuno complicador para a questão.
Chamar o Presidente de ‘despreparado, embaraçado e intimidado’ em matérias de ambito militar não é coisa de somenos, porque toca em um nervo exposto.
Convocado à Casa Branca, o general pôs o seu cargo à disposição, o que é de certa forma um gesto inútil, eis que o cargo não lhe pertence, a par do mal que essa indiscrição poderia causar já está feito.
De qualquer forma que evolua essa importuna crise, o Presidente Obama dificilmente sairá indene do episódio.
E é lamentável que visões preconceituosas e corporativistas tenham sido literalmente difundida por um sôfrego alto-falante, que preza mais os quinze minutos de notoriedade, do que os interesses de Estado e da Administração Obama.
( Fontes: International Herald Tribune e Folha de S. Paulo )
Segundo consta, o culpado do ‘furo’ da revista foi o vulcão islandês, o impronunciável Eyjafjallajokull, cuja erupção e profusas cinzas inviabilizaram viagens aéreas em semana de abril, forçando o general e os seus auxiliares a demorado deslocamento de ônibus de Berlim a Paris. Durante essa proximidade acidental, o reporter dispôs de inusitada familiaridade com o círculo de McChrystal.
Não será fora do comum que comandados reclamem do comandante-em-chefe e de seus auxiliares imediatos. O que não estava previsto é que tais críticas hajam sido feitas junto aos atentos e profissionais ouvidos de um jornalista.
Há observações depreciativas acerca da alta hierarquia da Casa Branca, nelas incluídos o Vice-Presidente Joe Biden, o General Jim Jones, Assessor de Segurança Nacional, e Richard Holbrooke, Enviado Especial para o Afeganistão e o Paquistão.
Sem embargo, e a despeito do seu caráter corrosivo, tais comentários não têm a gravidade de epítetos, mesmo ouvidos de segunda mão, e supostamente ditos pelo Comandante das tropas no Afeganistão, o General de quatro estrelas Stanley McChrystal, a respeito de seu Comandante-em-Chefe, o Presidente Barack Obama.
Em uma primeira versão dessas alegadas declarações, McChrystal, que foi nomeado por Obama para comandar os contingentes estadunidense e da OTAN no Afeganistão, qualificara o Presidente como ‘despreparado’, ‘embaraçado e intimidado’.
Os chefes militares do Comandante no Afeganistão criticaram acerbamente tais declarações. Nesta quarta-feira, 23 de junho, o general McChrystal se encontrará com o Presidente Obama e o Vice-Presidente Biden “para explicar ao Pentágono e ao Comandante-em-chefe suas expressões citadas na reportagem”.
Obama, segundo fonte importante, ficou furioso com o artigo, em especial com a sugestão de que ‘ele estava desinteressado e despreparado para discutir a guerra no Afeganistão ao assumir suas altas funções’.
A outra menção à opinião do general-comandante se refere ao que auxiliares de McChrystal repassaram ao reporter, afirmando que o general ficara “bastante desapontado” com uma reunião no Gabinete Oval com Obama, e que ele achara o Presidente “embaraçado e intimidado” durante encontro no Pentágono com o general McChrystal e vários outros generais.
Como se verifica, as fontes do jornalista de ‘Rolling Stone’ são de segunda mão, posto que dada a sua cercania com o general – e as circunstâncias em que foram manifestadas – tenham foros de aparente credibilidade.
Esse gênero de fofoca, que delicia uma certa espécie de jornalismo, não representa decerto a cobertura mais oportuna, sobretudo se se levar em conta a presente situação do conflito que, há pouco, ultrapassou o marco dos mil americanos mortos em combate (desde 2001). Se a guerra do Afeganistão, com todos os seus notórios precedentes históricos, já enfrenta problemas sérios, como o adiamento da tomada de Kandahar, o que reflete discordâncias nos altos círculos sobre o andamento da campanha, as observações atribuídas a McChrystal trazem inoportuno complicador para a questão.
Chamar o Presidente de ‘despreparado, embaraçado e intimidado’ em matérias de ambito militar não é coisa de somenos, porque toca em um nervo exposto.
Convocado à Casa Branca, o general pôs o seu cargo à disposição, o que é de certa forma um gesto inútil, eis que o cargo não lhe pertence, a par do mal que essa indiscrição poderia causar já está feito.
De qualquer forma que evolua essa importuna crise, o Presidente Obama dificilmente sairá indene do episódio.
E é lamentável que visões preconceituosas e corporativistas tenham sido literalmente difundida por um sôfrego alto-falante, que preza mais os quinze minutos de notoriedade, do que os interesses de Estado e da Administração Obama.
( Fontes: International Herald Tribune e Folha de S. Paulo )
terça-feira, 22 de junho de 2010
A Herança Administrativa do Governo Lula
Não é de hoje que, em todas as análises da situação das contas do Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, os especialistas lamentam o aspecto negativo do aumento dos gastos permanentes com o funcionalismo, que impedem a maior flexibilização no controle dos dispêndios públicos. Essa inchação da máquina burocrática da administração, a par de pressionar as contas, tem ulterior traço negativo, que é o de limitar o montante a ser destinado aos investimentos.
É óbvia a importância da parcela de inversões de parte do Estado. Nesse setor, em boa parte pela má alocação de fundos, se privilegia na destinação das dotações o caráter assistencialista e a ênfase nas categorias mais baixas do funcionalismo público.
Tal empreguismo eleitoreiro favorece categorias que pelo seu caráter subalterno na escala hierárquica não justificara no passado a formação de ‘carreiras’. Sob a lábil escusa que o serviço público estava antes elitizado, procurou-se reduzir as diferenças entre o topo e a base da pirâmide salarial do funcionalismo. A par disso, a administração petista cuidou de nivelar por baixo, pulverizando o número de carreiras. Das principais, e que exigem maior nível de estudo – diplomatas, auditores fiscais e advogados da União -, cujo número equivalia a 31 no início do governo Lula, pularam atualmente para 108 as carreiras civis. Quanto aos cargos, que em certos casos independem de carreira, eram 97 em 2002, e agora são 317.
Tal munificência quanto à máquina funcional – que, ao engordar desmesuradamente os quadros, reforça os traços patrimonialista e clientelista do Estado, o que não é exatamente a tendência moderna nos principais países – igualmente transcura e de forma assaz grosseira a relevância da educação e de sua importância para a construção futura da nação.
Não se pode, contudo, negar que exista coerência nessa opção pela quantidade em detrimento da qualidade, não só nas bases clientelistas e neo-populistas do partido líder. Tampouco se deva esquecer as tentativas – em seguida disfarçadas – de não prestigiar o estudo e o saber de parte do chefe carismático do movimento. O fato de tal suposta preferência não haja sido mais verbalizada com a acentuação anterior não significa infelizmente que tenha desaparecido de suas convicções.
Nesse contexto, é gritante o menosprezo pelas categorias do magistério educacional. Se o professor Fernando Henrique Cardoso desiludira os seus antigos companheiros do corpo docente, a atitude do governo Lula desmereceu igualmente as fáceis promessas do vitorioso sindicalista à plêiade de professores petistas exibidas nos programas televisivos da campanha pelo primeiro mandato. Que se destine mais de seis mil reais a motoristas do Ipea e que aos professores universitários seja destinada a vala dos dois mil é um crime contra o estudo e a longa formação. Mais ainda, um colossal e estúpido erro que penaliza igualmente os estudantes. Professores mal pagos, por mais altruistas que sejam, é uma garantia de ensino deficiente, além da manipulação de um círculo vicioso, que só tenderá a baixar a qualidade do ensino e, por conseguinte, o preparo de gerações inteiras de brasileiros.
Nivelar por baixo nunca foi o objetivo dos movimentos de esquerda a que o petismo de hoje homenageia na palavra, mas desmerece nos atos.
Não se pode, porém, negar que falte coerência ao governo de Lula da Silva. Não se cinge, como se verifica, à sua má-vontade com o investimento às rubricas do orçamento destinadas às grandes obras de infraestrutura. Também na inversão para a educação de qualidade, não se ouve o presente ! da administração petista.
(Fonte: Folha de S. Paulo )
É óbvia a importância da parcela de inversões de parte do Estado. Nesse setor, em boa parte pela má alocação de fundos, se privilegia na destinação das dotações o caráter assistencialista e a ênfase nas categorias mais baixas do funcionalismo público.
Tal empreguismo eleitoreiro favorece categorias que pelo seu caráter subalterno na escala hierárquica não justificara no passado a formação de ‘carreiras’. Sob a lábil escusa que o serviço público estava antes elitizado, procurou-se reduzir as diferenças entre o topo e a base da pirâmide salarial do funcionalismo. A par disso, a administração petista cuidou de nivelar por baixo, pulverizando o número de carreiras. Das principais, e que exigem maior nível de estudo – diplomatas, auditores fiscais e advogados da União -, cujo número equivalia a 31 no início do governo Lula, pularam atualmente para 108 as carreiras civis. Quanto aos cargos, que em certos casos independem de carreira, eram 97 em 2002, e agora são 317.
Tal munificência quanto à máquina funcional – que, ao engordar desmesuradamente os quadros, reforça os traços patrimonialista e clientelista do Estado, o que não é exatamente a tendência moderna nos principais países – igualmente transcura e de forma assaz grosseira a relevância da educação e de sua importância para a construção futura da nação.
Não se pode, contudo, negar que exista coerência nessa opção pela quantidade em detrimento da qualidade, não só nas bases clientelistas e neo-populistas do partido líder. Tampouco se deva esquecer as tentativas – em seguida disfarçadas – de não prestigiar o estudo e o saber de parte do chefe carismático do movimento. O fato de tal suposta preferência não haja sido mais verbalizada com a acentuação anterior não significa infelizmente que tenha desaparecido de suas convicções.
Nesse contexto, é gritante o menosprezo pelas categorias do magistério educacional. Se o professor Fernando Henrique Cardoso desiludira os seus antigos companheiros do corpo docente, a atitude do governo Lula desmereceu igualmente as fáceis promessas do vitorioso sindicalista à plêiade de professores petistas exibidas nos programas televisivos da campanha pelo primeiro mandato. Que se destine mais de seis mil reais a motoristas do Ipea e que aos professores universitários seja destinada a vala dos dois mil é um crime contra o estudo e a longa formação. Mais ainda, um colossal e estúpido erro que penaliza igualmente os estudantes. Professores mal pagos, por mais altruistas que sejam, é uma garantia de ensino deficiente, além da manipulação de um círculo vicioso, que só tenderá a baixar a qualidade do ensino e, por conseguinte, o preparo de gerações inteiras de brasileiros.
Nivelar por baixo nunca foi o objetivo dos movimentos de esquerda a que o petismo de hoje homenageia na palavra, mas desmerece nos atos.
Não se pode, porém, negar que falte coerência ao governo de Lula da Silva. Não se cinge, como se verifica, à sua má-vontade com o investimento às rubricas do orçamento destinadas às grandes obras de infraestrutura. Também na inversão para a educação de qualidade, não se ouve o presente ! da administração petista.
(Fonte: Folha de S. Paulo )
segunda-feira, 21 de junho de 2010
O Destempero do Técnico Dunga
O jogo Brasil versus Costa do Marfim mostrou uma vez mais a importância do supervisor ou chefe de delegação atuante, no que concerne às grandes linhas e não ao desempenho da seleção. Este papel compete ao técnico. Treinar os jogadores, selecionar os melhores e montar tática e estratégia são prerrogativas desses mesmos técnicos. Dada a importância que tem o futebol e a Copa do Mundo para o Brasil e a gente brasileira, é atribuição a um tempo invejável e arriscada.
No entanto, a CBD de Ricardo Teixeira deveria ter alguém de estatura moral e a consequente autoridade, não para intrometer-se na escalação ou tática de nosso time, mas em condições de intervir, com a necessária discrição, para que, v.g. o técnico observe normas de comportamento, tanto durante a partida, quanto fora de campo, que sejam consentâneas com a conduta e controle que as suas funções exigem.
A velha regra romana do quis custodiet ipsos custodes?[1] aqui se aplica à maravilha. O espetáculo dado ontem pelo técnico Dunga poderia ter sido evitado. E não apenas em atenção ao controle dos nervos e, por conseguinte, da postura. O técnico da seleção não é um torcedor privilegiado. Se as reações extremas – dentro de um arco civilizado de conduta é bom que se frise – do torcedor brasileiro, que vão da ovação à vaia, são atitudes nele compreensíveis, dada a carga emotiva que dedica ao escrete nacional, não se pode esperar que o diretor-técnico da seleção (do bonachão Vicente Feola, em 1958, até hoje o nome dessa importante função tem variado) tenha comportamento análogo enquanto acompanha,de seu posto de observação lateral do campo, o desenvolvimento da partida.
Os motivos que militam contra tal descontrole emocional são essencialmente de dupla natureza: (a) o técnico é, por assim dizer, a contra-imagem da seleção. Como pode esperar controle emocional de seus comandados se não domina as próprias emoções, sobretudo as agressivas ?; (b) em dominando os sentidos, mantém sob freio as respectivas paixões e terá, por conseguinte, discernimento claro para adotar, durante a partida, as decisões mais oportunas para a sua equipe.
Se lhe criticamos no passado as decisões, mormente no que concerne à convocação dos jogadores, não vamos hoje desmerecer de seu trabalho com o material humano que escolheu. Ontem, como bem disse a imprensa, vimos afinal a seleção do Brasil entrar em campo. A sua atuação foi convincente, malgrado a deslealdade do adversário – quiçá a homenagem mais ambígua que eventuais contendores possam prestar à seleção. Não é por acaso que a nossa camisa auriverde tem cinco estrelas azuis no peito.
Nesse ponto é que se afigura importante manter o controle emotivo. O destempero evidenciado durante a partida por Dunga teve um preço. O técnico precisa ter o pleno emprego do próprio discernimento, para intervir na escalação do time quando indispensável. No segundo tempo, com a vitória do Brasil praticamente assegurada, mandava o bom senso que Dunga substituísse Kaká. O nosso meia armador estava sendo caçado em campo, de forma dissimulada (do inexperiente Monsieur Stéphane Lannoy) porém contínua, através de um acosso que nada tem a ver com o jogo de futebol. Via-se nitidamente a crescente – e compreensível - exasperação do craque e o que tal reação poderia causar. Sem embargo, Dunga nada fez. Se tivesse atuado, substituindo Kaká, estaria agindo não só para preservar individualmente o atleta, mas também atuaria no interesse da seleção.
Ao invés de gritar palavras de calão, ou de extravazar em gestos o respectivo desconforto – com a deslealdade dos marfinianos e a apatia do árbitro -, teria sido mais apropriado e eficaz dominar a paixão e usar a razão.
Dunga não é, repito, um torcedor privilegiado. É o técnico da seleção. Na hora em que se esquece de tal detalhe, seria importante que houvesse alguém que o recordasse de seus deveres. Que não são o de vergastar a imprensa, ou de manter os jogadores em isolamento, como se carecessem de uma fortaleza para protegê-los dos contatos perniciosos com jornalistas.
Idiossincrasias à parte, é capital que os nossos recursos humanos – que são ainda mais parcos pelo arbítrio do selecionador – não sejam desperdiçados, submetidos a suspensões tão perniciosas, quanto moralmente injustas.
A expulsão de Kaká acabou sendo a culminação do processo de sua vitimização. Graças a um juiz não preparado para um jogo como o de ontem os vilões foram premiados e a vítima sacrificial... castigada. A foto do juiz elevando teatralmente o cartão vermelho contra Kaká é a prova documental do fracasso de um arremedo de arbitragem.
[1] Quem vigiará os vigias ? (Lat.)
( Fonte: O Globo )
No entanto, a CBD de Ricardo Teixeira deveria ter alguém de estatura moral e a consequente autoridade, não para intrometer-se na escalação ou tática de nosso time, mas em condições de intervir, com a necessária discrição, para que, v.g. o técnico observe normas de comportamento, tanto durante a partida, quanto fora de campo, que sejam consentâneas com a conduta e controle que as suas funções exigem.
A velha regra romana do quis custodiet ipsos custodes?[1] aqui se aplica à maravilha. O espetáculo dado ontem pelo técnico Dunga poderia ter sido evitado. E não apenas em atenção ao controle dos nervos e, por conseguinte, da postura. O técnico da seleção não é um torcedor privilegiado. Se as reações extremas – dentro de um arco civilizado de conduta é bom que se frise – do torcedor brasileiro, que vão da ovação à vaia, são atitudes nele compreensíveis, dada a carga emotiva que dedica ao escrete nacional, não se pode esperar que o diretor-técnico da seleção (do bonachão Vicente Feola, em 1958, até hoje o nome dessa importante função tem variado) tenha comportamento análogo enquanto acompanha,de seu posto de observação lateral do campo, o desenvolvimento da partida.
Os motivos que militam contra tal descontrole emocional são essencialmente de dupla natureza: (a) o técnico é, por assim dizer, a contra-imagem da seleção. Como pode esperar controle emocional de seus comandados se não domina as próprias emoções, sobretudo as agressivas ?; (b) em dominando os sentidos, mantém sob freio as respectivas paixões e terá, por conseguinte, discernimento claro para adotar, durante a partida, as decisões mais oportunas para a sua equipe.
Se lhe criticamos no passado as decisões, mormente no que concerne à convocação dos jogadores, não vamos hoje desmerecer de seu trabalho com o material humano que escolheu. Ontem, como bem disse a imprensa, vimos afinal a seleção do Brasil entrar em campo. A sua atuação foi convincente, malgrado a deslealdade do adversário – quiçá a homenagem mais ambígua que eventuais contendores possam prestar à seleção. Não é por acaso que a nossa camisa auriverde tem cinco estrelas azuis no peito.
Nesse ponto é que se afigura importante manter o controle emotivo. O destempero evidenciado durante a partida por Dunga teve um preço. O técnico precisa ter o pleno emprego do próprio discernimento, para intervir na escalação do time quando indispensável. No segundo tempo, com a vitória do Brasil praticamente assegurada, mandava o bom senso que Dunga substituísse Kaká. O nosso meia armador estava sendo caçado em campo, de forma dissimulada (do inexperiente Monsieur Stéphane Lannoy) porém contínua, através de um acosso que nada tem a ver com o jogo de futebol. Via-se nitidamente a crescente – e compreensível - exasperação do craque e o que tal reação poderia causar. Sem embargo, Dunga nada fez. Se tivesse atuado, substituindo Kaká, estaria agindo não só para preservar individualmente o atleta, mas também atuaria no interesse da seleção.
Ao invés de gritar palavras de calão, ou de extravazar em gestos o respectivo desconforto – com a deslealdade dos marfinianos e a apatia do árbitro -, teria sido mais apropriado e eficaz dominar a paixão e usar a razão.
Dunga não é, repito, um torcedor privilegiado. É o técnico da seleção. Na hora em que se esquece de tal detalhe, seria importante que houvesse alguém que o recordasse de seus deveres. Que não são o de vergastar a imprensa, ou de manter os jogadores em isolamento, como se carecessem de uma fortaleza para protegê-los dos contatos perniciosos com jornalistas.
Idiossincrasias à parte, é capital que os nossos recursos humanos – que são ainda mais parcos pelo arbítrio do selecionador – não sejam desperdiçados, submetidos a suspensões tão perniciosas, quanto moralmente injustas.
A expulsão de Kaká acabou sendo a culminação do processo de sua vitimização. Graças a um juiz não preparado para um jogo como o de ontem os vilões foram premiados e a vítima sacrificial... castigada. A foto do juiz elevando teatralmente o cartão vermelho contra Kaká é a prova documental do fracasso de um arremedo de arbitragem.
[1] Quem vigiará os vigias ? (Lat.)
( Fonte: O Globo )
domingo, 20 de junho de 2010
Brasil 3 x 1 Costa do Marfim
O início do jogo logo demonstraria que estava ali uma seleção brasileira diferente daquela da partida contra a Coreia do Norte. Ao invés do ritmo burocrático anterior, assistimos com prazer à movimentação de Kaká, Robinho e Luis Fabiano.
Jogando mais solto e com a inventividade que recordava o scratch da segunda fase das eliminatórias, os gols foram saindo - o primeiro, em que Luís Fabiano desencantaria, o segundo, bastante trabalhado e, a rigor, inválido porque o mesmo Luis Fabiano se valeria do braço, e afinal o terceiro, de Elano.
Diante do domínio técnico brasileiro, a partir dos vinte minutos do segundo tempo acentuou-se a deslealdade do time da Costa do Marfim. Em particular, Kaká sofreu uma verdadeira caça em todo o campo. A tudo assistia impávido o juiz francês Stéphane Lannoy que, a pretexto de deixar jogar, não coibia a violência e os toques de má-fé dos jogadores marfinianos.
Todos os excessos são reprováveis. Tanto o frenesi dos cartões amarelos aplicados pelo árbitro espanhol no jogo Alemanha x Sérvia, quanto a apatia do novel juiz francês Lannoy que, talvez para corrigir os exageros anteriores, se recusava a mostrar o cartão amarelo.
O anti-jogo da Costa do Marfim agradeceu à idiossincrasia desse juiz, simpático porém inexperiente. Quando jogadores recorrem à sistemática deslealdade – que se os juízes não querem ver, as câmeras mostram com profusão de detalhes – a impunidade tenderá inevitávelmente a incentivar a progressão geométrica da violência.
O cenário de jogos em que os juízes perdem o controle da partida tende em geral a involuir em prejuízo não dos infratores e daqueles que recorrem a golpes anti-esportivos, mas ironicamente contra os principais jogadores da equipe superior. Foi o que se viu quando Brasil x Costa do Marfim descambou para a violência e a encenação. Elano, contundido no joelho, teve de ser retirado de campo; Kaká, massacrado durante todo o tempo, acabou ganhando, por conta das provocações dos marfinianos, o seu cartão vermelho.
Se Dunga, ao invés de deblaterar como um torcedor contra o que ocorria com Kaká, tivesse substituído o jogador quando o placar era de 3 x 0, o técnico teria feito o que os comentaristas e muitos outros já reclamavam que fizesse, para que os bandidos não colhessem o fruto de suas botinadas e outros golpes mais refinados. Por não fazê-lo a seleção fica sem meia-armador – recordem-se que Dunga, por sua alta recreação, não quis convocar Ronaldinho gaúcho – no próximo jogo com Portugal e quem sabe, em outro mais, se levar uma ulterior suspensão da Fifa por bom comportamento.
De qualquer forma, o Sr. Blatter – que estava na tribuna – deveria ser inteirado por quem de direito da calamitosa arbitragem neste mundial. Aristóteles, apesar de desconhecer o esporte bretão, ensina das vantagens dos pontos intermédios. Assim nem farra de cartões, nem a renúncia ao seu emprego. Os juízes devem ser escolhidos menos pela geografia do que pela experiência. Mundial não é o momento de testar árbitros verdes ou fora dos grandes torneios.
Jogando mais solto e com a inventividade que recordava o scratch da segunda fase das eliminatórias, os gols foram saindo - o primeiro, em que Luís Fabiano desencantaria, o segundo, bastante trabalhado e, a rigor, inválido porque o mesmo Luis Fabiano se valeria do braço, e afinal o terceiro, de Elano.
Diante do domínio técnico brasileiro, a partir dos vinte minutos do segundo tempo acentuou-se a deslealdade do time da Costa do Marfim. Em particular, Kaká sofreu uma verdadeira caça em todo o campo. A tudo assistia impávido o juiz francês Stéphane Lannoy que, a pretexto de deixar jogar, não coibia a violência e os toques de má-fé dos jogadores marfinianos.
Todos os excessos são reprováveis. Tanto o frenesi dos cartões amarelos aplicados pelo árbitro espanhol no jogo Alemanha x Sérvia, quanto a apatia do novel juiz francês Lannoy que, talvez para corrigir os exageros anteriores, se recusava a mostrar o cartão amarelo.
O anti-jogo da Costa do Marfim agradeceu à idiossincrasia desse juiz, simpático porém inexperiente. Quando jogadores recorrem à sistemática deslealdade – que se os juízes não querem ver, as câmeras mostram com profusão de detalhes – a impunidade tenderá inevitávelmente a incentivar a progressão geométrica da violência.
O cenário de jogos em que os juízes perdem o controle da partida tende em geral a involuir em prejuízo não dos infratores e daqueles que recorrem a golpes anti-esportivos, mas ironicamente contra os principais jogadores da equipe superior. Foi o que se viu quando Brasil x Costa do Marfim descambou para a violência e a encenação. Elano, contundido no joelho, teve de ser retirado de campo; Kaká, massacrado durante todo o tempo, acabou ganhando, por conta das provocações dos marfinianos, o seu cartão vermelho.
Se Dunga, ao invés de deblaterar como um torcedor contra o que ocorria com Kaká, tivesse substituído o jogador quando o placar era de 3 x 0, o técnico teria feito o que os comentaristas e muitos outros já reclamavam que fizesse, para que os bandidos não colhessem o fruto de suas botinadas e outros golpes mais refinados. Por não fazê-lo a seleção fica sem meia-armador – recordem-se que Dunga, por sua alta recreação, não quis convocar Ronaldinho gaúcho – no próximo jogo com Portugal e quem sabe, em outro mais, se levar uma ulterior suspensão da Fifa por bom comportamento.
De qualquer forma, o Sr. Blatter – que estava na tribuna – deveria ser inteirado por quem de direito da calamitosa arbitragem neste mundial. Aristóteles, apesar de desconhecer o esporte bretão, ensina das vantagens dos pontos intermédios. Assim nem farra de cartões, nem a renúncia ao seu emprego. Os juízes devem ser escolhidos menos pela geografia do que pela experiência. Mundial não é o momento de testar árbitros verdes ou fora dos grandes torneios.
Colcha de Retalhos XLVII
Ainda a Reforma do Código Florestal
O Agrônomo Luiz Antonio Martinelli, professor titular do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), da Universidade de São Paulo, diz em entrevista a O Globo que o relatório do Deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), com a nova versão do Código Florestal, não tem nenhum embasamento científico e atende somente a interesses políticos.
Na verdade, dada a leviandade do relator pró-ruralista, Martinelli afirma, reportando-se a estudo da Embrapa: “Esse estudo, tecnicamente, é um lixo que já foi contestado por vários colegas que trabalham com mudanças no uso da terra. (...) (O) estudo do pesquisador da Embrapa é uma falácia encomendada. E esse foi o problema: o único estudo no qual o nobre deputado se baseou foi um estudo errado, que ele sabia que sofria fortes contestações. Então o estudo teve um uso meramente político.
Os leitores deste blog já estão informados da qualidade espúria do relatório do deputado, em aliança com a frente ruralista (presidente e relator da dita Comissão Especial são ruralistas, ou de carteirinha,o primeiro, ou de ocasião, como Rebelo).
Outros tópicos relevantes da entrevista: “As principais falhas são a redução da APP, a moratória, a não-punição. Se essas reformas forem aprovadas, estaremos indo na contramão da história. Por um lado, o Brasil investe milhões para promover um combustível ecológico, como é o etanol; por outro lado, essa reforma vai permitir ocorrer um desmatamento desenfreado, lançando uma quantidade enorme de carbono na atmosfera.”
“Não tem como uma floresta caber em 7,5 m de largura e ter alguma função ecológica. Não tem função ecológica protetora nenhuma em uma área tão exigua. Mesmo 15 m é muito pouco, isso é um retrocesso muito grande.”
Passar para os estados a prerrogativa de decidirem se ampliam ou reduzem as APPs “abre um precedente muito perigoso. Uma assembleia estadual é muito mais afeita a pressões de grupos locais.”
No contexto do anteprojeto ruralista, considerada a verborragia do relatório de Aldo Rebelo, recheado de citações com fumaças científicas, o professor Luiz Martinelli faz comentário que a meu ver encerra a discussão sobre a valia da versão ruralista de um novo Código Florestal: “A comunidade científica não foi consultada. Sei que esta é uma decisão política, mas tem de ser embasada na ciência. Não foi.”
Os Distúrbios no Kirguizistão
Os choques étnicos no sul do Kirguizistão, país montanhoso no centro da Ásia, são possível decorrência dos distúrbios que provocaram a queda do Presidente Kurmanbek Bakiyev, mas apesar de instados, tanto Moscou, quanto Washington, se limitaram a mandar ajuda humanitária.
Essa decisão política de duas Nações que se vem enfrentando há algum tempo nesse peculiar cenário reflete uma tácita e rara concordância. Não é difícil supor que tal se deve ao temor de se descobrir em um atoleiro, acrescido – no caso dos Estados Unidos - da circunstância que não seria prudente estender ainda mais o seu envolvimento em conflitos, já estando empenhado no Iraque e no Afeganistão.
A importância do Kirguizistão se prende justamente à sua posição geográfica. Para os Estados Unidos, é vital, em termos logísticos da conflagração afegã, a sua base aérea de Manas. Funciona como um centro (hub) do tráfego aéreo relativo à campanha aliada contra o talibã.
Por seu lado, a Rússia dispõe igualmente de uma base aérea, em Kant. O recente reforço militar enviado para o Kirguizistão por Moscou se limita a algumas centenas de paraquedistas, com o escopo exclusivo de defender a base.
A previsão – talvez otimista – é que o dissenso interno enfrentado pelo governo interino de Roza Otunbayeva venha a refluir e possa, assim, ser controlado. Nesse sentido, refugiados da etnia uzbeque, estariam tentando retornar a seus lares. Tudo dependerá de um eventual restabelecimento de um modus vivendi entre a maioria kirguiz e a minoria uzbeque.
( Fonte: International Herald Tribune)
Rodapé da Copa
Ontem com a eliminação virtual dos Camarões, ao colecionar a sua segunda derrota nesta Copa, não participará da segunda fase essa seleção que é a que tem maior participação, entre os africanos, nas diversas Copas do Mundo. Por mais de uma vez, inclusive, lograra classificar-se para a segunda fase. Desta feita, faltou-lhe a inventiva de antes, e o seu craque Eto, a par do gol de ontem, não teve muita presença.
Por sua vez, a Holanda, mesmo sem o brilhantismo de vezes anteriores, tornou-se a primeira seleção matematicamente classificada para a segunda fase.
Hoje, temos o jogo do Brasil com a Costa do Marfim. É de esperar-se que a nossa atuação melhore, para a geral alegria da torcida.
O Agrônomo Luiz Antonio Martinelli, professor titular do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), da Universidade de São Paulo, diz em entrevista a O Globo que o relatório do Deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), com a nova versão do Código Florestal, não tem nenhum embasamento científico e atende somente a interesses políticos.
Na verdade, dada a leviandade do relator pró-ruralista, Martinelli afirma, reportando-se a estudo da Embrapa: “Esse estudo, tecnicamente, é um lixo que já foi contestado por vários colegas que trabalham com mudanças no uso da terra. (...) (O) estudo do pesquisador da Embrapa é uma falácia encomendada. E esse foi o problema: o único estudo no qual o nobre deputado se baseou foi um estudo errado, que ele sabia que sofria fortes contestações. Então o estudo teve um uso meramente político.
Os leitores deste blog já estão informados da qualidade espúria do relatório do deputado, em aliança com a frente ruralista (presidente e relator da dita Comissão Especial são ruralistas, ou de carteirinha,o primeiro, ou de ocasião, como Rebelo).
Outros tópicos relevantes da entrevista: “As principais falhas são a redução da APP, a moratória, a não-punição. Se essas reformas forem aprovadas, estaremos indo na contramão da história. Por um lado, o Brasil investe milhões para promover um combustível ecológico, como é o etanol; por outro lado, essa reforma vai permitir ocorrer um desmatamento desenfreado, lançando uma quantidade enorme de carbono na atmosfera.”
“Não tem como uma floresta caber em 7,5 m de largura e ter alguma função ecológica. Não tem função ecológica protetora nenhuma em uma área tão exigua. Mesmo 15 m é muito pouco, isso é um retrocesso muito grande.”
Passar para os estados a prerrogativa de decidirem se ampliam ou reduzem as APPs “abre um precedente muito perigoso. Uma assembleia estadual é muito mais afeita a pressões de grupos locais.”
No contexto do anteprojeto ruralista, considerada a verborragia do relatório de Aldo Rebelo, recheado de citações com fumaças científicas, o professor Luiz Martinelli faz comentário que a meu ver encerra a discussão sobre a valia da versão ruralista de um novo Código Florestal: “A comunidade científica não foi consultada. Sei que esta é uma decisão política, mas tem de ser embasada na ciência. Não foi.”
Os Distúrbios no Kirguizistão
Os choques étnicos no sul do Kirguizistão, país montanhoso no centro da Ásia, são possível decorrência dos distúrbios que provocaram a queda do Presidente Kurmanbek Bakiyev, mas apesar de instados, tanto Moscou, quanto Washington, se limitaram a mandar ajuda humanitária.
Essa decisão política de duas Nações que se vem enfrentando há algum tempo nesse peculiar cenário reflete uma tácita e rara concordância. Não é difícil supor que tal se deve ao temor de se descobrir em um atoleiro, acrescido – no caso dos Estados Unidos - da circunstância que não seria prudente estender ainda mais o seu envolvimento em conflitos, já estando empenhado no Iraque e no Afeganistão.
A importância do Kirguizistão se prende justamente à sua posição geográfica. Para os Estados Unidos, é vital, em termos logísticos da conflagração afegã, a sua base aérea de Manas. Funciona como um centro (hub) do tráfego aéreo relativo à campanha aliada contra o talibã.
Por seu lado, a Rússia dispõe igualmente de uma base aérea, em Kant. O recente reforço militar enviado para o Kirguizistão por Moscou se limita a algumas centenas de paraquedistas, com o escopo exclusivo de defender a base.
A previsão – talvez otimista – é que o dissenso interno enfrentado pelo governo interino de Roza Otunbayeva venha a refluir e possa, assim, ser controlado. Nesse sentido, refugiados da etnia uzbeque, estariam tentando retornar a seus lares. Tudo dependerá de um eventual restabelecimento de um modus vivendi entre a maioria kirguiz e a minoria uzbeque.
( Fonte: International Herald Tribune)
Rodapé da Copa
Ontem com a eliminação virtual dos Camarões, ao colecionar a sua segunda derrota nesta Copa, não participará da segunda fase essa seleção que é a que tem maior participação, entre os africanos, nas diversas Copas do Mundo. Por mais de uma vez, inclusive, lograra classificar-se para a segunda fase. Desta feita, faltou-lhe a inventiva de antes, e o seu craque Eto, a par do gol de ontem, não teve muita presença.
Por sua vez, a Holanda, mesmo sem o brilhantismo de vezes anteriores, tornou-se a primeira seleção matematicamente classificada para a segunda fase.
Hoje, temos o jogo do Brasil com a Costa do Marfim. É de esperar-se que a nossa atuação melhore, para a geral alegria da torcida.
sábado, 19 de junho de 2010
A Lei da Ficha Limpa (II)
O Tribunal Superior Eleitoral por seis votos a um deu plena vigência à Lei da Ficha Limpa. Depois dos testemunhos de gramáticos e linguistas não havia qualquer motivo para esconder os condenados anteriormente atrás do biombo do ‘forem condenados’ ao invés dos ‘tenham sido condenados’. Tal interpretação redutiva não tinha qualquer fundamento na língua, como o atestam as inúmeras abonações que dão ao tempo verbal caráter condicional.
O solitário voto do Ministro Marco Aurélio Mello não desluz da maciça aprovação outorgada à benemérita iniciativa da PLP 518/09, que mostra o quão relevante é o empenho da sociedade civil. Valha a empresa do M.C.C.E., que serve como exemplo a ser imitado, haja vista a inoperância corporativa e alienada do Congresso. Somente a pressão da opinião pública tornará risíveis as desculpas e os pretextos de quantos buscam desmerecer da força da opinião pública, querendo inclusive fantasiá-la com os arremedos de ‘opinião publicada’.
Perguntemos agora ao deputado de Santa Cruz, no meu Rio Grande do Sul, se ele, que se disse lixar para a dita opinião, gostou da nova lei e do efeito que terá sobre os seus intentos de candidatar-se no futuro.
A força da opinião, que ocupa o espaço vazio deixado pela criminosa incúria e surda cumplicidade cooperativa com a ilicitude evidenciada à saciedade pelas duas Câmaras, poderá estender a proibição imposta pela ficha limpa aos deputados e senadores que se acreditavam impunes, por obra e graça da inexistência na prática de comissões de ética em nosso Congresso.
Penso no deputado do Castelo e no senador do Maranhão, a que a maioria de deputados e senadores salvou da merecida punição, por um simulacro de justiça, que mancha a instituição e escarnece do Povo soberano.
Quanto ao papel importante que deverá cumprir a nova lei da Ficha Limpa, ele deverá ser preservado e defendido pela aguda atenção desse mesmo Povo que a tornou possível. Não tenho dúvidas que os inúmeros transgressores da lei, condenados por órgão colegiados, como, v.g., Anthony Garotinho (PR) no Rio de Janeiro, Paulo Maluf (PP) em São Paulo, e Cássio Cunha Lima (PSDB) na Paraíba, mexerão céus e terras para lograrem re-obter a licença para concorrer às eleições.
Não pode haver exceções para esta Lei. Quem for colhido, nas suas malhas, deve cumprir com os prazos legais de proibição de valer-se deste direito cívico. Muitos o confundiram no passado como autorização na prática para delinquir, ou para transformar o mandato legislativo em iníquo privilégio que o punha fora do alcance da legislação válida para o comum dos mortais.
Os fichas sujas não deixarão de recorrer ao Supremo Tribunal Federal, levados por espertos causídicos, no intúito de ou esvaziar, ou estropiar a nova lei que constitui um marco no combate à corrupção no Brasil.
A Opinião Pública, braço da sociedade civil que fez o recalcitrante Congresso engolir o amargo fármaco da Nova Lei, precisa estar atenta. Cumpre rebater as sólitas manobras dos que tentam desmerecê-la na guisa de ‘opiniao publicada’, com os seus escusos e inconfessáveis propósitos.
( Fonte: O Globo )
Rodapé da Copa.
Realizando-se na África, não há de surpreender que a presente Copa abunde em zebras. Se o gol da Coreia do Norte, última do ranking mundial da Fifa, contra a seleção brasileira pode até ambicionar inserir-se nessa pouco honrosa classificação, não há dúvidas que os percalces sofridos pela Espanha – a Fúria tem o vezo de contrariar os mais risonhos prognósticos – Inglaterra (empatar com a humilde Argélia !) e França (contando com a simpática ‘ajuda’ do juiz saudita) já representariam a incontrastável entronização do arisco animal listado como símbolo. Surge, contudo, uma dificuldade. A derrota do bicho-papão Alemanha parece contribuir para transformar eventuais espantos em corriqueira realidade.
Será que as seleções ditas favoritas devam pôr as barbas de molho e se resignarem à virtual perda de seus privilégios ? Parece pouco crível que os outros times se conformem em cumprir o seu papel de ‘sparrings’. Tudo indica que tais risonhos esquemas tenham toda a aparência de o que na realidade são: existe uma equalização por baixo das seleções, e por isso a pletora de pretensas ‘surpresas’ tenderia a ser a regra e não a exceção do torneio.
O solitário voto do Ministro Marco Aurélio Mello não desluz da maciça aprovação outorgada à benemérita iniciativa da PLP 518/09, que mostra o quão relevante é o empenho da sociedade civil. Valha a empresa do M.C.C.E., que serve como exemplo a ser imitado, haja vista a inoperância corporativa e alienada do Congresso. Somente a pressão da opinião pública tornará risíveis as desculpas e os pretextos de quantos buscam desmerecer da força da opinião pública, querendo inclusive fantasiá-la com os arremedos de ‘opinião publicada’.
Perguntemos agora ao deputado de Santa Cruz, no meu Rio Grande do Sul, se ele, que se disse lixar para a dita opinião, gostou da nova lei e do efeito que terá sobre os seus intentos de candidatar-se no futuro.
A força da opinião, que ocupa o espaço vazio deixado pela criminosa incúria e surda cumplicidade cooperativa com a ilicitude evidenciada à saciedade pelas duas Câmaras, poderá estender a proibição imposta pela ficha limpa aos deputados e senadores que se acreditavam impunes, por obra e graça da inexistência na prática de comissões de ética em nosso Congresso.
Penso no deputado do Castelo e no senador do Maranhão, a que a maioria de deputados e senadores salvou da merecida punição, por um simulacro de justiça, que mancha a instituição e escarnece do Povo soberano.
Quanto ao papel importante que deverá cumprir a nova lei da Ficha Limpa, ele deverá ser preservado e defendido pela aguda atenção desse mesmo Povo que a tornou possível. Não tenho dúvidas que os inúmeros transgressores da lei, condenados por órgão colegiados, como, v.g., Anthony Garotinho (PR) no Rio de Janeiro, Paulo Maluf (PP) em São Paulo, e Cássio Cunha Lima (PSDB) na Paraíba, mexerão céus e terras para lograrem re-obter a licença para concorrer às eleições.
Não pode haver exceções para esta Lei. Quem for colhido, nas suas malhas, deve cumprir com os prazos legais de proibição de valer-se deste direito cívico. Muitos o confundiram no passado como autorização na prática para delinquir, ou para transformar o mandato legislativo em iníquo privilégio que o punha fora do alcance da legislação válida para o comum dos mortais.
Os fichas sujas não deixarão de recorrer ao Supremo Tribunal Federal, levados por espertos causídicos, no intúito de ou esvaziar, ou estropiar a nova lei que constitui um marco no combate à corrupção no Brasil.
A Opinião Pública, braço da sociedade civil que fez o recalcitrante Congresso engolir o amargo fármaco da Nova Lei, precisa estar atenta. Cumpre rebater as sólitas manobras dos que tentam desmerecê-la na guisa de ‘opiniao publicada’, com os seus escusos e inconfessáveis propósitos.
( Fonte: O Globo )
Rodapé da Copa.
Realizando-se na África, não há de surpreender que a presente Copa abunde em zebras. Se o gol da Coreia do Norte, última do ranking mundial da Fifa, contra a seleção brasileira pode até ambicionar inserir-se nessa pouco honrosa classificação, não há dúvidas que os percalces sofridos pela Espanha – a Fúria tem o vezo de contrariar os mais risonhos prognósticos – Inglaterra (empatar com a humilde Argélia !) e França (contando com a simpática ‘ajuda’ do juiz saudita) já representariam a incontrastável entronização do arisco animal listado como símbolo. Surge, contudo, uma dificuldade. A derrota do bicho-papão Alemanha parece contribuir para transformar eventuais espantos em corriqueira realidade.
Será que as seleções ditas favoritas devam pôr as barbas de molho e se resignarem à virtual perda de seus privilégios ? Parece pouco crível que os outros times se conformem em cumprir o seu papel de ‘sparrings’. Tudo indica que tais risonhos esquemas tenham toda a aparência de o que na realidade são: existe uma equalização por baixo das seleções, e por isso a pletora de pretensas ‘surpresas’ tenderia a ser a regra e não a exceção do torneio.
sexta-feira, 18 de junho de 2010
A Baleia e o Japão
Parece difícil acreditar mas o jornal britânico Sunday Times documentou através de gravações até onde vai o empenho do Japão em garantir a liberação da pesca da baleia.
Desde muito havia indícios quanto ao oferecimento de “incentivos” japoneses a delegados de países pobres do Terceiro Mundo no sentido de ‘orientá-los’ em votações determinantes durante as reuniões anuais da Comissão Internacional da Baleia (CIB).
Desta feita, no entanto, os repórteres do Sunday Times foram mais cuidadosos na coleta de dados incriminatórios.
Fingindo-se de representantes de milionário suiço, lobista contrário à caça de baleias, contactaram diplomatas de países africanos, caribenhos e do Pacífico. Com vistas à próxima reunião anual marcada para Agadir, no Marrocos, a iniciar-se na segunda feira, dia 21 de junho, ofereceram dinheiro em troca de mudança de posição – ao invés de aliados dos japoneses, votariam com os países conservacionistas.
Sem saber que estavam sendo gravados, negociadores como Ibrahima Sory Sylla, da Guiné, contaram que o Japão paga viagens, hospedagens e diárias para eles.
Por outro lado, Geoffrey Nanyaro, representante da Tanzânia na CIB igualmente declarou que delegados também ganham viagens ao Japão com todas as despesas pagas. Chegam ao ponto de perguntar: Você vai querer massagem de graça ? Não está sozinho ? Não quer relaxar ?
Diante das documentadas acusações – de que os japoneses pagavam de passagens aéreas a prostitutas em troca do voto – o Ministro do Ambiente da Austrália, Peter Garrett, pediu uma ‘reforma importante’da CIB, que tem 88 países membros, entre os quais promotores da caça às baleias, como Japão, Islândia e Noruega, bem como a maioria de nações, entre as quais o Brasil, que defendem medidas em prol da preservação das espécies desse grande mamífero marinho.
Posto que esteja documentada a desfaçatez e o procedimento antiético nipônico, nada existe no regulamento da CIB que torne ilegal essa peculiar ‘ajuda’ do Japão para engordar a bancada favorável as suas propostas.
Desde 1986 acha-se em vigor moratória que determina a suspensão parcial da pesca industrial às baleias. Essa moratória, se permitiu que a baleia não desapareça dos mares, não é completa, pois se permite uma suposta pesca com alegado objetivo de pesquisa, com o abate de trezentas baleias por ano.
Esta suposta pesca científica – como já foi demonstrado neste blog – não passa de um cínico expediente do Japão de arranjar carne de baleia para os ávidos consumidores nipônicos.
No que concerne a tais acusações – cuja seriedade e veracidade se afiguram dificilmente questionáveis – o governo japonês as nega categoricamente. O autismo da posição do governo mais se evidencia no total desprezo por qualquer proteção a essa espécie em perigo de extinção. A tal respeito, o ministro da Pesca, Masahiko Yamada, ameaça deixar a CIB se a conferência de Agadir não levantar a moratória à caça.
Nunca um país ousou mostrar a própria sanha de trucidar uma espécie ameaçada de forma tão ignóbil. Não só pelas baleias, mas também pelo auto-respeito do homo sapiens, façamos sinceros votos que, na semana vindoura, em Agadir, haja maioria de delegados honestos e responsáveis.
Rodapé da Copa.
Não sei como a Copa do Mundo da África do Sul passará para a história desportiva. Em termos de árbitros, o panorama não se afigura dos mais animadores. No jogo entre França e México, que terminou 2x0 em favor dos aztecas, a Fifa escolheu um juiz inexperiente em termos internacionais, Khalil al Ghamdi, de nacionalidade saudita. A sua relativa ignorância dos artifícios de muitos jogadores, permitiu que visse um penalty contra a França que não existiu, como o demonstrou a ótima cobertura da televisão. O beque francês Abidal desarmou Barrera, atacante mexicano na área com um carrinho que visava exclusivamente a bola. O que fez o atleta do México? Uma interpretação digna do César [1]na França e do prêmio Molière no Brasil – um mergulho para a frente, para fazer crer ao árbitro que tinha sido derrubado pelo adversário francês. Para azar dos gauleses, o juiz engoliu como veraz o que deveria na verdade ser punido com cartão amarelo, como simulação. Como na véspera, no jogo entre Uruguai e África do Sul, o gol decisivo foi virtualmente marcado pelo juiz !
( Fontes: Folha de S. Paulo e O Globo )
[1] O equivalente do Oscar para o cinema francês.
Desde muito havia indícios quanto ao oferecimento de “incentivos” japoneses a delegados de países pobres do Terceiro Mundo no sentido de ‘orientá-los’ em votações determinantes durante as reuniões anuais da Comissão Internacional da Baleia (CIB).
Desta feita, no entanto, os repórteres do Sunday Times foram mais cuidadosos na coleta de dados incriminatórios.
Fingindo-se de representantes de milionário suiço, lobista contrário à caça de baleias, contactaram diplomatas de países africanos, caribenhos e do Pacífico. Com vistas à próxima reunião anual marcada para Agadir, no Marrocos, a iniciar-se na segunda feira, dia 21 de junho, ofereceram dinheiro em troca de mudança de posição – ao invés de aliados dos japoneses, votariam com os países conservacionistas.
Sem saber que estavam sendo gravados, negociadores como Ibrahima Sory Sylla, da Guiné, contaram que o Japão paga viagens, hospedagens e diárias para eles.
Por outro lado, Geoffrey Nanyaro, representante da Tanzânia na CIB igualmente declarou que delegados também ganham viagens ao Japão com todas as despesas pagas. Chegam ao ponto de perguntar: Você vai querer massagem de graça ? Não está sozinho ? Não quer relaxar ?
Diante das documentadas acusações – de que os japoneses pagavam de passagens aéreas a prostitutas em troca do voto – o Ministro do Ambiente da Austrália, Peter Garrett, pediu uma ‘reforma importante’da CIB, que tem 88 países membros, entre os quais promotores da caça às baleias, como Japão, Islândia e Noruega, bem como a maioria de nações, entre as quais o Brasil, que defendem medidas em prol da preservação das espécies desse grande mamífero marinho.
Posto que esteja documentada a desfaçatez e o procedimento antiético nipônico, nada existe no regulamento da CIB que torne ilegal essa peculiar ‘ajuda’ do Japão para engordar a bancada favorável as suas propostas.
Desde 1986 acha-se em vigor moratória que determina a suspensão parcial da pesca industrial às baleias. Essa moratória, se permitiu que a baleia não desapareça dos mares, não é completa, pois se permite uma suposta pesca com alegado objetivo de pesquisa, com o abate de trezentas baleias por ano.
Esta suposta pesca científica – como já foi demonstrado neste blog – não passa de um cínico expediente do Japão de arranjar carne de baleia para os ávidos consumidores nipônicos.
No que concerne a tais acusações – cuja seriedade e veracidade se afiguram dificilmente questionáveis – o governo japonês as nega categoricamente. O autismo da posição do governo mais se evidencia no total desprezo por qualquer proteção a essa espécie em perigo de extinção. A tal respeito, o ministro da Pesca, Masahiko Yamada, ameaça deixar a CIB se a conferência de Agadir não levantar a moratória à caça.
Nunca um país ousou mostrar a própria sanha de trucidar uma espécie ameaçada de forma tão ignóbil. Não só pelas baleias, mas também pelo auto-respeito do homo sapiens, façamos sinceros votos que, na semana vindoura, em Agadir, haja maioria de delegados honestos e responsáveis.
Rodapé da Copa.
Não sei como a Copa do Mundo da África do Sul passará para a história desportiva. Em termos de árbitros, o panorama não se afigura dos mais animadores. No jogo entre França e México, que terminou 2x0 em favor dos aztecas, a Fifa escolheu um juiz inexperiente em termos internacionais, Khalil al Ghamdi, de nacionalidade saudita. A sua relativa ignorância dos artifícios de muitos jogadores, permitiu que visse um penalty contra a França que não existiu, como o demonstrou a ótima cobertura da televisão. O beque francês Abidal desarmou Barrera, atacante mexicano na área com um carrinho que visava exclusivamente a bola. O que fez o atleta do México? Uma interpretação digna do César [1]na França e do prêmio Molière no Brasil – um mergulho para a frente, para fazer crer ao árbitro que tinha sido derrubado pelo adversário francês. Para azar dos gauleses, o juiz engoliu como veraz o que deveria na verdade ser punido com cartão amarelo, como simulação. Como na véspera, no jogo entre Uruguai e África do Sul, o gol decisivo foi virtualmente marcado pelo juiz !
( Fontes: Folha de S. Paulo e O Globo )
[1] O equivalente do Oscar para o cinema francês.
quinta-feira, 17 de junho de 2010
Chávez, não-Ditador por graça da OEA
Continuam e se intensificam as tropelias do coronel Hugo Chávez contra as mais comezinhas garantias democráticas na Venezuela. Embora não costume anular os malfeitos realizados – e é prova disto o seu fechamento em 2007 da RCTV, a principal rede televisiva privada do país – no momento presente, talvez querendo valer-se da atenção preponderante concedida à Copa do Mundo, o cripto-ditador tem pisado mais forte no acelerador.
Para amortecer o impacto dos incessantes golpes com que vilipendia o que resta de liberdade democrática na terra venezuelana, o caudilho conta com a ajuda e as melífluas declarações de seus aliados, a partir da Alba – arremedo de organização internacional que congrega os regimes filo-chavistas, a começar pelo sandinista Ortega, passando pelos gerontocratas irmãos Castro, e se estendendo até o ex-bispo Lugo, no Paraguai - , e alargando-se com os ‘muy amigos’ Lula da Silva e Cristina Kirchner.
No entanto, se além da queda pelas vistosas fardas com muitos penduricalhos, Chávez deveria votar especial gratidão – a par de queimar oferendas nos seus pejis privados – à OEA, esta secular e ultra-ineficiente organização dos países americanos.
Por quanto tempo, o seu Secretário-Geral, o chileno José Miguel Insulza, e o colegiado da OEA persistirão em fingir não enxergar as repetidas transgressões de Hugo Chávez e de toda a coorte que montou ao cabo de onze anos de domínio na Venezuela ? Diz o povo que o pior cego é aquele que não quer ver. Para quem teima em manter a exclusão de Honduras do seio pan-americano – culpada de ter cortado pela raiz a jogada de Chávez e Lula para a re-materialização do golpista in pectore José Manuel Zelaya – não são de estranhar os dois pesos e duas medidas em não aplicar ao reincidente infrator venezuelano as normas da Carta Democrática.
Como na fazenda de Orwell, alguns animais são mais iguais do que os outros. Cabe aos partidários, no entanto, do proto-ditador Chávez tomar cuidado para evitar que, ao invés de se tornarem partícipes do opróbio que recai sobre os que se recusam a dizer que o rei está nu, se afundem no chavascal que circunda àqueles que parecem ignorar quão próximo o ridículo está do cinismo.
O silêncio conivente de muitas chancelarias tem dado ao caudilho Chávez a falsa segurança de que tudo lhe é permitido. Desde que, a exemplo das defuntas ditaduras do Leste Europeu que tanto admira, despachou dirigentes da Human Rights Watch[1] - que desejavam publicar relatório sobre a retrospectiva chavista em matéria de direitos humanos -ilegalmente, e com violência, no primeiro avião, que partia de Caracas, o comportamento do quase-ditador e de seu regime se torna cada vez mais atrevido e descarado.
Avolumam-se as infrações e os ataques contra os ‘inimigos’ da pátria – não há adversários políticos para as ditaduras e seus sucedâneos. Todo opositor deverá ser demonizado. Depois do fechamento da RCTV, a última voz de cauteloso dissenso, a Globovisión de Guillermo Zuloaga é acossada de todas as formas, mesmo aquelas que menos compromisso têm com qualquer aparência de equanimidade jurídica. Agora, a acusação capital contra Zuloaga é de possuir carros de procedência duvidosa. Como nos ensina La Fontaine, o poder absoluto não carece de lógica. Basta-lhe a força.
Na paranóia que acomete a ainda vasta irmandade dos castro-ditadores, tais regimes não pecam pela falta de apetite, nem se circunscrevem aos atores principais. Não refugam ‘distinguir’ igualmente aos modestos mas corajosos lutadores contra o arbítrio, como o quase anônimo jornalista Gustavo Azócar Alcalá que vem de ser condenado a dois anos e meio de prisão por delito de opinião. Assinale-se a ‘inventiva’ dos hierarcas do regime, que agora se servem do Código Penal para intimidar e, se for necessário, punir os ‘inimigos’ opositores.
Além da juíza Mariá Afiuni, que foi trancafiada na cadeia por ter a coragem de contrariar o poderoso de turno – para tanto a receita será sempre a infâmia de manipulados processos – não faltam mais vítimas anônimas para aliviar os temores do coronel Chávez.
Infelizmente, Garcia Márquez estava certo em seu prognóstico quanto ao futuro do novel tenente-Coronel Hugo Chávez Frias. Afinal, há na Venezuela uma longa e melancólica lista de presidentes perpétuos.
Somente o Povo venezuelano pode pôr termo às tropelias do caudilho contra a democracia. Lá em seu íntimo, mal encoberto pela própria soberbia, ele saberá o que lhe espera. Mais cedo ou mais tarde, a nêmesis que soi visitar na tarda noite os tiranos estará à sua espera.
Terá sorte se lhe couber o exílio, que é talvez a mais cruel prisão reservada aos ditadores e assemelhados.
Rodapé da Copa.
Se a simpática equipe da África do Sul não jogou bem contra o Uruguai, talvez sob o peso de excessivas cobranças ao ensejo de um feriado importante acerca de data histórica na luta contra o apartheid, a atuação do árbitro helvético Massimo Busacca lhe foi extremamente prejudicial. A marcação do penalty cometido pelo goleiro foi um crasso erro, eis que o jogador uruguaio supostamente vítima da penalidade máxima estava impedido, cousa que o trio de arbitragem suiço não quis dar-se conta. E o tal aclamado árbitro resolveu extrapolar. Por um penalty inexistente, ainda por cima expulsou o goleiro Khune. Será que agiria dessa forma contra a Itália, França, Alemanha ou Reino Unido ? A África do Sul que se tem prodigado tanto no esforço de acolher este Mundial da Fifa merecia melhor tratamento e mais respeito.
( Fonte: O Globo )
[1] ONG de Defesa dos Direitos Humanos.
Para amortecer o impacto dos incessantes golpes com que vilipendia o que resta de liberdade democrática na terra venezuelana, o caudilho conta com a ajuda e as melífluas declarações de seus aliados, a partir da Alba – arremedo de organização internacional que congrega os regimes filo-chavistas, a começar pelo sandinista Ortega, passando pelos gerontocratas irmãos Castro, e se estendendo até o ex-bispo Lugo, no Paraguai - , e alargando-se com os ‘muy amigos’ Lula da Silva e Cristina Kirchner.
No entanto, se além da queda pelas vistosas fardas com muitos penduricalhos, Chávez deveria votar especial gratidão – a par de queimar oferendas nos seus pejis privados – à OEA, esta secular e ultra-ineficiente organização dos países americanos.
Por quanto tempo, o seu Secretário-Geral, o chileno José Miguel Insulza, e o colegiado da OEA persistirão em fingir não enxergar as repetidas transgressões de Hugo Chávez e de toda a coorte que montou ao cabo de onze anos de domínio na Venezuela ? Diz o povo que o pior cego é aquele que não quer ver. Para quem teima em manter a exclusão de Honduras do seio pan-americano – culpada de ter cortado pela raiz a jogada de Chávez e Lula para a re-materialização do golpista in pectore José Manuel Zelaya – não são de estranhar os dois pesos e duas medidas em não aplicar ao reincidente infrator venezuelano as normas da Carta Democrática.
Como na fazenda de Orwell, alguns animais são mais iguais do que os outros. Cabe aos partidários, no entanto, do proto-ditador Chávez tomar cuidado para evitar que, ao invés de se tornarem partícipes do opróbio que recai sobre os que se recusam a dizer que o rei está nu, se afundem no chavascal que circunda àqueles que parecem ignorar quão próximo o ridículo está do cinismo.
O silêncio conivente de muitas chancelarias tem dado ao caudilho Chávez a falsa segurança de que tudo lhe é permitido. Desde que, a exemplo das defuntas ditaduras do Leste Europeu que tanto admira, despachou dirigentes da Human Rights Watch[1] - que desejavam publicar relatório sobre a retrospectiva chavista em matéria de direitos humanos -ilegalmente, e com violência, no primeiro avião, que partia de Caracas, o comportamento do quase-ditador e de seu regime se torna cada vez mais atrevido e descarado.
Avolumam-se as infrações e os ataques contra os ‘inimigos’ da pátria – não há adversários políticos para as ditaduras e seus sucedâneos. Todo opositor deverá ser demonizado. Depois do fechamento da RCTV, a última voz de cauteloso dissenso, a Globovisión de Guillermo Zuloaga é acossada de todas as formas, mesmo aquelas que menos compromisso têm com qualquer aparência de equanimidade jurídica. Agora, a acusação capital contra Zuloaga é de possuir carros de procedência duvidosa. Como nos ensina La Fontaine, o poder absoluto não carece de lógica. Basta-lhe a força.
Na paranóia que acomete a ainda vasta irmandade dos castro-ditadores, tais regimes não pecam pela falta de apetite, nem se circunscrevem aos atores principais. Não refugam ‘distinguir’ igualmente aos modestos mas corajosos lutadores contra o arbítrio, como o quase anônimo jornalista Gustavo Azócar Alcalá que vem de ser condenado a dois anos e meio de prisão por delito de opinião. Assinale-se a ‘inventiva’ dos hierarcas do regime, que agora se servem do Código Penal para intimidar e, se for necessário, punir os ‘inimigos’ opositores.
Além da juíza Mariá Afiuni, que foi trancafiada na cadeia por ter a coragem de contrariar o poderoso de turno – para tanto a receita será sempre a infâmia de manipulados processos – não faltam mais vítimas anônimas para aliviar os temores do coronel Chávez.
Infelizmente, Garcia Márquez estava certo em seu prognóstico quanto ao futuro do novel tenente-Coronel Hugo Chávez Frias. Afinal, há na Venezuela uma longa e melancólica lista de presidentes perpétuos.
Somente o Povo venezuelano pode pôr termo às tropelias do caudilho contra a democracia. Lá em seu íntimo, mal encoberto pela própria soberbia, ele saberá o que lhe espera. Mais cedo ou mais tarde, a nêmesis que soi visitar na tarda noite os tiranos estará à sua espera.
Terá sorte se lhe couber o exílio, que é talvez a mais cruel prisão reservada aos ditadores e assemelhados.
Rodapé da Copa.
Se a simpática equipe da África do Sul não jogou bem contra o Uruguai, talvez sob o peso de excessivas cobranças ao ensejo de um feriado importante acerca de data histórica na luta contra o apartheid, a atuação do árbitro helvético Massimo Busacca lhe foi extremamente prejudicial. A marcação do penalty cometido pelo goleiro foi um crasso erro, eis que o jogador uruguaio supostamente vítima da penalidade máxima estava impedido, cousa que o trio de arbitragem suiço não quis dar-se conta. E o tal aclamado árbitro resolveu extrapolar. Por um penalty inexistente, ainda por cima expulsou o goleiro Khune. Será que agiria dessa forma contra a Itália, França, Alemanha ou Reino Unido ? A África do Sul que se tem prodigado tanto no esforço de acolher este Mundial da Fifa merecia melhor tratamento e mais respeito.
( Fonte: O Globo )
[1] ONG de Defesa dos Direitos Humanos.
quarta-feira, 16 de junho de 2010
O Esquema Lula para as Questões Difíceis
O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva só surpreende àqueles que desconhecem a sua maneira de agir quando se defronta com questões difíceis.
De início, é importante determinar o que constitui ‘questão difícil’ para Lula. É aquela em que a assessoria técnica responsável preconiza uma determinação que vai contra a medida proposta. Chamemo-la de alcance popular, demagógico ou eleitoreiro, os efeitos do fator em causa não terão alterado o próprio caráter prejudicial.
Embora o cenário possa variar – e.g., pode ser econômico ou ambiental – a evolução da postura do personagem de quem se esperam as melhores decisões para a sociedade em geral tem mostrado em diversos episódios uma comovente coerência.
Em que se explicita essa admirável coerência ? Consiste sobretudo em esperta sequência de passos que, a despeito de não determinarem o desfecho, supostamente manifestam a atitude preclara, sensata e de estadista de ‘Nosso Guia’.
Tenhamos presente o demagógico e eleitoreiro reajuste de 7,7% para 8,4 milhões de aposentados e pensionistas do INSS que ganham acima de um salário mínimo, o que corresponderia a 6% do eleitorado. Concedido por um Congresso às vesperas dos comícios de outubro, a medida entra naquele cesto de irresponsáveis ‘bondades’ que assinalam tristemente os anos eleitorais.
Qual é o figurino de Lula para decidir tais questões ? Primeiro, ouve os responsáveis técnicos e políticos na área em apreço, no caso os ministros da Fazenda e do Planejamento. Como o primeiro mandatário já deveria sabê-lo, tanto Mantega quanto Bernardo se expressaram contra o aumento, não só por não existirem fundos orçamentários para prover a tal disposição, senão e sobretudo pelo efeito cumulativo sobre o já preocupante situação do deficit da Previdência.
Era então a hora de luzir o Lula estadista, aquela personalidade responsável, que zela pelas finanças pátrias, e que não se abala em tomar determinações impopulares, desde que bem fundadas.
Nesse sentido, com a necessária divulgação, mandou dizer que vetaria os 7,7%, e que de modo algum seria influenciado pela eleição. Valendo-se da imprensa, deu sequência à vulgarização continuada desta persona de Lula, o estadista sem medo, fazendo circular rumores de que até a sexta-feira passada, dia onze de junho, continuava ‘firmemente a pensar em vetar’ a cláusula em tela.
Eis que senão quando – no que se mantém o roteiro secreto das árduas decisões de Lula – intervêm as lideranças do Congresso para ponderar ao grande Chefe que se ele levar avante a difícil determinação, existe grande probabilidade de que tal veto seja derrubado, e, o que seria ainda mais terrível, Câmara e Senado poderiam ainda elevá-lo.
Antes que suceda a metanoia[1] presidencial, um parêntesis cabe: caberia perguntar a que servem tais lideranças – que o Presidente Jânio Quadros, em tempos idos, apostrofara de ‘líderes de trampa’ - se não é para aparecer diante da imprensa e choramingar acerca da impossibilidade de controlar os próprios liderados ?
Contudo, não retardemos mais dessa estória o fim – se não peca pela originalidade, semelha pelo menos uma cartilha bem apreendida por ‘Nosso Guia’. Surpresa ! Tangido pelas circunstâncias – e para não prejudicar a candidatura de sua pupila, aquela a quem comparou a Nelson Mandela, Lula se resigna a assinar o deletério aumento para os aposentados.
Como compensação, manda a justiça recordar, ele se animou a vetar o famigerado fator previdenciário. A campanha contra tal fator é um dos carros-chefes do partido do ínclito Roberto Jefferson que, apesar de cassado, foi escolhido como presidente do P.T.B. Melhor não falar dos desastrosos efeitos em cascata da eventual queda do fator previdenciário, com a previsível enxurrada na justiça de ações reivindicatórias.
Mas isso é uma outra estória, que esperaria não ter de escrever.
( Fonte: Folha de S. Paulo )
Rodapé da Copa
O Globo resumiu em sua manchete a reação do povo brasileiro diante da performance da seleção de Dunga: Tanto segredo para isso ? O caráter burocrático da tática do time brasileiro, com o exagero dos passes laterais e da penosa lentidão, que tornava previsíveis quase todos os lances, o caráter chamativo mas inútil das pedaladas de Robinho infundiram coragem na a princípio atemorizada pobre seleção da Coreia do Norte. Se para vencer a última equipe do ranking mundial da Fifa custa tanto sacrifício, o que serão os próximos matchs ? Armemo-nos de confiança, ó torcedores brasileiros, porque a jornada do Hexa ainda não está traçada, e será certamente muito dífícil. Esperemos que o roteiro final nos conduza ao exemplo de Filipão.
[1] Conversão.
De início, é importante determinar o que constitui ‘questão difícil’ para Lula. É aquela em que a assessoria técnica responsável preconiza uma determinação que vai contra a medida proposta. Chamemo-la de alcance popular, demagógico ou eleitoreiro, os efeitos do fator em causa não terão alterado o próprio caráter prejudicial.
Embora o cenário possa variar – e.g., pode ser econômico ou ambiental – a evolução da postura do personagem de quem se esperam as melhores decisões para a sociedade em geral tem mostrado em diversos episódios uma comovente coerência.
Em que se explicita essa admirável coerência ? Consiste sobretudo em esperta sequência de passos que, a despeito de não determinarem o desfecho, supostamente manifestam a atitude preclara, sensata e de estadista de ‘Nosso Guia’.
Tenhamos presente o demagógico e eleitoreiro reajuste de 7,7% para 8,4 milhões de aposentados e pensionistas do INSS que ganham acima de um salário mínimo, o que corresponderia a 6% do eleitorado. Concedido por um Congresso às vesperas dos comícios de outubro, a medida entra naquele cesto de irresponsáveis ‘bondades’ que assinalam tristemente os anos eleitorais.
Qual é o figurino de Lula para decidir tais questões ? Primeiro, ouve os responsáveis técnicos e políticos na área em apreço, no caso os ministros da Fazenda e do Planejamento. Como o primeiro mandatário já deveria sabê-lo, tanto Mantega quanto Bernardo se expressaram contra o aumento, não só por não existirem fundos orçamentários para prover a tal disposição, senão e sobretudo pelo efeito cumulativo sobre o já preocupante situação do deficit da Previdência.
Era então a hora de luzir o Lula estadista, aquela personalidade responsável, que zela pelas finanças pátrias, e que não se abala em tomar determinações impopulares, desde que bem fundadas.
Nesse sentido, com a necessária divulgação, mandou dizer que vetaria os 7,7%, e que de modo algum seria influenciado pela eleição. Valendo-se da imprensa, deu sequência à vulgarização continuada desta persona de Lula, o estadista sem medo, fazendo circular rumores de que até a sexta-feira passada, dia onze de junho, continuava ‘firmemente a pensar em vetar’ a cláusula em tela.
Eis que senão quando – no que se mantém o roteiro secreto das árduas decisões de Lula – intervêm as lideranças do Congresso para ponderar ao grande Chefe que se ele levar avante a difícil determinação, existe grande probabilidade de que tal veto seja derrubado, e, o que seria ainda mais terrível, Câmara e Senado poderiam ainda elevá-lo.
Antes que suceda a metanoia[1] presidencial, um parêntesis cabe: caberia perguntar a que servem tais lideranças – que o Presidente Jânio Quadros, em tempos idos, apostrofara de ‘líderes de trampa’ - se não é para aparecer diante da imprensa e choramingar acerca da impossibilidade de controlar os próprios liderados ?
Contudo, não retardemos mais dessa estória o fim – se não peca pela originalidade, semelha pelo menos uma cartilha bem apreendida por ‘Nosso Guia’. Surpresa ! Tangido pelas circunstâncias – e para não prejudicar a candidatura de sua pupila, aquela a quem comparou a Nelson Mandela, Lula se resigna a assinar o deletério aumento para os aposentados.
Como compensação, manda a justiça recordar, ele se animou a vetar o famigerado fator previdenciário. A campanha contra tal fator é um dos carros-chefes do partido do ínclito Roberto Jefferson que, apesar de cassado, foi escolhido como presidente do P.T.B. Melhor não falar dos desastrosos efeitos em cascata da eventual queda do fator previdenciário, com a previsível enxurrada na justiça de ações reivindicatórias.
Mas isso é uma outra estória, que esperaria não ter de escrever.
( Fonte: Folha de S. Paulo )
Rodapé da Copa
O Globo resumiu em sua manchete a reação do povo brasileiro diante da performance da seleção de Dunga: Tanto segredo para isso ? O caráter burocrático da tática do time brasileiro, com o exagero dos passes laterais e da penosa lentidão, que tornava previsíveis quase todos os lances, o caráter chamativo mas inútil das pedaladas de Robinho infundiram coragem na a princípio atemorizada pobre seleção da Coreia do Norte. Se para vencer a última equipe do ranking mundial da Fifa custa tanto sacrifício, o que serão os próximos matchs ? Armemo-nos de confiança, ó torcedores brasileiros, porque a jornada do Hexa ainda não está traçada, e será certamente muito dífícil. Esperemos que o roteiro final nos conduza ao exemplo de Filipão.
[1] Conversão.
terça-feira, 15 de junho de 2010
A Candidata Verde
Não, leitor, não estou me referindo à Senadora Marina Silva, Candidata do Partido Verde e do Movimento Ambientalista. Posto que o título seja suscetível de induzir em temporário erro, também nesse caso o ‘verde’ entra no cabeçalho como característica da candidata.
As coisas tenderão a se tornarem menos ambíguas quando se assinalar que o adjetivo é empregado nos sentidos ‘que ainda não amadureceu’ e, mais precisamente, na acepção metafórica, dada no verbete do Dicionário Houaiss ‘a que falta vivência, experiência’.
Entende-se que me reporto à candidata do PT à presidência da república, a Senhora Dilma Rousseff.
Com efeito, a antiga Ministra-Chefe da Casa Civil, que assumira o cargo no Palácio do Planalto em função de acidente na carreira política de José Dirceu, colhido, como se sabe, pelo escândalo do mensalão, cassado em consequência, como vítima sacrificial, pela Câmara dos Deputados.
Recentemente Dilma desincompatibilizou-se desse importante cargo, que, na presidência Lula, equivale à virtual posição de Primeiro Ministro. O próprio José Dirceu, ao despedir-se das responsabilidades planaltinas, aludira, talvez não exatamente em lapso, a esse período como a “meu governo”.
Não há negar, portanto, a relevância de tais funções e a experiência burocrático-administrativa havida pela Ministra-Chefe Dilma Rousseff. Não lhe falta autoridade, como, de resto, o sentiram diversos personagens da República.
Desejo referir-me a um outro gênero de falta de experiência. Jamais tendo sido eleita para qualquer cargo, seja nas esferas municipal, estadual e federal, compreende-se que se mostre insegura no diálogo e nas reuniões políticas, pelo seu desconhecimento do público partidário e das idiossincrasias da política, máxime nos níveis locais e estaduais.
Nesse sentido, e com a inquieta assessoria do partido oficialista, também conhecido como dos Trabalhadores, a nobre candidata tem fugido de entrevistas públicas como antes o diabo da cruz.
Dessarte, pretextando uma súbita viagem à Europa – quatro paises em cinco dias, em que logra encontros de photo-opportunity com Sarkozy amanhã (hoje, assiste ela em Paris, nós no Brasil, submetidos ao verbo do inamovível Galvão Bueno, mas privados dos judiciosos comentários de Falcão, ao jogo da seleção contra a Coreia do Norte); no dia dezessete, em Bruxelas, com José Manuel Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, no dia dezoito, com José Luis Zapatero, Primeiro Ministro da Espanha e no dia dezenove, com José Socrates, Primeiro Ministro de Portugal. Ao cabo dessa gincana política, volta exausta ao Brasil no dia vinte de junho corrente.
A tournée europeia veio muito a calhar para a candidata. Teve que cancelar a sua participação na ‘Sabatina da Folha’, entrevista pública, marcada com grande antecedência pela Folha de São Paulo. Pelo realce que deu ao descumprimento do compromisso, o prestigioso jornal parece que não apreciou muito seja a súbita ausência, seja os motivos aduzidos pela candidata do Presidente Lula.
Felizmente para a Folha, tanto o candidato do PSDB, o ex-governador José Serra, quanto a do Partido Verde, a Senadora Marina Silva permaneceram na raia, dispostos a responder às soezes e traiçoeiras questões que costumam colocar os jornalistas.
Não é a primeira vez que a candidata do PT opta por não comparecer a entrevistas e eventos públicos de que os quesitos não são conhecidos de antemão. Pelo visto, a antiga militante do P.D.T., hoje membro de carteirinha do P.T. prefere aquelas ‘entrevistas’ a que se possa responder pela internet, como a concedida às páginas amarelas da Revista Veja.
No entanto, se a candidata ungida pelo Presidente Lula deseja ser a escolhida pelo Povo brasileiro é difícil entender por qual razão queira evitar os debates e as entrevistas públicas. Se há um terreno em que o político deva lançar-se com desenvoltura é a área consagrada aos debates e às livres perguntas (e não as dirigidas e sopesadas por assessores, apparatchiks e aspones).
Por qual processo poderá o Povo brasileiro melhor conhecer e avaliar a real capacidade de cada candidato, senão através do livre embate das ideias ?
( Fontes: O Globo e Folha de S. Paulo )
As coisas tenderão a se tornarem menos ambíguas quando se assinalar que o adjetivo é empregado nos sentidos ‘que ainda não amadureceu’ e, mais precisamente, na acepção metafórica, dada no verbete do Dicionário Houaiss ‘a que falta vivência, experiência’.
Entende-se que me reporto à candidata do PT à presidência da república, a Senhora Dilma Rousseff.
Com efeito, a antiga Ministra-Chefe da Casa Civil, que assumira o cargo no Palácio do Planalto em função de acidente na carreira política de José Dirceu, colhido, como se sabe, pelo escândalo do mensalão, cassado em consequência, como vítima sacrificial, pela Câmara dos Deputados.
Recentemente Dilma desincompatibilizou-se desse importante cargo, que, na presidência Lula, equivale à virtual posição de Primeiro Ministro. O próprio José Dirceu, ao despedir-se das responsabilidades planaltinas, aludira, talvez não exatamente em lapso, a esse período como a “meu governo”.
Não há negar, portanto, a relevância de tais funções e a experiência burocrático-administrativa havida pela Ministra-Chefe Dilma Rousseff. Não lhe falta autoridade, como, de resto, o sentiram diversos personagens da República.
Desejo referir-me a um outro gênero de falta de experiência. Jamais tendo sido eleita para qualquer cargo, seja nas esferas municipal, estadual e federal, compreende-se que se mostre insegura no diálogo e nas reuniões políticas, pelo seu desconhecimento do público partidário e das idiossincrasias da política, máxime nos níveis locais e estaduais.
Nesse sentido, e com a inquieta assessoria do partido oficialista, também conhecido como dos Trabalhadores, a nobre candidata tem fugido de entrevistas públicas como antes o diabo da cruz.
Dessarte, pretextando uma súbita viagem à Europa – quatro paises em cinco dias, em que logra encontros de photo-opportunity com Sarkozy amanhã (hoje, assiste ela em Paris, nós no Brasil, submetidos ao verbo do inamovível Galvão Bueno, mas privados dos judiciosos comentários de Falcão, ao jogo da seleção contra a Coreia do Norte); no dia dezessete, em Bruxelas, com José Manuel Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, no dia dezoito, com José Luis Zapatero, Primeiro Ministro da Espanha e no dia dezenove, com José Socrates, Primeiro Ministro de Portugal. Ao cabo dessa gincana política, volta exausta ao Brasil no dia vinte de junho corrente.
A tournée europeia veio muito a calhar para a candidata. Teve que cancelar a sua participação na ‘Sabatina da Folha’, entrevista pública, marcada com grande antecedência pela Folha de São Paulo. Pelo realce que deu ao descumprimento do compromisso, o prestigioso jornal parece que não apreciou muito seja a súbita ausência, seja os motivos aduzidos pela candidata do Presidente Lula.
Felizmente para a Folha, tanto o candidato do PSDB, o ex-governador José Serra, quanto a do Partido Verde, a Senadora Marina Silva permaneceram na raia, dispostos a responder às soezes e traiçoeiras questões que costumam colocar os jornalistas.
Não é a primeira vez que a candidata do PT opta por não comparecer a entrevistas e eventos públicos de que os quesitos não são conhecidos de antemão. Pelo visto, a antiga militante do P.D.T., hoje membro de carteirinha do P.T. prefere aquelas ‘entrevistas’ a que se possa responder pela internet, como a concedida às páginas amarelas da Revista Veja.
No entanto, se a candidata ungida pelo Presidente Lula deseja ser a escolhida pelo Povo brasileiro é difícil entender por qual razão queira evitar os debates e as entrevistas públicas. Se há um terreno em que o político deva lançar-se com desenvoltura é a área consagrada aos debates e às livres perguntas (e não as dirigidas e sopesadas por assessores, apparatchiks e aspones).
Por qual processo poderá o Povo brasileiro melhor conhecer e avaliar a real capacidade de cada candidato, senão através do livre embate das ideias ?
( Fontes: O Globo e Folha de S. Paulo )
segunda-feira, 14 de junho de 2010
Lula, o Grande Eleitor ?
Com as convenções dos partidos surgem, afinal, oficialmente os candidatos à eleição presidencial. Pelo atávico formalismo ibérico, assistiu-se por meses a uma pantomima, em que os chamados pré-candidatos tinham de conformar-se na aparência às disposições de legislação procusteana. Na prática, o excesso de entraves, pela sua manifesta inadequação, se prestou à maravilha ao sistemático desrespeito pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva dessa mesma legislação. Com efeito, o absurdo dos impedimentos pode funcionar a contrariu sensu como virtual atenuante às suas repetidas transgressões da norma legal que o Tribunal Superior Eleitoral,de início por timidez e adiante pela lentidão do processo judicial, permitiu que as multas, por ora, se limitem a cinco.
Esses deslizes de Lula têm, pelo menos, a qualidade de assinalar quem é até o momento o personagem principal da eleição presidencial de 2010. Não só por causa de sua grande popularidade, que está na casa dos setenta, senão por sua postura de inventor, patrocinador e cabo eleitoral de sua candidata de algibeira, avulta a presença e a influência do presidente no exercício dos comícios de 2010.
Se tudo correr segundo este figurino – que tem estranhas e turbadoras semelhanças com a eleição do dentista Hector J. Cámpora na Argentina, em que o general Juan Domingo Perón, impossibilitado em 1973 de concorrer, recomendou ao povo argentino votar como se Cámpora fosse seu mero representante na Casa Rosada[1] - a candidata Dilma Rousseff será guindada ao Planalto, não por sua trajetória política, mas pela indicação do e vinculação ao seu mestre e criador.
Se bem que não desconheça dos riscos de tal estratégia, José Serra, do PSDB, em seu discurso de aceitação da própria candidatura, já investiu contra a grande sombra que deseja presidir – e não como magistrado – aos comícios de outubro de 2010.
Nesse contexto, Serra atacou o “aparelhamento” do governo Lula, dizendo que não tem “esquadrões de militantes pagos com dinheiro público”. Criticou a relação com ditaduras e quem “justifica deslizes morais dizendo que está fazendo o mesmo que os outros fizeram”. Em um dos trechos mais citados de seu discurso, afirmou: “Acredito que o Estado deve subordinar-se à sociedade e não ao governante da hora, ou a um partido. O tempo dos chefes de governo que acreditavam personificar o Estado ficou para trás há mais de trezentos anos. Luis XIV achava que o Estado era ele, mas na democracia e no Brasil não há lugar para luíses assim.”
Referindo-se indireta mas obviamente à adversária Dilma, sublinhou: “não comecei ontem e não caí de paraquedas. Apresentei-me ao povo brasileiro, fui votado, exerci cargos, me submeti ao julgamento da população, fui aprovado e votado de novo.”
Em seu discurso, na convenção que ratificou a chapa Dilma Rousseff (PT) – Michel Temer (PMDB), dentro de seu estilo usual, com a cara de pau de velho político, Lula chegou a atacar a oposição, dizendo esperar que seus adversários “não façam jogo rasteiro, inventando dossiês todo dia”.
Mostrando uma vez mais que procede a máxima que nada de novo existe na história, Lula declarou: “Vai haver um vazio naquela cédula e, para que esse vazio seja preenchido, mudei de nome e vou colocar Dilma na cédula. E aí as pessoas vão votar.”
Adequando-se ao modelo, Dilma Rousseff, em seu discurso de aceitação, citou mais de vinte vezes o nome de Lula. Consoante anuncia, o lema da campanha será ‘continuidade da mudança’.
Por sua vez, a respeitada candidata do Partido Verde, a Senadora Marina Silva mantém-se por enquanto na faixa dos dez por cento, consoante as pesquisas. Se não ameaça aos dois principais contendores, a sua quota inviabilizaria a decisão em primeiro turno.
(Fontes: O Globo e Folha de S. Paulo)
[1] Eleito, Campora, ao cabo de menos de três meses, foi forçado a renunciar. Como prêmio de consolação, Perón o expediu como seu embaixador no México.
Esses deslizes de Lula têm, pelo menos, a qualidade de assinalar quem é até o momento o personagem principal da eleição presidencial de 2010. Não só por causa de sua grande popularidade, que está na casa dos setenta, senão por sua postura de inventor, patrocinador e cabo eleitoral de sua candidata de algibeira, avulta a presença e a influência do presidente no exercício dos comícios de 2010.
Se tudo correr segundo este figurino – que tem estranhas e turbadoras semelhanças com a eleição do dentista Hector J. Cámpora na Argentina, em que o general Juan Domingo Perón, impossibilitado em 1973 de concorrer, recomendou ao povo argentino votar como se Cámpora fosse seu mero representante na Casa Rosada[1] - a candidata Dilma Rousseff será guindada ao Planalto, não por sua trajetória política, mas pela indicação do e vinculação ao seu mestre e criador.
Se bem que não desconheça dos riscos de tal estratégia, José Serra, do PSDB, em seu discurso de aceitação da própria candidatura, já investiu contra a grande sombra que deseja presidir – e não como magistrado – aos comícios de outubro de 2010.
Nesse contexto, Serra atacou o “aparelhamento” do governo Lula, dizendo que não tem “esquadrões de militantes pagos com dinheiro público”. Criticou a relação com ditaduras e quem “justifica deslizes morais dizendo que está fazendo o mesmo que os outros fizeram”. Em um dos trechos mais citados de seu discurso, afirmou: “Acredito que o Estado deve subordinar-se à sociedade e não ao governante da hora, ou a um partido. O tempo dos chefes de governo que acreditavam personificar o Estado ficou para trás há mais de trezentos anos. Luis XIV achava que o Estado era ele, mas na democracia e no Brasil não há lugar para luíses assim.”
Referindo-se indireta mas obviamente à adversária Dilma, sublinhou: “não comecei ontem e não caí de paraquedas. Apresentei-me ao povo brasileiro, fui votado, exerci cargos, me submeti ao julgamento da população, fui aprovado e votado de novo.”
Em seu discurso, na convenção que ratificou a chapa Dilma Rousseff (PT) – Michel Temer (PMDB), dentro de seu estilo usual, com a cara de pau de velho político, Lula chegou a atacar a oposição, dizendo esperar que seus adversários “não façam jogo rasteiro, inventando dossiês todo dia”.
Mostrando uma vez mais que procede a máxima que nada de novo existe na história, Lula declarou: “Vai haver um vazio naquela cédula e, para que esse vazio seja preenchido, mudei de nome e vou colocar Dilma na cédula. E aí as pessoas vão votar.”
Adequando-se ao modelo, Dilma Rousseff, em seu discurso de aceitação, citou mais de vinte vezes o nome de Lula. Consoante anuncia, o lema da campanha será ‘continuidade da mudança’.
Por sua vez, a respeitada candidata do Partido Verde, a Senadora Marina Silva mantém-se por enquanto na faixa dos dez por cento, consoante as pesquisas. Se não ameaça aos dois principais contendores, a sua quota inviabilizaria a decisão em primeiro turno.
(Fontes: O Globo e Folha de S. Paulo)
[1] Eleito, Campora, ao cabo de menos de três meses, foi forçado a renunciar. Como prêmio de consolação, Perón o expediu como seu embaixador no México.
domingo, 13 de junho de 2010
12 de Junho, Um Ano Depois
O doze de junho de 2009 foi a data das eleições presidenciais no Irã. Como a população iraniana aprendeu nessa ocasião, na teocracia dos ayatollahs tampouco se há de respeitar o ditame da maioria dos eleitores.
Até aquela data, se a democracia era característica pouco encontradiça no regime clerical do Líder Supremo Ayatollah Ali Khamenei, o veredito das urnas havia sido sempre respeitado. Houve mesmo uma tentativa, sob o presidente Mohamed Khatami, de recuperar algumas práticas democráticas, embora o estamento clerical-militar a tivesse obstaculizado.
Selecionando a Mahmoud Ahmadinejad para a presidência, o sucessor de Khomeini não queria correr riscos. Quando este concorreu à reeleição, Ali Khamenei não trepidou em cortar um dos derradeiros laços com a democracia. Não obstante a gritante maioria obtida pelos candidatos oposicionistas, tanto por Mir Hossein Moussavi, quanto por Mehdi Karroubi, esse fato não representou qualquer empecilho para que o regime encenasse uma fraude colossal.
Confirmando a famosa máxima de Lord Acton – o poder corrompe, e o poder absoluto o faz totalmente – Ali Khamenei e seus asseclas sequer se preocuparam com as aparências. Em um país de contagem manual dos sufrágios, não se pejou em declarar a vitória de seu pupilo Ahmadinejad em uma questão de horas. A fraude que rivalizou em atrevimento com as da Bielo-Rússia e as dos países do Magreb chegou a computar como vitorioso Ahmadinejad nos distritos natais dos dois principais candidatos oposicionistas.
Foi esta mesma votação que Nosso Guia com o seu próprio alheamento de qualquer preocupação com o conhecimento crítico, além da usual pobre metáfora futebolística, acrescentou uma mendaz observação: que as corajosas manifestações em Teerã e outros grandes centros naquele país não passavam de “ choro de perdedores”.
Na verdade, a situação do povo iraniano é demasiado triste para que me ocupe, neste artigo, dos laços espúrios que por idiossincrasias dos assessores políticos do Presidente Lula se estabeleceram entre o Brasil e a ditadura dos ayatollahs.
Para os leitores do blog procurei acompanhar a evolução dos acontecimentos na antiga Pérsia. A pergunta que se coloca é como se acha aquele movimento espontâneo e que já nos mostrou que há dois Irãs. O do estamento dominante, formado pela aliança entre os ayatollahs e clérigos ligados a Khamenei e os Guardas Revolucionários. Esses últimos tem empolgado boa parte do poder, inclusive na parte econômica e no esforço para a construção do artefato nuclear.
O embrionário movimento popular iraniano confirma a norma que preside às revoluções. Tanto naqueles movimentos que detêm parcela do poder, quanto naqueles outros que confrontam um regime autocrático, a radicalização é a norma. Ela se observa tanto no primeiro exemplo (revolução francesa), quanto no segundo (revolução russa).
A situação no Irã – que obviamente se insere no segundo exemplo – continua a evoluir, com a surda oposição da maioria da elite pensante e de largos extratos não só de estudantes e profissionais liberais, mas também de setores mais humildes, insatisfeitos com as condições prevalentes. Dessarte, a oposição de início se norteou por respeitar os chamados princípios da revolução de Khomeini. Nesse capítulo, se inserem as manifestações lideradas pelo Movimento Verde, de Moussavi e as do clérigo Karroubi.
Dada a brutalidade da reação governamental, evidenciada pelas arbitrariedades e violências das forças ditas da ordem, seja formal (polícia e destacamentos de choque), seja informal (a milícia basiji), a oposição popular se transforma em contestação ao regime. No caso de Moussavi, Karroubi, Khatami e de outros personagens com trânsito no esquema vigente ainda se nota a preocupação de não romper com as diretivas do Ayatolah Khomeini, agora um outro segmento mais dinâmico abandona as concessões dos moderados para adotar palavras de ordem como ‘morte ao Tirano’ (i.e., Khamenei, eis que Ahmadinejad não passa de um apparatchik [1]de alta hierarquia), assim como empunha bandeiras suprimindo qualquer menção ao onipotente Alá – com que esse setor de vanguarda marca a ruptura com a subordinação aos mulás do clero xiita, e passa a contestar frontalmente o regime.
Se o movimento democrático no Irã – nas suas duas formas, a moderada e a radical – foi jogado seja para os calabouços do regime imperante, ou para a morte (quer através do desaparecimento, quer através de tribunais que lembram os dos anos trinta do estalinismo), seja nos subterrâneos das catacumbas revolucionárias, onde se reforça a negação do poder formal, corrupto e tirânico, e se prepara a reação que como varreu a monarquia dos Pahlevis acabará por desvencilhar-se desta carga cada vez mais opressiva e distanciada da realidade das necessidades e reivindicações de uma sociedade com anseios libertários e alto nível educacional.
Todas as ditaduras se parecem, mas algumas são na aparência mais rijas e mais potentes do que outras. Todas, no entanto, brigam com um conceito básico, que é o do uso do fuzil. Um governo, uma classe, uma corporação podem intimidar e matar com esse instrumento (e, é claro, seus sucedâneos tecnologicamente mais avançados). Contudo, a repressão cega, brutal e ilimitada encontra a própria nêmesis na sua incapacidade de sentar-se sobre o fuzil, vale dizer conviver com a realidade por um período mais largo. E será esta a antinomia que decretará, mais cedo, ou mais tarde, a sua inexorável queda.
O regime do ayatollah Ali Khamenei – e de seu ordenança, o subpresidente Mahmoud Ahmadinejad – tem sido deveras competente na repressão sistemática de revoltosos reais e presumidos, deixando um rastro acabrunhante de mortes – quem não se recorda da jovem e bela mártir Neda, vitimada por um covarde projétil quando pacificamente participava de uma demonstração em favor de um dos candidatos esbulhados pelo tirano ? A repressão arremeda a revolução ao afundar-se cada vez mais na violência extremada. Chega até a ‘saudar’ visitas que se acham ilustres, como na malfadada missão de Lula a Teerã com alguns inconvenientes enforcamentos de ‘terroristas’ e ‘contestadores do regime’.
Quando uma mulher do povo – que teria todos os títulos para considerar-se da camada de apoio ao atual regime – afirma a um reporter que Khamenei e Ahmadinejad são piores do que o antigo Xá, não será uma vã esperança a de entrever para mais cedo do que muitos antecipam que todo essa magnífica construção da cega repressão clérico-militar venha abaixo com o fragor e o júbilo de oi polloi[2] . Será a culminação dos incessantes gritos que partem hoje, do terraço dos edifícios, sob o manto benévolo da noite, a clamaram a plenos pulmões pela breve e ansiada morte do Ditador.
[1] quadro burocrático (no regime soviético).
[2] Os Muitos (grego clássico)
Até aquela data, se a democracia era característica pouco encontradiça no regime clerical do Líder Supremo Ayatollah Ali Khamenei, o veredito das urnas havia sido sempre respeitado. Houve mesmo uma tentativa, sob o presidente Mohamed Khatami, de recuperar algumas práticas democráticas, embora o estamento clerical-militar a tivesse obstaculizado.
Selecionando a Mahmoud Ahmadinejad para a presidência, o sucessor de Khomeini não queria correr riscos. Quando este concorreu à reeleição, Ali Khamenei não trepidou em cortar um dos derradeiros laços com a democracia. Não obstante a gritante maioria obtida pelos candidatos oposicionistas, tanto por Mir Hossein Moussavi, quanto por Mehdi Karroubi, esse fato não representou qualquer empecilho para que o regime encenasse uma fraude colossal.
Confirmando a famosa máxima de Lord Acton – o poder corrompe, e o poder absoluto o faz totalmente – Ali Khamenei e seus asseclas sequer se preocuparam com as aparências. Em um país de contagem manual dos sufrágios, não se pejou em declarar a vitória de seu pupilo Ahmadinejad em uma questão de horas. A fraude que rivalizou em atrevimento com as da Bielo-Rússia e as dos países do Magreb chegou a computar como vitorioso Ahmadinejad nos distritos natais dos dois principais candidatos oposicionistas.
Foi esta mesma votação que Nosso Guia com o seu próprio alheamento de qualquer preocupação com o conhecimento crítico, além da usual pobre metáfora futebolística, acrescentou uma mendaz observação: que as corajosas manifestações em Teerã e outros grandes centros naquele país não passavam de “ choro de perdedores”.
Na verdade, a situação do povo iraniano é demasiado triste para que me ocupe, neste artigo, dos laços espúrios que por idiossincrasias dos assessores políticos do Presidente Lula se estabeleceram entre o Brasil e a ditadura dos ayatollahs.
Para os leitores do blog procurei acompanhar a evolução dos acontecimentos na antiga Pérsia. A pergunta que se coloca é como se acha aquele movimento espontâneo e que já nos mostrou que há dois Irãs. O do estamento dominante, formado pela aliança entre os ayatollahs e clérigos ligados a Khamenei e os Guardas Revolucionários. Esses últimos tem empolgado boa parte do poder, inclusive na parte econômica e no esforço para a construção do artefato nuclear.
O embrionário movimento popular iraniano confirma a norma que preside às revoluções. Tanto naqueles movimentos que detêm parcela do poder, quanto naqueles outros que confrontam um regime autocrático, a radicalização é a norma. Ela se observa tanto no primeiro exemplo (revolução francesa), quanto no segundo (revolução russa).
A situação no Irã – que obviamente se insere no segundo exemplo – continua a evoluir, com a surda oposição da maioria da elite pensante e de largos extratos não só de estudantes e profissionais liberais, mas também de setores mais humildes, insatisfeitos com as condições prevalentes. Dessarte, a oposição de início se norteou por respeitar os chamados princípios da revolução de Khomeini. Nesse capítulo, se inserem as manifestações lideradas pelo Movimento Verde, de Moussavi e as do clérigo Karroubi.
Dada a brutalidade da reação governamental, evidenciada pelas arbitrariedades e violências das forças ditas da ordem, seja formal (polícia e destacamentos de choque), seja informal (a milícia basiji), a oposição popular se transforma em contestação ao regime. No caso de Moussavi, Karroubi, Khatami e de outros personagens com trânsito no esquema vigente ainda se nota a preocupação de não romper com as diretivas do Ayatolah Khomeini, agora um outro segmento mais dinâmico abandona as concessões dos moderados para adotar palavras de ordem como ‘morte ao Tirano’ (i.e., Khamenei, eis que Ahmadinejad não passa de um apparatchik [1]de alta hierarquia), assim como empunha bandeiras suprimindo qualquer menção ao onipotente Alá – com que esse setor de vanguarda marca a ruptura com a subordinação aos mulás do clero xiita, e passa a contestar frontalmente o regime.
Se o movimento democrático no Irã – nas suas duas formas, a moderada e a radical – foi jogado seja para os calabouços do regime imperante, ou para a morte (quer através do desaparecimento, quer através de tribunais que lembram os dos anos trinta do estalinismo), seja nos subterrâneos das catacumbas revolucionárias, onde se reforça a negação do poder formal, corrupto e tirânico, e se prepara a reação que como varreu a monarquia dos Pahlevis acabará por desvencilhar-se desta carga cada vez mais opressiva e distanciada da realidade das necessidades e reivindicações de uma sociedade com anseios libertários e alto nível educacional.
Todas as ditaduras se parecem, mas algumas são na aparência mais rijas e mais potentes do que outras. Todas, no entanto, brigam com um conceito básico, que é o do uso do fuzil. Um governo, uma classe, uma corporação podem intimidar e matar com esse instrumento (e, é claro, seus sucedâneos tecnologicamente mais avançados). Contudo, a repressão cega, brutal e ilimitada encontra a própria nêmesis na sua incapacidade de sentar-se sobre o fuzil, vale dizer conviver com a realidade por um período mais largo. E será esta a antinomia que decretará, mais cedo, ou mais tarde, a sua inexorável queda.
O regime do ayatollah Ali Khamenei – e de seu ordenança, o subpresidente Mahmoud Ahmadinejad – tem sido deveras competente na repressão sistemática de revoltosos reais e presumidos, deixando um rastro acabrunhante de mortes – quem não se recorda da jovem e bela mártir Neda, vitimada por um covarde projétil quando pacificamente participava de uma demonstração em favor de um dos candidatos esbulhados pelo tirano ? A repressão arremeda a revolução ao afundar-se cada vez mais na violência extremada. Chega até a ‘saudar’ visitas que se acham ilustres, como na malfadada missão de Lula a Teerã com alguns inconvenientes enforcamentos de ‘terroristas’ e ‘contestadores do regime’.
Quando uma mulher do povo – que teria todos os títulos para considerar-se da camada de apoio ao atual regime – afirma a um reporter que Khamenei e Ahmadinejad são piores do que o antigo Xá, não será uma vã esperança a de entrever para mais cedo do que muitos antecipam que todo essa magnífica construção da cega repressão clérico-militar venha abaixo com o fragor e o júbilo de oi polloi[2] . Será a culminação dos incessantes gritos que partem hoje, do terraço dos edifícios, sob o manto benévolo da noite, a clamaram a plenos pulmões pela breve e ansiada morte do Ditador.
[1] quadro burocrático (no regime soviético).
[2] Os Muitos (grego clássico)
sábado, 12 de junho de 2010
A Lei da Ficha Limpa
A lei da Ficha Limpa ainda não tem assegurada a sua plena vigência, pois depende, por ora, de decisão do plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Trata-se de determinar se deva valer somente para aqueles condenados depois do dia quatro de junho, data da sanção da lei pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ou se abrange a todos os condenados por órgãos colegiados do Judiciário, pelos crimes catalogados nesta legislação.
A suposta dúvida se relaciona com a linguagem introduzida pelo Senador Demóstenes Torres (DEM-GO), quando de sua apreciação no Senado Federal, que substituíu a frase “que tenham sido condenados”, por “que forem condenados”.
Na verdade, no entender de gramáticos e linguistas essa dúvida não tem cabimento, como se depreende de númerosos empregos desse tempo verbal. Basta recordar a famosa frase do Marquês de Osório: “aqueles que forem brasileiros, que me sigam!” Na expressão em apreço se assinala inequivocamente o caráter condicional desse tempo do verbo ser, e, por conseguinte, não é limitativo em absoluto quanto à validade temporal.
A tal propósito, as manifestações dos presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) do Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul, defendendo a ampla aplicação da Lei da Ficha Limpa, constituem desde já uma nova alvissareira, posto que a norma será estabelecida pelo Superior Tribunal Eleitoral, provavelmente no decurso da semana entrante, quando se concluirá a análise da nova lei.
Há outro aspecto da lei da Ficha Limpa que acredito de toda oportunidade aprofundar neste blog. As leis de iniciativa popular constituem uma das mais acertadas inovações da Constituição de 5 de outubro de 1988, oportunamente cognominada pelo Presidente da Constituinte, Ulysses Guimarães, como a ‘Constituição Cidadã’.
Se bem que a aprovação da legislação em tela represente o benefício principal, é mais do que apropriado não esquecermos a tramitação no Congresso da P.L.P. 518/09, projeto elaborado pelo Movimento de Combate contra a Corrupção Eleitoral (MCCE). Tal tramitação evidencia dois fatos singulares e primaciais: (i) a resistência dos parlamentares à hipótese de uma regulamentação eleitoral do gênero proposto e (ii) a relevância e o caráter determinante do maciço apoio do povo brasileiro, com a vantagem acrescida da superveniência do pleito de outubro p.f.
Quanto ao aspecto (i), não se carece de poderes divinatórios para afirmar-se com segurança que hoje não existiria nenhuma legislação disciplinando essa importante lacuna, se o MCCE não houvesse apresentado a proposição ao Deputado Michel Temer, Presidente da Câmara, em setembro último. As próprias restrições do Deputado ao documento - que comissão altamente representativa do MCCE lhe fazia a tradição[1] - já constituíam indicação bastante da indisposição de Suas Excelências com tal iniciativa. A PLP 518/09 penou no olvido preterintencional do colégio de líderes, que, repetidas vezes, lhe denegou a requerida urgência. Nesse aspecto, vale menção de justiça à metanóia [2]do Presidente Temer que acabou por convencer seus colegas que não se poderia engavetar a proposição indefinidamente. Não cabe aqui aludir a todas as demais resistências encontradas pela PLP 518. Basta dizer que não foram poucas, nem seus opositores deixaram de apelar para todos os recursos a fim de pelo menos esvaziar o importante instituto legal. A única modificação sensível aportada foi a substituição da condenação por juiz ordinário pela de um colegiado de juízes (i.e., passagem ao segundo nível judicial).
No que concerne ao quesito (ii), a sabedoria do apelo à expressão direta da vontade popular fica amplamente corroborada pela força do movimento inercial catalisada pela PLP 518, que levou de roldão a todos os arreganhos e intentos de postergação ou deturpação. Disso constituíu a derradeira prova as tolas e insensíveis declarações do lider do governo no Senado, Romero Jucá, que se atreveu a dizer que o projeto da ficha-limpa não era prioridade do governo e sim da sociedade. Por ignorância ou soberbia, esqueceu-se – como da tribuna lhe relembrou o Senador Pedro Simon – que o governo não deve ter prioridades que não sejam aquelas acalentadas pela sociedade. Ainda ensaiaria Jucá outras estultícias menores, como a eventual inserção de emendas e quejandos, que a própria dinâmica do processo condenaria à mais grave das negações, a do silêncio reservado às irrelevâncias.
Agora, Suas Excelências – com as exíguas exceções de regra – fazem cara boa para amarga medicação. A Lei da Ficha Limpa não é panaceia para os males, os escândalos, e as vergonhas de nossas câmaras legislativas. Constitui, no entanto, estentórico grito de ‘presente !’ da sociedade enojada com as ilicitudes e a impunidade de muitos. Ela é, em realidade, um começo de bom augúrio, depois da exposição de tantas insanas mostras de privilégio e despejado corporativismo.
É importante, todavia, não esquecer que a entrada em vigor desta lei não resolverá todos os problemas de Pindorama. Representa, é necessário repeti-lo, um bom e alvissareiro início de processo de recuperação, mas sempre será um começo e nada mais.
( Fonte: O Globo )
[1] entrega.
[2] reconversão, arrependimento.
A suposta dúvida se relaciona com a linguagem introduzida pelo Senador Demóstenes Torres (DEM-GO), quando de sua apreciação no Senado Federal, que substituíu a frase “que tenham sido condenados”, por “que forem condenados”.
Na verdade, no entender de gramáticos e linguistas essa dúvida não tem cabimento, como se depreende de númerosos empregos desse tempo verbal. Basta recordar a famosa frase do Marquês de Osório: “aqueles que forem brasileiros, que me sigam!” Na expressão em apreço se assinala inequivocamente o caráter condicional desse tempo do verbo ser, e, por conseguinte, não é limitativo em absoluto quanto à validade temporal.
A tal propósito, as manifestações dos presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) do Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul, defendendo a ampla aplicação da Lei da Ficha Limpa, constituem desde já uma nova alvissareira, posto que a norma será estabelecida pelo Superior Tribunal Eleitoral, provavelmente no decurso da semana entrante, quando se concluirá a análise da nova lei.
Há outro aspecto da lei da Ficha Limpa que acredito de toda oportunidade aprofundar neste blog. As leis de iniciativa popular constituem uma das mais acertadas inovações da Constituição de 5 de outubro de 1988, oportunamente cognominada pelo Presidente da Constituinte, Ulysses Guimarães, como a ‘Constituição Cidadã’.
Se bem que a aprovação da legislação em tela represente o benefício principal, é mais do que apropriado não esquecermos a tramitação no Congresso da P.L.P. 518/09, projeto elaborado pelo Movimento de Combate contra a Corrupção Eleitoral (MCCE). Tal tramitação evidencia dois fatos singulares e primaciais: (i) a resistência dos parlamentares à hipótese de uma regulamentação eleitoral do gênero proposto e (ii) a relevância e o caráter determinante do maciço apoio do povo brasileiro, com a vantagem acrescida da superveniência do pleito de outubro p.f.
Quanto ao aspecto (i), não se carece de poderes divinatórios para afirmar-se com segurança que hoje não existiria nenhuma legislação disciplinando essa importante lacuna, se o MCCE não houvesse apresentado a proposição ao Deputado Michel Temer, Presidente da Câmara, em setembro último. As próprias restrições do Deputado ao documento - que comissão altamente representativa do MCCE lhe fazia a tradição[1] - já constituíam indicação bastante da indisposição de Suas Excelências com tal iniciativa. A PLP 518/09 penou no olvido preterintencional do colégio de líderes, que, repetidas vezes, lhe denegou a requerida urgência. Nesse aspecto, vale menção de justiça à metanóia [2]do Presidente Temer que acabou por convencer seus colegas que não se poderia engavetar a proposição indefinidamente. Não cabe aqui aludir a todas as demais resistências encontradas pela PLP 518. Basta dizer que não foram poucas, nem seus opositores deixaram de apelar para todos os recursos a fim de pelo menos esvaziar o importante instituto legal. A única modificação sensível aportada foi a substituição da condenação por juiz ordinário pela de um colegiado de juízes (i.e., passagem ao segundo nível judicial).
No que concerne ao quesito (ii), a sabedoria do apelo à expressão direta da vontade popular fica amplamente corroborada pela força do movimento inercial catalisada pela PLP 518, que levou de roldão a todos os arreganhos e intentos de postergação ou deturpação. Disso constituíu a derradeira prova as tolas e insensíveis declarações do lider do governo no Senado, Romero Jucá, que se atreveu a dizer que o projeto da ficha-limpa não era prioridade do governo e sim da sociedade. Por ignorância ou soberbia, esqueceu-se – como da tribuna lhe relembrou o Senador Pedro Simon – que o governo não deve ter prioridades que não sejam aquelas acalentadas pela sociedade. Ainda ensaiaria Jucá outras estultícias menores, como a eventual inserção de emendas e quejandos, que a própria dinâmica do processo condenaria à mais grave das negações, a do silêncio reservado às irrelevâncias.
Agora, Suas Excelências – com as exíguas exceções de regra – fazem cara boa para amarga medicação. A Lei da Ficha Limpa não é panaceia para os males, os escândalos, e as vergonhas de nossas câmaras legislativas. Constitui, no entanto, estentórico grito de ‘presente !’ da sociedade enojada com as ilicitudes e a impunidade de muitos. Ela é, em realidade, um começo de bom augúrio, depois da exposição de tantas insanas mostras de privilégio e despejado corporativismo.
É importante, todavia, não esquecer que a entrada em vigor desta lei não resolverá todos os problemas de Pindorama. Representa, é necessário repeti-lo, um bom e alvissareiro início de processo de recuperação, mas sempre será um começo e nada mais.
( Fonte: O Globo )
[1] entrega.
[2] reconversão, arrependimento.
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