sábado, 31 de outubro de 2015

Desconstruindo a Lava-Jato ?


                           
          O Ministro Teori Zavascki, do S.T.F, ataca mais uma vez a Operação Lava-Jato. Como se recorda, em época anterior, tinha concedido habeas-corpus a Renato Duque, que estava, com os demais suspeitos do Petrolão, em prisão especial de Curitiba, sob a jurisdição do juiz Sérgio Moro. Provocou atenção, porque até então a orientação do Supremo Tribunal Federal era de denegar os diversos pedidos de habeas corpus, feitos para todos os réus implicados nas investigações relacionadas com a Petrobrás. Não era, por acaso, que tal acontecia. Na verdade, constituía um apoio à ação do juiz Moro.

           Foi nesse sentido que despertou espécie essa primeira concessão de liberdade provisória a um diretor da Petrobrás, muito ligado a José Dirceu. Mais tarde, por força sem dúvida das pesadas acusações contra Renato Duque, o Ministro Teori Zavascki voltaria atrás e acolheria a volta à prisão desse diretor da Petrobrás.

           Mais tarde, o Ministro Teori Zavascki tomou outra decisão polêmica, que foi denominada de fatiamento da Lava-Jato.  Dando início ao chamado fatiamento da Lava-Jato (i.e., fracionando as questões da Lava-Jato em mais de uma vara judicial), o Ministro Zavascki acolheu reclamação da defesa de Flavio Barra, e determinou a suspensão da ação sobre a Eletronuclear (que tramitava em Curitiba), e mandou a questão para o Rio de Janeiro.

            Já no desmembramento relativo ao Ministério do Planejamento, o STF decidiu que caberia à Justiça federal de São Paulo (para onde a ação foi enviada) verificar as decisões do Juiz Moro, assim como as prisões determinadas até aquele momento.

            Na mesma linha, o Ministro Teori já havia determinado a suspensão da ação sobre a Eletronuclear, que transitava em Curitiba. Essa alteração foi provocada na análise das suspeitas relativas ao Ministério do Planejamento (envolvidos a Senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR).  Outra retirada da competência da Lava-Jato foram as acusações de caixa dois feitas pelo delator Ricardo Pessoa (dono da UTC), contra o Ministro Aloizio Mercadante (hoje Educação) e o Senador Aloysio Ferreira (PDSB).

             É difícil determinar qual o critério que está prevalecendo para o incremento desse fatiamento. Impondo-se pela exação, segurança e moderação,  o Juiz Sérgio Moro tem impressionado muito bem a opinião pública. Por outro lado, saltam aos céus dois argumentos de peso: (a) a firmeza e a segurança evidenciadas pelo juiz Moro; (b) o evidente bom-êxito da sua atuação, com domínio da complexa matéria, bem como o equilíbrio (que decerto não lhe prejudica a energia) que vem somando na avaliação de todos. Resulta, portanto, algo surpreendente que se passe ao chamado fatiamento que lhe retire essa delicadíssima questão, sem na aparência qualquer razão de peso que porventura o justifique, não se pode deixar de sublinhar a inevitável perplexidade provocada por uma súbita intervenção - como se fora um verdadeiro deus ex-machina.  Ao retirar de um juiz e do núcleo de Curitiba o julgamento de partes da Lava-Jato - pois já não mais se trata de tópicos isolados - para transferi-las a outras comarcas, que não tiveram até o momento nenhuma experiência dessa ampla e complexa questão, a dúvida que se coloca será não só acerca da unidade dos critérios adotados, mas também da coerência do respectivo juízo de conformidade com a já comprovada experiência da equipe chefiada pelo juiz Sérgio Moro. Pela forma unitária e fundamentada das diversas questões já tratadas e mesmo julgadas pelo juiz Moro, esse julgamento tem superado as previsíveis barreiras, sem que os advogados das partes tenham logrado estabelecer bases ou motivos que encontrem matéria suscetível de contestação judicial. Será que subdividir  por um improviso fatiamento a avaliação e o julgamento de parte das causas compreendidas na Lava-Jato não é correr um risco até agora não evidenciado, seja o aparecimento de contradições tanto na forma quanto no mérito, que podem ao cabo nada acrescentar à matéria em juízo, mas apenas acarretar-lhe desnecessárias e até contradições ?

                   É de esperar-se que tais erros ou discrepâncias não se verifiquem. Contudo, se contradições forem determinadas a princípio em foros estranhos â jurisdição de Curitiba, a fortiori crescerá o questionamento a respeito de sua oportunidade e conveniência, haja vista a atual profícua coordenação entre o meritíssimo juiz, o ministério público federal, a polícia federal, e o corpo de advogados, de que ora venham a ser mudados parcialmente os critérios que tem felizmente presidindo ao devido abrangente juizo dispensado com exação e propriedade pelo Juiz Sérgio Moro.

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

A Groenlândia está derretendo


                                     

          O aquecimento global, que alguns tolos ou mal-intencionados, tentaram negar, está derretendo a Groenlândia! Na escola, aprendemos que essa ilha - cujo tamanho quase nos parecia continental - na verdade tem grande parcela de gelo.

           Isso a torna suscetível - muito suscetível mesmo - à influência do meio-ambiente.

          Notícia do New York Times, o fato importante agora não é se a enorme ilha vai ou não diluir-se nos mares do norte. Dadas as condições objetivas, a subida da temperatura, o seu desaparecimento do cenário não é mais uma dúvida. Cientistas lá acorrem em bandos, no afã de determinar quanto tempo levará ou para que ela vire ilha desimportante, ou, se por capricho dos mares, a veremos transformada em ilhota pequenina.

          Pelo fato de ser predominantemente agregado de gelo, um acidente glacial, a sorte que de repente seja determinada pela observação a cercania de um inglório fim pode levar muito leitor casual a meditar nos caprichos da sorte.

          Que essa ilha sempre exposta com destaque na cartografia se descubra de súbito vítima de um processo inelutável de desfazimento há de levar muito leitor a refletir sobre quão caprichosos podem ser os destinos humanos.

          Pensar em públicas personalidades presentes na publicidade, nas postagens da internet e nas páginas dos jornalões, e parar por pequeno momento e porventura exclamar: pocha, como a  vida pode ser pérfida, e preparar paradas como esta!

          Hoje a Groenlândia está em todos os mapas!  Com o calor da terra subindo, quanto tempo há de passar para que ela se desfaça, e os cartógrafos coitados tenham de atualizar seus mapas?

           Será o progresso? Com o pós-moderno, muitos tem a impressão de que as coisas mudam de forma tão súbita...

           Mas se bem refletirmos, não é de hoje que se fala que a Groenlândia está destinada a derreter.

           Grandona como é nos mapas, transmite impressão de firmeza e permanência, que, como os jornalistas ora afirmam, é apenas uma ilusão.

           Os povos mais primitivos costumam ler na natureza avisos ominosos, augúrios de sorte madrasta.

           Será que a Groenlândia representa um desses portentos que desenham impiedosos nos céus ou fora deles cruéis repaginações, de públicas figuras que vão aos poucos diminuindo, sob o confuso peso de ações disparatadas, que já no presente induzem a pessimismo?

           Será que procede ser a pequenez o destino da Groenlândia? Ou algo dessa grande ilha há de permanecer?

(Fonte: The New York Times )

PINGA FOGO (IV)


                                          

Mais um Imposto

 

       Com as dificuldades previsíveis, acerca-se o prazo do primeiro pagamento do FGTS, para os ditos trabalhadores domésticos. A quantidade de exigências burocráticas continua respeitável. Faz parte, com diria a gente do ramo. Com os chamados "Simples" em que os tecnocratas entremostram o seu traço irônico - eis que chamar-se o complexo de simples não o torna fácil para o cidadão, que deve cuidar de satisfazer a aberta bocarra da captação de tudo o que de imposto chamar-se possa, a ponto que a dificuldade em geral obriga o recurso a contadores (que fazem apenas, e bem, o seu trabalho). 

       Mas na herança lusa, com a sua infernal burocracia, é esse o destino de Pindorama, com a multidão de impostos e taxas (e o mais que os dessa família são chamados). Para quê ? Não diria para nada, mas diga-me, ó ocasional leitor, de que servem eles, a par de engordar a máquina tantas vezes disfuncional do Estado (e com as devidas reservas, pois dizem que não fica bem) e a goela horrenda do ralo da corrupção, de que servem tantos tributos a tornar inda mais terrível o montante do Impostômetro que, como dizia a velha canção, cada vez mais aumenta mais, como o paralelo cordão dos puxa-sacos, berrado pelos foliões na velha marchinha do eterno carnaval...

 

Zelo excessivo na Operação Zelotes                       

 

       O Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo  tem despertado no PT reações raivosas pelo seu procedimento - que é conforme aos parâmetros instituídos por seu ilustre antecessor Márcio Thomaz Bastos  (1935 - 2014), que, quando Ministro da Justiça (2003-2007) do Presidente Lula da Silva, além de ótimas indicações para o Supremo, inclusive Joaquim Barbosa, poupou o presidente de um grande erro, que seria a expulsão de jornalista americano, que havia feito um perfil do Primeiro Mandatário, em que incluíra o hábito da bebida.           

       Com efeito, Thomaz Bastos convenceu o presidente Lula a dar autonomia à Polícia Federal, e isso muito contribuíu para o fortalecimento da democracia brasileira, como se tem verifica em muitas operações realizadas pela PF.

      O Ministro Cardozo tem sido objeto do mau-humor justamente tal política.  E é bom que assim seja para democracia brasileira nesse atual e particularíssimo momento de crise.

      Obviamente, os reclamos do PT - que, ao que consta, chegam a pedir-lhe a exoneração não tem cabimento.

       No entanto, o Ministro Cardozo, segundo a informação, teria indicado à P.F. que deve restringir as suas operações a horas normais, e não a que foi observada pela Polícia Federal, quando foi ao domicílio do filho Luis Cláudio Lula da Silva, às 23:00hs de terça-feira, dia 27 de outubro corrente, para intimá-lo a depor.  O caçula do ex-presidente teria recebido R$ 2,4 milhões de lobista suspeito de comprar medidas provisórias.

          Lula falou de 'pancadaria' que estaria sofrendo, e que a data da ação em apreço não foi "coincidência".

          Luis Cláudio nega qualquer irregularidade.

 

 

( Fontes:  O Globo, Folha de S. Paulo )

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Desconstruindo Dilma


                                       

       A pergunta de Miriam Leitão - como foi possível esse déficit primário  de R$ 60 bilhões? - é respondida pela própria na coluna desta 4ª feira.  Essa estória, se foi escrita por quem se intitulava a Presidenta, nós a devemos a Lula da Silva, que a inventou como candidata para sucedê-lo, malgrado ponderações de notáveis petistas que tentavam dissuadi-lo desse projeto. (V. coluna de Ricardo Noblat).

       Tenho para mim que o ex-torneiro mecânico pensava precipuamente nele mesmo ao indicar a sua chefa de gabinete. Queria uma criatura sua, que pudesse controlar e que, ao cabo do mandato, lhe cedesse a vez. Ao fazê-lo, mostrou enorme egoismo - pondo de lado nomes mais preparados para o desafio.

        Se em um país mais desenvolvido politicamente essa prestidigitação seria q  uase impossível, Lula sabia que mesmo tosca candidata teria grandes chances para sucedê-lo em Pindorama, dadas as regiões com grande aporte do Bolsa-família, como o Nordeste. Dilma virou a Mulher do Lula e não teve dificuldade em derrotar a José Serra, que em outro cenário venceria com facilidade a despreparada pupila, dado o seu traquejo, experiência executiva e brilhantismo.

       Facilitou-lhe a tarefa a discórdia no PSDB (pela surda oposição de Aécio Neves), que acabou por dar-lhe candidato a vice bastante opaco. A estória do triunfo da Mulher do Lula ainda não foi contada, e constitui triste relato do subdesenvolvimento político no Brasil.

        De tudo isso  Lula da Silva  em fim de contas é o responsável. Ao eleger a despreparada Dilma, pensando preparar a própria sucessão, cometeu enorme erro de que pensava valer-se no prazo de quatro anos, mas que, em fim de contas, e por crudelíssima ironia, a conta seria apresentada ao Povo brasileiro.

        No que o senhor Rui Falcão chama, no mais puro estilo do vitimismo petista, de "sórdida campanha da elite e da mídia" em artigo publicado pelo grande jornal midiático Folha de S. Paulo, em consequência de conjunção de fatores, o ex-presidente está colhendo a safra que plantou tanto nos seus oito anos de governo, quanto nos quatro em que as mesuras do poder se foram, de algum modo, dissipando.

         Dado o afinco reservado a tal faina, semelha difícil determinar quando realmente os ventos viraram, e o mar de almirante se foi transformando em um de grumete, tangido por borrascas e maus-tempos saídos não se sabe bem de onde.

         Se a incerteza é humana, e as dúvidas são as cordas de quem pensou que a bonança era permanente, a estória do operário que virou político que virou deputado e abominou os trezentos picaretas, que disputou eleições sem história, até lograr fazê-la, com mágica de encomendado feiticeiro o começo de outra estória, que principiaria bem e acabaria mal.

         O desastroso reino de Dilma Rousseff não se sabe quando terminará. E que ele tem voz em capítulo, ninguém ousaria negar.

          Para que se entenda o drama que a moça da algibeira acabou por criar, se nós eliminarmos o petrolão e outros escândalos ancilares, ainda permanece firme a catástrofe que é de exclusiva dílmica competência, vale dizer o déficit primário de sessenta bilhões de reais. Como  escreve Míriam Leitão "o resultado da desastrosa administração das finanças públicas (...) chegou agora, em 2015."

              Não se pode esquecer o trabalho beneditino , "o poço (sendo) cavado após ano".

               Durante o Dilma I começou a falar-se muito de opacidade fiscal. E com razão. "Depois do forte crescimento de 2010 teria sido mais sensato reverter as políticas e preparar o ajuste. O governo preferiu continuar erodindo o superávit primário". (...) Começaram também "a haver descontos na meta fiscal a ser atingida." A cada ano, a realidade fiscal se afastava: assim "aumentava o percentual de despesas que não deveriam ser computadas como despesas, de investimentos à perda de arrecadação com as desonerações."

                Não é que todas as desonerações tenham sido más: "mas a maioria dos benefícios fiscais foi concedida  a setores escolhidos, a começar pela indústria automobilística. O governo aumentou os gastos" uma constante do Dilma I, "engessou mais o orçamento e superindexou o salário mínimo", com a explosão das despesas previdenciárias. Diante "do aumento do rombo nas contas do INSS e da previdência pública", nada fez. "Nunca combateu o que tinha cara de fraude", como o vertiginoso incremento "dos gastos com seguro desemprego, mesmo em época de queda do desemprego. Com o crescimento da arrecadação tratou de gastar mais e várias despesas subiram de forma insustentável." Agora, em época de vacas magras, "tem de cortar até no  essencial."

                   Entrementes, dono da verdade, o governo rejeitava todas as críticas. A revelação de maquiagens contábeis, a indicação dos riscos envolvidos, a inchação do problema fiscal "foram tratados com desprezo e estigmatizados." Dentro de uma postura dócil, "o Banco Central não alertava suficientemente para a deterioração fiscal e em vários comunicados  dizia que esta área estava sob controle. (...) Para não enfrentar uma briga interna, o BC se omitiu muitas vezes no alerta que deveria ter feito às autoridades que administravam as contas públicas."

                    "Guido Mantega e seu secretário do Tesouro, Arno Augustin, demonstravam desprezo pelo equilíbrio fiscal. (...) Os truques repetidos e abusivos levaram a presidente à desconfortável situação de enfrentar uma possível rejeição às suas contas de 2014."

                      E para bom entendedor, frisando a gravidade do déficit fiscal : " as pedaladas  ainda não foram quitadas em 2015, nem estão computadas no déficit divulgado ontem (que é de R$ 60 bilhões!).

                     Joaquim Levy está isolado. É o único que defende um ajuste fiscal forte.  As tentativas do Dilma II tem sido desastradas: envio ao Congresso de Orçamento com déficit. O intento de abaixar os gastos públicos malogrou porque o Congresso decidiu... aumentá-los.  Houve uma MP bumerangue, a 664, que ao invés de abaixar o gasto com pensão de viúvas muito jovens, aceitou virar portadora de uma explosão previdenciária (abolição na prática do fator previdenciário, e o ingresso de outro regime de aposentadoria muito mais oneroso).

                       E qual é a cara do Dilma II? É a da confissão de um déficit primário de sessenta bilhões de reais. 

 

( Fontes:  O Globo, Coluna de Míriam Leitão, Folha de S. Paulo )

Jeitinho, Desinformação e Desigualdade Social


                        
          O título talvez seja longo, mas logo parecerá mais curto para o olhar do brasileiro.

          Assim, não é de hoje que o dia-a-dia do morador de Pindorama pode sofrer bruscas mudanças para melhor, se partes de sua realidade diária tiverem de ser vistas ou vividas pelo estrangeiro.

          Se este estrangeiro, for poderoso - ou até o mais poderoso do momento histórico - o cotidiano do brasileiro pode receber ou transformações, ou remendos temporários - que tendem a melhorar ainda que de forma conjuntural a realidade sócio-política em que vive.

          Assim, em grandes eventos, como bem sabemos, a autoridade brasileira, se ainda não consegue transformar a realidade nacional para o melhor permanente, tem habilidade em dois ou até três aspectos a ela relacionados: domina a tecnologia do make-believe (fazer crer) como construir pavilhões de Poniatowski (como o primeiro ministro de Catarina a Grande), só que a versão moderna dos ditos pavilhões ou  são filmetes de propaganda com o escopo de enfeitar a realidade nacional para os olhos dos árbitros dos grandes certamens, ou (b) a organização pelo tempo indispensável (até por períodos curtos de uma a duas semanas) de cenários que de algum modo se aproximam da sonhada realidade melhorada. Não estará excluído que cerceado pelo conluio de contradições aparentes, venha até a recorrer a  velhos truques do Barão de Munchausen, i.e., a mentirinha, como prometer que vai sanear determinada baía ou até uma lagoa menor, o que corresponde apenas a  reflexo imediato, que não tem a menor intenção de transportar para a realidade.

         O chamado jeitinho brasileiro - que é o subterfúgio para o truque ocasional e supostamente reservado aos cognoscenti  (conhecedores)  é um fato tão difundido sobre o brasileiro e, em especial, a autoridade brasileira, que estrangeiros (em geral os menos informados e/ou mais ingênuos) não se pejam de perguntar diante de dificuldade burocrática, de qual seria o jeitinho que resolveria o caso. Embora a palavra rescenda a corrupção, sobretudo aquela leve, ou melhor dizendo light,   para conformar-se à ânsia de torná-la ou mais palatável, ou menos feia, o dito jeitinho transmite ideia que me parece prosaica, mas realista quanto à empulhação pela autoridade.

         Não nos deixa mentir a expressão para inglês ver   a que no tempo do Império  (século XIX), o brasileiro comum se referia aos arranjos e enfeites temporários com que a autoridade enfeitava a mui heróica e leal cidade de são Sebastião do Rio de Janeiro, quando por aqui aportava a grande potência da época, a pérfida Álbion, de que os mares constituíam um amplo e cômodo lago.

          Esse modo um tanto esquizofrênico de lidar com a realidade nacional e a atitude tanto da Autoridade, quanto de seus servidores, e até do Povão amigo, há de apelar para o modo mais simples de relacionar-se com o dito Ambiente, que será sempre a Mentira, ou, se preferirmos, a sua versão mais educada, a Ficção (o que muda é o vestuário e a respectiva qualidade na apresentação).

          Sabemos que a lorota ou a caracterização inventiva terá as pernas curtas, no sentido de que o seu prazo de validade tende a ser extrema e incomodamente fugaz, mas para os atores do espetáculo a esperança reside nesses prazos bastante exíguos da encenação, ou, melhor dizendo, competição internacional.

          Por causa de inúmeros aspectos - a preguiça é um deles - mas notadamente a consciência de que a ameaça - no caso da presença estrangeira obrigatória e, por consequente, intrusiva - não é permanente nem eterna, e felizmente temporária e relativamente breve, a solução do breve enganoso (realidade enfeitada) constitui uma das soluções preferidas.

          Quando a realidade (por causa em geral de suas dimensões, ou da indolência da autoridade envolvida) não é suscetível de ficções temporárias,  quem prometeu e não cumpriu, uma vez entalado na contradição, partirá para a assunção da realidade em último caso, como v.g. no que concerne ao vexame da baía de Guanabara, em que se prometeu atacar a poluição que decorre sobretudo de despejo de esgotos não-tratados pelas cidades e povoações ribeirinhas, mas também de desleixo (como ocorre v.g. com o rio Tietê em São Paulo, que é sufocada pela agressiva ignorância ribeirinha através do lixo e da incúria. Nesse caso, a autoridade parte para a brutal franqueza, que é a maneira traumática (cortar o nó Górdio) de 'solucionar' o problema, como se partir para a grossura diminuísse o logro.           

            No que tange à desigualdade social, se ela não merecer o cuidado da autoridade respectiva, cuidado esse que pode revestir diversas formas, todas elas implicando esforço e continuidade,  a  consequência será mais sujeira.  Fala-se muito em integração da favela com a cidade. Nada contra. Mas não nos esqueçamos de que essa integração é uma rua de duas mãos: envolve respeito pelos seus habitantes, respeito esse da PM e de todas as autoridades do Estado e, também, respeito dos  habitantes dessa comunidade, que colaboram  com a coleta de lixo e todos os demais pormenores da vida citadina (que as novelas da Tevê costumam dissimular ou até mesmo omitir)...

 

( Fontes: Rede Globo,  O  Globo )

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

O Pêndulo da Justiça

                              

         O Impeachment desta feita enfrenta obstáculos imprevistos, que objetivamente pouco têm a ver com as condições objetivas que parecem determiná-lo.

          Vamos por partes. O que configura o(a) candidato(a) ao impeachment? A existência de um quadro de parte da mais alta autoridade da República que recomende o recurso a esse instrumento utilizável em casos extremos do ordenamento democrático.

           Que quadro é esse e quais são as condições que o tornam mandatório? Como premissa está o desrespeito à legalidade constitucional. Não se presumem falhas aleatórias, independentes da vontade do(a) primeiro(a) mandatário(a), mas sim comportamento que não deixe dúvidas sobre esse animus da alta autoridade.

           Hors la loi (fora da lei) é um conceito da legislação francesa que configura autoridade que conscientemente se afaste dos parâmetros legais. Determinada tal situação, a autoridade não mais pode servir-se das prerrogativas e garantias legais. Tal se baseia na simples razão de que, quem desrespeita a lei, não pode dela valer-se para blindar-se posteriormente.

          Deve entender-se como a ultima ratio[1] da democracia. No regime parlamentarista, a assembleia, pela moção de desconfiança, determina a saída do governo de um primeiro ministro e de seu gabinete. O parlamentarismo, que, no Brasil, vigorou no Segundo Reinado, e por um curto período na república, é um regime mais flexível, e portanto mais aconselhável a países com as nossas características.

          No presidencialismo, sendo o primeiro mandatário eleito pelo voto popular para mandatos fixos (hoje, de quatro anos), desembaraçar-se de um chefe de governo é tarefa mais complexa. Por essa razão, a nossa história recente só registra um caso de impeachment.

           Facilitou, na época, que se chegasse a tal decisão, a circunstância de que o primeiro mandatário atingido não era respaldado por um grande partido, como é atualmente a Presidente.

           Por motivos bem conhecidos, adentrou o Brasil  uma vez mais nesse processo. As condições que criaram tal situação são, segundo o apontam fortemente as aparências, a existência  de uma coleção ilegal de fundos baseada na principal companhia estatal, e que era realizada em detrimento dela e em favor seja de seus 'operadores' , seja do próprio partido (dentro de mentalidade voltada para o aparelhamento do estado).

           Outra razão para o impeachment está em governança que se afasta das normas legais, seja por incompetência, seja por fins inconfessáveis.

           Para este segundo caso de impeachment republicano, o Tribunal de Contas da União, após longo exame, e dada toda a oportunidade de defesa à acusada por intermédio de sua representante, a Advocacia Geral da União, optou por acolher o parecer do relator, quanto a existência das chamadas pedaladas nas prestações de conta, pedaladas essas que importam em desrespeito da Lei de Responsabilidade Fiscal, eis que se propõem a mascarar o não-cumprimento dessa Lei. Pedaladas são empréstimos ilegais tomados a bancos estatais (como o B.B., a CEF, o BNDES).

            Uma das características da administração Dilma Rousseff foi o pouco respeito aos critérios fiscais. Despreparada para o ordenamento fiscal e o controle da inflação, a Administração Dilma se pautou por uma gestão irresponsável dos fundos públicos, que se caracterizou por uma cultura de déficit fiscal e de pouca atenção às contas estatais e a seus recursos, com o surgimento de déficits pesados e do reviver de uma cultura inflacionária.  O maior responsável por isso não é Dilma Rousseff, mas quem a indicou para a presidência, sem que ela reunisse as condições mínimas necessárias para a exação de tal magno empenho.

             Infelizmente, com o assistencialismo do Bolsa Família, e de uma Região a ele dependente,  havia tristes condições para que a dita 'Mulher do Lula' fosse eleita, batendo um candidato muito mais preparado e habilitado para o cargo, embora  se deva declarar que a sua chapa foi boicotada pelo seu principal rival dentro do partido, e preenchida por um candidato a vice que não tinha o gabarito para tal. Também houve inegável cristianização desse candidato no importante estado de onde provinha o seu adversário interno. Tudo isso, junto com a popularidade do principal chefe do PT, determinaria a eleição de alguém que objetivamente não era a melhor candidata, nem estava preparada para tão importante missão.

              No momento, as razões técnicas que fundamentam a condenação das pedaladas já estão estabelecidas igualmente pelo corpo técnico da Câmara dos Deputados.

            Há óbvias condições políticas para o acolhimento das razões técnicas para o impeachment.  No entanto, existe um óbice político de ordem personalista. Determina a Constituição e dispõe, por conseguinte, o Regimento da Câmara que cabe ao seu Presidente dar início ao processo de impeachment, uma vez determinada a sua procedência. Não poderia haver signatário de maior peso ético, moral e intelectual de que o Dr. Hélio Bicudo - que deixou o PT por imperativo ético da crise do Mensalão. No entanto, um processo fundamentado e baseado outrossim no sentir de larga faixa da opinião pública nacional, chega às mãos de alguém que ocupa alto posto constitucional e que deveria ter a necessária isenção para uma decisão republicana.

              Sem embargo, há muitas dúvidas quanto à condição de parte da autoridade constitucionalmente investida de uma decisão pautada no direito e no interesse nacional. Com o aval do corpo técnico da Câmara, o que pode impedir Sua Excelência o Deputado Eduardo Cunha de desincumbir-se desse dever legal e constitucional?

              Correm a respeito rumores de que o Governo de Dilma Rousseff, temeroso das consequências do dito procedimento, teria acenado à referida autoridade sobre a possibilidade de uma combinação que não corresponde aos interesses da Nação, vale dizer criar condições para alegadamente isentar  a referida autoridade dos processos legais a que deveria responder. Além da verificação simples de que seria no caso 'un marché des dupes'  (um negócio de tolos), ou traduzindo em linguagem cabocla, um 'conto do vigário' porque a presidência não pode prometer o que não está no seu poder, é de esperar-se que Sua Excelência o Senhor Deputado, Eduardo Cunha, acolha a petição e a encaminhe ao Plenário da Câmara, como determina a Lei.     

( Fontes: O Globo, Folha de S. Paulo )




[1] razão última (a ser empregada como derradeiro recurso).

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Estados Unidos: Acordo sobre o Orçamento


  

         Surpreende que no Congresso Americano - Câmara e Senado - Republicanos e Democratas cheguem a acordo sobre pontos antes contenciosos, e que pareça nele prevalecer um espírito bipartidário, reminiscente de velhos tempos? Muitos dados semelham reforçar essa hipótese.  Não é que na prática desaparece o temível teto da dívida, várias vezes utilizado sobretudo pela Câmara para tentar extorquir concessões do Presidente Barack Obama ? O mesmo teto a que  chegaram em duas oportunidades distintas ao extremo de fechar o governo federal ? Desta feita as lideranças congressuais optaram por um teto móvel, na prática inexistente, o que evitará problemas para o Tesouro americano. Este poderá agora continuar a endividar-se sem a ameaça de  desastroso fechamento, que em oportunidade recente, no primeiro mandato de Obama, levara Agência de Avaliação de Risco ao extremo de baixar de um ponto a cotação do Tesouro estadunidense... Por quanto tempo deixará de ser  questão política e permanecerá na  condição burocrática, como era antigamente quando reinava o espírito do bipartidismo ?

           Como se sabe, o problema surgira a partir do pleito de 2010, em que, por causa da famosa tunda (shellacking) a Administração Obama perdeu a maioria na Casa de Representantes. Toda a legislação importante de Barack Obama - notadamente, a Lei da Assistência Médica Custeável (ACA), a importante Lei de subsídios para atividades afetadas pela grande crise financeira de 2008, e a Lei sobre bancos e ações - seria aprovada neste biênio de 2009/10.  O resultado negativo de 2010, decorrente em boa parte da inexperiência de Obama, teria pesadas consequências sobre a ação do Congresso, que a hostilidade do Partido Republicano a qualquer cooperação com os democratas condenaria a lamentável estagnação.

          Com o GOP conquistando a Casa de Representantes, instalou-se em Washington uma virtual paralisia legislativa. Assim, apesar de os democratas reterem a maioria no Senado até o começo deste ano de 2015, com a Câmara baixa nas mãos do GOP, desde 2011 e da facção do Tea Party, iniciou-se virtual bloqueio legislativo. Até a lei da reforma da imigração, que fora aprovada pelo Senado, com a participação de boa parte dos senadores republicanos, empacou na Câmara. Apesar de haver diminuído a facção do Tea Party, prevaleceu o facciosismo que veio a forçar agora a renúncia do Speaker John A. Boehner, republicano de Ohio. Note-se, a propósito, o que já foi mencionado várias vezes neste blog. terem os Estados de maioria republicana em 2010 realizado um extenso guerrymandering (redesenho dos distritos eleitorais, de modo a maximizar as maiorias republicanas, com a concentração em grandes distritos dos eleitores democratas).  O escândalo desse redesenho prevalece desde 2012 (as eleições para deputado são bianuais), a ponto de que em certos estados, como Ohio, Obama os conquistaria, enquanto o número de deputados, escolhidos em distritos redesenhados, de maioria republicana, não batem com os totais gerais estaduais... Essa situação nacional só poderá ser resolvida quando do  próximo recenseamento, que sói ser decenal...

          Voltando então à questão do início, semelha óbvio que a volta da boa vontade republicana se deve à preocupação de transmitir ao eleitorado que o GOP não é irresponsável (como foi a Câmara forçando em um desses choques anteriores a suspensão dos serviços estatais, com grande transtorno da população). Em nova maquiagem,  o GOP se apresenta mais ajuizado, e por isso disposto a ter flexibilidade nas negociações com a minoria democrata (tanto na Câmara, que costuma ser mais radical, quanto no Senado).  Assim, o Congresso republicano não deseja aparecer como atrapalhando a ação do Presidente Obama, em assuntos de óbvio interesse geral. Dessarte, em concessão republicana a proposta elaborada por Boehner e a ser já batida pelo martelo do novo Speaker Paul D. Ryan, de Wisconsin, que foi candidato a vice-presidente na chapa do GOP, encabeçada por Mitt Romney e derrotada por Obama em 2012, prevê as seguintes principais disposições: as despesas aumentarão em cerca de US$ 80 bilhões, o que não inclui um fundo de guerra de emergência no montante de US$ 32 bilhões. Tais incrementos seriam compensados por cortes nas despesas em Medicare e na Seguridade Social, bem como a poupança ou renda de uma série de outros programas, inclusive venda de petróleo das reservas estratégicas.

              Obama, como chefe do poder executivo, negociou as referidas disposições, inclusive a retirada de cortes havidos como prejudiciais, chamados de 'sequestration' que entorpecem a atividade econômica e afetam a segurança nacional.

               Assinala-se que o incremento de oitenta bilhões de dólares  corresponde a pouco mais de 1%  do  orçamento anual (cerca de US$ 4 trilhões).  Se implementado conforme esperado, o acordo congressual representa importante avanço depois de anos da paralisia acima mencionada.

                O bolo da  partida do Speaker John Boehner teve uma 'cereja' de inegável sentido  com a reautorização de funcionamento do Eximbank (Export-Import Bank) fundado há 81 anos atrás, cuja carta bancária de renovação estava sendo retida pelo hostil republicano presidente do Comitê Bancário da Camara, o republicano Jeb Hensarling, do Texas.

                 Para que a manobra do Speaker Boehner tivesse êxito, foi determinante o voto da bancada minoritária democrata, para retirar do Comitê hostil a reautorização do Eximbank (que caducara desde junho último). Desse modo, uma minoria de republicanos junto com a totalidade da bancada democrata somaram 246 votos e bastaram para derrotar os 177 republicanos restantes.

                  Os republicanos lograram aumentar as despesas com as forças armadas, e equilibrar as despesas com programas sociais. Também os democratas afirmam ter logrado os respectivos fins, retirando os caps (tampas) em determinadas despesas, assim como lograr que os dispêndios com as forças armadas e os programas não-militares tenham incrementos iguais.  

                    Nada como uma eleição relativamente próxima para dar mais juízo ao Partido Republicano, que ainda se recorda da má publicidade junto ao povo americano com o irresponsável fechamento de serviços públicos essenciais durante um dos últimos embates entre o GOP e o governo democrata de Obama.

 

( Fonte: The New York Times )

Primeiro Turno Argentino


                                   

        Não serviu muito ao governista Daniel Scioli - que obteve 36,86% dos votos - tentar dissociar-se de Cristina Kirchner e do chamado kirchnerismo. Veio incomodá-lo Maurício Macri que, com 34,33%, os quais, fora dos padrões portenhos, tornaram indispensável o segundo turno.

         O peronismo kirchnerista perdeu a maioria na Câmara dos Deputados, assim como a governança da província de Buenos Aires.

        O grande escritor argentino Jorge Luis Borges detestava peronistas e, por conseguinte, o peronismo, que julgava a expressão da vulgaridade senão da própria boçalidade.

         Ter esse movimento com tal força a ponto de a grande maioria intitular-se peronista, é sintoma algo preocupante, se guardarmos uma Weltanschaung[1] próximo dessa ideologia de massas que se tornaria o peronismo na Argentina.

         Como aumentou deveras, carece hoje de adjetivos identificadores, como o do kichnerismo.  Há de ver-se que existe uma personalização extrema no mundo dos hermanos, característica que tende a assustar um pouco.

         A personalização do pensamento político semelha à primeira vista um certo exagero. E que a identificação seja invadida por tantos, a ponto de que se tenha de recorrer a qualificativos personalistas como o sobrenome do caolho, como o chamou em um rasgo de intimidade Pepe Mujica - que faz pouco acaba de despedir-se com a habitual honradez  da segunda presidência no vizinho Uruguai.

        A situação política na Argentina ainda está indefinida. A esse propósito, em sua nota hodierna Miriam Leitão pondera que é cedo para comemorações, eis que ' no fim das contas, o primeiro e o terceiro colocados são peronistas'.

        Diante do perigo, os bichos se costumam agrupar em bandos da mesma cor.

        Caberia ao oposicionista Macri reunir as oposições no turno final. Resta saber se terá condições para tanto, quebrando os laços de dois agrupamentos de sufrágios pró-peronismo.

        A bagunça econômico-financeira - trazida pela Viúva de Kirchner - e que rivaliza com outra mais ao norte, poderá ser a causa principal que motivará o Povo Soberano.

         É de ver-se se Mauricio Macri terá o talento político e a mensagem para tanto.

 

( Fonte:  O  Globo )  



[1] Visão do mundo.

Mais perto do Responsável ?

                                
 

         A bancada do PT, ao que parece, está muito irritada com o Ministro da Justiça da Presidente Dilma Rousseff.  Ao que parece, o motivo da exasperação petista se deve a uma disposição do ex-Ministro da Justiça, Ramiro Thomaz Bastos, não há muito falecido. Quando ministro do Presidente Lula da Silva, introduziu reforma importante na operação da Polícia Federal, a qual deu, dentro da lei, autonomia. Na época, Thomas Bastos, além de trazer o brilhantismo que sempre o caracterizou na prática da advocacia, liberou a atuação da P.F. dentro dos parâmetros da legalidade.

          O atual ministro da Justiça é militante do Partido dos Trabalhadores, mas não alterou as disposições introduzidas pelo seu ilustre antecessor. José Eduardo Cardozo tem sofrido ocasionais rompantes da Presidente, cujo humor é conhecido. No entanto, continua a atuar dentro dos parâmetros dados por Thomaz Bastos. A aludida autonomia é uma das bases da operação Lava-Jato e de outras mais que a corrupção vigente no país torna indispensáveis, como na chamada Zelotes, que se origina de problemas na Receita Federal e no CARF.

           A gorda bancada do Partido dos Trabalhadores, produto direto da propaganda peculiar que antecedeu o primeiro turno, com uma rósea visão da economia e das transações em Pindorama, a par de negar o direito de resposta da oposição, como no caso limite do filmete sobre os perigos da autonomia do Banco Central, perigos esses vistos apenas pelas lentes de João Santana, essa nédia bancada, repito, é o resultado das mentiras de Dilma e da propaganda em torno. A sua correspondência com a realidade atual é, por conseguinte, extremamente precária, o que só tem contribuído para acirrar a considerável raiva popular com o estelionato eleitoral.

            Ninguém gosta de ser iludido. O PT, com dona Dilma - o velho capitão Lula foi escanteado nas eleições de 2014 (o que lhe mostrou o garrafal erro de que poderia instrumentalizar a reeleição ou não do seu primeiro poste.) Não se brinca com a força institucional de um primeiro mandatário, até mesmo alguém criado pelo interessado engordou bastante, e elegeu muita gente nas bancadas ancilares como PCdoB, além de outras oportunistas, na cissiparidade das legendas no Brasil.

           O PT está irritado porque se acredita um partido do poder de antigamente, como se estivera acima do bem e do mal.  Embora José Eduardo Cardoso seja um petista, ele tem aplicado as instruções vigentes, vindas do ilustre antecessor. Agora, ao verem Gilberto Carvalho, o homem da estrita confiança de Lula da Silva às voltas com a Polícia Federal, querem que o Ministro da Justiça volte atrás do exemplo de seu ilustre antecessor.

            O que faz levantar as lanças no arraial petista é a sensação de um cerco que se fecha.  Agora se passa ao suposto comércio com as medidas provisórias, no caso em tela para favorecer montadoras de veículos. As investigações da Justiça (entendida no seu aparelhamento amplo) prosseguem. Se os seus efeitos e dores consequentes vão aumentando, as reações dos atingidos tendem a espelhar tais efeitos, e  à medida que o diapasão cresce e se torna mais incômodo,  suas características tendem a dissociar-se da realidade presente, pensando poder transformá-la  por algum deus ex-machina ou mesmo pela aplicação da força bruta.

               Essa gente, no entanto, tem uma noção bastante fragmentária e distorcida da realidade imperante. Pensam ainda estar em posição de ditar condições, mesmo flagrantemente fora da lei. Com todos os seus destemperos, Dilma Rousseff tem agora demonstrado que aprendeu a lição e que a democracia brasileira, na qual prosperou, ,não permite que se pense reverter as condições imperantes, que são as da legalidade plena. Só que a Polícia Federal pela sua atuação mostra que não há mais brasileiros acima da lei. Há os que tem o privilégio do foro, e a democracia ensina que quanto menos existissem, melhor seria.

               Evitaríamos a instrumentalização de altos postos na República. Se atravessamos um momento peculiar, em que a impermanência constitui a regra, é bom e continua oportuno que toda a macacada fique nos respectivos galhos. Nenhum deles será demasiado alto para que não lhes acesse o braço longo da Justiça, no caso, o da Polícia Federal.

               Deixem José Eduardo Cardozo no lugar que está.  Deixem a Polícia Federal continuar no seu trabalho, que faz bem a toda gente de bem.

               E não pensem que os verdadeiros trabalhadores - e não aqueles de quepi chavista - não gostem da rigidez e direiteza da lei. A dura existência deles é prova disso. Não há maracutaias para o operário e o trabalhador. Vejam as conduções que devem usar. Vejam os respectivos horários de trabalho.

               Para eles, não há semanas de dois dias e meio, e a bonança de viagens sem fim.

               Não lhes assusta a Justiça. Que mal faz que a lei valha para todos?

 

( Fonte:  O Globo )

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Qual a força da Rússia ?

                                     

         Não faz muito Barack Obama relembrou a Vladimir Putin   que a Rússia era um poder regional, este último ouviu com atenção, mas não respondeu de imediato.

         Era muito claro na ocasião o sentido da observação do Presidente estadunidense. Seria mais ou menos, cuide de seus assuntos, mas na sua esfera. Subentendido nesse put down[1], que Putin não deveria esquecer que a atual Federação Russa não pode tomar ares de União Soviética.

         Apesar de ser o país sucessor da antiga URSS, em extensão territorial e em recursos, não se pode por ora compara-lo com a superpotência que desapareceu em 1992.  

         No entanto - e o comportamento de Vladimir V. Putin constitui forte indicação nesse sentido - ele está impaciente em incrementar a respectiva presença nos seus limites, pensando sempre na pro-ativa afirmação da respectiva potência.

         Foi no tempo do antecessor de Obama, George W. Bush, que Moscou começou a voltar a pôr as manguinhas de fora. Principiou no episódio da Georgia, com o apoio a regiões separatistas. O retorno ao velho imperialismo com o estrangeiro-próximo[2], se causou reações adversas, em nada alterou a situação da Georgia que teve de engolir o apoio russo às populações dissidentes.

         No que foi posteriormente saudado como hábil manobra política, desgastado com Washington e o Ocidente, Putin colocou na presidência o seu alter ego Dmitriy Medvedev, e passou os seguintes quatro anos como Primeiro Ministro. Com isso, a pecha de imperialista esmaeceu um tanto, e ele pode voltar mais tarde ao G-8.

        Se a queda de Viktor Yanukovich, em fevereiro de 2014, por força da revolução da Praça Maidan, em Kiev, na Ucrânia, redundaria na não-assinatura de pacto com Moscou na união aduaneira (o povo ucraniano aspira o acordo amplo com Bruxelas), tal também redundaria na anexação da Criméia e em intervenção branca de Moscou na Ucrânia oriental, com invasão nas fronteiras e estímulo aos chamados rebeldes pró-Rússia.

        Dadas as dimensões da Ucrânia, por essa fragrante intervenção nas questões internas de um país que mantinha boas relações com Moscou, Putin pagaria um preço alto pela ilegal invasão (que tentou coonestar através de referendo de afogadilho), com sanções à própria economia e a expulsão do G-8.

        O desgaste russo continua, mas uma vez invadida a Ucrânia, a posição da potência imperialista tem-se estendido no oriente, máxime nas vizinhanças da Criméia, através de "rebeldes" industriados e apoiados por Moscou. O Ocidente, notadamente a UE, na retórica tem sido aliado de Kiev, mas não chega sequer a fornecer-lhe armamento defensivo pesado. A Ucrânia, no entanto, pelo tamanho e potencial não pode ser comparada a pequenos países como a Geórgia, e por isso a sua resistência não pode ser subestimada pelo Kremlin. Nesse contexto, em comentário a artigo de George Soros as possíveis implicações da questão foram discutidas no meu último blog sobre a questão ucraniana.

       Já a recente entrada da Rússia no cenário sírio, como referida num dos últimos blogs tem ensejado ao Ocidente, em particular Estados Unidos e outros aliados na OTAN, de observar mais de perto a atual condição do armamento russo.

        Dois tópicos merecem especial atenção: a capacidade russa de realizar operações muito além dos limites atuais da Federação Russa, assim como o emprego de novas armas e equipamentos.  Dentre os aviões usados, está o Sukhoi Su-34, que é caça de ataque, e um míssil de cruzeiro - o Kalibr - com alcance de 1500 km, disparado de um navio no Mar Cáspio.   Já os caças russos cuidaram da barragem aérea em apoio das tropas de infantaria síria, e poderão também apoiar a ofensiva prevista na província de Aleppo de tropas iranianas.

          A ainda limitada operação na Síria poderá servir de exercício para as forças russas e mandar um recado para o Ocidente acerca da eventual restauração da capacidade militar da Rússia e do seu eventual alcance global.  O comportamento das forças russas indicará a extensão do esforço do governo Putin de transformar o respectivo poder militar, depois de decênios de decadência pós-soviética.

         Ao contrário das operações na Ucrânia - seja a tomada da Crimeia, seja a invasão das fronteiras desse país, em apoio aos chamados 'rebeldes pró-Rússia' - realizada de forma relativamente discreta e tortuosa (com o escopo de ocultar o mais possível o aporte russo)  - agora se dá o maior realce aos bombardeios na Síria, que tem cobertura jornalística e em vídeo, para larga distribuição.

         As forças armadas vem recebendo reforços  - aviões novos, navios de guerra e mísseis - mas também foram objeto de reestruturação, com redução de oficiais militares (privilegiada a qualidade ao invés do número) e a capacitação de um corpo de sub-oficiais de apoio.

           Malgrado os óbices da queda do preço do petróleo (o seu principal produto de exportação) e as sanções aplicadas pela anexação da Criméia,  os fundos militares chegam a 81 bilhões de dólares, ou 4,2 % do PNB.

            As novas capacidades das forças armadas russas foram demonstradas pela instalação de base aérea perto da Latakia, no noroeste síria, em cerca de três semanas, numa operação que incluíu 48 aviões de combate e helicópteros, divisões de tanques e veículos blindados, sistemas de artilharia e mísseis, defesas aéreas e habitações móveis para cerca de dois mil homens. Segundo se apurou, foi o maior transporte de material militar para o Oriente Médio desde a operação da União Soviética em 1970 no Egito.

            Em questão de dias, as missões de ataque aéreo  passaram de um punhado delas nos primeiros dias para cerca de noventa diárias, com a utilização de diferentes tipos de munição, teleguiada ou não, inclusive bombas de fragmentação e armamento especial para destruir  bunkers.

           No momento, as forças russas servem para a campanha aérea, e tem seiscentos fuzileiros navais em terra para proteger a base aérea de Latakia.  Por enquanto, não está previsto o envio de força militar de peso para apoiar os sírios.

            Conforme especialistas americanos, as operações na Síria mostram que a Rússia está mais ou menos no nível operacional dos Estados Unidos nos anos noventa. Segundo Mr. Kofman, que segue o desenvolvimento aero-militar russo, eles perderam em poucos meses cerca de cinco aeronaves, por causa da aceleração do tempo de operação, Sem embargo, Kofman não concorda com a avaliação de que a aviação russa seria uma espécie de Vila Potemkin.

                  A maior surpresa para o Ocidente está nos mísseis de cruzeiro, de mil e quinhentos km de alcance. Segundo os observadores, há um salto tecnológico nesse domínio, que poderia ser preocupante para a OTAN.

                   De acordo com informações de fonte americana, a Rússia realizou estreita coordenação com os seus aliados (notadamente o Irã).  O Major-general Qassim Suleimani, que é o comandante da força para-militar iraniana Quds, esteve em Moscou em julho último, para provavelmente coordenar-se com os russos na ofensiva prevista, assim como está empenhado em ajudar as milícias iraquianas (as forças militares dos dois países tiveram um desenvolvimento inverso à situação no tempo de Saddam Hussein, quando o Iraque dispunha de poder de fogo muito superior ao iraniano).

                     A impressão dos observadores de Tio Sam é de que os russos vem utilizando precipuamente as operações nessa campanha para uso eventual alhures. Em suma, seria uma espécie de treinamento reforçado, em nível assaz mais elevado de que os simples e usuais exercícios desse gênero.

                      Claramente Putin ambiciona dispor de braço militar forte para apoiar as suas nada pequenas ambições no plano político. Resta determinar se as bases da atual economia russa, bem mais raquíticas do que as da antiga União Soviética, terão condições de aguentar o tranco, levando-se em conta um parque industrial bastante inferior ao da antiga segunda superpotência.

                       Será por causa de todos esses aspectos - alguns limitativos - e uma base industrial-militar que não tem a pujança (nem o aporte de vários outros países, hoje na esfera ocidental) da antiga infraestrutura soviética, é que as grandes ambições de gospodin Putin podem sofrer do peso negativo de fatores potencialmente contrários. Sem nunca esquecer, de resto, que  Vladivostok com a sua simbologia de domínio do Leste  não basta decerto para controlar um outro grande jogador na política mundial, a saber, o antigo Império do Meio, hoje República Popular da China, que também começa a movimentar-se, tanto economica e politicamente, quanto militarmente, sob o igualmente ambicioso Xi Jinping, o atual chefe-supremo da segunda potência econômica mundial.

 

( Fonte:  The New York Times )        



[1] no contexto, caberia a tradução 'chamada à ordem'.
[2] expressão com que a Rússia designa os seus vizinhos.

Risco à Democracia?


                                      

         Comoventes os escrúpulos de dona Dilma, na sua entrevista para a CNN! Não  é que agora, ela lembra dos riscos para a democracia ao discutir-se o impeachment ?   

          Preocupações estas que sequer lhe passaram pela cabeça quando mergulhou em propaganda fora da realidade, apresentando economia e país como se tudo estivesse no melhor dos mundos, e com a desfaçatez e a petulância dos embusteiros iludindo com a enganosa publicidade de João Santana e  pétreo cinismo zombando de quem ousasse negar vivermos então no melhor dos mundos.

          É possível enganar o povo brasileiro, ainda mais envergando a máscara da segurança, que a detenção do poder parece validar. O erro de dona Dilma está em pensar que os eleitores esqueceriam as promessas e a falsa segurança de quem se tinha a acima da verdade. Suas mentiras, a arrogância na falsidade, e sobretudo o próprio cinismo chocariam quem julgara toda aquela petulante segurança como se arrimada na verdade. Mas a mentira tem pernas curtas e a reação que provoca é de raiva e indignação, raiva pelo engano sofrido, indignação porque, pela própria desfaçatez, ei-la de volta no poleiro do mando, como se risse às bandeiras despregadas pelas estórias da carochinha que fez passar por verdade.

           É interessante esse vale-tudo do poder que acredita ter condições de mentir e atochar cinicamente para o eleitorado esses pavilhões do Conde Poniatowski[1], e, mais tarde, com a reação do Povo soberano, vestir-se com preocupações com a 'adolescente' democracia brasileira, e arrotar, subitamente impregnada de cuidados cívicos, conselhos de suposta prudência na discussão do 'impeachment' pelos alegados riscos que traz consigo!

           O PT, em treze anos de poder, não se pejou de passar do Mensalão para o Petrolão.  Aquele partido aguerrido, jacobino, que chegara a expulsar de suas fileiras deputados que decidiam sufragar pelo voto indireto quem era o portador das esperanças do Brasil democrático, mostra agora que tudo não passara de farsa e embuste, para torcer o nariz para Tancredo Neves, chegando até a não assinar a Constituição, por desagradar-lhe este ou aquele artigo! A farsa em Pindorama é factível[2], pois enquanto persistirmos nesse jeitinho de remendar e de perdoar, todos esses arreganhos de falsos democratas dos tartufos da república serão possíveis.

            Viramos a terra das pesadas penas no papel, que, mal entradas nas prisões, se deformam em reduções mil, como se tudo fosse de mentirinha. Temos de tirar o medievo de nossos cárceres, mas infundir em nosso direito penal não a ficção das chamadas progressões de pena, mas a realidade de o que sociedade exige pelo crime praticado. Tomemos cuidado com a ficção, porque logo surgem os que dela vivem, pensando poder praticar o crime, e depois gritar viva a democracia!

             Esta senhora que hoje se diz tão preocupada com a adolescente democracia brasileira, onde estava quando geriu o Conselho de Administração da Petrobrás, que fora invadida pela corrupção descarada, e por isso dessangrada sem piedade. Onde  estivava ela, que diz nada ter ouvido, nem visto ? Será que o PT julga possível safar-se da tempestade que semeou e provocou, quando ainda hoje, através de discípulos de Orestes Quércia sequer tem pejo de assinar relatórios em que não se indicia ninguém e, sobretudo, não se aponta nenhum culpado na farra das propinas?

              Agora esta senhora - imitando o seu preceptor (não se esqueçam que todos têm o guia e exemplo que fazem por merecer) - chora lágrimas de crocodilo, temente aos males da sempre jovem democracia brasileira.  Embarcou sem pestanejar na jangada de seu preceptor e comandante - Lula da Silva - que ora se diz preocupado com a democracia brasileira, e com a injustiças que pairam sobre o seu partido. Enquanto isso, diminuem os seus prefeitos, vão para a cadeia os favorecidos do Mensalão e esperamos do Petrolão.

              Gritam os céus que ela perdeu a confiança do Povo brasileiro - por haver ousado enganá-lo - e não serão vãs alianças  com gente de quem se esvai o poder, nem ameaças e temores com alegados perigos à democracia - riscos esses que não lhe modificaram em nada a propaganda mentirosa e arrogante que,em grande parte, a elegeu - que lhe serão de alguma valia nessa hora extrema,  em que o velho Povão manifesta renovada confiança na provada democracia, que tem a guiá-la o exemplo e a palavra de Hélio Bicudo  um varão de Plutarco. Provada já, a democracia brasileira dispensa esses falsos conselhos de quem tem muito a perder pela barca que escolheu e as mentiras que pregou.

 

(  Fonte: O Globo )  




[1] No seu passeio pelo interior do Império russo, mostrando à Soberana Catarina a Grande os pavilhões de 'felizes camponeses' preparados adrede para convencer a Tzarina das benesses gozadas por seus súditos.
[2] O pernicioso 'jeitinho' permitiu a quem não assinara, rever depois a própria decisão, passando como se houvesse subscrito o documento desde a primeira hora. Devemos ter a coragem de nossos atos, e não permitir que partidos políticos se valham de fáceis perdões, como se a tivessem apoiado desde a primeira hora.