quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

A Igreja sentirá falta de Bento XVI ?

                          

          Hoje, 28 de fevereiro, por sua própria vontade, Bento XVI se afastará da Sé de Pedro. Um Papa conservador, candidato in pectore de João Paulo II, após cerca de oito anos de pontificado,  de certa maneira inova, ao tomar o caminho de S. Celestino V.
          As semelhanças, contudo, são enganosas. Escolhido por um conclave em crise, o monge Pietro del Murrone, que vivia em clausura não suportou o desafio da política do final do século XIII. Em poucos meses renuncia, para tornar-se um  virtual prisioneiro, encarcerado na vila de Fumone, sob as vistas suspicazes do sucessor Bonifácio VIII.
          Celestino V vivera em aura de santidade. Por isso fora ungido, e por isso renunciara. Os temores do sucessor – que para tanto tinha sobejas e egotistas razões – lhe acrescentaram mais títulos para a beatificação e canonização.
          Hoje Papa Ratzinger se transforma em pontífice emérito, o primeiro na bimilenar crônica da Sé de Pedro. Afasta-se cercado de multidões de súbito chorosas, que lhe dispensam calor e emoções antes não vistas. Também por sua determinação, segue com as honras devidas para Castel Gandolfo, a residência estival dos pontífices.
          Antes adotara as necessárias providências para as novéis circunstâncias, eis que a Sé vacante não surge por esta única feita por decorrência da morte do Papa reinante. Obviamente, não participará do conclave, embora não se exclua que tenha candidato, como ele mesmo o foi de seu antecessor, Papa Wojtyla.  Também fez saber que residirá em uma das inúmeras construções do Estado Vaticano, e que vestirá batina branca.
          Como nos reinos do passado, ele, enquanto vivo, relembrará assim a estirpe pontifícia, e disporá, ainda que na relativa modéstia dos antigos soberanos, de um círculo doméstico, que aglutinará os mais chegados.
         Toda renúncia de boa fé – como é claramente o caso - traz no seu bojo o desprendimento dos afagos do poder. Como agora nos diz o Sucessor de Pedro, enfrentou ele momentos difíceis. Na sua derradeira homilia, enquanto Papa reinante, ele disse: “Tive momentos de alegria e de luz, mas também momentos que não foram fáceis”. E nesse contexto, precisa: “momento de mares turbulentos e ventos contrários, como em toda a história da Igreja, em que o Senhor parecia dormir.”
         Como referido, o próprio Papa Ratzinger fez questionamento similar ao de sua alocução de despedida, na visita ao campo de concentração de Auschwitz, em 2006, onde morreram 1,5 milhão de judeus, exterminados por conta da solução final nazista, durante a Segunda Guerra Mundial: “Onde estava Deus naqueles dias ? Por que Ele silenciou ? Como pôde permitir o triunfo do Mal ?” Nesse contexto, Paulo VI fizera no caso do assassínio de Aldo Moro pelas Brigadas Vermelhas pronunciamento ainda mais incisivo.
        Colocados diante da expressão da malignidade – e dificilmente se encontrará exemplo mais turbador do que a criminosa insânia da Solução Final do nacional-socialismo de Adolf Hitler – os papas se perguntam sobre a não-intervenção da Divindade.
        As visões da divindade variam através dos tempos. Do imóvel movedor de Aristóteles, que seria adaptado pela teologia de São Tomás de Aquino, a expressão de Deus tomaria muitas formas, inclusive a trina. Outra versão está na Confissão de Fé do vigário de Savóia[1], de Jean-Jacques Rousseau, que renderia ao cidadão de Genebra muitas perseguições por apresentar o divino com os trajes do deísmo, vale dizer a sua não-intervenção nas questões terrenas.         
         Foram, sem dúvida, muitas as crises no pontificado de Bento XVI, algumas vindas de pontificados anteriores, como a da pedofilia na Igreja, o desafio antes das seitas e agora evangélico, sobretudo na América Latina, e no ainda maior país católico do mundo, as contas do Banco Vaticano – o chamado Instituto Pontificio para as obras da Religião e o que se poderia chamar o escândalo do mordomo.
        Como Prefeito da Sacra Congregação para a Doutrina da Fé, o Cardeal Joseph Ratzinger seria um ativo e proficiente auxiliar do Papa polonês no combate à teologia da libertação e a seus proponentes mais em vista.
       No antigo Santo Ofício, de controversa memória, foram convocados ou enquadrados muitos teólogos como Hans Kung, Edward Schillebeeckx e Leonardo Boff, na época OFM. Do cordial acosso a este último também participaria o então cardeal do Rio de Janeiro, que tinha muito trânsito sob João Paulo II. De uma certa forma, a frase ‘o inverno na Igreja’ do maior teólogo do Concílio, Karl Rahner SJ, nos ajuda a entender tal período de repressão conservadora, sedulamente aplicada ao longo do pontificado do papa polonês.
      Dessa visão conservadora e delicadamente repressiva da Igreja o Cardeal Ratzinger seria a epítome nos tempos do  Papa João Paulo II, e por isso entraria no conclave desmentindo o velho dito (quem entra papa sai cardeal). Com efeito, a coalizão conservadora não faria alimentar muitas dúvidas acerca da indicação e posterior eleição do primeiro papa germânico em muitos séculos.
     Teólogo conservador, Ratzinger disporia da instrumentália para as amicais conversações com os teólogos que guiados pelo espirito joanino buscavam cooperar na abertura de janelas dos palácios vaticanos.
     Semelha bastante difícil, portanto, augurar a indicação de um pontífice com o espírito de Papa Giovanni, o papa do Concílio Vaticano II. Depois de um tão longo inverno,  afigura-se humanamente problemático que o habemus papam nos traga um purpurado da linha progressista.
     Sem embargo, os caminhos do Espírito Santo são insondáveis, e quem ousaria contrariá-los ?
      Se o leitor que já me conhece a preferência m’o permitir, gostaria de aditar algumas considerações que creio pertinentes.  Até hoje, o Papa Bom desperta a preocupação nos meios conservadores. Não terá sido por outra razão que só foi proclamado beato nos anos finais do pontificado de Wojtyla, que decerto não tardou em elevar aos altares personalidades como Escrivá de Ballaguer, sobre cuja santidade pesam tantas dúvidas.
      Tampouco nos seus oito anos de Sé pontifícia, Bento XVI terá considerado oportuno canonizar a João XXIII, o maior pontífice do século XX, cuja morte em três de junho de 1963 colheu o sentimento unânime dos grandes – e pequenos ! – de seu tempo, como nunca mais nos anos seguintes iria ocorrer com o Sé de Pedro.
       Ao invés de condenações, como asseverou no seu célebre discurso de abertura do Concílio, Papa Giovanni indicou o caminho de o que unia, no papel da Igreja de Mãe e Mestra através dos tempos.
      Ao invés de lamentações, é hora de trazer gente nova, que não seja zangada ou que preze o passado, pois a Igreja se deseja sobreviver ao desafio dos tempos, terá forçosamente de abrir as janelas e de aceitar os novos ventos, nunca descurando de sua eterna proposta de renovação.
      Será em tal atmosfera que as basílicas e as igrejas não representarão apenas obras de arte e de museu, vazias de fiéis e cheias de turistas. Não é olhando para o passado, com a sua pompa cerimonial, que adentraremos o futuro, de modo a que a Igreja corresponda à antiga etimologia grega, e nos prometa a repetida reunião em assembleias sempre renovadas de gente que continua a acreditar na sua eterna mensagem de justiça e fé.

 

(Fontes:  O Globo, Annuario Pontificio, Karl Rahner,SJ  )



[1] Célebres palavras de um ficcional vigário na Savóia, inserido no livro “ Émile, ou de l’Education” , de Rousseau.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Escárnio do Povo Soberano

                                     

        O que fazer do Congresso ? Será que Suas Excelências, do alto de suas regalias corporativas, pensam gozar do respeito do Povo brasileiro ?
        Não sei, ou melhor, não me animo a respondê-lo de modo enfático. De um lado, existe um portentoso fosso, criado por inúmeras vantagens auto-atribuídas e por  horário e carga semanal de trabalho que o cidadão comum – essa categoria a que, segundo Lula da Silva, os parlamentares não pertencem  - encara com raiva ou desencanto.
        Por outro lado, o cidadão brasileiro encara o Parlamento em Brasília como o cúmulo do artificialismo corporativo. Trabalham em geral por um dia inteiro – a quarta-feira – viajam na terça e na quinta (sempre às expensas do contribuinte), enquanto o corpo auxiliar de assessores (e dos inevitáveis aspones) dispõe de outro horário também absurdo, eis que só podem assinar o ponto de tarde...
        Trabalham pouco – veja-se a enorme carga de vetos presidenciais pendentes, e a judicialização crescente dos respectivos encargos – mas na estapafúrdia ciranda dos partidos, a maioria sem qualquer ideologia que não a sede de prebendas, ocupam descaradamente o horário nobre da televisão, com as suas repetidas inserções e vazias mensagens.
        Sem embargo, se pouco labutam – a ponto que nenhum patrão no mundo real os aguentaria por muito -  exigem mundos e fundos do erário público. Numa debochada retribuição pelo que auferem, não se percatam do afrontoso descompasso ao se colocarem, no cômputo imparcial das Nações Unidas, como o segundo Congresso mais caro no mundo !
        Como se tal não bastasse, ora preside o Senado quem já se demitiu no passado para evitar a cassação. De novo, a cidadania  - espicaçada pelos jovens que pelo próprio zelo e insistência nos acenam, apesar de tudo, com um futuro de esperanças – se movimenta, tanto no espaço herziano com milhões de assinaturas, quanto nas cercanias do Congresso, a exigir do presidente Renan Calheiros a renúncia.
        Ele tergiversa, diz que também já foi jovem, e chega a tocar na velha tecla de um suposto preconceito anti-nordestino. Se a recusa persistir, no entanto, ela irá alastrar-se, e como Anteu, há de retirar das entranhas da terra a força inexorável das causas populares, a que irão acudir os indecisos e os timoratos de hoje.
       Não é nota de pé de página, embora pareça. Blairo Maggi,do Partido da República, tem na corrente quarta-feira – o dia útil dos senhores congressistas – a eleição prevista para a presidência da Comissão de Meio Ambiente do Senado !
       Como determinar,  se é um escárnio, ou maneira agressiva de assinalar o que vale o P.V. na sua atual direção ou, até mesmo, a expressão ao revés da desimportância que o estamento político atribui aos recursos naturais em um país que ainda os guarda bastantes para despertar não só a inveja de outrem, mas a cupidez dos exploradores ? Eles têm pressa em abater as florestas restantes, acabar com os aquíferos, e um vastíssimo etcetera, para transformar o Brasil em um grande areal ou, bafejados pela sorte, em enorme savana !
         E, no final, tudo se encaixa: num Senado presidido por Renan Calheiros, Blairo Maggi deve presidir a Comissão do Meio Ambiente !

 

(Fonte :  O Globo )

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

De Política, Lá e Cá

                                         

          Começando pela eleição italiana, depois de semanas de nervosas predições aconteceu o que há muitos anos, com pequenas modificações, tem marcado o panorama itálico.
           Dividido entre tantos pretendentes a ter maioria nos palácios de Montecitorio (Câmara de Deputados) e Madama (Senado), de modo a instalar-se no Palácio Chigi (Primeiro Ministro), o mundo político peninsular fragmentou-se mais uma vez, cada um de sua parte em condições de proclamar a sua ‘vitória’.
           Tal espetáculo só mesmo seria imaginável na velha Itália, em que a reunificação feita pela Casa de Savoia se espelharia, em realidade, na profusão de antigos reinos, ducados, principados, para não falar da república de mais longa vida, e no Estado Pontifício nascido de uma doação que, na verdade, nunca houve.
          No entanto, Pier Luigi Bersani venceu, ainda que de forma apertada, a eleição tanto para o Senado (31,63%) quanto para a Câmara (29,54%). É, contudo, uma vitória no photo-chart, eis que Silvio Berlusconi, na reta final, aproximou-se muito da coalizão da esquerda, com 30,72%, para o Senado, e 29,18% para a Câmara.
         Como o gabinete a ser formado precisa ser respaldado com maiorias na Câmara e no Senado, e levado em conta o fato de que o partido do Primeiro Ministro Mario Monti teve um patamar baixo de votos – cerca de dez por cento em ambas as Casas – a governabilidade não se afigura factível apenas com a juntada do partido do atual Presidente do Conselho.
         Havendo o partido de Beppo Grillo atingido cerca de 20% do total, e sendo a proposta eleitoral do comediante uma verdadeira anti-proposta, com a negação dos políticos e da detestada austeridade, em princípio – na Itália todas as considerações políticas são possíveis – ter-se-ía que excluir da formação de gabinete o movimento do signore Grillo.   Como, no entanto, as fórmulas na constituição parlamentarista italiana são múltiplas, e podem incluir todo gênero de apoio externo negociado, não me atreveria a considerar fora do jogo das alianças esse bloco parlamentar.
         O que causou no passado, os tropeços e as quedas dos gabinetes foi a baixa confiabilidade das alianças de sustentação, sujeitas à rápida erosão e a possibilidade, nunca descartável, de insinuantes e desequilibrantes propostas alternativas da associação de partidos capitaneada pelo Cavaliere. A par disso, os governos têm de replicar no Senado, o mesmo esquema da Câmara, vale dizer a condição de manter uma maioria, o que duplica a dificuldade do jogo, sobretudo se tiver de recorrer a pequenos partidos de pouca confiabilidade.
        Por sua vez, através do Atlântico – e desta feita a imagem corresponde à realidade – o velho estadista Fernando Henrique Cardoso, que é um homem cordial, como nos foi dito ser próprio do nosso ethos, sabe igualmente dizer a palavra justa, e não se perder, como tantos outros mais jovens, nos meandros de um discurso de pouco impacto.
         Dilma ainda está fazendo o seu aprendizado na política. Se estivesse mais adiantada, teria evitado a areia movediça da declaração peremptória de não ter herdado “nada” da gestão tucana.
        Como isso é patente e gritantemente falso, avançando dessa forma desconsiderada, d. Dilma fica sujeita a ouvir o seguinte:
        “O que é que a gente pode fazer quando a pessoa é ingrata ?  Nada. Cospe no prato que comeu.” E só para completar: “ Quem não tem projeto é quem está no governo, porque eles pegaram o nosso.”
         FH tornou a defender o nome de Aécio como candidato, mas ainda não tem pressa:  “Não é o momento. Temos uma candidatura em construção. Não queremos uma pessoa, mas uma opinião.”
        O ex-Presidente tem toda a razão. Tanto em um caso, quanto noutro.

 

( Fontes:  CNN,  International  Herald Tribune, Folha de S. Paulo )

O GOP tem medo do Povo ?

                                       

       O  Partido  Republicano,  o Grand Old Party,  sempre foi tradicionalmente o representante do conservadorismo. No passado, contudo, o partido de Lincoln não refletia apenas a direita, os brancos e protestantes, e as chamadas elites dominantes. Havia espaço em suas fileiras para os moderados, que chegaram a constituir corrente importante dentro da agremiação, com maior força na Nova Inglaterra, com líderes como Nelson Rockefeller e John Lindsay, que, se não empolgaram a presidência, exerceram no seu tempo bastante influência.
     O próprio Lindsay, ao conseguir reeleger-se prefeito em New York pela legenda do Partido Liberal, já mostraria a crescente resistência da militância republicana ao progressivismo dentro do GOP.  Com efeito, Lindsay perdera a nomination partidária na luta pela reeleição para um candidato mais do gosto conservador. E em 1971, ao mudar de partido – Lindsay deixou o GOP e registrou-se como democrata – de uma certa maneira, a corrente republicana moderada e progressista entraria em lenta decadência, com o avanço da direita conservadora.
      Naquela época o Partido Republicano teve de afastar a direita radical, como a John Birch Society. Por outro lado, com o divórcio do Sul profundo do Partido Democrata – por força da Presidência de Lyndon Johnson com os direitos civis e da política de integração para os afro-americanos – as maiorias sulistas, ligadas à antiga Confederação derrotada pelo Presidente Lincoln e o Norte, trocaram a aliança, ao se bandearem para o GOP.
      A corrente evangélica, ao identificar-se majoritariamente com os republicanos, completou, por assim dizer, o perfil militante, conservador, e estreitamente relacionado com os extratos demográficos da ur-América.
      Diante da avalanche de Barack Obama em 2008, a reação republicana, associada a plutocratas como os petroleiros irmãos Koch, assumiu características em que o obscurantismo (criacionismo, anti-ambientalismo, rejeição de minorias), se conjuga com obstinadas falsidades (o movimento dos ‘birthers’, que nega seja Obama um americano nato). Toda a intolerância e a raiva pequeno-burguesa correria nas veias do chamado Tea Party, que se reclamara do levante dos colonos no porto de Boston contra os desmandos tributários da Inglaterra imperial.
     Se os traços distintivos do atual GOP, que se identifica com a classe abastada e a alegada América profunda, o predispuseram para tentar absorver a facção do Tea Party, como uma ala na extrema direita da própria direita, o caráter oportunista e pequeno-burguês desse movimento o coloca, mutatis mutandis, dentre aqueles associados radicais da ultra-direita de que se servira através dos tempos o partido Republicano, para depois se ver constrangido a expeli-los  por somarem cada vez menos, transformando-se em autêntico contrapeso.  
      Dessarte, o descarado oportunismo do GOP, julgando poder instrumentalizar uma grosseira caricatura sua (no caso o Tea Party), se ainda persiste no cenário político americano, semelha claro que, após o êxito nas eleições intermediárias de 2010, com a sua onda de direita do shellacking (tunda), que castigou a inexperiência executiva de Obama[1], a reação democrática será longo processo, mas já bem encetado com a afirmativa vitória de seis de novembro de 2012, quando a profecia-mantra do líder da minoria no Senado, Mitch McConnell não se concretizou, com a reeleição do Presidente.
       O  Partido Republicano, no entanto, tem dado, diante do desafio de tentar empolgar o poder, uma resposta que se tende a dar-lhe rendimentos no curto prazo, deverá ser autodestrutiva em prazo médio.
        Muitos dos recursos eleitorais de que se vale o GOP são de legalidade questionável, além de trazerem dentro de si o germen da respectiva nulidade.
        Nas  últimas eleições, em estados com assembleias de maioria republicana, houve diversos expedientes tendentes a dificultar e/ou desencorajar o sufrágio de camadas demográficas identificadas com os democratas (afro-americanos, latinos, pobres). Dentre esses truques, está o requisito de apresentação de documento de identificação com foto, a complexidade intencional do processo de votação – com as longas filas que provoca e a cansativa demora ocasionada – como se viu na Flórida e no Ohio. Além disso, a campanha de Obama – sobretudo em estados swing (indefinidos)- manteve um plantão cívico para lidar com especiosas intervenções para negar a validade do voto das minorias não-favorecidas.  A estratégia do preconceito e da negação do temido sufrágio das camadas reprimidas, na verdade, não inova. Como no Sul da antiga Confederação, os supostos testes de conhecimento (literacy tests) que visavam denegar o voto aos negros.  Hoje o preconceito continua atuante, posto que com outras vestimentas. O objetivo precípuo, sem embargo, não muda: adulterar o processo eleitoral, ao dificultar seja por restrições ao voto antecipado, seja por incômodos e ulteriores obstáculos, o sufrágio das minorias que, por inúmeras razões, desejam que o respectivo direito seja respeitado, contribuindo para tornar a votação mais justa e abrangente.
      Os empecilhos acima-referidos, malgrado o seu caráter iniquo e malévolo, constituem, na verdade, a face relativamente light da estratégia do GOP, no que concerne aos respectivos esforços no campo aético de ganhar as eleições nos diversos níveis do governo estadunidense.         
       São muito mais preocupantes outras tendências e projetos do Partido Republicano, no terreno da subversão do resultado eleitoral. Se esses vetores são decerto ainda mais condenáveis, o grau há de variar entre aqueles que são ilegais, e outros que visam a deformar o resultado da eleição, ainda que respeitem pro-forma a legalidade.
       Quanto ao processo ilegal, a atual Câmara de Representantes tem representado para os observadores o que configura um falso enigma. A sua maioria republicana – ainda que emagrecida na última eleição – corresponde a um intenso processo de redesenhamento de circunscrições eleitorais, feito por assembleias estaduais de maioria do GOP.  Os distritos foram mudados de duas formas: aqueles urbanos, de maioria democrata, concentrados para que os representantes eleitos fossem em menor número; outros distritos, de bairros abastados, foram redistribuídos de modo a garantir as respectivas maiorias republicanas.
        Como prova de que os sufrágios, no âmbito estadual e distrital, não têm o mesmo peso, diferem os coeficientes da votação geral em cada estado e por distrito. O gerrymandering – ou seja os pesos diferentes do voto – fica patente no cotejo entre o valor do sufrágio em todo o Estado (v.g., nas eleições para presidente e governador) e naquele dos distritos eleitorais para cada deputado, em que o percentual do GOP é superior àquele do voto estadual.
        Não é fácil acabar com essa fraude eleitoral, mas se tornará ainda mais difícil o processo se a grande imprensa referir-se a essas estranhas maiorias na Casa de Representantes como consequências eventuais (ou até mesmo acidentais) de um mecanismo de redistritamento que não tenha um escopo precípuo. Não são nugatórias as consequências do gerrymandering. Dentro do anel rodoviário de Washington – o chamado beltway – não é de somenos a persistência do gridlock (o impasse institucional), que é alimentado pela Câmara de Representantes de maioria republicana.
         Por outro lado, dentro dos processos legais – mas de resultados duvidosos – se insere o novel truque do Grand Old Party de tentar resolver a sua menor votação no corpo eleitoral americano – o que se traduz, v.g., pela derrota de novembro do seu candidato Mitt Romney à  presidência – através de artificialismos e de truques o cômputo da votação nos Estados Unidos.
          Como se sabe, o voto é indireto na União Americana. Cada estado tem um certo número de votos (que correspondem a eleitores indiretos) e que refletem o seu volume demográfico. Assim, no cômputo final dessa votação indireta, terão mais peso os estados maiores como a California, o Texas e New York. Até o presente, e com a única exceção do Estado do Maine, o candidato que tiver a maioria no estado, leva todos os delegados desse Estado para a votação indireta no colégio eleitoral.
          Empenhados em resolver o problema de conquistar o poder, os republicanos voltam a recorrer a meios artificiosos e contábeis para tentar voltar à Casa Branca. Se não o conseguem pelos meios legais, o jeito será alterar tais meios, para que a vitória de seu candidato seja possível  (conquanto a legitimidade tenda a sofrer, eis que como se verá, crescerá a possibilidade de que o candidato eleito não seja aquele que haja colhido o maior número na totalidade do corpo eleitoral).
           A notícia ainda sai sem maior relevo, mas merece ser considerada com muita atenção, porque as intenções dos republicanos não são das melhores.
           Assim, o presidente do Senado da Pennsilvania, Dominic Pelaggi, introduziu formalmente projeto de lei para que os votos eleitorais sejam distribuídos proporcionalmente. A vitória de um candidato a presidente no colégio da Pennsilvania não irá assegurar-lhe a totalidade dos sufrágios do estado – que, assim, deixa de ter relevância com estado determinante na eleição – mas que garante que os votos sejam parcelados por distrito eleitoral.  No entender dos especialistas, esse truque contábil ajudaria que o candidato do GOP tivesse mais votos no cômputo fragmentado. Esse expediente – que segundo a Constituição e se a Corte Suprema estiver concorde é da estrita competência estadual – embaralharia as perspectivas futuras e tornaria menos difícil o triunfo do GOP.
             Se confirmado esse tétrico cenário – e se imitado por outros estados com maiorias de representantes do Partido Republicano  - as eleições presidenciais dependeriam de uma estranha contabilidade. Como é gritante o projeto de fraudar legalmente as eleições, o seu próprio êxito tenderia a inviabilizá-lo, com o ulterior recurso à eleição universal, não mais determinada pela votação indireta dos Estados. 
            Entretanto, o processo de emenda constitucional nos Estados Unidos – o que é uma de suas qualidades – não tem a facilidade que caracteriza as reformas no Brasil. Levaria bastante tempo – até mesmo décadas – para afastar de cena essa prospectiva deturpação de um procedimento que tem garantido resultados democráticos até a data presente, quiçá com uma única exceção, em que na prática o grande eleitor do Presidente dos Estados Unidos tenha sido a Suprema Corte.
 

( Fontes subsidiárias:  International Herald Tribune,  TPMDC )



[1] O livro de Ron Suskind, Homens de Confiança (Confidence Men) retrata muito bem tal período, em que a inexperiência executiva de Obama fez perder ao Partido Democrata a Casa de Representantes.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

O Juiz Garzón e mais Novas direto do Front

   Inédita renúncia de Cardeal

         Dando um bom exemplo, o  cardeal britânico Keith O’Obrien renunciou ao posto, e por conseguinte à sua participação no próximo conclave.
         O’Brien tinha sido acusado por quatro sacerdotes de acosso sexual nos anos oitenta.
         A atitude de O’Brien, de que não há precedente na história dos conclaves da Igreja Católica, constitui decerto um bom precedente que, se não elide o comportamento reprovável, o torna pelo menos causa para uma correta decisão.
 

O  Vexame  da  MP 595

         Dando sequência a uma resposta timorata e caudatária na questão da reformulação dos portos,  o governo continuou a ceder aos sindicatos de portuários, agora indicando por intermédio do ministro Leônidas Cristino, da Secretaria dos Portos, que tenciona oferecer mais incentivos aos portos públicos.
        Não é crível que o governo petista não haja examinado a questão com a necessária abrangência e equilíbrio, antes de submetê-la através da Medida Provisória  595 ao Congresso Nacional.
         A despeito de respaldado pelo Superior Tribunal do Trabalho, o governo preferiu ceder à greve ilegal dos portuários, com promessas de modificações no regime portuário.
         Com isso, o custo Brasil continua alto, refém das exigências descabidas dos sindicatos de estivadores, que são responsáveis pelo mau funcionamento do setor, e consequente prejuízo às nossas exportações.
         Não contente com a postura submissa e condescendente do fim de semana, o governo – temeroso de que as benesses prometidas não sejam bastantes – já assume que poderá oferecer ulteriores incentivos aos portos públicos. Com isso se descaracteriza a iniciativa em prol da competitividade dos portos, e se torna mais capenga a pretendida ‘reforma dos portos’.
         Como não é crível que o senhor Leônidas Cristino tenha cedido tanto sem o aval da Presidenta, verifica-se que falta tutano e vontade política de implantar uma autêntica reforma nos portos nacionais, com vistas a tornar mais competitiva a atuação brasileira no comércio internacional.
       À  maneira de um castelo de cartas, a férrea disposição da dílmica administração mostrou a sua verdadeira natureza. A república sindicalista continua de pé.

 
O  Caso Gurtel

          O juiz José Ceres determinou uma série de diligências para abrir as contas da campanha eleitoral das regiões autônomas de 2007, em que Francisco Camps (PP) foi reeleito presidente da Generalitat de Valencia.
          Segundo o noticiário do jornal El Pais, o magistrado em tela mantém as suas imputações à maior parte da direção regional do Partido Popular durante aquele período, assim como ao ex-vicepresidente da Generalitat Vicente Rambla.
           Nesse sentido a promotoria Anti-corrupção considera os dirigentes, acima citados, do Partido Popular culpados de financiamento ilegal (da campanha eleitoral). Tal se deve à circunstância de que tais indivíduos receberam vultosas somas de dinheiro das empreiteiras.
          Como se terá presente, foi com base no pretexto jurídico de que as escutas do caso Gürtel (financiamento ilegal das construtoras ao Partido Popular e a seus dirigentes) seriam ilegais do ponto de vista jurídico, a Corte Suprema na Espanha determinou o banimento do juiz Baltasar  Garzon (Audiência Nacional).
          Não é só o caráter pretextuoso da motivação jurídica que motivou uma grave (e injusta) decisão, que foi o afastamento por onze de anos da atividade como juiz de Baltasar Garzón. Dada a fragilidade da imputação, baseada em argumento contestável, e a manifesta amplitude do Caso Gürtel, que atinge o Partido Popular e seus dirigentes de forma ampla e incontestável, semelham colocadas as bases para uma pronta ação de anulação de um procedimento tão injusto, faccioso e de ultra-questionável base jurídica quanto o foi o lamentável banimento de um grande juiz como o é Baltasar Garzón.

 

( Fontes:  El Pais,   O  Globo )            

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Colcha de Retalhos A.8

                                           

Eleição italiana

          Estará datada a máxima do político mineiro Magalhães Pinto, que dizia “eleição e mineração só depois da apuração”? Apesar do indubitável progresso das predições dos institutos de pesquisa, as urnas ainda reservam alguns mistérios.
          No entanto, o espaço para as eventuais surpresas, nos países mais adiantados, se não desaparece, encolheu bastante. A boca de urna costuma delinear um quadro assaz aproximado da realidade do sentir popular.
          Berlusconi, esse antifenômeno itálico, terá sido esvaziado demasiado depressa, para alguém que dominara a política por décadas. O seu segredo talvez esteja em refletir muitos traços do ethos nacional, a começar pela ojeriza do cidadão comum em pagar impostos. A par disso, as suas estroinices e problemas com os juízes terão afastado partidários, mas persiste a sua capacidade de imantar a direita (somada aos assumidos neofascistas e até mesmo a separatistas do Norte).
         Bersani, da liga das esquerdas,com certa liderança nos sufrágios, tem de responder pela inépcia de antigos chefes da respectiva coligação, que, ou perderam a ocasião de neutralizar a Berlusconi, ou encabeçaram frágeis maiorias, que os expunham às chantagens da extrema esquerda ou às traições sistêmicas de ‘aliados’ pouco confiáveis.  
         Monti, dentro da ótica de uma administração técnica, logrou cumprir a respectiva tarefa. O seu problema está em que o seu apoliticismo é faca de dois gumes, por haver desperdiçado muitas oportunidades de faturar sobre uma popularidade arduamente conquistada. As reviravoltas confundem o eleitor, e contribuem para enfraquecer o tecnocrata. A sua esperança é acessória, na medida em que estaria mais em compor  contingente com suficiencia para ajudar a formar uma maioria.
         Beppo Grillo é o voto de protesto que, de uma forma ou outra, costuma aparecer nas eleições italianas. Desta feita, dá a impressão de haver crescido bastante. De qualquer forma, ao tirar sufrágios de Berlusconi, Beppo Grillo pode estar dando um aporte substancial, seja para inviabilizar a formação das sólitas maiorias do comendador, seja para facilitar a aglutinação de uma coalizão das esquerdas responsáveis.
 

 
De volta a república sindical ?

           O Governo Dilma Rousseff parecia imbuído da resolução de quebrar o gargalo do poder sindical nos portos brasileiros através da MP 595, que tramita no Congresso, para tornar menos paquidérmico o atual modelo portuário. Abrindo licitações para esse setor, e o libertando dos altos custos do modelo estatal sob controle sindical, a iniciativa assustou os portuários.
           A proclamada greve dos portuários – liderados pela CUT e a Força Sindical – a despeito de ilegal (pela decisão do Tribunal Superior do Trabalho), levou a suspensão do trabalho por uma manhã inteira, até que o governo petista cedesse, aceitando rever vários pontos da aludida medida provisória.
          Assim, o ministro Leônidas Cristino (da Secretaria dos Portos) declarou: “a gente tem que ter humildade de dizer que precisa conversar, abrir o  leque de negociação para que tenha um consenso”.
           Com esse tipo de postura, e a linguagem de Paulinho da Força Sindical, as perspectivas de que a dita reforma venha natimorta, são fortes. Assim, para os sindicalistas o OGMO (órgão gestor da mão de obra) concentrará todas as contratações, tanto para portos públicos, quanto privados. Considerado inegociável pelo referido Paulinho, esse Ogmo inova às avessas, eis que torna público o que deveria ser privado.
          Se Dilma ceder no capítulo, a escrita na parede para o poder sindical – com a sua defesa de vantagens corporativas em detrimento do interesse nacional – ficará bastante clara. A MP  595 já era, e tudo fica como dantes no quartel de Abrantes.

 
 A perseguição judicial dos mortos na Rússia

 
           Na semana passada, Sergei L. Magnitsky receberia notificação judicial de que o Estado russo está abrindo procedimento fiscal a respeito de alegadas evasões fiscais por ele praticadas.
           Não se pode dizer que a ordem instaurada pelo Presidente Vladimir V. Putin esteja inovando, porque nessa prática foram useiras e vezeiras as antigas tiranias, mas de todo modo ela provoca alguma espécie pela circunstância de que o réu Magnitsky faleceu em 2009.
           Acresce notar que Sergei Magnitsky foi uma vítima das cadeias russas, no que teve predecessores ilustres, como Fiodor Dostoievsky, que escreveu  Recordações da Casa dos Mortos, referentes aos anos em que esteve detido pelo Estado tzarista na Sibéria.
           Dostoievsky, no entanto, teve mais sorte do que Magnitsky. Se o regime era tão brutal quanto, ele pelo menos sobreviveu ao cativeiro e presenteou a Humanidade com mais obras literárias. Magnitsky, por sua vez, teve a morte apressada pela falta de qualquer atendimento médico digno desse nome.
           No ano passado, a administração Obama proibiu a entrada nos Estados Unidos de todas as pessoas acusadas de envolvimento no assassínio (por denegação de assistência médica) de Sergei Magnitsky,  ou de participação em abusos aos direitos humanos.
          Por estranha reforma no direito penal da Federação Russa, agora nem os mortos estão livres da perseguição da Justiça.  Os parentes da vítima do serviço carcerário russo procuraram bloquear esse simulacro de ação judicial, por ser inumano e politicamente motivado. 
           Para evitar que Magnitsky fique sem defesa – ou melhor, que o caso em tela não seja acoimado de nulo pela falta de contraditório, a corte Tverskoi designou um defensor público para ‘defender’ o falecido sr. Magnitsky.  
           Tudo nisso é pro-forma, excluído o ridículo e a sufocante extensão do poder – agora até sobre os mortos – do Presidente Vladimir Putin.                      

 
Na China, o passaporte é uma arma

          Os chineses, sobretudo os da etnia Han, não costumam ter problemas na obtenção de passaporte. Como noticia o New York Times, em 2012, as estatísticas registram 83 milhões de viagens para o exterior, 20% mais do que em 2011, e cinco vezes mais do que na década precedente.
          Ótimo, não é ?  A segunda potência econômica do planeta não mais dificultaria os deslocamentos de seus cidadãos ?  Pelos dados recolhidos na reportagem, a resposta pode ser um otimista sim, desde que acompanhado de reservas assaz manifestas para serem caladas.
          O chinês pode viajar, desde que não integre alguma das minorias que compõem a República Popular da China, sob a esmagadora maioria da etnia Han. Se o interessado em deslocar-se para o exterior for tibetano, uighur, mongol, ou porventura outra minoria submersa no mar Han, ou então mantiver opiniões pouco consentâneas com o PCC, as coisas tenderão a complicar-se.
          Em outras palavras, as possibilidades de que venha a obter o  mágico documento que lhe permitiria viajar para o exterior tendem a aproximar-se das práticas vigentes por países como Cuba, que se não tem a importância do gigante de Beijing, sóem no entanto aplicar regras ainda mais estritas no que concerne aos supostos direitos de seus cidadãos de valer-se de uma prerrogativa tão comum nas democracias.
          Não é consolo, mas vige a igualdade na falta de direitos também para os chineses que, vivendo no exterior, hajam por algum insondável motivo caído na lista negra da burocracia chinesa de segurança. Assim, um chinês que viva no estrangeiro e deseje visitar parentes ou amigos no Império do Meio, se estiver no longo elenco dos indesejáveis, a sua viagem para um aeroporto chinês (até mesmo em Hongkong) conduzira inexoravelmente a um outro avião que o devolva para onde veio.
         Como se vê, o passaporte não é um anódimo instrumento turístico-burocrático para o funcionário chinês encarregado do guichê dos viajantes. Para ele, esse documento de viagem é uma arma da RPC para o controle das minorias e dos dissidentes (aqueles que algum dia expressaram alguma opinião não estereotipada e inconforme com os padrões do PCC) !

 

( Fontes:  O Globo,  International Herald Tribune )

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Chávez terminal et al.

                                           

    O estado de Chávez

               O muro de silêncio e desinformação em torno do presidente enfermo Hugo Chávez Frias, à luz da história, nada tem de original. A mentira e o tráfico da notícia são instrumentos de um poder derivado, que costumam crescer à medida que definham os sinais vitais do soberano.
              São os chamados próximos do titular do poder. O exemplo que vem à mente – pela longa sucessão na sé pontifícia – é o do Papa, cuja saúde era preservada pelos ávidos familiares, até que exalasse o último suspiro.
              Como se depreende na longa marcha do coronel, depois que lhe apareceu a catadura do mal, o estamento dominante em Caracas se tem empenhado com comovente zelo em disfarçar e tergiversar sobre  sua condição.
              O próprio caudilho determinou as regras deste macabro jogo, preferindo internar-se no desvio do hospital dos irmãos Castro, do que submeter-se ao tratamento avançado do Hospital Sirio e Libanês. A razão é conhecida: abominando a transparência, o coronel optou por enfurnar-se no recesso cubano. Será mais atrasado, mas na amada Cuba o líder da Alba poderá reter por mais tempo a ilusão do controle acerca da informação.
            O retorno de Hugo Chávez a Caracas feito atrás das cortinas do oficialismo, o povo não viu. Supostamente, está internado em hospital militar, mas não há foto sequer que o documente.
            A verdade, no caso, semelha difícil de aferrar nos detalhes, mas, como sói acontecer nas longas encenações, os seus traços portentosos se vão delineando, no cediço cerimonial que cerca tais carregadas circunstâncias.
            Uma frase aqui de um ministro, outra do substituto designado, e o quadro agourento se irá completando, nas negras tintas do óbito anunciado.

  

A saga do menino Sean Goldman

          Em dezembro de 2009, por força de liminar concedida pelo Ministro Gilmar Mendes do STF, a guarda do menino Sean foi entregue ao pai David Goldman. Não foram estabelecidas quaisquer condições para que a avó materna, Silvana Bianchi, que tinha a guarda até então, após a morte da mãe Bruna, em agosto de 2008, pudesse ter contato e direitos de visita ao neto.
         Depois que o menino foi levado para New Jersey, as portas e o acesso ao menino Sean se tornaram inatingíveis. A avó e o padrasto advogado não desistiram da luta, apesar da postura do pai. Para que se tenha noção da nova situação, David Goldman, em correspondência de 2010, estabeleceu como condições para a visita o pagamento dos gastos que tivera com o processo (cerca de US$ 200 mil), e a desistência, de parte da família brasileira, de todas as ações que tramitam nos Estados Unidos.
         Salta aos olhos a inadmissibilidade, à luz do direito  internacional vigente na matéria, dessas condições que lembram às do personagem shakespeareano Shylock, no Mercador de Veneza. No entanto, como tudo nesse processo, não foi fácil a derrubada das iníquas exigências. Com efeito, em julho de 2012,  a divisão de apelações da Corte Superior de New Jersey decidira que a avó Silvana poderia continuar sua disputa pelo direito de rever  o neto. Nesse sentido, estabeleceu que as Partes tentassem um acordo para a visitação.  
          Como tal não foi possível, em decisão deste mês de fevereiro a Suprema Corte de New Jersey julgou procedente o pedido de visitação de Silvana. Por outro lado, considerou sem valor as exigências feitas pelo pai David.
          Entretanto, se a visita está permitida em tese, como declarou a parte brasileira, os juízes não determinaram como ela deva ser, nem fixaram data. Nesses termos, consoante disse a avó Silvana “ainda não estou com as malas prontas”.
         Na sua solicitude para atender à pretensão do pai David, o  ministro Gilmar Mendes cedeu, na liminar, a guarda do menino ao pai, sem estabelecer qualquer determinação resguardando os direitos da avó materna, que mantinha até então a guarda de Sean.  Se o fizesse, teria balizado de forma irretorquível os direitos da avó brasileira, dentro de o que prescreve a convenção internacional sobre a matéria. Se o ramo materno da ascendência do menino Sean não dispusesse de maiores recursos, não teria qualquer possibilidade prática de visitação do filho da brasileira Bruna.
           Mesmo com as facilidades de que dispõe o ramo materno, verifica-se que uma vez partido Sean para a terra de Tio Sam, sem quaisquer garantias, é deveras complicado (e oneroso) o exercício do comezinho direito da visitação.  Desde dezembro de 2009 até hoje a visita de Sean e a conversa com sua avó (será possível mantê-la em português ?) continua sendo apenas uma miragem.
           É de esperar-se que tão flagrante injustiça seja superada.

 
A  Prisão pela Justiça Boliviana de torcedores do Corinthians

 
            O  filme  mostrado  na  sessão  da  justiça  boliviana  evidencia que o sinalizador náutico foi adrede apontado por membro da Gaviões da Fiel contra a torcida do San José,  de Oruro. Tal sinalizador, de fácil obtenção no comércio brasileiro, constitui óbvia ameaça à incolumidade alheia, se não manipulado corretamente.
            Uma revista decente na entrada do estádio eliminaria o perigo que esta arma representa. Inadmissível e criminosa a detenção do sinalizador em um estádio. Somente na atmosfera demencial que cerca  essas torcidas está a sua utilização, que  se destina à segurança da navegação. Só é imaginável nas torcidas organizadas – e não há santos nessa categoria – que constituem um triste fenômeno. De resto, os crimes recentes praticados, sem exceção de clube, por elementos de tais bandos, deveriam ser bastantes para determinar-lhes a supressão.  
            A morte do garoto Kevin Espada é mais uma consequência do caráter facinoroso dessas torcidas. Esperemos que os paredros não consigam anular as penalidades contra o Corinthians, que não pode alegar desconhecimento dos riscos envolvidos.
           Será através da severa penalização dos clubes que se colocam as condições determinantes para a inviabilização de tais grupos, verdadeiras associações para delinqüir.
 

 
( Fontes:  O Globo, Rede Globo, Folha de S. Paulo )

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Lições da Visita de Yoani

                                      

         O que nos ensina a vinda da blogueira Yoani Sánchez ao Brasil ? Em primeiro lugar, cumprimentos pelo êxito na ofensiva obscurantista organizada em reunião ilegal na embaixada de Cuba, sob a batuta do embaixador Carlos Zamora Rodríguez, e a participação de Ricardo Poppi Martins, assessor do Ministro Gilberto Carvalho, da Presidência da República.
         Tristes trópicos ! Alimentados pelos sólitos dossiês – que parecem interessar menos pelo risível conteúdo – do que pela falsa impressão dada, de mágicas provas e de ocos propósitos (nisso fascistas e comunistas se dão as mãos, pelo embuste da empresa, que se fundamenta na cínica máxima de que os fins justificam os meios).
         As reações à visita da blogueira Yoani nos tem mostrado várias coisas. Primeiro, registremos a presença de dona Intolerância, cuja visão nos deprime e nos revolta. Deprime, porque a sua cara, com o nariz de palhaço, é de gente jovem, mas que está a serviço de velhas ideias, que não são as da liberdade e da pacífica coexistência. Nada têm a ver decerto com os manifestantes que saíram de luto e apressaram a queda de Fernando Collor. Tampouco estão ligados à antiga UNE, aquela que defendia o governo democrático de João Goulart, e que teve por isso a sede empastelada e queimada. Hoje a UNE é chapa branca, o idealismo já era, mas tem verbas e prebendas do governo.
        Revolta, porque agem com a boçalidade das tropas de choque, que ao invés do debate preferem o silêncio imposto pela gritaria e a violência verbal (quando não gestual).
        A visita de Yoani tem sido  preocupante prova do poder da intolerância. E o que move esses bonecos da ditadura é o temor da verdade. Não podem permitir as palestras, filmes e noites de autógrafo dessa perigosa agente – que eles, como se vivessem no século passado, dizem ser da CIA! No caso em tela não sei o que mais seja ou censurável ou ridículo, se a fraqueza do Estado, ou a benigna negligência dos defensores da liberdade que permitem prevaleça essa deplorável rotina da baderna sob encomenda, de poucas mas contundentes ideias, e a carantonha da violência burra e intolerante.
        Entristece que se associem a juventude e a decrepitude do autoritarismo cubano ! Ao lado da maligna negligência do Estado  -  em que José Dirceu chega a exprobar de absurda a lei da Ficha Limpa e regurgitam cediços projetos de controle da imprensa e da temida opinião pública -  a visão do programa da blogueira embaralhado por baixarias e estúpidas perseguições revela, por vezes, a imagem deformada de uma juventude.
        A liberdade, essa tenra plantinha que mal convive com a violência, embuçada ou não, só pode progredir nos espaços em que as opiniões são respeitadas, e não pisoteadas pela ordem unida e a prepotência.
        Esse quadro de gente jovem a repetir slogans sob encomenda, em defesa de um regime anacrônico e antidemocrático, para acossar e perseguir com o braço longo da autocracia, a uma solitária dissidente – que quadro mais melancólico para a antiga generosidade dos jovens, hoje transmutados em bonecos a serviço de mal-disfarçada ditadura !
        E que fazer do P.T., antes o partido da ética, agora força auxiliar do obscurantismo?

 

( Fonte:   O Globo on line )

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Dilma x Aécio

                                              

         É talvez cedo para a largada da campanha eleitoral de 2014. No entanto, de um lado e outro petistas e tucanos sentem que tudo induz à antecipação da retórica eleitoreira. O PT se reúne para comemorar dez anos na presidência. Lançada uma cartilha em que os contrastes se pintam com as tintas da propaganda, pondo nas alturas os governos Lula e Dilma, e acerbas críticas a FHC, o Partido dos Trabalhadores  organiza celebração em São Paulo, para que Lula indique Dilma, e dela participem os mensaleiros José Dirceu, José Genoino e João Paulo Cunha.
        O peixe-piloto Gilberto Kassab foi convidado para compor a mesa – com direito a vaias e hostilização pelo auditório. Já a trinca dos condenados pelo STF foram recebidos com entusiasmo pela assistência, mas não tiveram lugar na mesa dos dois gerarcas petistas, Lula da Silva e Dilma Rousseff.
       Ecoou na grande sala paulistana o discurso do senador Aécio Neves (PSDB/MG) pronunciado naquela mesma jornada no Senado Federal.
      Em tom ainda moderado, Aécio principia a assumir o papel de principal candidato oposicionista à candidatura petista de Dilma Rousseff, dissipadas as dúvidas sobre uma eventual postulação pelo ex-presidente Lula.
      Aproveitando a visita ao Brasil da blogueira Yoani Sánchez e a intolerância dos militantes do PT e do PCdoB que, conforme as possibilidades do local, perseguem sempre a denegação da palavra à ativista cubana – até ensaiado no próprio Congresso por senadores das esquerdas unidas – Aécio cuja oratória ameaça a quem não é do ramo, perguntou retoricamente: “ Mas afinal, qual é o PT que celebra aniversário hoje? O que fez do discurso da ética, durante anos, a sua principal bandeira eleitoral, ou o que defende em praça pública os réus do mensalão ? O  PT que considerava inalienáveis os direitos individuais ou o que se sente ameaçado por uma ativista cuja única arma é a sua consciência ?”
       Na sua alocução, Aécio citou o baixo crescimento econômico (no mesmo dia o Banco Central estimou em 1,35% o avanço do PIB em 2012), a inflação, a quebra de confiança dos investidores, e o descalabro das contas públicas.
       Devolvendo o ataque petista da cartilha, em que tenta denegrir o legado do governo de FHC, o Senador referiu-se à ‘herança bendita’  do governo tucano.  No entender do pré-candidato, a incapacidade de gestão se adensou e o Brasil parou. Nesse sentido, os fundamentos da economia estão em rápida deterioração, colocando em risco avanços que o país levou anos para implementar, como a estabilidade da moeda.
       Tudo leva a crer que o dragão estará na ribalta da eleição de 2014. Ainda mais cedo do que o esperado o presidente do BC se apressou em declarar que não haverá, por ora, aumento dos juros, o que não seria a seu ver necessário. Dada a postura de Dilma, o mercado estava certo em seu ceticismo quanto ao emprego de meios mais fortes no combate à inflação.
       Entrementes, os outros dois pré-candidatos, Eduardo Campos (PSB) e Marina Silva (‘Rede’) nadam sozinhos, no caudaloso rio das ambições, por ora cuidando de manter as próprias forças e respectiva relevância, nessa corrente em que infestam as piranhas.

 

( Fonte:   O  Globo )

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Pra que Nuclear ? Acosso a Yoani et al.

   
 Mais uma usina nuclear ?

          A falta de bom senso e de consciência ecológica se evidencia na abstrusa decisão de construir mais outra usina nuclear.  Já temos duas e sem a menor necessidade o governo pensa em fazer mais uma.
          Para quê e por quê? São as perguntas  que se impõem.
          Quanto à serventia, o Brasil dispõe de duas próximas a regiões habitadas. Não terá acaso o governo Dilma Rousseff presentes os inúmeros acidentes que cercam a essa fonte energética ? Será que os de Three Mile Island (Estados Unidos), Tchernobil (Ukrania) e Tsushima (Japão)  não são suficientes para mostrar-lhes a periculosidade e os danosos  efeitos  sobre as populações vizinhas,  ceifando vidas, afetando gravosamente  outras, inviabilizando terras e aquíferos ?
         E o Brasil não é Japão, país desprovido de fontes energéticas e, mesmo forçado a recorrer ao nuclear, se vê constrangido a ter de cerrar usinas ?
         O que falta à nossa terra, e em especial a seus dirigentes, é um mínimo de discernimento. Além da fonte hídrica que nos proporciona energia barata e abundante, dispomos, além das usinas térmicas,  das alternativas eólica, solar e da biomassa. Nesse sentido, convém não exagerar no erro. Manda o mais elementar bom senso que nos restrinjamos às duas Angras. 
          Qual a necessidade de recorrer a tão perigosa alternativa, com tantos graves  prejuízos ao meio ambiente e à nossa gente ?
        

Yoani Sánchez e a democracia

          A blogueira Yoani, com sua boa vontade e simpatia, qualificou de comportamento democrático as atenções que vem recebendo de pessoas que atuam como se foram agentes da ditadura em Cuba.
           Por atenção com o país (e governo !) que a recebe, Yoani prefere disfarçar a atitude agressiva e fascistóide com que maltas do PT e do PCdoB têm procurado prejudicar eventos e reuniões por ela protagonizados, como se fossem características democráticas.
          Na verdade, esses atos provocados e teleguiados pelos apparatchicks de Havana nada têm a ver com a autêntica democracia.  O parentesco será com  as ignóbeis falsas democracias, aquelas adjetivadas, sejam fascistóides ou comunistóides, eis que nos métodos e na falta de qualquer sentido de atenção e respeito às pessoas que não tenham mentalidade de carneiro tais governos e regimes se parecem de forma comovente.
          Por outro lado, o dílmico governo – que nega mais manda funcionário da presidência para participar de reunião com direito a dossiê, e de organização de campanha difamatória e de acosso à visitante – com sua postura subalterna e hipócrita no caso merece sem dúvida  o Prêmio Pinóquio, com especial menção ao Ministro (e fiscal de Lula da Silva) Gilberto Carvalho !
            Não se pode confundir democracia com ditadura, nem acosso com a tradicional acolhida do brasileiro !


Um artigo importante

            O Governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, escreveu para a Folha um artigo relevante “O Congresso deve revidar”, publicado no jornal de domingo dezessete, na seção Tendências/Debates.
            Ler Tarso Genro é um prazer, primeiro pelo que escreve e a oportunidade de suas colocações, e segundo, pela descomunal diferença da indigência do outro PT, aquele que se filia à corrente de Lula da Silva.
            Concordando ou discordando de suas opiniões, nos sentimos a palmilhar outros terrenos, que deveriam ser igualmente visitados pelos companheiros petistas.
            Não se deve escorraçar – nem preterir - a inteligência, a cultura, a seriedade e a objetividade – antes atributos do Partido dos Trabalhadores quando na oposição – de uma formação política, ainda que no poder.
 

 
( Fontes:  Folha de S. Paulo, O Globo )

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Tragédia Síria: Indecisão de Obama

                         

          A revolução síria já atravessou muitos marcos. Como muitas outras, começou com a insatisfação da cidadania, através de pacíficas passeatas, que o regime  alauíta respondeu com a violência. Se estava na sua própria lógica, sustentada na polícia secreta e na brutalidade institucional, o ditador Bashar al-Assad incidia na mãe de todos os erros das tiranias, a que os gritos de manifestantes de rua pela liberdade soam como mortais ameaças, que nelas provoca a reação do fuzil.
          O povo sírio soube distinguir a verdadeira resposta do governo de Assad não nos ocos discursos em assembleias  títeres, mas nos primeiros cadáveres de populares, seja aqueles abatidos pelos tiros da estúpida repressão, seja os restos mortais deformados pela tortura do Mukhabarat[1], que mais por intimidação são entregues às famílias.
           23 meses  se arrasta a rebelião, que por cômputos incontestáveis estende o seu controle por boa parte do velho país sírio, a ponto de os aliados russos  aliados do déspota – além de providenciarem maciças transferências de compatriotas de volta para a Federação Russa -  reconheçam que os rebeldes dominam a maior parte do território.
         Os países e movimentos partidários de Assad o têm assistido com comovente pertinácia. Todos eles o fazem menos por simpatia do que por necessidade. O Kremlin teme pela perda da base naval de Tartus – a única que dispõe de águas quentes por todo o ano -  na costa síria, no Mediterrâneo oriental. Os ayattollahs de Teerã tem em Damasco um dos seus poucos aliados, a quem provê com auxílios de toda ordem, material e pessoal. Tais dispêndios mais do que contrabalançam o baque de ver o lado sunita do mundo árabe reforçado, e o respectivo isolamento estratégico incrementado. Por sua vez, o Hezbollah de Nasrallah que cresce no Líbano ainda democrático se veria enfraquecido com a respectiva expulsão da Síria, conduto até hoje propício para os armamentos procedentes do Irã. E, por fim, o Hamas na sua luta contra Israel veria complicadas as linhas de fornecimento iranianas.    
          Vladimir Putin tem sustentado o aliado Bashar com comovente coerência. O Conselho de Segurança das Nações Unidas tem recusado – por força do veto russo e do aliado pequinês – qualquer ação das Nações Unidas a não ser as desarmadas, o que levaram ao fracasso o Plano Annan. Apesar das naturais simpatias do regime Bouteflika na Argélia, o presente representante argelino, Lakhdar Brahimi, mediador  das Nações Unidos junto ao regime sírio tampouco tem condições de objetivamente ajudar a Damasco. Com poucas opções, sobre a mesa tem a proposta de um ‘diálogo entre regime e oposição’ em alguma sede das Nações Unidas. Não parece ser saída para o ‘túnel escuro’ em que se meteu a guerra civil síria.
         Por sua vez, Moscou principiou a retirar pessoal russo de um país em que claudica o poder de al-Assad. Dentro de um possibilismo forçado pelas circunstâncias, o chanceler Sergei Lavrov tenta salvar o que possa ser salvo, em um cenário no qual as opções se encolhem na perspectiva de uma solução negociada. Diante de Bashar al-Assad avulta o espectro do tribunal da Haia – o cômputo de vítimas mortais já toca as setenta mil – e o estreitamento de um final de reino, em que os caminhos de saída são progressivamente fechados, enquanto avultam as opções tipo Kaddafi (a morte nas mãos do inimigo), asilo em terra amiga (que se evaporam como o orvalho matinal, com a decadência acelerada do poder dos Assad), ou a custódia pelo tribunal da Haia (alternativa alimentada pela progressiva fraqueza política e o consequente peso negativo de contrariar a opção mais lógica).
         Nesse contexto, o presidente Barack Obama – que contrariou as posições de Hillary Clinton, no Departamento de Estado, de Leon Panetta, Secretário da Defesa, e do Diretor da CIA, que favoreciam o armamento seletivo da Liga Rebelde anti-Assad  - preferiu continuar na política de apoio não-militar, por temer que as armas acabem em mãos de radicais, como a al-Qaida.
        Uma das causas principais da longa resistência de Assad reside nas restrições impostas à oposição e aos rebeldes sírios, enquanto Teerã e no passado Moscou não trepidam em fornecer armamento letal ao regime.
         Essa falta de apoio – além de contribuir para a continuação de uma situação adversa à causa da Liga, tem trazido água para o moinho de Assad e de seus aliados – pode diminuir a influência de  Washington e do Ocidente no quinto e derradeiro ato da tragédia síria.
         A indecisão de Obama pode não só levar a uma prorrogação no sofrimento do povo sírio, senão a uma involução no pós-revolução. Se a possibilidade da alternativa da ‘jornada de tolos’ tende a enfraquecer-se, a perspectiva de uma falsa solução – com tantos interessados nesse sentido – não é de ignorar-se. De toda forma, as soluções tipo Pilatos  de mandar vir bacia d’água para lavar as mãos nunca foram as melhores para aqueles que se empenham em criar  condições dignas para um povo sofrido.

 

( Fonte subsidiária:  International Herald Tribune ) 



[1] Polícia secreta.