sexta-feira, 30 de novembro de 2012

A Questão da Palestina


                                      
         O  Presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, obteve mais uma vitória parlamentar para o seu sofrido país, com a votação da Assembleia Geral das Nações Unidas pela promoção da ANP ao status de Estado observador (não membro). Teve o apoio de 138 países, dentre os quais o Brasil, China, Rússia, Índia, França, Espanha e Itália. O isolamento de Israel se patenteia em que a sua posição contrária foi sufragada apenas por Estados Unidos e Canadá, num total de nove votos contra. Na Europa, apenas a República Tcheca apoiou Tel-Aviv. Na última hora, Alemanha e  Reino Unido mudaram de posição, preferindo a abstenção ao desgaste do voto negativo.
     É  lamentável que o moderado Abbas tenha de recorrer a votações na Assembleia Geral para tentar       retirar da virtual paralisia em que ora se encontra o processo de paz no Oriente Próximo. A capitis diminutio em que se acha a Palestina é um dos escândalos perenes da política internacional. Após o fracasso dos Acordos de Oslo, a política israelense, a despeito de nominal apoio ao processo de paz, na verdade tem sido determinante pela sujeição da Autoridade Palestina e o favorecimento das ocupações ilegais pelos chamados colonos de território palestino, para a exacerbação da crise, o que na prática só tende a aproveitar a contestação violenta do Hamas.
     Os Estados Unidos, por razões de política interna, nos momentos cruciais, tenderá a favorecer o governo israelense, por mais que Tel Aviv não haja favorecido o processo de paz. Depois das provocações de Ariel Sharon, o gabinete de Benjamin Netanyahu evidencia a tendência para a direita e o consequente alastramento dos assentamentos clandestinos dos colonos na margem ocidental do Jordão. Assim, não estranha que Netanyahu haja classificado a fala de Abbas como “ cheia de mentiras “. Mais do que surpreender, consterna que o primeiro ministro israelense tenha considerado a alocução de Abbas na Assembleia Geral como “ um discurso cheio de gotas de veneno e propaganda falsa contra Israel. Esse não é o jeito de alguém que diz querer a paz”.
     Em passado recente, Barack Obama discordou da postura de Netanyahu na questão da Palestina, sublinhando as resoluções do Conselho de Segurança como normativas para a solução do dissídio.  O primeiro ministro israelense,forte pelo apoio que lhe dá o Congresso americano, tem muita vez batido de frente com a Casa Branca, posto que, forçoso seja reconhecê-lo, malgrado a proclamada equidistância, na hora da decisão Washington se associa à posição israelense.
     Ao entrar no seu segundo mandato, Barack Obama deverá contribuir para a solução da questão palestina. Tal só será possível se os Estados Unidos aprofundarem a orientação antes tentativamente adumbrada quando da reunião do presidente com Netanyahu.
     A prevalência do estado-cliente sobre a potência tutelar – situação criada desde os anos setenta, através de Nixon e Kissinger – carece de ser superada. Obama, na sua atual situação, teria todas as condições para implementar a necessária reversão. A ninguém aproveita a persistência do tratamento colonial aplicado por Israel à Palestina. A manutenção da Autoridade Palestina como se fora um verdadeiro bantustan não é uma perspectiva inteligente, que se possa considerar como conducente ao estabelecimento da paz duradoura.
      Entrementes, quase em surdina, de novo entra em cena a figura de Yasser Arafat. É importante que as causas de sua morte sejam esclarecidas de forma definitiva. Não seria de somenos a contribuição -  em um sentido ou noutro – da causa mortis do velho lutador transformado em mártir da paz para a criação do balizamento indispensável para aclarar a ambiência em que dois povos históricos carecem de aprender a conviver em paz – o que pressupõe respeito mútuo em condições existenciais paritárias.
       Agradeceriam não só o entorno regional, mas a própria comunidade internacional, se se lograsse resolver, através da justiça, uma questão que já se prolonga por demasiado tempo.

 

( Fonte:  O  Globo )

 

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Novo Perfil na Revolução Síria

                                      
          A queda de base aérea no norte da Síria terá fornecido ao exército rebelde o que tanto os Estados Unidos, quanto os árabes do Golfo lhe haviam negado até agora. Para essa atitude terão contribuído não só temores com a infiltração por jihadis (guerrilhas islâmicas radicais) do movimento e lembranças da difusão dos stinger na guerrilha afegã nos anos oitenta, senão a prudencial paralisia da Casa Branca, nas últimas semanas da campanha de Barack Obama pela reeleição.
          Dadas as notícias que provêm do móvel front sírio, a coligação rebelde se apossou de cerca de trezentos mísseis terra-ar, dos quais cerca de cento e cinquenta estão operacionais (é prática usual dos responsáveis por tal armamento retirar-lhes o gatilho, por precauções de segurança).
          Depois do cerco de dois meses, a base caíu em posse do exército livre da Síria. Este evento assinala duas modificações importantes no quadro da guerra civil: (a) as forças governamentais em situações isoladas – como a desta base – não semelham ter condições de levantar cercos por ações terrestres, dependendo de forma crescente de ataques e provisões por via aérea.
         Dessarte, os rebeldes tiveram acesso afinal àquilo que o Ocidente e seus aliados árabes optaram por não conceder-lhes. Posto que obsoletos, os mísseis soviéticos de que se apossaram as forças rebeldes já provocaram imediata mudança nas condições do enfrentamento.
         Assim, (b) os aviões da Força Aérea governamental – sobre que o relativo enfraquecimento da infantaria de Assad se tem apoiado de forma progressiva – não mais gozam da imunidade anterior, como bem o demonstra a imediata derrubada de duas aeronaves (e mais dois helicópteros) pelas forças revolucionárias.
         Essa mudança qualitativa ocorrida na Síria em favor do Exército Livre decerto nâo surpreende. A recusa tática do Ocidente em disponibilizar as forças rebeldes de armamento terra-ar só poderia funcionar enquanto as condições no terreno impossibilitassem o exército livre de toma-los do inimigo, no caso dos depósitos das forças oficialistas. A queda da base nortista torna írrito tal condicionamento. Se as armas podem não ser state of the art  (do último tipo), não diferem muito nos efeitos práticos, eis que vulnerabilizam a principal arma de ataque das forças oficiais.
         Pela extensão do conflito e a amplitude da coalizão popular contra o detestado regime de Bashar al-Assad, não é necessária muita imaginação para conscientizar-se de mais uma derrota estratégica do atribulado governo de Damasco.
         Como a segurança contra os chamados terroristas estrangeiros armados não está mais garantida nem na capital, como a ulterior e recentíssima explosão de carro bomba o indica, e as defecções dos quadros do regime – tanto nos altos quanto médios escalões – se alastram naquela fuga de magotes de ratos e ratazanas reminiscente dos naufrágios de grandes transatlânticos, as  bombásticas declarações do déspota de resistência até o último soldado podem ser comparadas com as fulgurantes salvas que precedem a súbita precipitação de um abandono cada vez mais provável.
         Na macabra contabilidade do conflito, os seus quarenta mil mortos representam respeitável, posto que inamovível, testemunho de acusação nas aras do Tribunal Penal Internacional da Haia pelo altíssimo preço colocado ao povo sírio para livrar-se afinal do oftalmólogo Bashar, filho do general e ditador a partir de 1971, Hafez al-Assad (1930 – 2000).
         Nesta hora, em que vaca desconhece bezerro, os eventuais protetores estarão pensando em preservar os dedos, eis que os anéis, em termos de sólidas alianças e de base em águas quentes, podem ser coisa do passado.    

 
( Fonte subsidiária:  CNN )      

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Luta pela Democracia


                                                       
O erro de Mohamed Morsi

         Talvez o Presidente do Egito, Mohamed Morsi, haja sido arrastado pela húbris.  Eleito democraticamente pelo povo, terá acreditado que a chancela da legitimidade do sufrágio lhe abrisse recursos excepcionais.
          Contudo, pelo decreto em que se autoconfere poderes discricionários, ele em nada se distingue dos déspotas que o precederam.
          Terá pensado que somente o Judiciário o contestaria. Para sua surpresa, se descobre antagonizado por populares que lhe prepararam o caminho, após as hesitações da Fraternidade Muçulmana, para que democraticamente se empenhasse nas eleições para a sucessão de Hosni Mubarak.
          Agora manda dissolver pela força policial o ajuntamento de milhares de manifestantes que de novo acorreram à praça Tahrir.
          Ao valer-se do arbítrio, Morsi se nivela aos seus antecessores, como Mubarak e a Junta Militar. Ao sair fora da lei, ele perde a legitimidade e incorre nos mesmos riscos e abismos que tragaram aqueles a quem o presidente julgou poder imitar.
         Criticado pelo seu próprio ministro da Justiça, Morsi deveria reconhecer o erro cometido, antes que seja tarde demais.


A  justiça de Hugo Chávez

           A continuada prisão da juíza Maria Lourdes Afiuni é incômoda mostra da precariedade da justiça  na Venezuela chavista. Está encarcerada pelo simples motivo de ter ousado discrepar do caudilho – quando libertou da cadeia o banqueiro Eligio Cedeño, por haver excedido o tempo na prisão sem julgamento. Cedeño, acusado de violar controles cambiais, achava-se detido há três anos, quando a legislação determina o máximo de dois. Ao aplicar a lei, a juíza foi presa em dezembro de 2009, por ordem de Hugo Chávez. Este, no seu programa de transmissão nacional, chegara a afirmar que ela  merecia trinta anos de reclusão.
          Assim, a magistrada Afiuni perdeu a liberdade meramente por cumprir a lei.
          Em consequência, a juíza foi encerrada no cárcere, aonde seria estuprada em 2010. Por força disso, ela abortou, mas continuou a sofrer maus-tratos, como cortes de gilete e queimaduras com guimbas de cigarro, toleradas pelos esbirros do regime, e aplicadas por detentas nessa prisão onde se acham criminosas violentas.
          Hoje, por questões de saúde, ela está em prisão domiciliar. 
          Hugo Chávez continua a denegar-lhe a liberdade, malgrado o desgaste que a detenção de uma juíza cause à  imagem da democracia no regime chavista. Pelo visto, contrariar~lhe a vontade constitui transgressão mais grave do que ater-se ao que dispôe a legislação.
          Nesse quadro, não parece temer que o chamem de tirano. Com efeito, nem mesmo o demove apelo recebido pela libertação da juíza Afiuni de Noam Chomsky, que diz admirar.
          Sem dar-se conta do paradoxo, tal postura só tende a tornar ainda mais gritante a injustiça do todo-poderoso Señor Presidente.

 

( Fontes: Folha de S. Paulo, International Herald Tribune, O Globo ).

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Notícias do Front da Burocracia

                                             
                        Com os supostos propósitos de descentralizar a administração pública federal e proteger o cidadão, o governo de FHC instituira as agências ditas reguladoras.  Seus diretores teriam mandatos específicos – o que em tese lhes asseguraria a necessária autonomia e, em princípio, resguardaria o interesse do consumidor – que poderiam ser renovados, em caráter excepcional.
                   Fernando Henrique imitava os Estados Unidos, onde por iniciativa de administrações democratas surgiram agências que regulam e autorizam alimentos e remédios (FDA) e fiscalizam o mercado acionário (SEC). Mais recentemente a agência de proteção ao consumidor, em que se empenhou a hoje senadora Elizabeth Warren, que participou das lutas, tanto na Casa Branca de Obama, quanto no Congresso, de proteger o cidadão de enganosos cartões de crédito, hipotecas com embustes nas letras pequenas de seus termos, etc.
                   Warren é, de resto, considerada um bicho-papão para a direita republicana, não só pela sua advocacia da lei Dodd-Frank (que procura evitar os excessos de Wall Street que levaram à quebra do Lehman Brothers e à grande Recessão), mas também por seus questionamentos ao Secretário do Tesouro Timothy Geithner. Como se sabe – e foi documentado pelo livro Homens de Confiança, de Ron Suskind – máxime no desastroso primeiro biênio de Barack Obama, o centrismo e as ilusões com o bipartidismo fizeram o novel presidente desperdiçar a maioria democrata nas duas Casas do Congresso. Por causa disso, viria o shellacking  (tunda) da eleição intermediária de 2010, quando o GOP arrebatou a Câmara de Representantes. Nesse contexto, por força menos da municipalização do pleito para deputados, do que por força sobretudo do gerrymandering (redesenho partidário dos distritos eleitorais), os republicanos mantiveram a maioria na câmara baixa, posto que diminuída em relação à anterior. De qualquer forma, o domínio do GOP de um dos ramos do Legislativo garante o gridlock (paralisia) no Congresso.
                   Mas voltemos ao tema hodierno. Dentre os diversos escândalos do governo Dilma – de que a chamada faxina constitui manobra oportunista da presidente para, sempre a posteriori , colher benefícios junto à opinião pública, ao dissociar-se das práticas dos malfeitos.A ultima operação da Polícia Federal prendendo a quadrilha de Paulo Vieira (inclusive o peixe graúdo de Rosemary Noronha, ex-secretária de Lula e José Dirceu) mostra a preocupante situação nas agências reguladoras, transformadas em cabides de emprego.
                   Com efeito, essas agências tem passado uma imagem assaz negativa da atuação do Estado, como se viu no vazamento de petróleo na bacia de Campos, em área alocada  à Chevron, companhia estrangeira americana, e a deficiente fiscalização da ANP, entidade entregue ao PCdoB. E, agora, na indicação pelo Presidente Lula de alguém sem condições para assumir  a ANA – Agência Nacional de Águas, conforme amplamente demonstrado pela  rejeição de Paulo Vieira em primeira votação pelo Senado, pelo ministro competente e pelos funcionários da própria agência. Nada disso foi bastante para dissuadir o presidente de forçar a nomeação, que acabou aprovada.
                   Há uma evidente distorção do escopo precípuo da agência reguladora. Se não se podem excluir os bons exemplos, muito do que vem a público aponta para a sua instrumentalização burocrático-partidário. A ênfase não estaria no benefício ao consumidor, mas na oportunidade oferecida do desenfreado empreguismo, com vistas a saciar a sede da dita base de apoio.
                   Partidos como o PMDB de Henrique Alves  são sedentos das benesses do Estado, mas, pelo menos no governo de D. Dilma, tem votado contra projetos prioritários do governo, como na aprovação de emenda ruralista contrária ao anterior Código Florestal.
                   Até o presente, o governo Dilma continua, apesar de uma inflação persistente, da endêmica corrupção, dos apagões da Eletrobrás, da crise na Petrobrás e da ineficiência estatal (v.g., a situação da infraestrutura aeroportuária) a fruir de razoável aprovação. Cabe a pergunta se a sua incapacidade de dissociar-se da herança administrativa do governo Lula acabará por repercutir nos seus índices, com a queda da presidenta nas pesquisas.
                   O prognóstico mais provável é que, arrimada no assistencialismo e na demagogia dos inflacionários aumentos do salário mínimo, Dilma Rousseff terá condições de postular a reeleição (outra invenção de FHC).  Até o presente, não se descortina no horizonte candidato que possa validamente contestar-lhe a permanência no palácio presidencial.

 

( Fontes:  O Globo,  The New Yorker )

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

De novo, a Corrupção


            Será apenas retórica no que concerne a Lula e ao PT a pergunta de Ricardo Noblat em sua coluna de segunda-feira em O Globo: “Quem diria que seu partido, dono do discurso da ética, patrocinaria o maior escândalo de corrupção na História recente do país ?”
            O juízo da Ação Penal 470 ainda continua no Supremo Tribunal Federal, agora sob a presidência do Ministro Joaquim Barbosa, que pela sua firmeza e exação ganhou o respaldo da sociedade civil. No entanto, gente enredada no Mensalão e já condenada pelo Supremo, como o deputado Valdemar Costa Neto (PR/SP), está envolvida em outro esquemão de corrupção em agências reguladoras e órgãos federais.
            A Polícia Federal identificou 1179 chamadas telefônicas feitas do restaurante japonês de Paulo Vieira, diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) para o citado deputado Valdemar e integrantes de seu partido, o PR. A respeito, semelha oportuno assinalar que Valdemar Costa Neto foi condenado por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha no aludido processo do Mensalão.
            Quem é Paulo Vieira, que a presidente Dilma Rousseff exonerou no sábado 24 por ter sido detido em operação da Polícia Federal ?   Opositores de sua nomeação para o cargo de diretor de Hidrologia da Agência Nacional de Águas recordaram o estranho processo de sua aprovação pelo Senado Federal, por indicação do Presidente Lula da Silva. Em dezembro de 2009, o nome foi rejeitado pelo Senado. Depois de nova recusa, segundo Noblat, o Presidente voltou a insistir, e na terceira vez obteve a aprovação senatorial.
             Dentre os opositores de Paulo Vieira, estava o então ministro Carlos Minc(PV), do Meio Ambiente, que defendia a indicação da técnica Gisela Forattini, apoiada pelos funcionários da agência: “ Já havia informações de que ele (Vieira) não era flor que se cheirasse, que navegava em águas turvas”.
             A indicação de Vieira terá partido de sua irmã Rosemary Noronha (também detida pela Polícia Federal). Esta se valia de sua posição no Escritório de Representação da Presidência em São Paulo para alegado tráfico de influência. Ao contrário das demais exonerações pelo Palácio do Planalto dos envolvidos na operação da Polícia Federal, Rosemary – que fora secretária de José Dirceu por mais de dez anos e depois fora promovida por Lula para o escritório em São Paulo, costumava acompanhar o Presidente nas suas viagens ao exterior – mereceu atenções especiais da Presidenta.  Com efeito, Gilberto Carvalho, o Secretário-Geral da Presidência, foi encarregado de informar o ex-Presidente do infeliz ocorrido.
             De acordo com O Globo, Paulo Vieira – que chegou a ter restaurante no bairro Jardins e uma rádio – chefia grupo composto pelos irmãos Marcelo Rodrigues Vieira e Rubens Carlos Vieira, diretor da ANAC; e pelos advogados Marco Antonio Negrão Martorelli, Lucas Henrique Batista e Patrícia Santos Maciel de Oliveira. Ainda segundo a matéria de O Globo, os advogados são suspeitos de assinar peças jurídicas produzidas pelo citado Paulo Vieira em casos em que há suspeita de corrupção. Os seis foram detidos, mas Patrícia já estaria em liberdade. 
             A quadrilha, de conformidade com a notícia, comandada por Paulo Vieira é acusada de cooptar servidores do TCU, do Ministério da Educação, da Secretaria de Patrimônio da União e dos Correios para produzir pareceres técnicos favoráveis a empresas e pessoas que tenham interesses junto a órgãos federais, além de acelerar processos.
             Caberá acaso ainda alguma tenaz dúvida, diante de toda essa movimentação, ora trazida à luz pela Polícia Federal, para a pergunta do colunista Ricardo Noblat se o ex-Presidente Lula pode considerar-se de novo enganado ?
             Será uma válida interrogação, diante das iteradas revelações que devemos às operações da Polícia Federal ?

 

( Fonte:  O  Globo )           

PS. O Senado já aprovou a modificação regimental para que a votação pelo plenário não seja mais secreta e sim em aberto no processo de cassação de senadores, conforme recomendado pelo Conselho de Ética. Que fim levou a marcação pelo Presidente Marco Maia (PT/RS) do voto da dita modificação  pela Câmara dos Deputados? Causa espécie tanta demora, sobretudo se levarmos em conta que a emenda só passará a valer se aprovada pelas duas Câmaras?...  

domingo, 25 de novembro de 2012

Adeus Mano

            A CBF - leia-se José Maria Marin e o vice Marco Polo Del Nero - deu afinal o bilhete azul para Mano Menezes. Deveras anticlimática a escolha do momento. Qual a intenção em despedir o técnico logo depois da vitória contra a Argentina ? Terá sido para mostrar que vencer na Bonbonera os nossos principais rivais hemisféricos não tem relevância alguma ?
            Se a CBF errou na hora, acertou em marcar o malogro no fiasco da Copa América e no melancólico final da derrota olímpica. A displicência da defesa permitira ao México um gol record com segundos do primeiro tempo. Eis o Brasil na estatística das Olimpíadas - só que no lugar errado.
            Talvez na falta de motivação dos jogadores - e na preferência da força muscular sobre a técnica - Mano deixa a sua marca ao revés.
             Há gente que aposte em Felipão.  Com efeito, a ele - e a dupla Ronaldo - Rivaldo - devemos a quinta copa de 2002. O tempo passa, no entanto, e o fracasso no Palmeiras está aí no curriculo.
             Se Tite arrebatar o mundial de clubes, será o preferido. A conferir. 

O Independentismo Catalão

                                      
        O movimento catalão pró-independência se insere no panorama europeu. Existe aparente contradição na súbita busca de afirmação soberana desses estados-anões diante de seculares situações da respectiva submersão no quadro de grandes nações-estado.
          Esta freudiana pulsão pró-secessão – que é fenômeno, como veremos adiante, não adstrito à Espanha – se torna estranhamente mais inteligível dentro do contexto da União Europeia. Assim, paradoxalmente, os argumentos que conduziram à construção europeia – a necessidade de laços econômico-financeiros mais estreitos não só para dar melhores condições de mercado para os diversos países, mas também para aproximar politicamente antigos adversários – podem servir como uma espécie de rede de segurança que a contrario sensu viabiliza a pulverização das pequenas nacionalidades.
         O gigantismo da U.E.  – e esse caráter de desperdício e de multiplicação burocrática que vemos não só em Bruxelas (sede política da UE), mas também em Estrasburgo (sede parlamentar) – tem fornecidos argumentos para posições contrárias ao poder supranacional, como se verifica no recente virtual veto do Primeiro Ministro David Cameron à proposta orçamentária apresentada pelos eurocratas.
          A difícil – e pendular – relação do Reino Unido com a atual União Europeia – como o foi no passado com os sucessivos avatares de Bruxelas – reedita as contradições entre o insularismo britânico e a sua necessidade de compor-se com o Continente. Na família europeia – cujo crescimento quiçá excessivo tende a dificultar-lhe a tomada de decisões – os motivos respectivos de permanência podem variar, mas o segredo da resistência estrutural está na circunstância de que as razões para a associação são mais fortes do que a ânsia de ruptura.
         Nesse sentido, a ignorância do passado pode ser fautora de erros no presente. Cameron, se se detivesse nos inúmeros malogrados intentos de seu país em participar da então  CEE, intuiria melhor da conveniência de não servir-se demasiado da carta do divórcio europeu, porque pode acabar se descobrindo fora do concerto europeu, com toda a indústria de Sua Majestade a cobrar-lhe por se descobrir sem as vantagens dessa união para os próprios produtos.
         O mais interessante neste exemplo é que vemos também no caso britânico um outro exemplo da acima-citada pulverização nacional. Com efeito o Reino Unido deverá enfrentar em futuro relativamente próximo um referendo similar ao do projeto dos independentistas da Catalunha. Reporto-me à Escócia, onde Suas Majestades têm um belo castelo senhorial, e que poderia voltar a ser um reino soberano, como o foi ao tempo dos Stuart e da infeliz rainha Mary.
         Mas voltemos à Catalunha. Artur Más, o líder do governo regional, convocou  eleição que tem um dúplice objetivo. Se o seu partido ganhá-la com substancial maioria, Más poderia partir para a secessão. A Catalunha é a mais importante das 17 regiões de Espanha, e com a conveniente rede europeia de segurança, ei-la transformada em mais um membro da UE.
        O primeiro Ministro Mariano Rajoy considera tal propósito anticonstitucional.  Os projetos autonomistas e mininacionais da região catalã apontam para a dívida de 42 bilhões de euros (no quadro da dívida de Espanha com suas 17 regiões  no montante total de cento e quarenta bilhões de euros).  A gastança do líder anterior, Jordi Pujol e a de  Artur Más  já contribuiu para dar status de junk (lixo) para a dívida catalã. A flama independentista do líder catalão não o impediu, de resto,  de solicitar a Madri a concessão de empréstimo emergencial de cinco bilhões de euros.


(Fonte: International Herald Tribune )

sábado, 24 de novembro de 2012

De novo a Praça Tahrir

                                                  
          É comprida também no Egito a luta pela democracia. Milhares de manifestantes voltaram à praça Tahrir, para novos protestos, ora motivados por decreto do Presidente Mohamed Morsi, em que assume plenos poderes.
          Morsi saía de exitosa mediação que levara ao cessar-fogo entre Israel e o Hamas. A despeito das diferenças ideológicas, havia mantido contatos construtivos com o Presidente Barack Obama, e nesse sentido, valendo-se de sua cercania com a liderança do Hamas, criara condições para mais uma trégua entre Gaza e Tel-Aviv.
          De certa forma, o decreto autoritário veio na contramão da evidenciada habilidade para trazer a paz, ainda que precária, para aquela região. Eleito pelo voto popular, Morsi surpreendeu a opinião pública ao recorrer a medidas que mais parecem emanar de um homem forte como o ex-ditador Hosni Mubarak.
         O decreto de Morsi utiliza linguagem que lhe outorga poderes irrestritos  de “ tomar todas as medidas e procedimentos necessários” para lidar com qualquer ameaça potencial contra a Revolução. Por outro lado, estabelece que os atos e disposições da Assembleia Constituinte não estão submetidos à revisão pela Justiça.
         Se a iniciativa presidencial se fundamenta no desígnio de evitar a paralisia legal, dando à assembleia constituinte caráter soberano em suas determinações, a declaração do chefe da Suprema Corte de que não acata o decreto presidencial já é ulterior indicação das dificuldades que Morsi terá pela frente.
         Há outras disposições questionáveis no citado decreto, como a determinação de novos julgamentos para o ex-presidente Mubarak e outros acusados da morte de manifestantes civis durante a revolução que derrubou o antigo regime.
         Nesse sentido, Yasser Ali, porta-voz do presidente Morsi tentou apresentar os novos poderes ditatoriais como temporários, a vigorar apenas até a promulgação dentro de poucos meses da nova constituição. Consoante tal enfoque, o decreto foi baixado “para possibilitar o fim do período de transição da maneira mais rápida possível.”
        Malgrado todos esses esforços, foi muito negativa a recepção da  medida presidencial. Por recordar ações similares no passado, Morsi foi considerado um novo faraó, dado o ranço absolutista do decreto. Os  escritórios em Port Said, Suez e Ismailia, do partido do presidente, a Fraternidade Muçulmana, foram incendiados pelo povo.
        A par disso, novas concentrações populares afluíram para a Praça Tahrir, não obstante a ação da polícia e das bombas de gás lacrimogêneo.
        Dadas as lembranças evocadas e as semelhanças com as reações autoritárias do passado, além da abrupta apresentação das draconianas disposições, o procedimento do presidente Mohamed Morsi – que nada fez para distinguir-se dos déspotas que o precederam – atuou como se fora uma provocação, de novo jogando para  ruas e praças as multidões que haviam enfrentado Mubarak e o exército para abrir à democracia as terras do Egito.
        O futuro dirá se Morsi, e sua Fraternidade Muçulmana – com  entrada tardia no combate pela democracia na praça Tahrir – terão ou não subestimado a capacidade de reação daquela mesma turba que em fevereiro e março de 2011 enfrentara riscos não desprezíveis no seu propósito de trazer os ventos da primavera árabe para as margens do Nilo.

 

( Fonte:  International Herald Tribune )

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Notícias do Front Jurídico - Político


                                  
A Posse de Joaquim Barbosa

            O ministro Joaquim Barbosa tomou posse ontem como Presidente do Supremo Tribunal Federal.  A Presidente Dilma Rousseff compareceu, mas manteve um ar de enfado durante toda a cerimônia; também, e com cara fechada, o Deputado Marco Maia (PT), presidente da Câmara.  Compareceram igualmente o Presidente do Senado, José Sarney, ministros de estado e presidentes de tribunais superiores.
            Dentre os oradores, assinale-se a denúncia do Procurador-geral da República, Roberto Gurgel , de proposta de emenda constitucional que pretende retirar da competência do Ministério Público o poder de investigação, o que colocaria o MP do Brasil na companhia de apenas três países: Uganda, Indonésia e Quênia.  Nesse contexto, Gurgel levantou a suspeita de que a decisão da Comissão Especial da Câmara seria retaliação pela atuação do Ministério Público. Embora não haja citado casos específicos, a acusação contra José Dirceu e demais réus do Mensalão será a hipótese mais provável.
           Em seu discurso, Barbosa criticou a ´Justiça desigual´, eis que nos tribunais ´nem todos os brasileiros são tratados com igual consideração´. Na presença de Dilma – e também dos presidentes do Senado, José Sarney, e da Câmara, Marco Maia – o novo Presidente do STF defendeu a independência dos juízes e condenou quem pede favores a políticos para facilitar promoções na carreira de magistrado.
          Dentre os oradores, Ophir Cavalcante, presidente da OAB, chamou de histórico o julgamento da Ação Penal 470, que “ fixou em cada cidadã e cidadão a consciência de que ninguém está acima da lei”.
          Como assinala Merval Pereira em sua coluna, o Ministro Luiz Fux, escolhido por Joaquim Barbosa para fazer a saudação oficial – que submeteu ao presidente – respondeu às críticas ao Supremo provocadas pelas condenações aos mensaleiros. Sem embargo, Fux não deixou de elogiar a atuação da Presidente Dilma Rousseff, a quem agradeceu pela sua indicação ao Supremo.
         Na cerimônia, não havia muitos representantes do Partido dos Trabalhadores. Compareceram os governadores Jaques Wagner (PT) e Agnelo Queiroz (PT). Do PSDB vieram os governadores Geraldo Alckmin e Antonio Anastasia. Dentre os convidados, havia muitos representantes da classe artística: Lucélia Santos, Milton Gonçalves, Lázaro Ramos, Djavan e Martinho da Vila. Compareceram também o deputado Romário e o antigo piloto Nelson Piquet.
        Ao contrário de embates anteriores, Barbosa e o ministro Ricardo Lewandowski (empossado como vice-presidente) apertaram-se sorridentes a mão em cumprimento pela posse do novo Presidente.
         No que tange ao antigo presidente, Ayres Britto, recebeu palavras de elogio de diversos oradores. Esteve igualmente presente o ex-ministro Cezar Peluso, que também presidiu o STF.

 

A leitura do relatório da CPI do Cachoeira

         O deputado Odair Cunha (PT-MG) voltou atrás da disposição de ler ontem o próprio relatório. O recuo do relator foi interpretado como motivado pelo temor de que o documento fosse rejeitado pela comissão.
         Além de propor o indiciamento do governador Marconi Perillo (PSDB), mas não o de Agnelo Queiroz (PT), tampouco foi bem recebido o indiciamento de jornalistas, a começar pelo de Policarpo Júnior, da revista Veja, além da solicitada investigação contra atos do procurador-geral Roberto Gurgel.
         A esse respeito, semelha interessante assinalar que até a semana passada o relator Odair Cunha demonstrara convicção sobre a inexistência de elementos para pedir o indiciamento do jornalista Policarpo Júnior, e a investigação do Procurador-Geral-da República pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Sem embargo, nesta segunda-feira disse a mais de um interlocutor que mudaria o texto para atender a pressões muito acima dele e do PT. Estará acaso o deputado Odair Cunha insinuando pressões vindas do líder máximo ? De qualquer forma, Odair Cunha discutiu seu relatório com o presidente do PT, Rui Falcão, e com o líder petista na Câmara dos Deputados, Jilmar Tatto. Nesse contexto, o réu do Mensalão e ex-ministro José Dirceu chegou a Brasília na segunda, dezenove, para encontros políticos. Segundo O Globo, José Dirceu foi o mais ferrenho defensor de investigação de Veja e de seu diretor em Brasília, Policarpo Júnior.
         Por sua vez, segundo o respeitado deputado Miro Teixeira (PDT-RJ),  o relatório final da CPI foi feito para ser derrotado.Talvez não interesse a setores do próprio PT aprofundar investigações sobre a construtora Delta. Nós tentamos quebrar sigilos de empresas que receberam dinheiro da Delta e não conseguimos. Se houvesse interesse do PT na investigação, teríamos conseguido.”
        Quanto ao indiciamento de jornalistas, afirmou  o deputado: “ Tanto no caso dos jornalistas, como no do procurador-geral, há a revelação de notório sentimento de vingança de um lado, e, por outro, sobre a imprensa, um passo adiante na tentativa de intimidação de jornalistas investigativos.”
        Existe, por outro lado, a impressão difusa de que o objetivo é o de não aprovar o documento porque ao PT não interessaria aprofundar a investigação sobre a construtora Delta. Tal se prende ao fato de que muitos, sem alarde, discordam do indiciamento de Fernando Cavendish, ex-dono da construtora Delta, embora, em público, digam o contrário.

 

( Fontes: O Globo, Folha de S. Paulo )      

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Mais uma trégua na Palestina


              O enésimo cessar-fogo foi acordado entre Israel e Hamas. Na sua disparidade, as 153 mortes (148 palestinos contra cinco israelenses) já constituem um cruel espelho das brutais diferenças envolvidas no choque entre duas sociedades a que tudo parece opor, com exceção da própria condição humana.
              De um lado a superpovoada Faixa de Gaza, em que a população civil vegeta em condições sub-humanas, atenazada e perseguida por uma série de bloqueios e de interdições impostos pela potestade que vive em relativa opulência além-muros. Este mesmo contingente se acha sob o estrito controle de facção palestina radicalizada pela demonização do adversário, do qual, assim como Anteu se reenvigora pela mãe-terra,  extraem a motivação para luta sem outro limite que a terra arrasada.
             Nessa guerra sem quartel, a única verdadeira vítima é a sociedade civil, e ainda mais marcada tal condição será no formigueiro de Gaza, do que nos núcleos urbanos israelenses.
             É mais fácil de intuir a revolta do habitante de Gaza que, apesar de não estar envolvido em qualquer rede ou conexão do tentacular conceito de terrorismo, tem a sua modesta habitação destruída ou um parente próximo morto pela circunstância de viver nas cercanias de algum funcionário do Hamas.
            Esta será a causa objetiva da própria desgraça. Colhido pelas engrenagens infernais do ódio, ele se debate contra uma situação injusta – ser carne de canhão por motivo de ações tomadas pelo poder a que está submetido, ações essas voltadas para punir outras alegadas injustiças (o bombardeio das vizinhanças civis ditas inimigas, porque constituem parte da potência ocupante).
           Qual a possibilidade de que a revolta dos civis venha a confrontar e a modificar a beligerância do Hamas? Como todos os queixumes de um extrato desarmado e sem condições objetivas de aglutinação alternativa, a resposta será que outros males virão para essa gente que é pobre e não tem para onde ir além dos cortiços onde vive.
           Os acordos de Oslo seriam um drummondiano retrato na parede, se porventura tais construções restassem de pé nas áreas devastadas pela incompetência, cinismo e posterior radicalismo.
            A injustiça que a alegre e apressada comemoração nos jardins da Casa Branca pensara firmar o fim anunciado se mostraria, nos anos futuros, muito superior ao prematuro desejado  congraçamento.
           Se houve ingenuidade de Yasser Arafat e sua equipe, ao não estipular metas incontornáveis se a paz verdadeira devesse ser atingida, a outra parte, de Rabin e Peres seria corroída pelas concessões aos chamados colonos.
           Não pretendo aqui retraçar caminho que perdeu o rumo e desperdiçou real oportunidade para a construção da paz.
           A injustiça prevalente, com a sua ocupação militar da Cisjordânia, será a fábrica diabólica de mais injustiças e das deformações que sói acompanhar-lhe a inerente radicalização.
           Basta contemplar a atual sociedade israelense, com processos acelerados de apartheid e modalidades de limpeza étnica, como assinalados em artigo hodierno de Clovis Rossi, para ter a consciência de que existem forças deletérias que, na verdade, ao invés de promover o bem público preparam um porvir cada vez mais tenebroso e disfuncional.
           Os avisos são múltiplos, mas o seu significado parece escapar tanto do povo, quanto de seus extratos dirigentes. Assim, enquanto alguns celebram mais um cessar-fogo, no mesmo dia explode em  ônibus de Tel-Aviv uma bomba, ferindo vinte pessoas.
           Haverá mais eloquente sinalização de que se o injusto sistema persiste, a paz continuará a ser  ficção contingente, personagem acessória de lúrido cenário de opressão e sofrimento ?     

 

(Fontes: Folha de S. Paulo, International Herald Tribune )

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

A Guerra Aérea no Oriente Próximo


          Apesar dos esforços do presidente Mohamed Mursi, do Egito, da Secretária de Estado Hillary Clinton,  de Ban Ki-moon, Secretário-Geral das Nações Unidas, e de outros países, com diferentes empenhos e influência, ainda permanece ativa a beligerância entre Israel e o Hamas, na Faixa de Gaza. Como  a mais cursória das avaliações demonstrará o extremo desequilíbrio no número de mortos – 130 palestinos e cinco israelenses -  é a população civil de Gaza a maior vítima desta guerra aérea, no qual a preponderância tecnológica de Israel  esmaga os civis palestinos, transformados em carne de canhão para os guerreiros do Hamas, e de alvos colaterais para o incessante bombardeio, intento em destruir estoques dos rudimentares foguetes palestinos, a par de quadros militares dos senhores da Faixa de Gaza.
         Tudo começou com a eliminação do artilheiro-mor de Gaza,   Ahmed Jabari, cuja capacidade técnica, e entrosamento com o fornecedor iraniano, terá levado o governo Netanyahu ao lançamento do míssil ar-terra, decerto não com a consciência da reabertura das hostilidades – eis que, de uma forma ou de outra, elas estão sempre presentes – mas a certeza de provocar uma nova guerra.
         E o assassínio de Jabari reabriria as comportas infernais, com os incessantes bombardeios de Israel, que atingem indistintamente  supostos depósitos de armamentos, rede de túneis secretos, bases da administração do Hamas militar e civil, bancos, prédios com sucursais de noticias, e muitas residências e edifícios habitados por civis desarmados. Esses últimos alvos, sob a alegação de que o Hamas costuma esconder os seus agentes por trás de supostos escudos civis.
        Por outro lado, a artilharia do Hamas – cuja incessante atividade terá sido uma das motivações desta enésima guerra – tem procurado alvejar não só o sul israelense, objetivo costumeiro de um ódio persistente que a longa ocupação militar israelense trata de retro-alimentar dentro do infernal mecanismo, mas agora com patética efusão de mísseis. A tecnologia do Hamas, por cortesia de Teerã, o leva desta feita bastante além, transformando Tel-Aviv e Jerusalém em objetivos de foguetes de médio alcance. Sem embargo,  escudo tecnológico de Israel -  o chamado domo de ferro – tem por ora evitado que tais mísseis logrem atingir eventuais metas nos dois principais centros urbanos do Estado judeu.
       Com a ativa participação da Secretária Hillary, os esforços do Presidente Mursy, do Egito, e do Secretário-Geral Ban-Kimoon, ganham maior consistência. As intenções de Netanyahu (e do Tsahal, o exército israelense) de invasão terreste semelham afastar-se.
       Cumpre agora negociar o estabelecimento do cessar-fogo, que o mútuo ódio entre ocupante israelense e resistente palestino não há de facilitar. Se Mursy tem acesso direto aos radicais do Hamas e terá alguma voz com  Khaled Meshaal, o atual chefe da facção que domina Gaza, a Secretária Hillary não tem contato direto com esse grupo havido como terrorista. A intermediação se torna menos fácil em contatos com Mahmoud Abbas, da Autoridade Palestina (cuja influência está em baixa neste conflituoso ambiente), o próprio Mursy e o Primeiro Ministro Netanyahu, cuja postura é sempre uma incógnita, embora como político calejado conheça os respectivos limites.
       O gabinete israelense  ter-se-á oposto ao estabelecimento do cessar-fogo, sem a obtenção de garantias de parte de Gaza no que tange à imposição de uma trégua. Como o presidente Barack Obama aludira anteriormente, a atual crise decorre também do constante acosso pela rudimentar (mas eventualmente letal) tecnologia missilística de parte do Hamas, notadamente ao sul israelense, assaz próximo das bases lançadoras da Faixa de Gaza, ora dominada pelo grupo mais radical na sua oposição a Israel.
        Nesse contexto, Netanyahu brecou o estabelecimento do cessar-fogo sem quaisquer garantias no que respeita à atividade do Hamas. De toda maneira, quer venha a ser imposta ou não, basta cotejar as posturas respectivas – tanto de Gaza, quanto de Tel-Aviv – qualquer trégua só terá alguma possibilidade de maior eficácia se houver uma abertura de parte a parte, e notadamente de Israel, que é a potência militar ocupante. Enquanto as coisas permanecerem como efetivamente estão, qualquer acordo estará escrito nas areias do deserto.
        Nesse quadro, voltamos sempre ao velho dito – só a paz constrói, e a justiça é a única estrada que pode abrir as portas dessa cidade, até hoje mítica, do Oriente Próximo.

 

(Fontes:  Folha de S. Paulo, O Globo, International Herald Tribune )

terça-feira, 20 de novembro de 2012

O problema da Escolha


           Muitos – e não me excluo disto – ficaram decepcionados com a circunstância de que Dilma Rousseff no seu discurso de posse no Congresso Nacional preferiu deixar a critério dos legisladores a oportunidade da tomada de iniciativa de reformas no quadro político brasileiro.
           Há difusa consciência da necessidade de reformas. Várias são mencionadas, e dentre essas avultam a política e a fiscal. Pode-se discutir a respectiva urgência, porém é inegável a consciência de que uma depende da outra.
          A hora e a vez são importantes.Não há momento de maior relevância  nos mecanismos do poder que o de sua assunção. Por imprecisados instantes, restam abertas as cancelas da burocracia e da conformidade. Tudo ou quase tudo se admitirá ao novel titular do mando, na homenagem ao sufrágio da Nação que então se consubstancia. Até hoje, no entanto, disso tivemos prova apenas no episódio do confisco dos depósitos bancários no início do governo Collor que deixou fundo rastro de desgraças particulares e de pública insatisfação.   
         Cabe, por conseguinte, perguntar do porquê o governo constitucional da Presidente Dilma Rousseff se esquivou deste magno desafio, e optou pela alternativa da chamada normalidade burocrático-institucional.
         Nesse ponto, releva de resto sublinhar que aqui não se trata de eventual saída com recurso a excepcionalidades fora do contexto constitucional. Muito ao contrário. Neste passo decisivo, havia dois caminhos: o rotineiro, que se circunscreve às praxes ordinárias da normalidade administrativa e aquele que se vale de uma exceção, de hábito atribuída aos presidentes recém-empossados.
        Sem embargo, se a escolha de Dilma deixou travo amargo naqueles que lamentaram a ocasião perdida, será imperativo buscar compreendê-la. Se assim procedermos, o faremos com duplo objetivo: não só colocar no contexto próprio essa omissão, senão envidar esforços para que tal oportunidade não seja desperdiçada no futuro.
        Primo, o processo da indicação e posterior eleição de Dilma Rousseff pode ser caracterizado pelo ato político de seu criador, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, designá-la como candidata à sua sucessão, dada a impossibilidade constitucional da segunda reeleição. Nessa oportunidade, por uma série de circunstâncias, a seleção de Lula preteriu outros candidatos dentro do partido, que, em diversas condições, teriam maiores títulos para reivindicar a investidura. No caso, a onipotência do criador terá limites. Dentre esses, os mais significativos pertencem ao corpo eleitoral. 
       Ora, no caso em tela, a conjunção de fatores redundou favorável ao desígnio presidencial. Em algumas regiões, o eleitor acedeu à proposta do criador. Em outras, a falta de carisma e de união na oposição tornou possível a vitória da antiga chefe da Casa Civil e virtual Primeiro Ministro do Presidente Lula.
       Secondo, é grande o poder de Lula, mas decerto não será ilimitado. Nesses termos, se logrou fazê-la presidente, não teve condições de dar-lhe não só tarimba política (e o consequente controle da dita base de apoio), mas também de infundir-lhe  visão original e própria do respectivo mandato.
       Não poderemos, em consequência, exigir de Dilma Rousseff uma originalidade de visão que ela, como criatura de Lula da Silva, necessariamente não terá.
       Por isso, irá conviver tanto com a inchação do Estado e do governo, quanto com o modelo patrimonialista, com o seu acúmulo de tributos a sufocar a alternativa da inteligência e da modernidade.
       E aqui o risco de giz termina. Com uma pequena qualificação. Em política, as oportunidades não são muitas, embora existam. Se assim o desejar, em um segundo mandato, Dilma Rousseff  pode reinventar-se. E, diante da geral surpresa, empolgar a oportunidade que antes deixara escapar.  Se tal lance devemos considerar improvável, ele não será, contudo, impossível.
       Está aí a História, essa senil personagem, que nos seus confusos enredos, até isto virá a admitir.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Georgia, China e Susan Rice

                                             
Georgia :  o exemplo ucraniano

      A vitória do partido de Bidzina Ivanishvili sobre a representação do Presidente Mikheil Saakashvili, nas eleições parlamentares do mês passado, tem sido acompanhada por medidas judiciais. Nesse sentido, o presidente Saakashvili, cujo mandato termina em 2013, deverá ter diversas autoridades de sua administração, segundo o novo Primeiro Ministro Ivanishvili, submetidas a julgamento.
      Consoante Ivanishvili, esses altos funcionários são acusados de se valer de meios ilegais de vigilância para gravar conversações com o escopo eleitoral de desacreditá-lo.
      Tal reação com vistas a judicializar a disputa – dentro de uma linha que não difere muito do approach do presidente Yanukovich na Ucrânia, que mandou prender e fez condenar a ex-Primeiro Ministro e adversária Yulia Timoshenko (além de outros próceres do partido contrário) – motivou pronta reação estadunidense no que tange a essa antiga república da defunta União Soviética.
       Tendo em vista o rumo da luta política na Georgia,  com ênfase em represálias através de suposta instrumentalização do sistema judiciário, Washington alertou a nova administração de que ações de promotores com flagrante motivação política tenderiam a pôr em risco a candidatura desse  país de tornar-se um membro da OTAN.
 

A nova liderança da República Popular da China

     Os especialistas em política chinesa – que, nas suas forçosas limitações, recordam os antigos kremlinologistas, com a suposta esotérica sapiência acerca do Politburo soviético – agora formam um comitê de sete dirigentes (ao invés dos nove anteriores).
     O novo comitê permanente se compõe de sete senhores, todos permanentemente jovens, com negros cabelos sem uma cã sequer. Tampouco sobrou lugar para uma presença feminina.
     A orientação política desses senhores pode talvez ser determinada por fatores acessórios do processo. Assim, pairou sobre a nova liderança a sombra de Jiang Zemin, o líder que se formalmente se aposentara há dez anos atrás. Consoante se assevera, pelo menos quatro dos membros indicados teriam estreitas ligações com Jiang. De resto, Hu Jintao,  que deveria ter mais voz em capítulo, terá consentido na maior influência do veterano dirigente. Dados os antecedentes – Deng Xiaoping decerto o maior – tal se insere no respeito chinês pela opinião dos mais velhos.
      O viés conservador terá sido sublinhado pela não-promoção de dois expoentes ditos reformistas: Wang Yang, secretário do PCC na província de Guangdong (a mais rica do país) e Li Yuanchao, o diretor organizacional do PCC.
      Xi Jinping – que já assumiu a secretaria geral do PC e a chefia da comissão militar -  deverá suceder a Hu como presidente no próximo ano. Por sua vez Li Keqiang será o primeiro Ministro, substituindo a Wen Jiabao.     

 
Susan Rice -  a  futura Secretário de Estado ?

      Afro-americana, próxima do Presidente Barack Obama e atual embaixadora dos Estados Unidos na ONU, o caminho de Susan Rice para suceder a Hillary Clinton como Secretária de Estado parecia já traçado.
       Com efeito, também Madeleine Albright, na Administração Clinton, passara de início pela delegação nas Nações Unidas antes de ser investida como chefe do Departamento de Estado.
       Dada a sua militância democrática e conhecimento de questões diplomáticas, a embaixadora Rice semelha a candidata natural a esse prestigioso encargo.
       Se acaso não o conseguir, tal peripécia nada terá a ver com o seu estilo, que pode lembrar pelas suas feições para alguns demasiado afirmativas.
       Na verdade, por comparecer a cinco entrevistas televisivas dominicais, Susan Rice corre o risco de estar entrando em uma situação que não lhe concernia diretamente. Rice tomou o lugar a pedido de Hillary. Assim, a 16 de setembro, fundando-se em informações (talking points) que recebera dos serviços de segurança da Administração, ela descrevera o assédio ao consulado em Benghazi como se fosse manifestação espontânea de protesto, posteriormente instrumentalizada (hijacked) por extremistas e não um ataque terrorista premeditado.  Depois de uns dias, os republicanos no Congresso passaram a pedir-lhe a demissão.
      Este ataque à missão de Benghazi – de que resultou a morte do embaixador americano na Líbia – iria ser inserido na campanha presidencial, com o intento do GOP de prejudicar o presidente Obama. Malgrado os ataques – inclusive em dois debates televisivos – eles não surtiram efeito junto à opinião pública, não afetando a imagem do candidato à reeleição.
      Responsabilizar-se agora a Susan Rice por ter apresentado, com base em dados oficiais, uma versão supostamente insatisfatória do episódio, dá a impressão de querer utilizar o ocorrido como um pretexto para criticar a competência diplomática de Rice.
       Dado o caráter pugnaz de Susan Rice, não será muito provavelmente esse tipo de argumento que a afastará da liça pelo Departamento de Estado, se realmente ela  for indicada para o posto.

 

( Fonte: International Herald Tribune )  

domingo, 18 de novembro de 2012

Colcha de Retalhos CXXVII

                                             
Cristina Kirchner ou Cristina Chávez Frias ?

           Nestor Kirchner ainda era vivo quando foi descoberta a mala com dinheiro para a eleição da esposa Cristina. Embora as investigações tenham avançado à maneira das terras desse continente, restaram poucas dúvidas quanto à origem dos fundos.
          Muita água já passou debaixo da ponte, com a viúva Cristina em seu segundo mandato. Sem embargo, a munificência do líder venezuelano se dirigia a uma aliada, e não a simpatizante ocasional. Tanto o comportamento político da Kirchner, quanto a evolução da economia argentina tem evidenciado, para o bem e para o mal.
          O verticalismo nos controles se tem incrementado. O enfraquecimento do peso tem sido monitorado não conforme as regras do mercado. Ao invés, se propõem imagens alternativas, que refletem a visão do poder mas não a realidade.
         Velhas técnicas autoritárias – como a do controle do fornecimento de papel de imprensa, de que era mestre o PRI mexicano, das eleições fraudadas e da democracia de fachada – voltam a ser ressuscitadas.
         Nesse contexto, a viúva busca a ordem unida nos meios de comunicação, eis que lhe desagradam as dissonâncias da oposição. Daí,  a perseguição ao grupo Clarin.
         Por uma série de causas – desatadas sobretudo após as últimas eleições presidenciais de outubro de 2011 – a popularidade de Cristina tem caído bastante. Não foram só os entraves cambiais às viagens no exterior, episódios de corrupção no governo, falta de sensibilidade com graves acidentes, repressão à crítica na imprensa, e até desentendimentos com a base sindical peronista, a par da elevação da carestia (a oficial é de 9%, mas a real chega 25%).
        O panelaço de setembro último, com duzentas mil pessoas na Praça de Mayo, já começa a lembrar os idos de de La Rua.
        Já fica complicado desmerecer de tais manifestações, como se restritas à classe média. E enquanto isso, a taxa de aprovação popular despenca de 70%, em princípios do ano, para os atuais 36%.
 

  O 39º  Ministério

         A triste frase de que não há nada de seguro no subdesenvolvimento – já citada no blog -  reaparece com a criação de mais um ministério pelo governo Dilma Rousseff. Como se 38 não fossem bastantes, o governo petista  inventa mais um, dedicado ora a pequena e micro-empresa.
         Esse gabinete inchado, ora pulverizado em trinta e nove secretarias de estado, com todas as regalias e funções gratificadas, margeia o mítico número dos quarenta. Tal fragmentação só contribui para onerar os gastos correntes, e aumentar o empreguismo. Será mais um artifício para atender à insaciável sede da chamada base de apoio parlamentar.
        A inutilidade de todo esse esquema grita aos céus. Nunca foi preciso sobrecarregar os gastos correntes, nem a alçar a nível ministerial os diversos objetivos da ação estatal para que se agilize e se desenvolva a micro-empresa.
        Não será através  de mais cargos burocráticos de alto nível que iremos dar apoio à micro-empresa. Com efeito, há muitos setores que, na verdade, não são mais do que pretextos para a criação de ministérios, a presidência petista sempre empenhada em arranjar mais poleiros para os partidos políticos da base.   
        O que mais confrange nisso tudo é a pobreza da visão, é o empedernido subdesenvolvimento intelectual, é a inútil sobrecarga do Estado. Pensa-se em cargos e em benesses políticas, e não na simplificação da escandalosa burocratização na criação de empresas – grandes, médias, pequenas ou micro – com as burras exigências de uma estrutura patrimonialista, a dos cartórios, repartições, despachantes e incontáveis jornadas perdidas para consumir tempo e boas propostas e intenções – ou empurrar para a economia informal.


 Conflito de Gaza               

        Dadas as reais possibilidades de extensão do conflito na Faixa de Gaza, diante da anunciada ofensiva de forças israelenses por terra, é de crer-se que o Conselho de Segurança das Nações Unidas avoque a questão, de forma a deter a maquinaria infernal da guerra. Nesse sentido, existem todos os motivos para que se detenham tais forças, através da pronta ação do Conselho.
        Para tanto, é indispensável o acordo das grandes potências, membros permanentes do CSNU, para que as hostilidades de parte a parte sejam detidas, sem ulterior derramamento de sangue, em especial de civis inocentes.


 ( Fontes:  Folha de S. Paulo, O Globo)