quinta-feira, 31 de maio de 2012

O Problema Sírio

                                       
       A primavera árabe pode ser fenômeno resolvido ou esquecido em outras paragens, mas a revolução síria, que já completou um ano, continua. Saída do extremo sul, em Deraa, o levante se estendeu por todo o país.
       Politicamente, o movimento abrange as diversas regiões dessa terra de passagem entre ocidente e oriente. Se nos atívéssemos ao choque das ideias, a posição do ditador Bashar al-Assad  seria insustentável. A revolta se alevanta em toda parte, tendo superado o macabro teto dos catorze mil mortos.
       Sem embargo, e malgrado a ampla rejeição sofrida, o regime alauíta se mantém por um conjunto de fatores, nos planos externo e interno.
       Do exterior, vem a blindagem de Vladimir Putin, com o seu veto no Conselho de Segurança, motivado não por humanas inquietudes com o povo da Síria, e suas diversas minorias, mas por determinantes militares e navais, como a sua preciosa base de Tartus, no Mediterrâneo oriental.
      Ainda na face externa, a despeito das sanções impostas pelo Ocidente e a quarentena diplomática, há um limite para tais arreganhos, o que tem facilitado as medidas da Federação Russa e de seu ocasional aliado da China Comunista, com o seu veto de cortesia.
      Essa falta de maior empenho – o que ocorreu na derrubada de Kaddafi, a que terá decerto contribuído o manancial petrolífero – ela se desnuda e se explicita nas tentativas de observação não-armada das atrocidades na Síria, a princípio pela Liga Árabe, e mais tarde pelo Plano Annan.
     Movidos pelo Qatar e a Arábia Saudita, os intentos iniciais de controle por missão da Liga fracassaram em resultado do despreparo de seus integrantes, assim como de não ter meios de impor a suspensão das hostilidades.
    O Plano Annan, ideado pelo ex-Secretário-Geral das Nações Unidas, ora naufraga por similares causas. Originado de resolução desdentada do Conselho de Segurança, por imposição da Federação Russa, o plano de seis pontos de Kofi Annan se vê a braços com adversário que torna a presença da Missão de Observação das Nações Unidas patética explicitação de suas lacunas.
    Annan corre sério risco de desmoralizar-se, menos pelo malogro efetivo de seu Plano, do que pela suposta hubris de havê-lo acalentado, contra um conjunto de circunstâncias que recomendaria maior cautela na elaboração e na aceitação da empresa.
     Bashar al-Assad poderá recebê-lo em múltiplas audiências e assentir formalmente a todas as exigências do ex-Secretário-Geral e Prêmio Nobel da Paz Kofi Annan. Bastará tê-lo pelas costas para que novos massacres irrompam, sempre perpetrados por esses fantomáticos terroristas armados, que nada mais são do que o braço castrense do regime alauíta, a dizimar crianças e civis desarmados, como no recente morticínio de Houla.
    Esse regime – que ainda dispõe de considerável força militar e do tácito apoio de muitas minorias, que veem no grito de democracia do levante o espectro das hordas sunitas – no exterior dispõe do auxílio também militar de Teerã. Por isso, a sobrevivência do ditador al-Assad não ocorre por acaso, não obstante o seu crescente isolamento político-diplomático.
    A oposição turca, capitaneada pelo Primeiro Ministro Recip Erdogan, é outra faceta  da coligação contrária a Assad. Derrotado na batalha da opinião pública, com a sua sucessão de atrocidades – o que torna Bashar um possível réu no Tribunal Penal Internacional da Haia – o ditador sírio corrobora o velho ditado das limitações de quem se sustenta pelo fuzil.
   Bashar não está, contudo, sozinho. Não é só a Rússia a protegê-lo com os seus vetos munificentes. Também o Irã tudo fará para evitar a queda do regime alauíta (uma hetorodoxa dissidência do ramo xiita), que tem fornecido até hoje condições para que o arrimo ao Hezbollah, no Líbano, pelos ayatollahs iranianos possa continuar.
    A dinâmica sunita – sob a liderança da Arábia Saudita e o ímpeto do emir do Qatar – se desencadeia contra a ditadura alauíta de Bashar movida a fortiori pela perspectiva de ulterior ganho estratégico contra o adversário xiita.        
    Tal escopo da aliança de Riyadh e Doha não seria, apenas, a cereja do bolo em disputa.
     No século XIX, o chamado grande jogo descrevia o embate, por interpostos meios, dos imperialismos britânico e russo, na sua luta pelo controle do Oriente Médio. Agora, no século XXI, os agentes podem ter mudado, mas os objetivos ainda têm muito a ver com a afirmação do poder.
     O problema na Síria, no entanto, essa histórica terra de passagem, concerne  e muito diretamente à respectiva população. Se o seu querer terá vez, os dias de Bashar al-Assad estão contados.





( Fontes subsidiárias: International Herald Tribune, New York Review )

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Notícias Direto do Front

                                 
Quarentena diplomática para Assad


      O último massacre perpetrado pelo regime de Bashar al-Assad não deixa possibilidade de negá-lo,partindo,então ditadura síria  para o que os franceses denominam la fuite en avant (a fuga para a frente). Sem uma desculpa convincente, Damasco optou por partir para a ignorância, apegando-se cinicamente a uma explicação sem pé nem cabeça.
      Com os desarmados observadores das Nações Unidas por perto, e documentada a mortandade, Bashar resolve uma vez mais apelar para a mentira deslavada, como o é a inculpação desses gangsters terroristas armados que só existem na imaginação de um regime que não trepida em liquidar crianças e outras vítimas indefesas.
     Revela-se inoperante a solução através do Conselho de Segurança, que seria obviamente o conduto lógico, consoante as funções prescritas a tal Conselho pela Carta das Nações Unidas.
     Como o novel Presidente Vladimir Putin não quer perder o aliado, nem sobretudo a base naval em águas do Mediterrâneo, qualquer causa que vá bater-lhe à porta está fadada ao fracasso. Com efeito, o veto russo continuará se acaso pleitear-se que se passe das inócuas repreensões e de um plano Annan desdentado, para qualquer coisa de mais efetivo. A importância que Putin dá à opinião pública, já se conhece pela maneira com que trata os opositores internos (o veto chinês vem a reboque do russo, e cairia tão logo gospodin Putin se convencesse da impossibilidade de mantê-lo).
    Para que tal ocorra, no entanto, o autocrata do Kremlin terá de sentir na carne o desgaste de tal negativa. Posto que existirá sempre algo que o constranja a rever as suas presentes diretivas, no momento ele singra um mar de almirante, não encapelado por contestações que lhe custem caro.
   A atual reação do Ocidente, com a retirada de seus embaixadores de Damasco, se aperta o cerco diplomático ao regime alauíta, ainda não é coisa de tirar o sono do ditador.
   Nesse contexto, a atitude da diplomacia brasileira, retendo o chefe de missão, a pretexto de ‘manter aberto um canal de diálogo com Damasco’, está mais no campo do humor negro do que de diretivas de um país sério.


A Crise do Mensalão


    Cada cabeça, cada sentença.  Há comentários relativos ao incidente Lula x Gilmar Mendes que demonstram o quanto a massa bruta dos fatos tende a  ser muita vez apenas ingrediente das interpretações dos colunistas. Muitos – por sorte não a totalidade – verão nos fatos a confirmação de suas antigas prevenções  e suspeitas.
    A hubris de Lula da Silva, saído de grave doença, e acreditando-se capaz de insinuar proteções (que podem virar ameaças); o irrequieto Gilmar Mendes, cujo comportamento pregresso induziria ao trato daqueles remédios, a serem usados com cautela; e o anfitrião do encontro, que dá várias explicações para o estranho encontro – o que fazer dessas personalidades da República ?
    A linguagem está aí para ser decifrada. Que tal iniciar sem mais postergações o juízo do mensalão ? É hora do Ministro Ricardo Lewandowsky completar o seu parecer de revisor. Afinal, como já lhe foi dito, ele não terá interesse em ser havido como o ‘coveiro do mensalão’.
    Sob a presidência de Ayres Britto, a relatoria de Joaquim Barbosa, e a promotoria de Roberto Gurgel, é hora dos hábeis advogados se calarem por um instante para que esta causa célebre seja ouvida, defendida e julgada.
   Enquanto espoucam os fogos de artifício da CPMI do Cachoeira, que semelha no célere caminho da proverbial pizza da confraternização, não será o caso de julgar o que deve ser julgado, e decidir o que deve ser decidido, nesse tão sofrido e interminável processo do Mensalão ?




( Fontes:  Folha de S. Paulo, O Globo ) 

terça-feira, 29 de maio de 2012

Ainda o Encontro Lula - Gilmar

                                        
       A imprensa se delicia com o pratarraz da reunião Lula da Silva – Gilmar Mendes, intermediada pelo amigo Walter Jobim. É notícia da véspera, ou a dizer verdade – um artigo aliás bastante esquivo – da antevéspera, ou até do mês anterior.
       No entanto, em meio a gritos e impropérios, às versões contrapostas, a comentários alimentados por alianças eletivas e antigas prevenções, há dois caminhos que podem levar ao mesmo destino.
      Como elemento subsidiário, para afastar as névoas da dissimulação, a evidência e a probabilidade maior são critérios válidos para afirmar a maior verossimilhança de uma hipótese contra as fumaças das negativas e da fuga da responsabilidade.
     Na sua tarda missão de impedir ou atrasar o julgamento do mensalão, parece difícil contestar o propósito do ex-Presidente Lula da Silva de encontrar-se com o Ministro Gilmar Mendes, do Supremo.
     Afastada a implausibilidade de um encontro fortuito no gabinete do ex-Ministro e amigo comum Walter Jobim, que outro tema levaria o ex-Presidente Lula a agendar esse encontro ?
     Assinale-se que ele se declara indignado com a acusação, mas o seu comunicado não aduz nenhum outro motivo para a reunião além de seu caráter ‘ocasional’. Ora, na reconstituição da coluna de Merval Pereira, se indica que Jobim convidara Gilmar Mendes a instância de Lula. Lá se vai o caráter acidental da reunião... Para a ‘indignação’ do ex-presidente se faz necessária outra razão, que não é apresentada.
    Existe também  correção a comentários de fontes jornalísticas  que maliciam o atraso de Gilmar Mendes em divulgar o que ocorrera em fins de abril. Com efeito, como assinala a reconstituição de Merval Pereira, Gilmar revelou o fato ao procurador-geral da república, Roberto Gurgel, ao advogado-geral da União, Luis Inácio Adams e ao presidente do STF, Ayres Britto, antes que o caso fosse publicado por ‘Veja’. O segredo já não era tão exclusivo quando foi divulgado pelo semanário.
    Dentro do molde conhecido – procurar um terceiro que haja sido o ‘padrinho’ junto a Lula de indicação ao Supremo (V.,v.g., Sepúlveda Pertence e a Ministra Carmen Lúcia) – em almoço no Palácio da Alvorada, a convite de Dilma Rousseff, Ayres Britto, que não viu malícia na observação, recorda ter-lhe Lula perguntado sobre Celso Antonio Bandeira de Mello (que passa por guru do atual presidente do STF), dizendo que qualquer dia desses os três tomariam um vinho juntos.
    Nesse contexto, no mínimo o ex-presidente toma atitudes suscetíveis de serem mal interpretadas, no seu afã de adiar o julgamento do mensalão para depois das eleições municipais de outubro.
   O rosario de reações dos Ministros do STF não se afigura de resto favorável ao cometimento de Lula da Silva. Para o decano do Supremo, Celso de Mello, o comportamento de Lula foi indecoroso. Nesse sentido, declarou que o ex-presidente poderia ser alvo de impeachment se ainda estivesse no cargo.
    O mensalão parece perseguir Luiz Inácio Lula da Silva. Como recorda Merval Pereira, esta seria a segunda vez que tal escândalo ameaçou levar-lhe à beira do impeachment. A primeira, pelo fato em si, que o constrangeu a pedir desculpas ao povo brasileiro e a dizer-se traído, em pública admissão da gravidade de o que acontecera.
    Desta feita, a desenvoltura do ex-Presidente desvela que lhe está faltando um quê de sensibilidade, para não meter-se em vespeiros nessas missões impossíveis.
   Nos comentários e imagens desencontradas que essa empresa mal encetada e mal continuada, talvez o retrato mais devastador seja a caricatura de Chico, com Lula e Gilmar sentados,e o ex-presidente a ver-se com a mão colhida por ratoeira, enquanto exclama ‘Ops! Foi mal...’
   A verdade pode ser incômoda presença, se se pretende denegá-la ou adulterá-la. E quanto maiores os esforços em fazê-la desaparecer, mais ela avança, com o seu sorriso largo, por vezes desdentado, a desmoralizar quem desejara enfurná-la entre os caniços de pantanosas margens...



( Fontes:  O Globo, Folha de S. Paulo, Veja )

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Carta para o Presidente Roberto Dinamite


        é amarga a taça da eliminação da Libertadores, em jogo onde o Vasco teve uma certa superioridade em campo, até chegar o momento decisivo, em que Diego Souza não logrou fazer o gol que nos daria a classificação.
       Recordo-me de episódio semelhante na partida Barcelona x Chelsea, em que atacante do time inglês não desperdiçou a oportunidade, driblando o goleiro e decidindo o jogo.
       No entanto, a direção agiu bem não responsabilizando o jogador. A má-sorte é difícil de tragar, mas não deixa de ser um fator a ser computado.
       O Clube de Regatas Vasco da Gama tem que ver o ocorrido, a despeito de tudo, sob uma luz positiva. Não foi por acaso que nosso time chegou tão longe.
      Não seria a solução adequada, portanto, liquidar o Vasco como grande equipe. Não se pode esquecer que a escalação do Vasco é o seu maior patrimônio. Um tropeço não será motivo para desfazer-se de um capital alinhado com dificuldade e muito esforço. Não nos interessa enfraquecer o Vasco, o que representaria uma atitude burra, que nos faria regredir no Campeonato brasileiro, ao vendermos o que temos de mais precioso.
      Temos que lutar pelos jogadores, montar um esquema mais sério de apoio ao time, e não estar continuamente de pires na mão, como antes, com o atraso das remunerações, e agora com a irresponsável disposição de estropiar o nosso plantel, transformando o CRVG em timinho e não na equipe de grande tradição, com uma torcida espalhada por todo o Brasil.
     É uma vergonha o tratamento dispensado a Juninho, as promessas feitas e não cumpridas. Será tão difícil para um time com nossa história  obter um patrocínio que realmente corresponda ao tamanho de nossa torcida ? Ao invés de todo esse malabarismo, sem centro de treinamento, com salários atrasados,  e sem pagar nem fundos de garantia nem direitos de imagem, o clube apresenta um quadro contristador, em que falta quase tudo (planejamento, competência), mas ainda resta o esforço individual e de conjunto dos atletas.
      Como o Vasco, presidente, o senhor também tem história. É tempo de honrá-la. Promessas e improvisação nada resolvem. Se outras equipes logram ter  sustentação e folha de pagamento, o Vasco se realmente pretende  tornar-se  equipe sólida e respeitável precisa ter um mínimo de organização e planejamento.  
     Basta de amadorismo !


Notícias do Front (21)

                                  
Sinais de Descontrole


      As revelações da revista Veja sobre a desenvoltura do ex-presidente Lula da Silva fundamentam reações como na coluna  semanal de Ricardo Noblat em O Globo.
     Com efeito, a falta de medida de Lula procurando inviabilizar o julgamento do mensalão levanta indagações sobre a hubris do ex-mandatário, que parece desconhecer limites quanto ao bom senso de suas intervenções.
     Mesmo sem entrar em considerações éticas,  já a CPI do Cachoeira desvela falta de tino político. A tentativa de instrumentalização de uma CPI não é procedimento aconselhável neste gênero de investigação parlamentar. Para uma ferramenta da política brasileira que mais recorda canhão solto em convés de velho galeão, é necessária muita presunção pensar que se possa mantê-la sob controle.
    De resto, poucas são as CPIs que não viram pizza. A atual parece já bem encaminhada nesse sentido.
    Por outro lado, os desastrados contatos de Lula de interferir no juízo do mensalão podem criar na alta corte ambiente oposto ao das intenções do ex-presidente. O próprio comentário do ministro decano do STF, Celso de Mello, considerando indecoroso o comportamento de Lula – e passível de impeachment se ainda estivesse no cargo – lhe sublinha o garrafal erro de apreciação.
 

Sinais de Descontrole (II)  

      
    A inchação das vagas de vereador para a próxima eleição – segundo O Globo haverá mais 3.672 edis – é um fenômeno abusivo e contrário ao interesse do país e do próprio povo.
    Recente iniciativa da população de um município de impedir tal crescimento foi atalhada por corte de justiça, em decisão que merece ser reavaliada. Afinal, o Povo é ou não soberano ? Quero crer que tal palavra não está sem propósito no preâmbulo e no artigo 1º  da Constituição de cinco de outubro de 1988.
   Tais bondades desse Congresso das quartas-feiras deveriam ser revertidas, dado o inútil dispêndio provocado por essa irresponsabilidade.
   Há cabimento  aumentar de nove para vinte e um o número de vereadores em Teresópolis, município que ainda sofre dos efeitos da calamidade de 2011?
   Por outro lado, para uma atividade que muitos desejam  gratuita, os aumentos tanto na remuneração (como o da Gaiola de Ouro no Rio de Janeiro), quanto no número de cadeiras implica em descontrole de despesa, sem qualquer contrapartida no aporte dessas câmaras para as respectivas coletividades.
 

O Médico condenado pelo Conselho Tribal    

  
    Conselho Tribal da Região Khyber, no norte paquistanês, considerou culpado o médico Shakil Afridi de ação contra os interesses do Estado. Nesse sentido, o médico paquistanês foi enquadrado em regulamento que data dos tempos do Raj britânico, sendo-lhe aplicada a pena máxima de 33 anos de detenção, com multa equivalente a US$ 3,500.00
      Nessa corte tribal – na qual o réu não pode defender-se diretamente – o Dr. Afridi foi inculpado de empregar campanha de vacinação contra a hepatite como artifício para obter dados de DNA.
     A aplicação da pena em questão lança mais luz sobre as relações entre Estados Unidos e Paquistão, a par de merecer ações e comentários contrastantes das duas partes, o que tende a fornecer ulteriores elementos sobre o atual estágio desse relacionamento. 
      Consoante alta fonte autorizada dos EUA, ‘nunca se pediu ao doutor espionar o Paquistão. O que lhe foi pedido foi ajudar na localização de terroristas da Al Qaida, que ameaçam o Paquistão e os Estados Unidos. Ele auxiliou na salvação de vidas  paquistanesas e americanas’.
      Por sua vez, de acordo com funcionários da segurança no Paquistão, sob interrogatório o Dr. Afridi admitiu ter ajudado a CIA antes do raid dos Comandos ‘Navy Seals’, que matou Osama Bin Laden, em maio de 2011. Essa operação enraiveceu os funcionários paquistaneses, que não foram dela informados previamente, e que a encararam como uma violação da soberania nacional.
     Conforme as fontes locais, o Dr. Afridi teve sorte em ser julgado sob o código tribal, oriundo da época colonial.Se o tivesse sido pela legislação paquistanesa, teria sido enquadrado na pena máxima, que é a de morte.
 

( Fontes: Veja, O Globo, International Herald Tribune )

domingo, 27 de maio de 2012

Colcha de Retalhos CXIV

                                 
As matanças de al-Assad e a farsa do Plano Annan.


       O chamado Plano Annan continua, na prática, a permitir o morticínio de rebeldes pelas tropas do ditador Bashar al-Assad.
      A presença de observadores, mesmo em maior número, não tem qualquer poder para conter as mortes de opositores ao regime alauíta. Com efeito, o veto da Federação Russa e a reboque da China Comunista  impede que se dê ao contingente das Nações Unidas qualquer capacidade de efetiva contenção dos ataques do exército sírio.
     O seu papel se limita exclusivamente a testemunhar as atrocidades do déspota. Como na tragédia da aldeia de Houla, com mais de cem mortos civis, dos quais 32 crianças.
     Tampouco os observadores podem impedir ações das forças de Bashar. A ponto de que haja a possibilidade de maior envolvimento do Líbano, em função da criminosa desenvoltura das ações repressivas das divisões do regime.
    Diante desse comportamento de cínico desrespeito ao cessar-fogo, que transforma os capacetes azuis desarmados em meros espectadores de um massacre programado, o Reino Unido convoca o Conselho de Segurança das Nações Unidas. Mantido a afrontoso desafio de parte das forças de al-Assad  a qualquer medida de contenção dos abusos e da violência, a prorrogação nesses termos do Plano Annan implica em um alibi para tais ações que violam qualquer simulacro de suspensão das hostilidades.
     Será possível que a virtual licença para matar  – viabilizada pela recusa do governo Putin em dar condições para armar a tropa das Nações Unidas – continuará a vigorar, ao arrepio do direito internacional humanitário e da indispensável proteção dos opositores sírios contra as atrocidades praticadas pelo tirano Bashar e seus esbirros ?


A Crise na União Europeia


    Ainda que François Hollande tenha iniciado a sua gestão por um primeiro encontro com a Chanceler alemã, Angela Merkel, essa barretada tem sido interpretada mais como um gesto formal, do que propriamente como confirmação da diarquia, que com Nicolas Sarkozy havia assinalado a associação franco-germânica.
    Hollande tem enfatizado o crescimento, ao contrário da austeridade. No que tange aos euro-bonus, a sua contraposição a Berlim é marcada, através do apoio à sua emissão, em atitude oposta àquela preconizada pela Alemanha.
   Sinalizando a confiança do mercado na economia alemã, o lançamento por Berlin de títulos da dívida alcançou a soma de aproximadamente quatro bilhões e seiscentos milhões de euros. O rendimento oferecido para esses títulos de dois anos de vencimento é de 0.07%, é baixíssimo, o que reflete a confiança do inversor no tesouro alemão.
   Nesta semana entrante, o encontro informal em Bruxelas dos chefes de governo do U.E. poderá evoluir ou para uma contraposição entre a austeridade defendida pela senhora Merkel e o crescimento advogado pelo novel presidente francês. Especula-se sobre um possível isolamento da posição alemã, com o favorecimento de lançamento de euro-bonus pelo BCE, em que a crise financeira na União seria enfrentada pelo lançamento de títulos em que todos os dezessete membros da Zona do Euro partilhassem a responsabilidade pela dívida europeia (a que se opõe atualmente a RFA).
     No entanto, esse total isolamento da Merkel semelha pouco provável. A par dos países endividados, como a Itália e a Espanha, assim como os casos mais graves (Grécia, Portugal, Irlanda), existe também aqueles com a casa em ordem, como Finlândia, Áustria e Holanda. Em uma eventual negociação, os países com o dever de casa em ordem tenderiam a associar-se com a posição alemã.
     Por outro lado, há dúvidas quanto à estruturação dos euro-bonus. É difícil conceber que  Berlin e seus aliados concordarão com a emissão de bonus que valham como um cheque em branco para cobrir a dívida grega. Discute-se acerca das modalidades mais prováveis. Nesse sentido, se julga mais viável uma espécie de sistema híbrido, em que somente uma parcela da dívida é assegurada em conjunto, ou nele só se admitiria a participação de estados-membro com a sua dívida total abaixo de certa percentagem do PIB.  
     Nesse particular,a singularização da posição da Chanceler Merkel é enganosa, eis que a recusa a essa flexibilização creditícia é uma postura alemã, e não um capricho personalista da chefe do governo. Falando em ‘off’ uma autoridade financeira germânica disse não haver ‘base legal’ para os euro bonus  que estariam ‘expressamente proibidos’ pelos tratados da União Europeia.[1]
        De qualquer forma, somente após o dezessete  de junho, com o resultado das novas eleições na República Helênica estariam criadas as condições para o encaminhamento da crise em Atenas. Se a consulta repetir-se com a negativa do eleitorado em uma solução do problema segundo os parâmetros anteriores, se passaria a uma nova fase da crise, agora irrevogavelmente alargada para a Zona do Euro.


A estranha campanha de Lula


      A revista Veja deste fim de semana publica reportagem sob o título “Um Ex defende seu legado”.  De acordo com o semanário seria ‘quase patético o esforço de Lula para reescrever o capítulo mais sombrio de seu governo, o mensalão. Seu foco agora é o Supremo Tribunal Federal, onde os 36 réus do escândalo serão  julgados.’
       Com efeito, no entender de Veja ‘as abordagens impróprias e os comentários de Lula sobre os juízes da corte têm causado contrangimentos’.
      A esse respeito, após reunião no gabinete do ex-Ministro Nelson Jobim, agendada a pedido do ex-presidente, o Ministro Gilmar Mendes disse: “Fiquei perplexo com o comportamento e as insinuações despropositadas do presidente Lula”.
       O ex-presidente estaria empenhado em apagar da história o capítulo do mensalão. Depois de uma série de intentos, que não teriam rendido os efeitos esperados, de acordo com a revista, Lula pôs em pauta “ um plano B, um conjunto de ações temerárias que consistem na abordagem direta ou indireta dos ministros do STF. Lula tomou para si essa missão.”
      Dentre as abordagens diretas, estariam o Ministro Gilmar Mendes e o atual Presidente da Corte, o Ministro Ayres Britto. Nas indiretas, estaria a Ministra Carmen Lúcia (Lula encarregaria do convencimento o ex-Ministro Sepúlveda Pertence).



Eleição Presidencial no Egito


     O primeiro turno da eleição egípcia,  com grande afluxo popular, decidiu sobre o embate decisivo entre o representante da Fraternidade Muçulmana, Mohamed Morsi e  o ex-Primeiro Ministro do governo Mubarak, Ahmed Shafik.
     Morsi obteve cerca de 25% dos sufrágios, seguido por Shafik, com um pouco menos. Refletindo o parcelamento dos votos, dois outros candidatos obtiveram totais aproximados de 20% respectivamente (Abdel Moneim Abul Fotouh, como islamo-liberal e Hamdeen Sabahi, um populista secular, opositor de Mubarak em causas de interesse dos pobres). O quinto lugar coube a Amr Moussa, ex-ministro do exterior e ex-secretário-geral da Liga Árabe, com plataforma um pouco mais conciliatória do que a de Shafik.
      Enquanto Morsi teve de reverter às posições da Fraternidade, Ahmed Shafik defendeu uma linha de lei e ordem. General reformado da Força Aérea, Shafik se apresentou como defensor da ordem, prometendo controlar o poder da Fraternidade e  os protestos de rua.
      Os resultados definitivos tardarão alguns dias. O resultado do segundo turno dependerá do jogo das alianças. O complicador adicional é que a extensão dos poderes constitucionais do futuro Presidente ainda não está definida. O comitê encarregado da redação da Carta enfrenta um impasse, que reflete a disputa entre islamitas e liberais.
       Por força de contestações de outros partidos da linha islâmica, houve uma inflexão para a direita do candidado da Fraternidade. Por outro lado, Shafik promete basicamente ordem e estabilidade. Dada a extensão da rede de sustentação do partido mais antigo do Egito, o representante da Fraternidade Muçulmana parece ter maiores possibilidades de vitória.
 



( Fontes: International Herald Tribune, O Globo, Veja)   



[1] A expressão ‘ausdrücklich verboten’, dita e repetida por bigodudo soldado do Kaiser, na obra-prima pacifista de Jean Renoir ‘La grande Illusion’, frisa o pendor alemão por essa frase ritual. Também aqui seria o caso de perguntar-se se a ênfase reflete igualmente negativa peremptória.

sábado, 26 de maio de 2012

Os Vetos ao Código Florestal

                                 
       É confusa a primeira reação de ambientalistas e ruralistas às modificações introduzidas pela Presidente Dilma Rousseff ao projeto do Código Florestal aprovado pela Câmara de Deputados.
        Tal se deve sobretudo à circunstância de que muitas das alterações ainda não são conhecidas plenamente. Ao contrário do veto total ao projeto votado na Câmara, recomendado pela ex-Ministra Marina Silva e as associações ambientalistas, Dilma optou por doze vetos parciais, assim como a edição de Medida Provisória com mais trinta e duas modificações ao texto do Relatório Piau.
       As mudanças são, portanto, 44.  A reação dos ruralistas foi mais moderada do que a dos verdes. Nesse sentido, o presidente da ‘Frente Parlamentar da Agropecuária’, deputado Homero Pereira (PSD-MT) julgou os cortes mais ‘palatáveis’do que o esperado. Sem embargo, o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) critica acerbamente o uso da MP para recompor o texto modificado do código: ‘O governo não pode editar medida provisória sobre matéria já votada  e aprovada no Congresso antes que analisemos os vetos. Isso é inconstitucional.’ Por isso, Caiado ameaça ir à Justiça contra a MP que será publicada no D.O. de segunda-feira.
      A tônica da reação ambientalista se deve a duas causas básicas: o movimento preferia o veto total ao projeto da Câmara, assim como ao fato de que o teor das alterações introduzidas pelo Poder Executivo ainda não são conhecidas na íntegra.
      Somente com a sua reportada publicação no Diário Oficial que circulará na segunda-feira se poderá ter conhecimento mais amplo e detido de  matéria sem dúvida complexa.
     Segundo se informa, a análise do Código teve acompanhamento direto pela Presidente, que nos ‘últimos dez dias (...) comandou as reuniões pessoalmente e fez questão de repassar ponto a ponto os vetos e as mudanças’.
     A principal mudança é a exigência de recuperação da vegetação destruída nas margens dos rios. O relatório Piau desfizera uma das medidas básicas na preservação ambiental que é a Area de Preservação Permanente (APP), com largura variável segundo a caudal do rio respectivo.
     Nesses termos, todos os produtores rurais que desmataram margens de rios até 22 de julho de 2008 serão obrigados a recuperar a vegetação. A recomposição será proporcional ao tamanho da propriedade. Vale dizer, os grandes proprietários terão que recompor faixas maiores do que os pequenos.
     Essa preocupação do governo levou à elaboração de uma tabela (‘escadinha’) em que a restauração se graduará pela extensão da propriedade agrícola.
    A intenção, consoante assinalou a Ministra Izabella Teixeira, do Meio Ambiente, foi ‘a de evitar insegurança jurídica e inconstitucionalidades. Mas principalmente, para não anistiar o desmatamento, não permitir a redução da proteção do meio ambiente, promover a restauração ambiental e o interesse público.’ Em resumo, na visão da Ministra ‘ Não tem anistia’.
    Resta agora verificar se o governo Dilma Rousseff terá condições de manter os respectivos vetos e fazer aprovar a Medida Provisória que complementa a sua reformulação do texto ruralista que fora aprovado pela Câmara.
      Dada a composição da Câmara e o consequente desequilíbrio na representação do sentir da opinião pública nacional, não será tarefa fácil vencer a bancada ruralista, artificialmente inflada pela Constituição de cinco de outubro de 1988. Com efeito, os estados do Norte e Nordeste tem representação aumentada, em consequência da desigualdade do peso do voto para a eleição da Câmara. É o chamado ‘efeito burgo podre’ a que me tenho referido em diversos blogs.  
     Será possível manter os vetos de Dilma, se houver a necessária arregimentação, assim como mantida a disciplina na base de apoio do governo. Ainda que os vetos da Presidente não possam restabelecer a qualidade anterior do Código Florestal vigente, eles representam indubitável melhoria em relação à votação da Câmara. Importa, por conseguinte, que a posição presidencial seja respeitada, e não se repitam episódios como o da rebeldia do lider Henrique Alves (PMDB-RN) com toda a bancada do PMDB.



( Fontes:  O Globo e Folha de S. Paulo )

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Não querem falar com o grego Tsipras

           
       A Velha e austera senhora da União Europeia fechou as portas para o deputado Alexis Tsipras, líder da Syriza.
      O escopo do novo expoente político  – catapultado pela crise em seu país para encabeçar o segundo  principal partido grego – terá sido eivado da impetuosidade dos principiantes.
      Motu proprio, resolveu ele visitar as duas maiores autoridades da cena europeia: Angela Merkel e François Hollande. O propósito seria o de apresentar  suas ideias para esses dois personagens. Partia do talvez algo juvenil pressuposto de que os representantes da diarquia acederia, malgrado o radicalismo de suas posturas, em ouvi-lo. Afinal de contas, terá pensado, fui convocado pelo Presidente Karolos Papoulias para tentar formar um gabinete. Além disso, não foi por capricho da Deusa Fortuna. Constitucionalmente, lhe assistia o direito de participar desse exercício, depois de Antonis Samaras, líder dos conservadores, e antes de Evangelos Venizelos, chefe do Pasok.
     Decerto, o atraiu a perspectiva de que o recém-eleito socialista François Hollande atenderia ao seu pedido. No fim de contas,ele vencera o conservador Nicolas Sarkozy sob a bandeira do estimulo ao crescimento econômico e não o da austeridade. No entanto, o esquerdismo de Hollande tem limites, e ele preferiu não conceder ao grego Tsipras – que no momento, além de chefe da Syriza, é deputado ao Parlamento helênico  - a oportunidade de uma audiência.
     Se em Paris a sorte lhe foi madrasta, resulta difícil acreditar que Tsipras haja considerado ter alguma chance em ser recebido pela própria antítese da sua proposta política. Angela Merkel persiste no seu apego extremado à austeridade. Dado o desafio colocado pela eventual superveniência do temido calote de Atenas, há uma compreensível movimentação nos gabinetes europeus e no BCE para encontrar uma resposta para a crise. Se a Chanceler Merkel pode acabar isolada na sua inflexível pertinácia da receita da austeridade como solução para a crise do euro (e da Grécia, entre outros países), diante do nascente polo alternativo alicerçado pelas urnas – ao contrário da sucessão de reveses que a Merkel vem colhendo nos Länder alemães – não se pode excluir que as respostas para a crise europeia não mais sejam da espécie do samba de uma nota só que prevalece até o presente.
      Não me reporto a pescadores de águas turvas – como tem sido o Primeiro Ministro David Cameron, que julga poder dar o troco de suas desventuras na U.E. com predições acerca do próximo descalabro do euro – mas se afigura sempre mais provável que a saída keynesiana para a crise venha a colher um número crescente de adeptos.
      Nas suas palavras em Berlim, Tsipras afirmou: “Estendemos a mão para todos os lados do espectro político,não viemos aqui para chantagear quem quer que seja, viemos para discutir. Queremos uma troca de ideias e pensamos que aqueles temerosos do diálogo não estão preparados para debater, talvez por que tenham uma consciência pesada”.
     Se na Alemanha, o seu anfitrião – o Partido da Esquerda – atravessa momento difícil, em que a sua liderança é contestada, no dia anterior, na França, o interlocutor foi o quarto colocado no primeiro turno, Jean-Luc Melenchon.
      Não tendo a excursão europeia do lider da Syriza saído com o figurino previsto, a inexperiência de Tsipras provocou previsíveis censuras na frente interna.
     Para o virtual segundo turno nos comícios gregos, a dezessete de junho, há uma tentativa da Nova Democracia (conservadores) de Samaras de reforçar a sua bancada. Nesse sentido, Dora Bakoyannis, filha do antigo Primeiro Ministro Konstantinos Mitsotakis, tentara em 2009 assumir a liderança partidária, mas foi derrotada por Samaras. Agora, realiou-se com Samaras, e suspendeu a atividade de sua Aliança Democrática (que não preencheu a quota de 3% necessária para o ingresso no Parlamento). Outro partido de direita – o Laos- que também não lograra alcançar o limite dos 3%, está sendo incorporado na Nova Democracia, no intento de que atinja o número suficiente para fazer jus ao ‘bônus’ de mais 50 deputados, atribuídos pela Constituição helênica ao partido majoritário, com vistas a assegurar a governabilidade.
     É de notar-se que E. Venizelos do Pasok foi recebido às pressas pelo Presidente François Hollande, em uma audiência obviamente arranjada, dada a negativa do Elysée em agendar entrevista com o radical Alexis Tsipras.
     Na pequena Grécia, para onde se dirigem as atenções dos governantes da União Europeia, a próxima eleição poderá dar a sinalização para o eventual encaminhamento  da crise. Dada a circunstância  de que a insatisfação popular com a situação da República Helênica volte a manifestar-se nas linhas precedentes, com a permanência do calote de novo saindo das urnas, não surpreende  que Berlim (e Bruxelas) acenem com possibilidades de lidar de forma pró-ativa com a reiteração de tal desafio.
     Qualquer que seja o resultado, semelha difícil visualizar a formação de gabinete do tipo do encabeçado por Lucas Papademos, tão cordato e disposto a cumprir todas as exigências da Chanceler Angela Merkel.



(Fonte subsidiária: International Herald Tribune)   

Será Obama reeleito ? (II)

                             
       A que se deve a prolongada resistência das bases republicanas a Mitt Romney ?  Na fase inicial das primárias do GOP, vários pré-candidatos assumiram a liderança. O governador do Texas, Rick Perry foi um desses. Outro foi o afro-americano e ex-executivo do Burger King, Herman Cain. Mais tarde surgiram Newt Gingrich e Rick Santorum.
      A tônica de todos eles residia na circunstância de serem conservadores de boa cepa. Entrementes, observado e encorajado pela direção partidária, e dispondo da melhor estrutura organizacional de campanha, lá estava, sorridente e disponível, Mitt Romney.
      Todos  tiveram antes de Mitt os seus quinze minutos de notoriedade. Foram considerados candidatos aptos a ambicionar a sagração em Tampa, mas por esta ou aquela razão (incompetência, escândalos pessoais pregressos, a própria falta de estrutura para enfrentar o ordálio das sucessivas primárias) eles foram ficando pelo caminho, até que, temeroso de ser humilhado na sua natal Pennsilvania, o ultra-conservador Rick Santorum renunciou à postulação. No final, até o solitário e libertário Ron Paul – que não venceu nenhuma primária – terá mostrado disposição de não mais concorrer.
      Mitt Romney ficou sozinho no picadeiro. Desde o princípio, tivera apoio entre 25 a 28% das preferências. Se a maioria dos republicanos timbrou por longos meses em ignorá-lo como alternativa válida,  sua organização (é a segunda vez que disputa a presidência), sempre bem azeitada em termos de finanças, com o passar dos meses foi engrossada por  afluxo de notáveis, até que Jeb Bush, o irmão de George Bush Jr. e ex-governador da Flórida, se tornou a virtual cereja do bolo.
     Feita no momento exato, a sua intervenção veio culminar a série encetada pelo governador de New Jersey, Chris Christie. O apoio deste último, que chegara a examinar a possibilidade da própria candidatura, representou o primeiro endosso importante para Mitt. E agora, o preferido do clã Bush vinha praticamente selar o entendimento do GOP de que o ex-governador de Massachusetts deveria ser ungido.  Basta de divisão e de querelas intestinas ! Era chegada a hora da união em torno do candidato natural.
    Nesse contexto, com a abrupta saída de Santorum, a persistência de Gingrich, falto de recursos e de votantes, o condenava à irrelevância.
     Se Romney semelha, dessarte, destinado a ser designado em Tampa como o campeão republicano contra o dragão Barack H. Obama, o que desvendou a seu respeito o processo sempre desgastante das primárias ?
     A militância conservadora republicana – os moderados no GOP são espécie virtualmente extinta – não engole as credenciais conservadoras de Mitt Romney. Nesse contexto, é oportuno frisar que o ex-governador de Massachusetts não ganhou em nenhum estado do Sul americano. Como não se desconhece, o Sul bandeou-se para o GOP depois que o Partido Democrata, sob a liderança do texano Lyndon B. Johnson (1908-1973), o 36º presidente, implementou a revolução nos direitos civis e o fim da segregação racial.
     Por isso, essa primeira interrogação perdura: até que ponto continua a rejeição dos votantes republicanos sulistas contra Romney ?
    Em que se baseia esta postura da base ? No fato de que Mitt seria um flip-flopper, vale dizer alguém que não possui sólidas convicções conservadoras. Assinale-se que foi na governança de Romney em Massachusetts que foi aprovada uma reforma sanitária estadual que é perturbadoramente semelhante à Lei da Assistência Sanitária Custeável. Mais tarde, já pré-candidato, Mitt se dissocia da reforma da saúde estadual, havendo tardiamente descoberto os vícios redibitórios de uma lei socialista pela qual se empenhara enquanto governador. Decerto, terá contribuído para essa luz interior do candidato que a nova lei federal tinha sido aprovada pelo Congresso sem um voto sequer do GOP. Embora em algum debate futuro e ao ser porventura relembrado de assertivas suas em favor da sua lei estadual,talvez venha a encontrar  dificuldade em explicar para a opinião pública essa cambalhota eleitoral. O virtual candidato republicano à Presidência espera que a sua nova posição seja entendida e aceita.
        Mitt Romney dispõe de assessoria razoavelmente organizada e de fundos abundantes para a campanha. O problema é que às vezes resolve improvisar, e as gafes resultantes podem ser manancial não desprezível para os adversários.
        Será ele realmente o moderado que deseja cativar o voto independente ? São conhecidas as suas posições com relação à pobreza. Em jantar para coletar fundos na Florida, Romney foi ouvido dizer que tenciona cortar fundo (slash) programas de assistência.
        Ainda no campo da insensibilidade social, serão também relembradas as respectivas propostas de eliminar o Título X, o único programa federal dedicado ao planejamento familiar; de deixar o processo hipotecário seguir o seu curso (com a tomada da residência do morador inadimplente);  apresentação de política imigratória à direita das de Rick Santorum e Newt Gingrich.
        A par de sua observação sobre a pobreza e o que manifesta de calejado menosprezo dos desafortunados, Romney e a liderança republicana concertam estratégia comum para criar um novo impasse sobre a dívida. Não é nem floreio oratório nem por acaso que a imagem do incêndio nas campinas (prairie fire) é assimilada à dívida pública pelo candidato,  ‘ameaçando Iowa e nosso país’.
         Romney deseja explorar o que entende ser a maior vulnerabilidade de Obama, i.e., a economia. Pesquisas do Gallup comparam a presente  atmosfera com anos anteriores em que presidentes procuravam reeleger-se: ‘o clima atual se parece mais com os anos em que os presidentes em exercício perderam, do que com o tempo em que ganharam’.
         O speaker John Boehner se mostra, por outro lado, disposto em criar condições para um novo showdown (embate) quanto ao orçamento (e ao teto da dívida pública).  O escopo seria embaraçar o presidente Obama com nova crise orçamentária. Quanto ao teto da dívida, o Secretário do Tesouro, Timothy Geithner estima que seria atingido para o fim do ano, posto que o Tesouro disponha de instrumentos (tools) suficientes para manter a situação sob controle até princípios de 2013. Nessas condições, a margem de recursos levaria o embate do teto da dívida para depois da eleição de novembro, o que tornaria irrelevante a artimanha republicana.    
         Com a experiência havida na crise anterior, é de esperar-se que Barack Obama saiba enfrentar o desafio desta feita com maior proficiência e autoridade. Também é lícito contar com o açodamento republicano, provocado não só pelo ano eleitoral, senão pela inebriante perspectiva de voltar à Casa Branca. Tal impetuosidade – que se reflete nos quatro projetos do GOP de orçamento – merece o seguinte comentário do líder da maioria no Senado, o democrata Harry Reid: ‘Por sua natureza, esses projetos não são sérios. Estão aí só por causa do show.’
        Tal falta de seriedade no tratamento de assuntos de Estado, que envolvem os interesses da comunidade nacional como um todo, pode representar mais um tiro pela culatra nos algariados planos do Partido Republicano para os comícios de seis de novembro.




(Fonte:  International Herald Tribune)  

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Será Obama reeleito ?

                                      
        Os principais pesquisadores políticos não se aventuram, por ora, a prognósticos para a eleição presidencial de seis de novembro.
        Barack Obama hesitou demasiado no primeiro biênio de seu mandato. O livro de Ron Suskind, Homens de Confiança, a que já me referi neste blog, relata os erros cometidos. O presidente, por inexperiência executiva, e insatisfatória assessoria política e econômica, não se valeu do controle das duas Casas do Congresso em uma luta efetiva contra a grande Recessão.
       A principal conquista desse biênio 2009-2010 foi a Lei da Assistência Sanitária Custeável, que ora corre o pesado risco de ser considerada  inconstitucional pela maioria republicano-conservadora da Suprema Corte. Pouco importa como assinala  Ronald Dworkin que o principal argumento da ação contrária – relacionado ao instituto do mandato – não tenha consistência jurídica. Se for derrubada pela Corte, a motivação será política, na toada das sentenças Bush v. Gore (que deu de bandeja a presidência a Bush júnior) e Citizens United (que subverteu o financiamento da propaganda eleitoral).
       Sem embargo, a famosa tunda (shellacking) não foi inesperada. A eleição para prover o assento de Ted Kennedy no Senado fora ganha pelo republicano Scott Brown, em estado que pende para os democratas (Massachusetts). Para tanto, a incompetência da candidata Martha Coakley foi decerto um fator mas,também, contribuíu bastante a desconexão da Casa Branca com a realidade política circundante.
     A perda na eleição intermediária de 2010 da Casa de Representantes, em avalanche republicana e do Tea Party, decorreu da insatisfação com a gestão de Obama no que tangia à economia. Não havendo tomado medidas que para convencer o eleitorado de seu eficaz empenho no combate à grande recessão, Barack Obama amargou um duplo castigo.
     Além de não mais controlar o Legislativo, eis que a Câmara passou a ser dominada pela dupla John BoehnerEric Cantor, do G.O.P., Obama ficou igualmente manietado para a tomada de providências efetivas no combate à recessão. Já não mais poderia montar o cavalo que passara diante dele encilhado durante o primeiro biênio.
     Por outro lado, o caráter radical da maioria do Tea Party muito lhe desgastaria a popularidade, por causa do modo insatisfatório com que lidou com o desafio da exploração sectária do GOP para aprovação congressual de novo teto para a dívida da União.
    A opinião pública estadunidense considera que o presidente em exercício é o responsável pelo estado da economia. Obama não pode arguir que herdou a grande recessão dos alegres compadres republicanos sob a regência de George W. Bush.
    A experiência política americana ensina que a recessão não causa necessariamente a não-reeleição do presidente em funções. Ronald Reagan em 1984 é exemplo disso, ao vencer Walter Mondale. No entanto, o eleitor terá essa situação muito presente, e se o desempenho do presidente em exercício não lhe satisfizer em matéria economico-financeira (V. os exemplos de George H.W.Bush e Jimmy Carter, que não lograram reeleger-se) ele estará destinado a ser presidente de um só mandato.
      Os republicanos nunca fizeram segredo – e o lider da minoria no Senado Mitch McConnell está aí para confirmá-lo – de que a principal missão do GOP é de inviabilizar o intento de Barack Hussein Obama para conseguir a ambicionada reeleição.
      Por enquanto, se anuncia uma disputa apertada (tight race). Com a candidatura republicana praticamente assegurada a Mitt Romney, o ex-governador de Massachusetts pode concentrar-se na campanha contra Obama.
     A circunstância de que o presidente não tenha uma vantagem substancial – e a possibilidade de que os comícios de novembro lhe sejam contrários – tende a diminuir a possível influência positiva do cabeça de chapa democrata na composição de Senado e Câmara.
     Conquanto a turma do Tea Party na Câmara tenha ajudado bastante os democratas pelas suas atitudes demasiado doutrinárias, é ainda um toss-up ( cara ou coroa) o resultado na Casa de Representantes. Se a eleição para presidente for muito renhida – como no momento é o mais provável – há ainda a possibilidade de os republicanos manterem o predomínio na Câmara, posto que com menor margem.
     No Senado, em que a maioria democrata encolheu bastante, perdura a esperança de que candidaturas do Tea Party (como na recente primária em que o veterano Richard Lugar teve denegada a sua candidatura a nova reeleição) venham a auxiliar os democratas. Nesse modelo, os radicais do Tea Party assustam o eleitorado com suas posturas sectárias e ensejam, por conseguinte, o triunfo do opositor democrata.
    Não é à toa, por conseguinte, que esta eleição de 2012 vem sendo considerada como uma das mais importantes da história política americana.
    Barack Obama será combatido sobretudo pela situação econômica. Por isso, o presidente depende dos indicadores de trabalho e desemprego. Um aumento pronunciado no desemprego – ou níveis muito baixos de novas contratações – poderiam ter efeito desastroso sobre a postulação de Obama.
    Malgrado ser o presidente  popular com o eleitorado feminino e com os jovens (neste setor, no entanto, a sua conduta presidencial fê-lo perder muitos votos), ele não desconhece que a eleição de novembro será ganha – ou perdida – por causa da economia.
    A ênfase, portanto, está claramente marcada. Romney tenderá a privilegiar tal área, e o próprio Obama não terá outra saída senão terçar armas nesse campo. Não é que, no entanto, aí esteja desarmado.Disto nos ocuparemos em blog a seguir.



(Fonte subsidiária: International Herald Tribune)

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Crescei e Endividai-vos !

                                 
      Já faz tempo que a economia brasileira se acha aos cuidados do alfaiate Guido Mantega. Com efeito, pela forçada saída de Antonio Palocci, Mantega assumiu o ministério da Fazenda ainda no primeiro mandato do Presidente Lula (27 de março de 2006), e agora serve a sucessora, Presidente Dilma Rousseff. São, portanto, mais de seis anos.
      Posto que os estilos sejam diversos – o de Lula da Silva mais presidencial, e o de Dilma, mais gestorial – Mantega vem singrando  mares que não  são de almirante com a nave Brasil a contento dos respectivos comandantes.
     Aumentamos nossas reservas em divisas, o real é moeda estável e valorizada, somos credores do FMI e o Produto Interno Bruto (PIB) cresce, se bem que não no ritmo de outros BRICs.
      No momento, por força de ulterior crise internacional – em 2008, tivemos a crise financeira internacional, originária da bancarrota do Lehman Brothers que aqui virou marolinha; agora, pairam na Europa as dúvidas  acerca do euro, decorrentes da inadimplência da Grécia e de outros mais – patina a taxa de crescimento de nosso PIB.
     Seguindo o exemplo anterior, se pretende alavancar a economia pela via do consumo, vale dizer, do incentivo às compras de bens de consumo duráveis (automóveis populares, eletrodomésticos) através de reduções de impostos que gravam esses produtos.
     Nesses termos, o governo estimula o incremento nas vendas desses bens duráveis, com que se favorece as montadoras de automóveis – mantendo artificialmente aquecido o setor se evitam as férias forçadas nas fábricas – e a economia se conserva ativa.
     O quadro, contudo, se complica se tivermos presente que esse crescimento é alimentado pelas vendas a crédito. Nada mau se é para movimentar a economia e evitar o desemprego .
     Procurar sair da crise pelo incentivo ao crédito implica no aumento do endividamento. As estatísticas da dívida das famílias junto aos banco mostram um crescimento sustentado desde janeiro de 2007 com 24,9% até janeiro de 2012, com 42,72%, e uma projeção do professor Simão Silber para abril p.p. em 45%. Por outro lado, a evolução do comprometimento da renda dos brasileiros com dívidas bancárias vai de 15,58% (janeiro de 2005) até 22,30% (dezembro de 2011).
     Segundo outras informações, o brasileiro se serve do cheque especial (com os seus juros escorchantes) em 22 dias do mês, o que decerto não é pouco. Se as taxas de endividamento ainda não atingem níveis da dívida americana, ao ensejo da presente grande recessão, a tendência brasileira consoante as tabelas não é de molde a visões muito otimistas.
    Por outro lado, ao contrário de outros povos, a poupança do brasileiro não tem o animador percentual que se registra além mar. Há pouco, falou-se muito da caderneta de poupança, de quanto o modelo preexistente é estimado pelo brasileiro comum. Tudo isso pode ser verdade, mas tal não quer dizer que sejamos um país de poupadores. A dívida, através do excesso de aquisições a prazo, seria nosso traço mais marcante.
     Sob o lulopetismo, o governo favorece a transferência de renda para as classes menos aquinhoadas pela sorte. É orientação positiva, que deve ser estimulada. Para alcançar tal objetivo, no entanto, semelha no mínimo discutivel o procedimento adotado pelos Presidentes Lula da Silva e Dilma Rousseff.
    Mesmo através da dívida, a filosofia keynesiana incentiva a ativação da economia através de investimentos que criem melhores condições de emprego, transporte e saneamento. Esse alavancamento da economia é feito parcialmente através de déficits orçamentários, que serão compensados no futuro pelas maiores oportunidades criadas.
   O lulopetismo, no entanto, privilegia os gastos correntes, com o consequente aumento do empreguismo, a par do assistencialismo, de programas como bolsa família e outros congêneres.
    O problema do assistencialismo está espelhado no estado-líder deste programa, a saber o progressista Maranhão, em que mais de noventa por cento da população está por ele coberta. Não obstante, seu índice de desenvolvimento humano (idh)  é o segundo mais baixo do Brasil.
    Não se deve, decerto, deixar à míngua aqueles que precisam. Sem embargo, a orientação básica de tais esquemas de apoio é criar condições para que as pessoas e comunidades saiam da situação em que se encontram.  O exemplo do Maranhão e outros estados do Nordeste aponta para uma condição permanente, em que os favorecidos se contentam com os magros recursos que lhes são atribuídos, sem qualquer ambição de alcançar novos patamares existenciais mais dignos.
     Outro aspecto da economia petista é o salário mínimo, que vem sendo inchado, não só pelas taxas da inflação, mas até pelo índice  de crescimento do PIB. O que se está fazendo é uma retroalimentação da inflação, mantida ativa através de  série de anacrônicos índices,  herança da cultura da carestia.
     O Estado brasileiro sob os líderes da filosofia lulopetista continua deficitário em investimento, o que se traduz em generalizada deficiência em infraestrutura, saneamento básico,saúde, educação e segurança.
     O nosso crescimento em termos de PIB, alimentado pelo real sobrevalorizado, nos coloca ora como sexta economia mundial, superando o Reino Unido !
     Haja vista o que precede, é de perguntar-se se este lema do ‘Crescei e Endividai-vos!’ irá funcionar por muito tempo.   
   A mãe de Napoleão, Laetitia Ramolino Bonaparte, quando lhe contavam das glórias do filho, costumava dizer, no seu francês estropiado:  Desde que isso dure...



( Fonte:  O Globo )  

terça-feira, 22 de maio de 2012

O Veto ao Código Ruralista

                        
       Até o presente, Dilma Rousseff não tem dado indicações animadoras quanto ao seu apoio à causa ambientalista. Excluído o parêntese oportunista do compromisso assumido às vésperas do segundo turno, quando fez mesuras à mensagem da candidata Marina Silva e os seus  dezenove milhões de votos, Dilma tem dito algumas palavras na defesa do meio ambiente.
      Tal não contribuiu, todavia, até o momento, em fazer que a vontade da opinião pública brasileira seja respeitada por um Congresso eleito sob parâmetros que favorecem aos proprietários rurais e  estados de menor densidade demográfica. Esse grave desequilíbrio – que reedita o fenômeno dos burgos podres na Inglaterra – é uma das grandes falhas da Constituição de cinco de outubro de 1988.
     Na votação pela Câmara do chamado relatório Paulo Piau (MG) – que revogou a versão menos ruim do código aprovada pelo Senado – a presidente se defrontou, inclusive, com a deserção em massa da bancada do PMDB, encabeçada pelo líder Henrique Eduardo Alves (RN), a qual, é bom que se relembre, diz integrar a maioria governamental. Será marca de grave fraqueza nesta ‘base de apoio’ se o trânsfuga – que se jactou da suposta proeza – e o respectivo partido não pagarem pelo voto contrário ao governo.
     Conforme é seu costume, a presidente fez difundir na imprensa que considera a hipótese de vetar, no todo ou em parte, o Código aprovado pela Câmara. Estudava o assunto e, simultaneamente, difundia um propósito ainda não corroborado pela firma irrevogável. Sabe-se que o prazo fatal vence a 25 de maio, nesta sexta-feira.
    Esse procedimento presidencial se quer hábil, não só por auscultar as reações de gregos e troianos, mas também por difundir na sociedade a alegada simpatia da Chefe da Nação com o ambientalismo. O que virá depois será outra estória.
   No passado, o seu criador pautou-se sempre em estender o perdão aos desmatadores, sob a forma de prorrogação do  sursis (suspensão) das multas que deveriam pagar por investirem contra a nossa floresta. Ter-se-á julgado muito esperto, ao manter a indefinição na aplicação da lei. Objetivamente, no entanto, deixava poucas dúvidas sobre quem realmente apoiava.
    A par disso, Dilma Rousseff se filia a um desenvolvimentismo que já tem um olor de coisa passada. O momento é mais de conciliar a preservação de nossa riqueza florestal – única no mundo – com formas de desenvolvimento sustentável. Deparando atitudes de Lula, Dilma e do atual PT, a pergunta irrompe: o que fazia Chico Mendes nesta companhia ? Se a sua vida não houvesse sido covardemente ceifada, onde estaria hoje o seu movimento e a sua pregação ?
    A Folha publica hoje apelo público de dez ex-Ministros do Meio Ambiente[1] à Presidente da República, para que vete integralmente os retrocessos do texto aprovado pela Câmara dos Deputados que altera o Código Florestal.
     Este veto deveria aplicar-se “a toda e qualquer norma de caráter permanente ou transitório que:

     - Sinalize ao país a possibilidade presente e futura de anistia;

     - Permita a impunidade em relação ao desmatamento;

     - Descaracterize a definição de florestas, que está consagrada na legislação vigente;

     - Reduza direta ou indiretamente a proteção do capital natural associado às florestas;

     -  Fragilize os serviços prestados por elas;

     -  Dificulte, esvazie ou desestimule mecanismos para a restauração;

     -  Ou, ainda, fragilize a governança socioambiental.”
 
     O veto presidencial, se se deseja eficaz e eficiente, terá de ser suprido por M.P., que evite o vácuo legislativo e que, ainda nas palavras do apelo público dos ex-Ministros, estabeleça ‘uma política florestal sustentável – e que, portanto, valorize as funções de conservação, de recuperação e de uso econômico do capital natural associado às nossas florestas’.
    Dilma Rousseff tem sido apresentada como líder enérgica e motivante. Do paço do governo, a hora vai soar para que a sua vontade, como expressão do interesse nacional, motive e leve os parlamentares a seguir linha de pensamento e ação avalizada pela esmagadora maioria da opinião pública.
   Em termos de política de governo, presidentes não fazem apelos a sua maioria parlamentar, mas transmitem o seu sentir para que preceitos básicos sejam por ela respeitados. A menos que seja tropa sem controle, que decide a seu  bel prazer.
   É o que veremos em futuro próximo.




(Fonte: Folha de S. Paulo)



[1] Carlos Minc, Marina Silva, José Carlos Carvalho, José Sarney Filho, Gustavo Krause, Henrique Brandão Cavalcanti, Rubens Ricupero, Fernando Coutinho Jorge, José Goldemberg e Paulo Nogueira Neto.