sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Cesare Battisti e as Relações Brasil-Itália

A concessão pelo Ministro da Justiça, Tarso Genro, do status de refugiado político ao italiano Cesare Battisti vem provocando forte reação do governo italiano e de movimentos políticos de tendência direitista. Após declarações do Primeiro Ministro, Silvio Berlusconi, e dos Ministros da Defesa, Ignazio La Russa e das Negócios Estrangeiros, Franco Frattini, em que se censurava a decisão do Ministro Tarso Genro, o próprio Presidente da República, o ex-comunista Giorgio Napoletano, enviou carta ao Presidente Luiz Inacio Lula da Silva. Napoletano encarecia a Lula que derrogasse a medida de seu ministro, e que concedesse a extradição.
A esse propósito, releva assinalar que o Presidente italiano – um cargo essencialmente protocolar naquele país – na correspondência se reporta ao seu stupore diante da medida. Isto foi traduzido pela imprensa brasileira como “surpresa”, o que é substituir um termo forte – equivalente ao estupor do vernáculo – por um vocábulo mais débil. Em outras palavras, se colocava na missiva de Napoletano, em português, a expressão diplomática que ele deveria ter usado. Mas a pouca atenção do Presidente italiano à prática diplomática não se limitou à linguagem, eis que tampouco teve a cortesia de que o Presidente Lula tomasse conhecimento do teor da carta quando a recebesse. Ao contrário, apressou-se em mandar divulgá-la pelas agências de notícia.
No Brasil, a par do apoio prestado pelo Presidente Lula à determinação de seu Ministro da Justiça – que contrariou, em nível político, pareceres técnicos da Procuradoria Geral da República e do CONARE, ambos favoráveis à extradição - transpirou para a imprensa despacho do atual Presidente do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Gilmar Mendes, para o Procurador-Geral da República. Nesse procedimento, que deve preceder ao conhecimento da matéria pelo plenário do Supremo, Gilmar Mendes se reportou à providência adotada pelo Ministro Genro como um ato isolado.
Se cabe aguardar que o Supremo venha a ocupar-se da questão, semelha existirem duas possíveis respostas de nossa mais alta Corte. Ou decide não mais conhecer da matéria, pelo fato de não haver sido aprovada a extradição, ou pende para examinar o mérito do assunto. De qualquer forma, mesmo neste último caso, pela legislação a última palavra cabe ao Presidente da República.
A despeito, portanto, das atitudes teatrais, tão ao gosto peninsular, dos Ministros italianos – o Ministro da Defesa ora reclama a convocação ‘para consultas’ do Embaixador da Itália no Brasil –, toda essa bulha motivada por um obscuro revolucionário de um ainda mais obscuro movimento extra-parlamentar “Proletários Armados pelo Comunismo” (PAC), condenado à prisão perpétua por um julgamento in absentia deverá findar com a confirmação do status de refugiado de Cesare Battisti.
Enquanto se aguarda que o Brasil retome a sua tradição de concessão de asilo a perseguidos políticos – interrompida na expedição para Cuba dos dois boxeadores que pleiteavam o asilo territorial – pergunto-me apenas por que tais protestos oficiais e manifestações perante missões diplomáticas não ocorreram quando Cesare Battisti residia na França, sob a presidência de François Mitterrand. O defunto Presidente tinha a idiossincrasia de não autorizar a extradição de perseguidos políticos. Sucedido por Jacques Chirac, a atitude do governo francês mudou, e Battisti teve de fugir para o Brasil. Se a política explica a diferença na atitude francesa, o que fica difícil de entender é a aparente plácida aceitação da vontade de Mitterrand pelos políticos italianos. O que mudou agora ?

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

O Discurso de Obama no Capitólio

Dos JORNAIS XXVIII

O GLOBO 21.I.2009
FOLHA DE S.PAULO


Em um dia frio (-3º) em Washington, acorreu à posse de Barack H. Obama, o 44º Presidente dos Estados Unidos, grande multidão, orçada entre 1,800 e 2 milhões de pessoas. Todo o enorme espaço (2,5 km) entre o Obelisco de Washington e o Capitólio estava repleto de um público entusiasta e festivo, que comparecia para manifestar o seu apoio para o primeiro presidente negro dos Estados Unidos. Depois de prestar o juramento constitucional, com a mão apoiada em bíblia que pertencera ao Presidente Abraham Lincoln, Obama pronunciou discurso de cerca 20 minutos, definido como realista porém esperançoso.
A alocução de Obama não teve a retórica altissonante da campanha, nem o mantra “Sim, nós podemos”, e tampouco profusas citações de Abraham Lincoln e Martin Luther King. Assinale-se, no entanto, que o cotejo simbólico com o 16º Presidente esteve sempre presente para Obama : ao declarar-se candidato há dois anos atrás, no mesmo lugar em Illinois em que Lincoln lançara a sua primeira campanha; mais tarde, na viagem de trem de Filadelfia para Washington, refazendo o percurso de Lincoln,como presidente-eleito; e, por fim, ao jurar sobre a bíblia utilizada pelo ilustre predecessor, ao tomar posse em 1861.
A este propósito, a pesquisa realizada por analistas da CNN me parece interessante, ao identificar as principais fontes das citações e da linguagem empregadas no discurso de posse. De forma algo surpreendente, o espírito do revolucionário Thomas Paine, o grande panfletista do século XVIII, está bastante presente nas suas palavras, e em especial na citação de sua obra que George Washington mandou fosse lida para as tropas americanas: “Seja dito para o mundo futuro que nas profundezas do inverno, quando nada poderá sobreviver senão a esperança e a virtude, que a cidade e a nação, alarmados diante do perigo comum, avançaram para enfrentá-lo.”
Obama, se reconhece a realidade da crise, não deixa dúvidas sobre o êxito da resposta:
“os desafios que enfrentamos são reais. Mas saibam disso, Estados Unidos da América, eles serão vencidos.”
De acordo com a postura já conhecida de Obama, ao invés de condenar o passado, o discurso olha confiante para o futuro. Essa atitude generosa já se podia intuir desde o início da mensagem, nas medidas palavras, em que agradece ao antecessor pelo serviço à nação, assim como “pela generosidade e cooperação” demonstradas durante a transição de governo.
Se não elude a responsabilidade geral pela crise econômica, faz um apelo para que todos participem ao lado do governo na luta indispensável para a sua superação. Barack Obama, por conseguinte, rejeita o dito de Ronald Reagan em 1981, de que o governo represente o problema e não a solução.
Outra passagem lapidar do discurso mostra claramente o que pensa da política de Bush e de Cheney, na sua reação aos atentados de onze de setembro de 2001: “para a nossa defesa comum, nós rejeitamos a falsa escolha entre nossa segurança e os nossos ideais.”
A alocução igualmente reafirma a própria disposição de retirar-se do Iraque e de chegar à paz no Afeganistão. Dada a complexidade das guerras herdadas de Bush júnior, não se poderia esperar que fosse mais explícito em suas palavras.
Importante igualmente é a referência ao mundo muçulmano em que a nova Administração busca “um novo caminho à frente, baseado em respeito e interesse mútuos.” Releva notar que a possibilidade de que esta frase venha a refletir um compromisso real da parte dos Estados Unidos vai depender estreitamente de um maior equilíbrio no tratamento a ser dispensado à crise entre Israel e o povo palestino.

O futuro dirá se o novel Presidente saberá valer-se do crédito de confiança que é comumente concedido pela opinião pública durante o início de novo mandato. Ninguém poderá, se honesto e são de mente, duvidar da amplitude do desafio que deve arrostar. O desgoverno de Bush, a gravidade da crise, a urgência nas medidas para enfrentá-la e superá-la, a necessidade de novas e inequívocas respostas nos campos das relações internacionais, do respeito aos direitos humanos e ao direito internacional, da energia e do meio-ambiente, entre outros, dão uma idéia do que terá pela frente ao sentar-se no gabinete oval da Casa Branca..
Muito do eventual sucesso de sua presidência dependerá da maneira com que há de comportar-se nesses primeiros cem dias. Fazemos votos para que, na medida do possível, possa comparar-se ao exemplo dado em 1933 por seu grande predecessor Franklin Delano Roosevelt.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Declarações Infelizes

O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em visita à Venezuela, ladeado pelo Presidente Hugo Chávez, declarou-se em favor da tese da reeleição indefinida. Não vê nada demais que seja novamente proposta ao eleitorado venezuelano – a primeira vez, em 2007, a proposição fora rechaçada – a possibilidade de o primeiro mandatário pleitear quantas reeleições desejar.
O primeiro erro cometido pelo Presidente Lula consiste em opinar – com a agravante de fazê-lo no território do país visitado - sobre um tópico de política interna desse país. Nessa questão se interlaçam as normas da não-intervenção e de seu corolário, que é o respeito pelo direito soberano do povo de decidir sobre o respectivo destino.
Com as suas considerações sobre as diversas culturas de cada país, em um agrado a seu anfitrião, ele se pronuncia candidamente sobre o direito do Presidente Chávez postular a sua reeleição indefinida, através da emenda constitucional que reapresenta à consideração do eleitorado. E em defesa desse suposto direito, trocando alhos por bugalhos, justifica tal pretensão à luz da possibilidade de primeiros ministros europeus ficarem muitos anos no poder. Abstraindo as características democráticas desses regimes – que não são apenas fachadas referendárias - é constrangedora essa confusão conceitual, que equipara regimes parlamentares - em que a permanência no poder do Primeiro Ministro depende de maiorias no Parlamento – com regimes presidenciais, em que o mandato do Presidente é determinado diretamente pelo povo, em eleições periódicas.
Na sua defesa da pretensão do caudilho Chávez de atropelar o eleitorado, arrancando a reeleição indefinida, antes que a crise internacional cerceie ainda mais a munificência demagógica do Presidente venezuelano, o Presidente Lula houve por bem considerar igualmente admissível a reeleição indefinida no Brasil. A Constituição brasileira não é uma lei ordinária, suscetível de ser mudada sempre que isso for da conveniência do grupo no poder ( não é por acaso que a reeleição foi combatida por Lula e o PT quando estavam fora do poder). Agora, se utiliza a perigosa linguagem do possibilismo, como se tudo fosse admissível. Não se tentou há pouco tempo em Brasília lançar uma ‘reforma política’ em que todos os mandatos teriam a mesma duração (cinco anos), misturando no mesmo saco presidentes, deputados e senadores?
Mas deixemos de lado mais esta digressão do Presidente Lula. Pela democracia na Venezuela, e não por seu arremedo chavista, esperemos que o caudilho seja mais uma vez derrotado na sua ambição de perpetuar-se no poder.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

A Ofensiva de Israel contra a Faixa de Gaza

No seu décimo-oitavo dia, a ofensiva do exército e da aviação israelense contra Gaza ainda não alcançou o objetivo que se prefixara ao iniciar as operações de guerra: a destruição da capacidade do Hamas de lançar foguetes ‘artesanais’ contra cidades e povoações israelenses a cerca de 30-40 km da fronteira.
Somente o desespero pode explicar este recurso do Hamas em alvejar o poderoso vizinho com seus foguetes de curto raio da ação. O Hamas governa em Gaza, após conseguir afastar o Al-Fatah. Movimento integrista, com vínculos assistencialistas muito estreitos com a população local, o Hamas é radical, adota táticas éticamente contestáveis (a exemplo do Hezbollah do Líbano) com a sua instrumentalização da população civil. Apesar de extremista, o Hamas não é insano. O seu recurso à guerrilha dos foguetes só é explicável porque a atual liderança israelense, após a derrocada dos Acordos de Oslo, adota uma estratégia de sufocar a população palestina, através do incessante aumento da colonização nos territórios da Cisjordânia, da construção do muro de contenção (que invade ilegalmente os territórios palestinos) e de uma rede viária que privilegia os núcleos de neo-colonização.
A despeito das declarações em contrário, a partir do fracasso do plano Clinton, em que Arafat terá perdido oportunidade histórica, ao recusar a proposta de paz (por não incluir o direito de retorno dos refugiados de 1948), a causa da paz na Palestina foi a principal vítima com a ascensão de Sharon – visita provocatória à mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém, que desencadeou a segunda Intifada – e a assunção do governo de Bush-Cheney (que acentuou o desequilíbrio no Oriente Próximo, com seu apoio aos governos direitistas israelenses, em detrimento de Arafat, virtual prisioneiro em Ramallah).
A situação no Oriente Próximo agravou-se nos últimos anos em que a política dos dirigentes israelenses se orientou para a ‘bantustanização’ dos territórios palestinos e da sua conseqüente inviabilização como Estado independente. Se alguém se propusesse criar um sistema que impossibilitasse a convivência pacífica entre dois povos, não poderia colimar nada mais apropriado do que a série de medidas implantadas (núcleos de colonização israelense, rede viária de sustentação, cerca de concreto, barreiras de circulação, etc.) para tornar realidade esta anti-política.
Daí o desespero do Hamas e da população de Gaza, cercada esta por uma série de embargos punitivos, devidos à circunstância de ter preferido o movimento integrista ao invés do moderado Fatah, de Abbas.
A história das relações entre Israel de um lado, e o movimento palestino de outro, mostra – como assinala Robert Fisk – que o recurso à guerra e sobretudo às invasões do Líbano (e agora de Gaza e da Cisjordânia) não proporciona os resultados perseguidos por Israel. Não obstante o seu poderio desproporcional com respeito aos palestinos, a dinâmica demográfica e as limitações a que mesmo Tel Aviv tem de sujeitar-se demonstra de forma consistente o truismo de que, entre as serventias do fuzil, não está a de oferecer assento a quem o utiliza.
Dessa maneira, a atual campanha militar – alavancada pelas próximas eleições israelenses, pela ambição dos herdeiros de Sharon de vencer nas urnas a ultradireita de Netaniahu e possibilitada pelo apoio dos Estados Unidos, nos estertores da Administração de Bush júnior – se já se aproxima das suas mil baixas na população de Gaza, ainda não logrou extinguir o lançamento dos ditos foguetes artesanais contra o território israelense. Mesmo admitido que logre interromper essa resposta da guerrilha palestina contra Israel, se não houver uma solução política séria para a questão palestina – assegurado o respeito às fronteiras através de observadores imparciais – pode-se prognosticar, sem medo de erro, que o atual cenário naquela zona conflagrada continuará a prevalecer. De um lado intolerância e desrespeito aos direitos básicos das populações civis; de outro, crescimento de movimentos do estampo de Hezbollah e Hamas, i.e., do integrismo fundamentalista e radical.
Entretanto, nunca é tarde demais, para que a paz prevaleça. Para isso, é indispensável a vontade política. O calendário oferece para tanto uma grande oportunidade.
Com a palavra o futuro Presidente Barack Obama.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Da Reforma Ortográfica.Considerações sobre a custosa inutilidade.

Ao ver o desalento do professor Pasquale Cipro Neto, mostrando toda uma prateleira de livros tornados obsoletos pela enésima reforma ortográfica – que entrará em pleno vigor em 2012, mas já está sendo aplicada - , ao concordar integralmente com a opinião deste estudioso (e de muitos outros) acerca da inutilidade desta reforma, parece-me forçoso acrescentar mais algumas considerações.
A reforma não é apenas inútil, mas também perniciosa – como deixou implícito Cipro Neto – ao forçar a obsolescência de todos os livros publicados no Brasil – de referência, literários e técnicos – como se a indústria editorial nacional carecesse do artificialismo sistêmico das mudanças anuais da indústria automobilística ou as sazonais da moda.
Em um país de muitas editoras e poucos leitores, uma pessoa de bom senso há de perguntar-se do porquê desses esforços reiterados que no espaço de uma geração são ritualmente impingidos como necessidades inadiáveis aos alfabetizados brasileiros. Procederão as justificativas de ampliar o mercado editorial com a padronização do idioma não só no Brasil e em Portugal, senão nos demais países de língua portuguesa (Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné Bissau, Timor Leste, etc.) ? Decerto as dúvidas expressas são fundadas, mas não creio que se deva tentar entender tal proliferação reformista a partir da análise das argumentações das partes diretamente interessadas nesse processo.
Das Causas. Quando o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o decreto ratificando o acordo promovido pelas Academias, pensei na frase do estadista francês Georges Clemenceau de que “a guerra é demasiado importante para deixá-la por conta dos generais”. Não, caro leitor, não estou confundindo conflito armado com imposição de reforma ortográfica. O meu raciocínio é de ordem epistêmica e pode igualmente inspirar-se no dito latino “quis custodiet ipsos custodes?” (quem vigiará os vigias ?). Em outras palavras, a reforma ortográfica é demasiado importante para que a deixemos ao arbítrio dos gramáticos e das academias.
Com efeito, o parecer dos ditos especialistas terá seu peso, mas ele deve estar submetido às instâncias do Estado, que julgarão da conveniência ou não da implementação das opiniões setoriais. Deparamos aqui, no entanto,a uma inversão do processo. Como Foucault nos ensina, o poder se manifesta em muitas formas. No caso presente, prepondera a visão técnico-burocrática das academias, erigidas na prática como autoridade máxima, eis que as negociações – e as reformas – por elas encaminhadas são chanceladas pelo poder estatal como se fossem irrecusáveis e inquestionáveis. Depois das negociações entre as academias, e estranhas concessões (como a duvidosa fundamentação para que ideia no Brasil fique sem acento – irrisório agrado ao uso não-acentuado em Portugal), a aprovação pelos poderes do Estado é uma simples formalidade, como se verifica pelos termos com que o Presidente Lula ratificou o acordo. E é bom que se frise, esta atitude de aprovação automática, sem questionamento, caracteriza no particular tanto o atual, quanto o seu imediato antecessor, Fernando Henrique Cardoso.
Infelizmente, a busca da causa não pode deter-se na desenvoltura das academias e na chancela pelo poder estatal. Está aí a herança da colonização, com suas ordenações, sua índole normativa, burocrática e cartorial, a criar uma teia infernal para as atividades tantos comerciais, quanto culturais. O formalismo, as instâncias burocráticas, a pulverização do poder representada por um sem-número de régulos, todos nominalmente prostrados diante da figura distante e quase inatingível de el-Rei será um quadro que terá desaparecido com a Independência ?
Ou será que tais práticas persistem sob outras formas ? Não nos esqueçamos que em tempos da ditadura houve um ministério que se ocupou precipuamente em simplificar as normas burocráticas no Brasil. Terá tido sucesso ? Basta visitar um simples cartório para que vejamos quem vence por ora essa inglória batalha.
Comparações desconfortáveis. Quem foi caracterizado como a autoridade máxima para determinar do acerto ou não de normas derivadas do presente acordo ortográfico, justificou-lhe a assinatura pela circunstância, a seu ver única no mundo, da existência de duas ortografias oficiais do português – a brasileira e a portuguesa. Tive dificuldade em acreditar no que estava ouvindo. Duas ortografias do português únicas no mundo ? E o que dizer das variantes do inglês nos Estados Unidos e na Inglaterra ? Será que a língua inglesa encontra-se em desvantagem nesses dois países, por não estar submetida a nenhuma instância burocrática ? Acresce notar que seja nos Estados Unidos, seja no Reino Unido não houve qualquer reforma no espaço de tempo em que o português – esta última flor do Lácio - pode orgulhar-se de pelo menos três !
Se acrescentarmos o francês – a despeito de lá existir a Académie Française, de onde Machado de Assis copiou a nossa – tampouco há a registrar reformas ortográficas recentes.
Sem as contínuas mudanças a que se submeteu o português, em que estado se acha o inglês (nas suas expressões inglesa e americana) e o francês ? Seriam, porventura, a reificação do atraso ou vão bem, obrigado ? Fico a indagar-me porque ainda não aplicaram o modelo luso-brasileiro, que obriga gerações a reinventar a roda, enquanto os editores tupiniquins permanecem felizes com suas edições de três mil exemplares...